Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
24/09.2TBMDA.C2.S2
Nº Convencional: 7ª SECÇÃO
Relator: MARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA
Descritores: ACÇÃO DE REIVINDICAÇÃO
DIREITO DE PROPRIEDADE
MURO
MATÉRIA DE FACTO
PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
NULIDADE DE ACÓRDÃO
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
REGISTO PREDIAL
PRESUNÇÕES LEGAIS
PRESUNÇÃO DE PROPRIEDADE
Nº do Documento: SJ
Data do Acordão: 01/22/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL - RELAÇÕES JURÍDICAS / PROVAS.
DIREITO DOS REGISTOS E NOTARIADO - REGISTO PREDIAL / EFEITOS DO REGISTO.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO / INSTRUÇÃO DO PROCESSO - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / ARTICULADOS / SENTENÇA / RECURSOS.
Doutrina:
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGO 344.º, N.º1.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 467.º, N.º1, AL. E), 661.º, 712.º, 722.º, N.º2.
CÓDIGO DO REGISTO PREDIAL (CRGP): - ARTIGO 7.º.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGO 205.º.
LEI Nº 41/2013, DE 26 DE JUNHO: - ARTIGO 7.º.
NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (NCPC): - ARTIGOS 412.º, 607.º, N.º5, 615.º, N.º 1, D), 666.º, N.º 1, 662.º, 682.º, N.º2, 690.º-A, N.º3.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL:
-Nº 680/98, DISPONÍVEL EM WWW.TRIBUNALCONSTITUCIONAL.PT .
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ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 27 DE SETEMBRO DE 2007, PROC. Nº 07B2028 E JURISPRUDÊNCIA NELE CITADA, EM WWW.DGSI.PT , E DE 16 DE JANEIRO DE 2014, PROC. Nº 695/09.0TBBRG.G2.S1, EM WWW.DGSI.PT .
-DE 8 DE OUTUBRO DE 2009, PROC. Nº 839/04.8TBGRD.C1.S1, EM WWW.DGSI.PT .
-DE 8 DE MAIO DE 2013, PROC. Nº 3036/04.9TBVLG.P1.S1 E JURISPRUDÊNCIA INDICADA, EM WWW.DGSI.PT;
-DE 24 DE OUTUBRO DE 2013, PROC. Nº 1673/07.9TJVNF.P1.S1, EM WWW.DGSI.PT .
Sumário :
I - A lei portuguesa prevê apenas um grau de recurso no julgamento da matéria de facto, razão pela qual a intervenção do STJ nesta matéria apenas se justifica sempre que o tribunal recorrido tenha ofendido uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova, para a existência do facto, ou que fixe a força de determinado meio de prova; mas já não nas circunstâncias em que apenas se pretende reanalisar a apreciação que as instâncias fizeram de prova testemunhal, pericial ou qualquer outra sujeita ao princípio da livre apreciação da prova.

II - A fundamentação das decisões desempenha, simultaneamente, uma função de demonstração da sua própria coerência, de persuasão dos destinatários e de possibilidade de controlo pelas partes e pelos tribunais superiores, mas também de legitimação do exercício do poder judicial.

III - Não é susceptível de fundamental a arguição de nulidade de acórdão – por falta de fundamentação – a mera discordância com as conclusões de facto constantes do acórdão.

IV - A nulidade por omissão de pronúncia apenas se verifica quando o tribunal deixa de apreciar questões que tinha de conhecer, mas já não quando, no entender do recorrente, as razões da decisão resultam pouco explicitadas ou não se conhecem de argumentos invocados.

V - Não obstante do art. 7.º do CRgP resultar que a inscrição no registo predial faz presumir a titularidade do direito de propriedade, tal presunção não abrange a definição da delimitação física do prédio, e que é a que está em causa na discussão da titularidade da faixa de 28 m de terreno.

Decisão Texto Integral:
Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça:




1. AA e mulher, BB, instauraram uma acção contra CC e mulher, DD, pedindo I) que fosse declarado serem proprietários dos prédios que descrevem no artigo 1º da petição inicial (a), b) e c)), II) que os réus fossem condenados a reconhecer essa titularidade e que deles faz parte a área de 28,58 m² que ocuparam, e III) ainda a demolir os muros que construíram e a construir o que derrubaram, e a desimpedir a área ocupada ou IV) no pagamento das despesas que venham a ter com a construção desse mesmo muro, e, em qualquer caso, V) de uma indemnização pelos prejuízos causados com a destruição dos muros e apropriação da pedra, em montante a liquidar.

Em síntese, alegaram factos tendentes a demonstrar a aquisição por usucapião, afirmaram que actualmente os prédios constituem uma unidade, separada do exterior por muros, um dos quais ladeava o prédio dos réus e foi por estes destruído, apoderando-se os réus da pedra e ocupando um área de cerca de 28 m² de um dos três prédios, b). Afirmaram ainda que os réus construíram ilegalmente um muro em terreno seu e com uma altura que impede que o sol atinja esse prédio, prejudicando a sua qualidade como terreno de cultura.

Os réus contestaram Por entre o mais, impugnaram a aquisição por usucapião e deram uma versão diferente da situação descrita pelos autores. Nomeadamente, alegaram que existia um caminho que confinava com um muro seu, que os autores em parte derrubaram indemnizando os réus, e que permitia aos réus o acesso a um palhal de sua propriedade, ao qual se acedia passando “por uma eira comum a diversas pessoas, entre as quais os donos do palhal”; que a eira foi indevidamente ocupada pelos autores com uma construção, impedindo o acesso ao caminho e ao palhal, o que os obrigou a derrubar parte de um muro que fazia parte do conjunto predial dos autores, permitindo-lhes a passagem para o caminho e para o palhal, mas com grande dificuldade. Assim, derrubaram o muro e construíram outro, encostado a umas lanchas de pedra e a uma vedação que delimitavam o prédio b) referido pelos autores., no seu prédio. Não se apoderaram de pedra dos autores nem “de qualquer pedaço de área” do mesmo prédio b); e o muro que construíram, “em propriedade sua, é aproximadamente da altura das construções situadas nas suas extremidades”.

Os autores replicaram. Afirmaram, nomeadamente, que o caminho referido pelos réus não era um caminho particular, mas sim “uma servidão de passagem para o palheiro adquirido pelos réus, servidão essa que passava e ocupava terreno propriedade dos autores”, o prédio b). E que adquiriram esse e os outros dois prédios em 1981 “a EE e mulher, FF, como é do conhecimento dos réus”.

O valor da causa, sobre o qual as partes manifestaram divergência, foi fixado em € 85.300,00, após arbitramento (despacho de fls. 117).

A fls. 70 e segs. foi elaborada a lista de factos assentes e a base instrutória, da qual, para o que agora particularmente releva, constou desde logo o quesito 8º, com o seguinte conteúdo: “Na data referida em E) [“E) Os réus procederam, no dia 16/10/2008, à demolição de um muro de pedra”], os réus ocuparam, em cerca de 28 metros, o prédio descrito em B)?” (trata-se do prédio b), descrito na petição inicial).

No julgamento de facto, constante de fls. 163, foi respondido a este quesito 8º: “Provado apenas, e esclarecendo, que, ao derrubarem o muro de pedra e edificarem um outro, em local diferente, os réus acrescentaram, ao seu prédio, vinte e oito metros quadrados que, anteriormente, integravam a unidade dos prédios dos autores, com origem num dos seus três constituintes”.

E a acção foi julgada parcialmente procedente pela sentença de fls. 168, que declarou “os autores únicos e legítimos donos do conjunto de prédios identificados no artº 1º da petição, conjunto esse que integra a área ocupada de cerca de vinte e oito metros quadrados”, condenou os réus “a demolir o muro de blocos construído e a deixar livre e desocupada a referida área de cerca de vinte e oito metros quadrados, bem como na construção do muro divisório de pedra anteriormente existente” e absolveu os réus quanto ao mais.

Os réus recorreram; no recurso, impugnaram, designadamente, a resposta ao quesito 8º.

Pelo acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de fls. 229, a sentença foi anulada. O acórdão, tendo em vista a resposta que foi dada ao quesito 8º, impugnada, observou que a sentença deveria ter individualizado “o facto ou acto (…) de aquisição daquele direito real de propriedade” sobre os três prédios cuja titularidade reconheceu aos autores, neles incluída “a parcela de terreno objecto do dissídio”; mas não o fez: “em lado nenhum se diz por que modo é que os autores adquiriram aquele direito real de propriedade”. E acrescentou que “o demandado impugna o facto aquisitivo do direito real de propriedade alegado pelo demandante”, não sendo pois exacta a afirmação, na sentença, de que “aquele não conteste o direito deste”.

Assim, e após fundamentar como se deve entender a causa de pedir numa acção de reivindicação e o que se exige ao respectivo autor que prove, ainda que goze da presunção do registo, que aliás se restringe “aos elementos confrontadores do prédio”, o acórdão concluiu: “os autores alegaram uma posse boa para usucapião – mas nenhum dos factos invocados por aqueles relativos à posse e a este modo de adquirir o direito real – que são controvertidos por os réus os terem validamente impugnado – foram seleccionados para a base instrutória”, sendo portanto insuficiente a matéria de facto.

Por este motivo, o acórdão anulou a sentença e determinou a sua ampliação, “no tocante aos factos alegados pelos recorridos (…) relativos à posse boa para a aquisição por usucapião”; e considerou prejudicada a apreciação das questões suscitadas, nomeadamente quanto à impugnação da decisão de facto, relativa ao quesito 8º.

Os autores recorreram para o Supremo Tribunal de Justiça; mas o recurso não foi admitido, pelo despacho de fls.287

Efectuou-se novo julgamento de facto (fs. 401), que manteve a resposta ao quesito 8º; e a fls. 411 foi proferida nova sentença, que decidiu nos mesmos termos da anterior.


2. Os réus recorreram de novo para a Relação; e novamente impugnaram a resposta ao quesito 8º.

Pelo acórdão de fls. 486, a Relação concedeu provimento à apelação e revogou a sentença, “em consequência do que também se julga procedente apenas em parte a acção, condenando os RR a reconhecer serem os A.A. os únicos e exclusivos proprietários dos prédios supra identificados sob os pontos 1), 2) e 3) da matéria de facto dada como assente, mas absolvendo-os de tudo o mais peticionado, por não provado.”

Para o efeito, e nomeadamente, a Relação corrigiu oficiosamente o quesito 8º e a sua resposta, considerada conclusiva, introduziu as necessárias adaptações em outros pontos da matéria de facto e julgou prejudicada a impugnação deduzida contra essa resposta. No que toca ao mérito do recurso, a Relação, recordando que “o que se discute é apenas saber se a ocupação da área de 28 m² levada a cabo pelos réus e a destruição de um muro de pedra, efectuadas em 16/10/2008 (…) viola ou não esse direito de propriedade dos autores, isto é, torna-se necessário apurar se tais actos levados a cabo pelo réus incidiram ou não na área dos prédios dos autores (…)”, concluiu que a prova não releva “para o reconhecimento de uma eventual posse efectiva e duradoura por parte dos autores sobre a área de 28 m² em discussão (…)”.

E acrescentou ainda que a prova revela sim que os réus e os anteriores proprietários donos do palheiro passaram pelo referido terreno, para acederem ao dito palheiro, durante vários anos, não inferiores a dez, passando por uma eira que pertencia, não aos autores, mas a vários comproprietários. Julgou assim improcedente o pedido de reconhecimento do direito de propriedade sobre esses 28 m² e da sua desocupação; e igualmente improcedentes os pedidos de demolição do muro novo e de reconstrução do que foi demolido, por não ter ficado provado que este era propriedade dos autores.


3. Os autores recorreram para o Supremo Tribunal de Justiça. Pelo acórdão de fls. 632, foi decidido: “anula-se o acórdão recorrido e determina-se que o processo regresse ao Tribunal da Relação de Coimbra para que seja julgada a alegação de falta de fundamentação e a impugnação da reposta ao quesito 8º da base instrutória, pelos mesmos juízes que intervieram no acórdão anulado, se possível.”

Em síntese, considerou-se que “ao eliminar o quesito 8º e parte da respectiva resposta, sem substituir o quesito por outro, que permitisse aos autores fazer prova sobre a localização da área ocupada dentro do conjunto de prédios (do prédio b), mais precisamente), a Relação inviabilizou a procedência do pedido de reconhecimento de que essa área era de sua propriedade. Entende-se que o quesito 8º pode ser interpretado na sua dimensão fáctica, sem necessidade de uma (nova) anulação e produção de prova em 1ª Instância; e que, assim sendo, cumpre anular o acórdão recorrido, nos termos previstos no nº 3 do artigo 682º do Código de Processo Civil, para que julgue a alegação de falta de especificação da fundamentação da resposta e a impugnação da resposta correspondente.”

Na sequência da anulação, foi proferido o acórdão de fls. 663, que alterou a resposta ao quesito 8º da base instrutória e, para evitar contradições, modificou as respostas aos quesitos 23º e 40º; e concluiu que “não se pode entender” que a área em discussão “fosse parte da unidade predial dos A.A.”, que “não lograram (…) provar a existência de quaisquer seus actos de posse sobre a referida área de 28 m², muito pelo contrário, dado que ficou provada a existência da referida passagem a favor do palheiro que é dos R.R., com dezenas de anos, o que é a absoluta negação do alegado pelos A.A. quanto à ocupação dessa área, relativamente à qual alegaram uma ocupação apenas com actos de agricultura”. E concluiu também que não ficou provada a propriedade sobre o muro.

Assim, a Relação julgou de novo que a acção procedia “apenas em parte, condenado os R.R. a reconhecer serem os A.A. os únicos e exclusivos proprietários dos prédios (…) identificados sob os pontos 1), 2) e 3) da matéria de facto dada como assente, mas absolvendo-os de tudo o mais peticionado, por não provado”,


4. Os autores voltaram a recorrer para o Supremo Tribunal de Justiça, esclarecendo que pretendem “discutir a bondade da solução jurídica adoptada pelo douto acórdão da relação de Coimbra na parte que alterou a resposta aos quesitos 8º, 23º e 40º da base instrutória e ao facto de não ter reconhecido que a faixa de terreno com 28 metros não é parte integrante dos prédios identificados sob os pontos 1), 2) e 3) da matéria de facto dada como assente”.

Nas conclusões das alegações colocaram as seguintes questões:

– nulidade do acórdão recorrido, por falta de fundamentação de facto (al. b) do nº 1 do Código de Processo Civil): “a aplicação e a interpretação que o tribunal recorrido efectuou às normas dos artigos 607º e alínea b) do 615º do Código do Processo Civil não está conforme com a melhor interpretação destes artigos, pois não se vê de que forma o tribunal recorrido formou a sua convicção, primeiro, porque não analisou todas as provas para além de que, mesmo as analisadas não permitiam que se alterasse as respostas aos quesitos 8º, 23º e 40º, pelo que incorreu em erro manifesto, pelo que tal decisão, viola as normas do artigo 2º e do nº 1 do artigo 205º da Constituição da República Portuguesa, cuja inconstitucionalidade aqui se invoca”;

– Nulidade do acórdão recorrido por omissão de pronúncia, no que respeita à prova testemunhal (al. d) do nº 1 do artigo 615º);

– Nulidade do acórdão recorrido, por não ter apreciado “todos os argumentos apresentados”, por não se ter pronunciado “seja expressamente, seja de forma leve, quanto a todos os pedidos formulados pelos AA, não se tendo pronunciado sobre problemas necessários e fundamentais e necessários à justa decisão da lide, como é o caso da causa de pedir dos pontos 29º a 41º (…) e pedido formulado em III da petição inicial” (al. d) do nº 1 do artigo 615º);

– Errada alteração das respostas aos quesitos 8º, 23º e 40º, em preterição da “ciência e vinculatividade da prova documental, pericial, a inspecção ao local, considerada determinante pelo tribunal de 1ª Instância, bem como as regras da experiência comum e de estarmos perante factualidade notória, para responder aos quesitos 8º, 23º e 40º, e ao atribuir força probatória suficiente para alterar as respostas do tribunal de 1ª instância aos quesitos”; violação do “disposto no artigo 412º e 514º, nº 1 do CPC”;

– violação do “disposto no artigo 7º do CRP, fazendo tábua rasa das normas de direito substantivo que estabelece, para o caso em apreço nos presentes autos, a distribuição do ónus da prova, impondo-se pois a anulação das novas respostas fixadas pelo tribunal recorrido para os quesitos 8º, 23º e 40º da base instrutória e a sua substituição pela factualidade fixada (…) pelo tribunal de 1ª instância, resultando dessa forma evidente a competência do STJ para se pronunciar sobre esta matéria, conforme decorre do nº do artigo 662º do CPC”;

– violação dos limites fixados pelo artigo 662º;

–  prova “de actos de posse sobre a referida faixa de terreno”.


Os réus contra-alegaram, sustentando a confirmação do acórdão recorrido.

O recurso foi admitido, como revista e com efeito devolutivo.


5. Vem provado o seguinte, após as alterações determinadas pelo acórdão recorrido:


1). A favor dos autores encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Meda sob o n.º … (cotas Ap. 1 e Ap. 3 de 1998/12/18) e inscrito na matriz predial urbana de Mêda, sob o artigo …°, um prédio urbano, sito na Rua das Eiras, Vale do Porco, freguesia de Poço do Canto, concelho de Mêda, composto de casa de rés-do-chão e primeiro andar e logradouro, com a área total de 204,1 m2, que confronta a Norte com caminho público, a Sul e Nascente com AA e a Poente com GG (al. A da lista de factos assentes)

2) A favor dos autores encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Meda sob o nº … (cota G-1 Ap. 3/050291) e inscrito na matriz predial rústica de Mêda, sob o artigo .., um prédio rústico, sito em Eira Nova, freguesia de Poço do Canto, concelho de Mêda, composto de terra de batata e amendoeiras, com a área de 77 m2, que confronta a Norte com AA, a Sul com serventia particular, a Nascente com herdeiros de HH e a Poente com II. (al. B da lista de factos assentes)

3) A favor dos autores encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Meda sob o n.º … (cota Ap. 1 de 2001/11/15) e inscrito na matriz predial rústica de Mêda, sob o artigo …, um prédio rústico, sito em Eira Nova, freguesia de Poço do Canto, concelho de Mêda, composto de terra de batata e pastagem, com a área de 234 m2, que confronta a Norte com caminho público, a Sul e Nascente com II e a Poente com JJ. (al. C da lista de factos assentes)

4) Os prédios descritos em A), B) e C) apresentam-se actualmente como uma única unidade. (al. D da lista de factos assentes)

5) Os réus procederam, no dia 16/10/2008, à demolição de um muro de pedra. (al. E da lista de factos assentes)

5 A) ADITADO pelo primeiro acórdão da RELAÇÃO, por o considerar assente, por acordo das partes: Na data de 16/12/2008 (em que procederam à demolição de um muro de pedra) os réus também ocuparam cerca de 28 m² de terreno.

6) A unidade dos prédios dos autores é vedada para o exterior, nomeadamente através de muros de pedra (quesito 1º).

7) Em particular na parte em que esses muros confrontam, a sul, com um prédio dos réus. (quesito 2º)

8) O muro demolido referido em 5) tinha altura que, em concreto, não foi possível fixar, mas inferior a metro e meio (quesito 3º)

9) ALTERADO PELA RELAÇÃO: Na data de 16/10/2008 (em que procederam à demolição de um muro de pedra antigo) os réus também ocuparam, pelo menos desde então, cerca de 28 m² de área esta situada entre esse muro de pedra e umas “lanchas” ou pedras ao alto enterradas no solo e paralelas a esse muro, dele separadas por cerca de 1,50 metros, e pela qual sempre foi feito o acesso ao palhal que é hoje propriedade dos RR – resposta dada ao quesito 8º da b. i., em que se alterou a resposta dada em 1ª instância a este respeito.

10) O muro que os réus construíram tem uma altura média de dois metros e sessenta. (quesito 9º)

11) Os réus colocaram várias fiadas de blocos de cimento em cima de um muro de pedra, situado a poente do prédio descrito em 2, com oitenta centímetros de largura e um metro e trinta de altura. (quesito 10º)

12) Fazendo com que esse muro passasse a atingir mais de um metro e oitenta de altura. (quesito 11º)

13) Tudo isso contra a vontade dos autores. (quesito 12º)

14) E sem o respectivo licenciamento camarário. (quesito 13º)

15) Pelo que foi levantado um auto de contra-ordenação pela Câmara Municipal da Meda (quesito 14º)

16) Com a construção do muro com altura média de dois metros e sessenta, parte da unidade dos prédios dos autores viu reduzida a sua exposição solar. (quesito 15º)

17) A unidade dos prédios referida em 4) é formada por diversas construções, algumas delas construídas até à estrema do prédio dos réus, que se situa a sul. (quesito 16º)

18) Os autores tiveram que indemnizar os réus, por motivo que não foi possível fixar com rigor. (quesito 19º)

19) Rente ao prédio dos réus, e com seis metros e oitenta e cinco de comprimento, os autores edificaram uma construção que pode ser utilizada como galinheiro. (quesito 20º)

20) Existiu um conjunto de pedras dispostas ao alto e em fila num dos limites da unidade predial referida em 4) supra – resposta dada ao quesito 23º, alterada pela Relação.

21) A par dessa fila de pedras encontra-se uma rede de vedação aí colocada pelos autores há anos. (quesito 24º)

22) Rede essa de arame, e com altura próxima de metro e meio. (quesito 25º)

23) Desde há muitas dezenas de anos, e até há lapso de tempo que não foi possível fixar com rigor, mas não inferior a dez anos, os réus e anteriores donos do palheiro acediam ao mesmo por sobre uma faixa de terreno com cerca de um metro de largura. (quesito 27º)

24) Os réus e anteriores donos do palheiro acediam a essa faixa de terreno depois de passarem numa eira que lhes pertencia a eles e a outros co-proprietários. (quesito 28º)

25) Essa eira situava-se em local que não foi possível fixar com rigor mas no interior da unidade de prédios referida em 4 supra (quesito 29º)

26) De momento, é impossível, trilhando exactamente a mesma faixa de terreno, aceder ao palheiro. (quesito 30º)

27) Para acederem ao palheiro, os réus demoliram um muro. (quesito 31º)

28) O muro que os réus edificaram tem a altura máxima das construções que os autores levantaram na unidade de prédios referida em 4 supra (quesito 37º).

29) O prédio dos réus é murado em todos os seus limites, com excepção das estremas onde se situa o palheiro e onde os autores edificaram. (quesito 38º)

30) Os autores construíram os edifícios correspondentes aos prédios inscritos na matriz da freguesia do Poço do Canto, sob os artigos … e …. (quesito 39º)

31) Os autores, por si e seus antecessores, há mais de cinquenta anos, ininterruptamente, utilizam e colhem o produzido na unidade de prédios referida em 4) supra – resposta dada ao quesito 40º, alterada pela Relação.

32) À vista de toda a gente, sem oposição de quem quer que seja, ignorando a eventual lesão de direitos de outrem e sem coacção. (quesitos 41º, 42º, 43º e 44º)

33) Pagando a contribuição de todos os três prédios. (quesito 49º).


6. Cumpre conhecer do recurso.

Antes de mais, cabe recordar o seguinte:

– A lei portuguesa apenas prevê um grau de recurso no julgamento da matéria de facto Como o Supremo Tribunal de Justiça tem repetida e uniformemente observado, quer em relação ao Código de Processo Civil anterior, quer no que toca ao Código de Processo Civil vigente, aplicável ao presente acórdão (cfr. artigo 7º da Lei nº 41/2013, de 26 de Junho), o Supremo Tribunal de Justiça não pode alterar a decisão do tribunal recorrido relativamente à matéria de facto, salvo no “caso excepcional previsto no nº 3 do artigo 674º” – nº 2 do artigo 682º, correspondente ao nº 2 do artigo 722º do Código anterior. Significa isto (cfr., apenas a título de exemplo, o acórdão de 27 de Setembro de 2007, www.dgsi.pt, proc. nº 07B2028 e jurisprudência nele citada, ou ainda o acórdão de 16 de Janeiro de 2014, www.dgsi.pt, proc. nº 695/09.0TBBRG.G2.S1) que é preciso que o tribunal recorrido tenha ofendido “uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova” para que, na revista, o Supremo Tribunal possa corrigir qualquer “erro na apreciação das provas” ou na “fixação dos factos materiais da causa” (acórdão de 27 de Setembro de 2007 cit. e acórdão de 8 de Maio de 2013, www.dgsi.pt, proc. nº 3036/04.9TBVLG.P1.S1 e jurisprudência indicada); nessa eventualidade, está ainda em causa a correcção da aplicação de regras de direito, relativas à admissibilidade ou ao valor (abstractamente fixado) dos meios de prova, e não a apreciação dos factos.

Não cabe pois no âmbito do recurso de revista analisar a apreciação que as instâncias fizeram relativamente à prova testemunhal, pericial, ou outra que esteja igualmente sujeita ao princípio da livre apreciação da prova; nem retirar presunções judiciais de factos provados, ou controlar presunções judiciais deduzidas da prova pelas instâncias, uma vez que ainda se situam no domínio dos factos (cfr. nomeadamente o acórdão de 24 de Outubro de 2013, www.dgsi.pt, proc. nº 1673/07.9TJVNF.P1.S1);

– A impossibilidade de controlo da decisão de facto, coincidente com o âmbito de aplicação do princípio da livre apreciação, que continua a ser o princípio geral em matéria de valoração da prova (hoje enunciado no nº 5 do artigo 607º do Código de Processo Civil), não significa que o Supremo Tribunal de Justiça não possa controlar a aplicação das regras que definem os pressupostos e os limites da “modificabilidade da decisão de facto” no recurso de apelação, fixados hoje no artigo 662º do Código de Processo Civil (anterior artigo 712º); o que é naturalmente diferente de controlar as decisões que a Relação profira no exercício do seu poder de modificação da decisão de facto, estas sim insusceptíveis de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, como resulta do nº 4 do mesmo artigo 662º (cfr. também apenas como exemplo, o acórdão de 8 de Outubro de 2009, www.dgsi.pt, proc. nº 839/04.8TBGRD.C1.S1).


7. Os recorrentes vêm arguir a nulidade do acórdão recorrido com fundamento em:

– falta de fundamentação da decisão de facto.

É incontestável que as decisões judiciais devem ser fundamentadas, nomeadamente no plano dos factos; que a Constituição eleva a princípio constitucional a fundamentação das decisões judiciais (artigo 205º), podendo questionar-se a sua conformidade com a Constituição se a omitirem; que, como se escreveu, desenvolvidamente, no acórdão nº 680/98 do Tribunal Constitucional (disponível em www.tribunalconstitucional.pt), «Este texto, resultante da Revisão Constitucional de 1997, veio substituir o nº 1 do artigo 208º, que determinava que "as decisões dos tribunais são fundamentadas nos casos e nos termos previstos na lei". A Constituição revista deixa perceber uma intenção de alargamento do âmbito da obrigação constitucionalmente imposta de fundamentação das decisões judiciais, que passa a ser uma obrigação verdadeiramente geral, comum a todas as decisões que não sejam de mero expediente, e de intensificação do respectivo conteúdo, já que as decisões deixam de ser fundamentadas "nos termos previstos na lei" para o serem "na forma prevista na lei". A alteração inculca, manifestamente, uma menor margem de liberdade legislativa na conformação concreta do dever de fundamentação.”; e que a fundamentação desempenha simultaneamente uma função de demonstração da sua própria coerência, de persuasão dos destinatários e de possibilidade de controlo pelas partes e pelos tribunais superiores, mas também de legitimação do exercício do poder judicial.

Ora, da leitura atenta do acórdão recorrido resultam as razões que levaram às alterações introduzidas na decisão de facto, quer quanto aos meios de prova analisados, quer quanto ao seu peso relativo, na formação da convicção a que a Relação chegou. No fundo, o que os recorrentes exprimem é, por um lado, a sua discordância com as conclusões de facto encontradas no acórdão recorrido, e, por outro, o seu apoio à apreciação feita na 1ª Instância. Mas essa discordância não é susceptível de fundamentar a arguição de nulidade do acórdão.

Fica assim afastada qualquer inconstitucionalidade do acórdão da Relação, por falta de fundamentação;


– omissão de pronúncia.

Em primeiro lugar, quanto à prova testemunhal. Não é muito clara a razão apontada para a nulidade. Admite-se que esta arguição se prenda com a afirmação de que o acórdão recorrido “não analisou todas as provas”. No entanto, para que essa afirmação pudesse ser considerada, seria imprescindível demonstrar que a Relação não respeitou as indicações dos ora recorrentes, no âmbito da oposição ao recurso de facto interposto pela parte contrária (cfr. nº 3 do artigo 690º-Ae nº 2 do artigo 712º do Código de Processo Civil, vigente na altura, e contra-alegações apresentadas no recurso de apelação, a fls. 465).

Admite-se ainda que os recorrentes se refiram à falta de explicitação das razões pelas quais se consideraram credíveis uns depoimentos e outros não. Mas essa afirmação, não concretizada face ao texto do acórdão recorrido e às exigências referidas no parágrafo anterior, não é de forma alguma apta a fundamentar uma nulidade por omissão de pronúncia, que se verifica apenas quando o tribunal deixa de apreciar questões que tinha de conhecer (artigos 615º, nº 1, d) e 666º, nº 1 do Código de Processo Civil).

Quando muito, poderia relevar se tornasse de tal forma insuficiente a fundamentação que se pudesse considerar existir falta de fundamentação; mas não é o caso.

Em segundo lugar, os recorrentes vieram arguir a nulidade por omissão de pronúncia, por não terem sido apreciados “todos os argumentos apresentados” e por o acórdão recorrido não se ter pronunciado “seja expressamente, seja de forma leve, quanto a todos os pedidos formulados pelos AA, não se tendo pronunciado sobre problemas necessários e fundamentais e necessários à justa decisão da lide, como é o caso da causa de pedir dos pontos 29º a 41º (…) e pedido formulado em III da petição inicial” (al. d) do nº 1 do artigo 615º).

A falta de consideração de argumentos não provoca nulidade; só releva a omissão de conhecimento de questões que tenham de ser apreciadas.

Quanto ao mais, repete-se o que se decidiu no acórdão de fls. 632:

Os recorrentes arguiram a nulidade do acórdão recorrido por ter omitido a apreciação dos “pontos 29° a 41 e pedido III constante da petição inicial e constantes da decisão de primeira instância sob a alínea b)” – ou seja:

– a alegação de que, mesmo que o muro demolido fosse dos réus, a altura do que construíram é superior à legalmente permitida, correspondendo a um exercício abusivo do “direito de tapagem ou de vedação”, prejudicando a entrada do sol no prédio b) e, consequentemente, as culturas nele existentes e causando prejuízos, afirmando (artigo 41º) “que se relega para execução de sentença a determinação do montante dos prejuízos, uma vez não estarem presentemente determinados ”  (artigos 29º a 41º da petição inicial);

 – pedido de condenação dos réus “a demolirem os muros construídos e deixar livre e desocupada a área por si ocupada (28,58 metros do quintal) e construir um muro em pedra numa distância de 22 metros, com cerca de oitenta centímetros de largura por 1,30 metros de altura” (pedido III da petição inicial); julgado procedente em 1ª Instância, nestes termos: “Condeno os réus a demolir o muro de blocos construído e a deixar livre e desocupada a referida área de cerca de vinte e oito metros quadrados, bem como na construção do muro divisório de pedra anteriormente existente”.

Entende-se que os recorrentes consideram que o acórdão recorrido tinha de se pronunciar sobre o alegado abuso na construção do muro.

No acórdão recorrido disse-se o seguinte, a terminar:

“Donde a conclusão de que além do reconhecimento do direito de propriedade dos AA sobre os prédios dos pontos 1), 2) e 3) supra – o que não é objecto de discussão – nada mais se pode julgar como procedente, improcedendo a acção, assim, quanto ao mais, pelo que se impõe a revogação da sentença recorrida, o que se decide.

Apenas cumpre ainda referir que apesar dos AA, em sede de petição, ainda terem alegado que a altura com a qual os RR construíram o novo muro é demasiada – pontos 29 a 40 –, na verdade não formularam qualquer pedido atinente, pelo que não se cuida de conhecer de tal alegação.”

Ou seja: a Relação considerou a questão agora em causa, esclarecendo que não se apreciava por não ter sido formulado pelo autores nenhum pedido assente nessa alegação; o que é exacto, conforme se pode verificar da leitura dos pedidos feitos na petição inicial, na sua parte final:

“Nestes termos, e nos demais de direito, deve a presente acção ser julgada procedente e provada e, consequentemente, decidir-se”, seguindo-se os pedidos I) a V), cujo conteúdo se descreveu no ponto 1. deste acórdão.

Com efeito, os pedidos têm de ser discriminadamente formulados na parte final da petição inicial, e só deles o tribunal pode conhecer: cfr. al. e) do nº 1 do artigo 467º e nº 1 do artigo 661º do Código de Processo Civil em vigor à data da apresentação da petição inicial em juízo. A exigência de delimitação formal dos pedidos explica-se porque delimitam o poder de cognição do tribunal, vinculado qualitativa e quantitativamente pelos pedidos deduzidos.

Não releva a afirmação de prejuízos cujo montante será determinado; nenhum pedido foi efectiva e formalmente formulado.

Improcede, assim, a arguição de nulidade.”


Quanto a este ponto, aliás, o acórdão recorrido repetiu o que anteriormente decidira. E não poderia ter procedido de outra forma, uma vez que se trata de questão não abrangida pela anulação, sobre a qual se tinha esgotado o seu poder jurisdicional.

 

8. Os recorrentes entendem que o acórdão recorrido procedeu a uma errada alteração das respostas aos quesitos 8º, 23º e 40º, em preterição da “ciência e vinculatividade da prova documental, pericial, a inspecção ao local, considerada determinante pelo tribunal de 1ª Instância, bem como as regras da experiência comum e de estarmos perante factualidade notória, para responder aos quesitos 8º, 23º e 40º, e ao atribuir força probatória suficiente para alterar as respostas do tribunal de 1ª instância aos quesitos”; e violação do “disposto no artigo 412º e 514º, nº 1 do CPC”, como atrás se transcreveu.

Resulta do que se disse no ponto 6 que está fora do âmbito possível do recurso de revista controlar a apreciação feita pela Relação quanto aos diversos meios de prova que livremente apreciou, formando a sua própria convicção. Da mesma forma, está também justificada a impossibilidade de retirar ilações de facto, ou de censurar aquelas que a Relação extraiu.

Mas os recorrentes afirmam também que o acórdão recorrido não atendeu a factos que consideram notórios, em violação do disposto no artigo 412º do Código de Processo Civil. No entanto, o que indicam são situações em que se lhes afigura que se deveria ter ligado dois factos, ou seja, criticam o acórdão recorrido por não ter deduzido das circunstâncias do derrube do muro que os réus aumentaram o seu prédio em 28m².

A verdade, porém, é que a Relação não eliminou o ponto 5-A da matéria de facto, embora não o tenha transcrito no acórdão agora recorrido; nem o poderia ter eliminado, uma vez que resultou de acordo das partes. A novidade decorre da alteração da resposta ao quesito 8º, operada pelo segundo acórdão: da conjugação entre os pontos 5-A e 9 deixou de resultar que esses 28 m² pertenciam ao terreno dos autores.

Não pode assim o Supremo Tribunal de Justiça censurar a alteração introduzida na matéria de facto, por exceder os limites do recurso de revista.


9. Os recorrentes apontam também uma violação ao disposto no artigo 7º do Código do Registo Predial (“O registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define.”). Pretendem que se presuma que os 28 m² em litígio integram o conjunto formado pelos prédios referidos nos pontos 1, 2 e 3 – cfr. ponto 4, passando para os réus o ónus da prova de que o não integram (nº 1 do artigo 344º do Código Civil).

No entanto, sendo exacto que, segundo este artigo 7º do Código do Registo Predial, a inscrição no registo predial faz presumir a titularidade do direito de propriedade, é igualmente exacto que a presunção não abrange a definição da delimitação física do prédio, que é o que está em causa neste processo (cfr., por exemplo, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de Outubro de 2009, www.dgsi.pt, proc. nº 839/04.8TBGRD.C1.S1).


10. Decorre do que se disse já nos pontos 6 e 8 deste acórdão não se encontrar motivos para considerar infringidos os limites previstos pelo artigo 662º do Código de Processo Civil para a alteração da decisão de facto, pela Relação.


11. Finalmente, os autores afirmam que fizeram prova “de actos de posse sobre a referida faixa de terreno”.

Trata-se também aqui de uma questão que não foi afectada pela anulação do anterior acórdão da Relação; e que o acórdão recorrido, portanto, se limitou a repetir, na sua parte final.

Não tendo sido apreciada no acórdão de fls. 632, cumpre conhecê-la.

Os recorrentes alegam que se trata de uma passagem, que “fazia parte da unidade de prédios descrita em 4º (…)”; que “agricultavam os prédios que compõem a unidade de prédio com excepção da faixa de cerca de 28 metros, faixa essa que onerava o prédio rústico descrito na alínea B), pois servia de servidão de passagem para o palheiro, adquirido pelos RR.”.

Esta alegação tem como pressuposto que a passagem “se encontra no interior da unidade de prédios” dos autores; e, segundo dizem estes ainda, se os réus a não reivindicam, “só pode considerar-se como fazendo parte da referida unidade de prédios”.

Esta ilação não pode aqui ser retirada, desde logo, por existirem outras possibilidades.

Mas o que é decisivo é que, não estando demonstrado o pressuposto, em virtude da alteração da decisão de facto, fica afastada a possibilidade de se tirar algum efeito de eventuais actos de posse por parte dos recorrentes.


12. Nestes termos, nega-se provimento à revista.


Custas pelos recorrentes.


Lisboa, 22 de janeiro de 2015


Maria dos Prazeres Beleza (Relatora)


Salazar Casanova


Lopes do Rego