Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 01326/03 |
Data do Acordão: | 12/03/2003 |
Tribunal: | 2 SECÇÃO |
Relator: | ALMEIDA LOPES |
Descritores: | CONTRA-ORDENAÇÃO. NULIDADE DE SENTENÇA. DECISÃO. |
Sumário: | É nula a sentença do tribunal tributário que, na parte decisória, não condena em coima, mas se limita a mandar reduzir a coima aplicada pela autoridade administrativa em conformidade com a regra do cúmulo jurídico das coimas. |
Nº Convencional: | JSTA00059809 |
Nº do Documento: | SA22003120301326 |
Data de Entrada: | 07/15/2003 |
Recorrente: | A... E MINISTÉRIO PÚBLICO |
Recorrido 1: | B... |
Votação: | UNANIMIDADE |
Meio Processual: | REC JURISDICIONAL. |
Objecto: | SENT TT1INST COIMBRA PER SALTUM. |
Decisão: | PROVIDO. |
Área Temática 1: | DIR PROC TRIBUT CONT - CONTRA ORDENAÇÃO. |
Legislação Nacional: | CPTRIB91 ART212 N1 D ART216 N3 ART227 N1 N2. CPP87 ART374 N3 B ART379 N1 A. DL 433/82 DE 1982/10/27 ART41 N1 ART75 N2 B. |
Referência a Doutrina: | ALBERTO DOS REIS CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO V5 PAG120-121. |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Com fundamento na prática de diversas infracções fiscais aduaneiras, a GNR, em 2.3.99, levantou auto de notícia contra as sociedades A.... e B... Por despacho de fls. 244 e seguintes, o Comandante da Brigada Fiscal condenou a arguida transportadora (a 1ª arguida) nas coimas de 16.500.000$00, 12.000.000$00 e 6.500.000$00, a que corresponde o cúmulo de 32.500.000$00 e a arguida expedidora (a 2ª arguida) nas coimas de 16.500.000$00 e 6.500.000$00, a que corresponde o cúmulo de 22.500.000$00. Após recurso para o Tribunal Tributário de 1ª Instância de Coimbra por parte de ambas as arguidas, o Mº Juiz, feito o julgamento, proferiu a sentença de fls. 610 e seguintes, dando parcial provimento aos recursos e declarando que foi violada a regra do cúmulo jurídico em ambas as condenações, pelo que as coimas devem ser reduzidas em conformidade, mas sem operar essa redução. Com essa sentença nem se conformou a arguida A... nem o Mº. Pº., tendo a primeira apresentado as suas alegações e conclusões de fls. 629 e seguintes e o segundo apresentado as alegações e conclusões de fls. 636 e seguintes. Sustenta o recorrente Mº Pº que a sentença é nula pelo facto de não conter decisão condenatória ou absolutória. Neste STA o processo foi aos vistos, pelo que cumpre decidir, a começar pelo recurso do Mº Pº que, por suscitar a nulidade da sentença, logra prioridade de conhecimento sobre o outro recurso. Após discorrer sobre o caso em recurso, o Mº Juiz a quo deu razão, em parte, às recorrentes, aceitando que as infracções foram praticadas com negligência. Mas terminou a sua sentença desta forma: “Termos em que, tudo visto e ponderado, se concede parcial provimento ao recurso de A..., sendo a sua conduta punível considerando haver concurso de infracções, a coima unitária violou o disposto no artº 19º do DL 433/82, de 27.10, aplicável ex vi do artº 4º do RJIFA, devendo ser reduzida em conformidade”. Para o recurso da B..., o Mº Juiz a quo voltou a decidir da mesma forma: a coima deve ser reduzida em conformidade. Isto é: o tribunal de 1ª instância nem confirmou as coimas aplicadas pela autoridade administrativa, nem as aumentou, nem as reduziu nem as revogou. Limitou-se a dizer que as coimas, por violação das regras de concurso de contra-ordenações, devem ser reduzidas, pois o cúmulo não terá sido feito. Será nula esta decisão? A sentença tem a data de 29.5.2001. Como o actual Regime Geral das Infracções Tributárias somente entrou em vigor em 5.7.2001, a sentença tem de ser apreciada à luz do CPT, vigente ao tempo na parte das contra-ordenações. Nos termos do artº 212º, nº 1, al. d), do CPT, no recurso da decisão administrativa de aplicação das coimas não vigorará o princípio da proibição da reformatio in pejus. Significa isto que o Mº Juiz a quo tanto pode manter as coimas, como reduzi-las. Mas se o tribunal reduzir as coimas, tem de ser ele a operar essa redução, não lhe sendo lícito reenviar o processo à autoridade administrativa para ser esta a fazer essa redução. O artº 216º, nº 3, do CPT, aludia à determinação da medida da sanção por parte do tribunal de 1ª instância. Isto é, a medida da coima ou das coimas tem de ser determinada pelo tribunal e não pela autoridade administrativa. Finalmente, o artº 227º, nos 1 e 2, do CPT, aludia ao despacho judicial, sentença ou acórdão que manteve ou alterou o montante da coima ou das coimas. Significa isto que é o tribunal que, alterando a medida da coima fixada pela autoridade administrativa, tem de proceder à fixação do novo quantum dessa medida da coima. Ora, o Mº Juiz a quo, ao mandar reduzir as coimas e ao não fazer ele próprio essa redução, omitiu um acto que a lei lhe impõe. Qual a sanção para essa omissão? O CPT não continha normas sobre nulidade da sentença e despacho proferidos em processo de contra-ordenação, pelo que se tinha de procurar resolver o caso à luz do regime geral das contra-ordenações (DL 433/82), nos termos do artº 2º, al. e), do CPT, que remetia para o RJIFNA. Este remetia directamente para o DL nº 433/82, ex vi do artº 4º, nº 2, do RJIFNA, aprovado pelo DL nº 20-A/90, de 15 de Janeiro. O DL nº 433/82 nada diz sobre nulidade da sentença proferida em recurso de contra-ordenação, mas o seu artº 41º, nº 1, remete para as normas do processo criminal. Nos termos do artº 374, nº 3, al. b), do CPP, a sentença tem de conter a decisão condenatória ou absolutório. Se essa decisão condenatória ou absolutória não existir, essa sentença é nula por força do artº 379º, nº 1, al. a), do CPP. Logo, como se diz no recurso do Mº. Pº., a sentença recorrida é nula por falta de fixação da medida concreta da coima ou coimas a aplicar. Se a coima ou coimas têm de ser reduzidas, então o Mº Juiz a quo tem o dever de fazer essa redução e não pode mandar que outros a façam por ele. Como escreveu o Prof. ALBERTO DOS REIS, “é da essência da sentença conter um comando: o juiz deve ditar um comando concreto, que representa a adaptação, ao caso particular, do comando geral e abstracto formulado pela lei. Se o magistrado, em vez de emitir um comando, uma verdadeira decisão, se limita a exprimir um parecer ou a expor dúvidas, é evidente que não existe sentença em sentido jurídico” (cfr. Código de Processo Civil Anotado, vol V, págs. 120 e 121). Se o tribunal superior anular a sentença, devolve o processo ao tribunal recorrido para ser proferida uma sentença que não seja nula (artº 75º, nº 2, al. b), do DL nº 433/82, de 27 de Outubro). Nestes termos, acordam os juízes deste STA em conceder provimento ao recurso do Mº. Pº. e em anular a sentença recorrida, devendo os autos voltar ao tribunal de 1ª instância para ser proferida nova sentença que contenha a decisão condenatória em coima ou coimas. Fica prejudicado o conhecimento do outro recurso. Sem custas. Lisboa, 3 de Dezembro de 2003 Almeida Lopes – Relator – Fonseca Limão – Pimenta do Vale |