Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02640/10.0BELRS
Data do Acordão:07/13/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANABELA RUSSO
Descritores:REVERSÃO
OPOSIÇÃO
PAGAMENTO
INUTILIDADE
Sumário:O pagamento da dívida exequenda pelo responsável subsidiário contra o qual foi revertida a execução fiscal não obsta ao prosseguimento dos autos de oposição à execução, uma vez que este mantém interesse válido em discutir os termos do seu chamamento aos autos e a sua responsabilidade pela dívida exequenda, motivo pelo qual não se verifica inutilidade ou impossibilidade superveniente da lide que seja causa da extinção da instância.
Nº Convencional:JSTA000P28038
Nº do Documento:SA22021071302640/10
Data de Entrada:02/15/2021
Recorrente:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A.........................
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
ACÓRDÃO

1. RELATÓRIO

1.1. A Autoridade Tributária e Aduaneira, inconformada com a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou improcedente a inutilidade superveniente da lide suscitada pelo Ministério Público e procedente a Oposição que A……………, na qualidade de revertido, deduziu ao processo de execução fiscal n.º 3263200601018426, do Serviço de Finanças de Lisboa, apresentou recurso jurisdicional, encerrando as respectivas alegações com a formulação das conclusões seguintes:

«4.1. Visa o presente recurso reagir contra a decisão que julgou totalmente procedente a Oposição judicial, intentada, pelo ora recorrido contra execução fiscal com o processo n.º 3263200601018426, instaurados pelo Serviço de Finanças de Lisboa 5 por dívidas de IVA contra a sociedade comercial “B…………….., Lda.”, referentes ao período de Dezembro de 2005, dívidas essas posteriormente revertidas no ora oponente, no montante total de 9.795,80 €.

4.2. Como fundamentos da oposição invocou o oponente no seu petitório inicial, em suma, a ilegitimidade, por falta de pressupostos da reversão, nomeadamente por falta de culpa pelo não pagamento da dívida de imposto objecto da execução, pois quando o prazo para pagamento voluntário da mesma terminou já não exercia de facto a gerência da sociedade devedora originária. Concluiu o seu articulado inicial peticionando a procedência da oposição, com a consequente extinção do processo de execução fiscal.

4.3. O DMMP emitiu Douto parecer, constante de pág. 164 dos autos de oposição, e no qual considerou haver lugar à extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, visto ter-se verificado o pagamento da dívida exequenda na pendência da oposição.

4.4. O Ilustre Tribunal “a quo” julgou improcedente, por não provada, a inutilidade superveniente da lide opositória, suscitada pelo DMMP, mais se decidindo pela procedente a presente oposição, considerando, para o efeito, e por um lado, ter-se verificado o fundamento de oposição à execução fiscal previsto no artigo 204.º, n.º 1, alínea b), do CPPT, consubstanciado na ilegitimidade do oponente, ora recorrido, para a execução, por não se ter demonstrado o exercício da função de gerente do oponente na sociedade executada originária à data do termo do prazo legal que esta dispunha para a entrega do IVA em questão ao estado, mais se tendo firmado, por isso, a ausência de culpa do oponente pela não entrega aos Estado do imposto em questão por parte da executada originária.

No entanto,

4.5. a decisão ora recorrida, não perfilhou, com o devido respeito, e salvo sempre melhor entendimento, a acertada solução jurídica no caso sub-judice, no que à julgada inexistência da inutilidade superveniente da lide.

Senão vejamos:

4.6. Considerou o Ilustre Tribunal a quo, na decisão ora em crise e no que respeita à pelo DMMP suscitada extinção da instância por inutilidade superveniente da lide que “Conforme resulta dos autos, efectivamente, o processo de execução fiscal foi extinto por força do pagamento da dívida por parte do revertido. Contudo, isso não determina necessariamente inutilidade ou impossibilidade superveniente da lide.

(…)

Ou seja, nem sempre ocorre a inutilidade/impossibilidade superveniente da lide de oposição na sequência do pagamento voluntário da dívida, como acontece, nomeadamente, quando o pagamento da dívida é realizado pelo responsável subsidiário”.

Ora,

4.7. é com esta parte do segmento decisório com a qual a Fazenda Pública não se conforma, sendo entendimento da Fazenda Pública, salvo melhor entendimento, que a extinção da execução fiscal à qual haja sido deduzida oposição judicial comporta sempre e igualmente a extinção desta, por impossibilidade superveniente da lide opositória.

Isto porque,

4.8. tendo a oposição judicial por finalidade extinguir a execução fiscal na qual aquela foi apresentada, conclui-se que o processo de oposição encontra-se estruturalmente dependente da execução fiscal na qual foi deduzida, sendo que a extinção da execução comportará, necessariamente, a extinção da oposição àquela deduzida, nos termos do disposto na alínea e) do artigo 277.º do CPC, aplicável ao processo judicial tributário nos termos da alínea e) do artigo 2.º do CPPT, não apenas por perda do objecto da oposição, como também se ter logrado almejar a finalidade a que esta se destina, ou seja, a extinção da execução fiscal na qual a oposição haja sido deduzida.

4.9. Neste mesmo sentido, veja-se o decidido por este mesmo Colendo Supremo Tribunal Administrativo, através do Acórdão proferido em 09-12-2009 no âmbito do recurso n.º 0946/09.

4.10. Aliás, idêntico entendimento foi comungado pelo DMMP nos autos de oposição ora em questão, através do seu Douto parecer nestes proferidos.

4.11. Ao assim não entender, o Ilustre Tribunal recorrido, no entendimento da Fazenda Pública, com o devido respeito e salvo sempre melhor entendimento, incorreu em erro de julgamento no que à pelo DMMP suscitada questão da extinção da instância opositória, por inutilidade superveniente da lide diz respeito, ao considerar não haver lugar, in casu, à extinção da instância de oposição, por inutilidade superveniente da lide.

4.12. Incorreu, assim, o Ilustre Tribunal recorrido, sempre com o devido respeito e salvo sempre melhor entendimento, em erro de julgamento, na aplicação do direito, violando com a decisão ora em crise o disposto no artigo 277.º, al. e), do CPC, ora aplicável por força do disposto no artigo 2.º, al. e), do CPPT.».

1.2. O Oponente, doravante Recorrido, notificado da interposição e admissão do recurso, não contra-alegou.

1.3. O Exmo. Procurador-Geral-Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso, aduzindo, nesse sentido, em conclusão, que «O pagamento da dívida exequenda pelo responsável subsidiário contra o qual foi revertida a execução fiscal não obsta ao prosseguimento dos autos de oposição à execução, uma vez que este mantém interesse válido em discutir os termos do seu chamamento aos autos e a sua responsabilidade pela dívida exequenda, motivo pelo qual não se verifica inutilidade ou impossibilidade superveniente da lide que seja causa da extinção da instância. Atendo que foi este o entendimento sufragado na sentença recorrida, impõe-se a sua confirmação, julgando-se improcedente o recurso».

1.5 Cumpridas a formalidades processuais subsequentes e não se verificando fundamento que obste ao conhecimento do recurso, procede-se de imediato ao seu julgamento.

2. OBJECTO DO RECURSO

2.1 Como é sabido, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é o teor das conclusões com que a Recorrente finaliza as suas alegações que determina o âmbito de intervenção do tribunal de recurso [artigo 635.º do Código de Processo Civil (CPC)].

Essa delimitação do objecto do recurso jurisdicional, numa vertente negativa, permite concluir se o recurso abrange tudo o que na sentença foi desfavorável ao Recorrente ou se este, expressa ou tacitamente, se conformou com parte das decisões de mérito proferidas quanto a questões por si suscitadas (artigos 635.º, n.º 3 e 4 do CPC), desta forma impedindo que voltem a ser reapreciadas por este Tribunal de recurso. Numa vertente positiva, a delimitação do objecto do recurso, especialmente nas situações de recurso directo para o Supremo Tribunal Administrativo, como é o caso, constitui ainda o suporte necessário à fixação da sua própria competência, nos termos em que esta surge definida pelos artigos 26.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF) e 280.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).

2.2. No caso concreto, tendo por referência o que ficou dito, é apenas uma a questão que importa decidir, qual seja, a de saber se o Tribunal a quo errou ao julgar que, independentemente da dívida exequenda ter sido paga na pendência dos presentes autos, não havia que julgar extinta a instância por inutilidade da lide, uma vez que ao Oponente-revertido assistia o direito de ver apreciada a validade do despacho de reversão e a exigibilidade da dívida.

3. FUNDAMENTAÇÃO

3.1. Fundamentação de facto

Em 1ª instância foram fixados como provados os seguintes factos:

1. Em 27-10-2003, através da AP n.º 1/20031027, foi averbado na Conservatória do Registo Comercial a constituição da sociedade «B………………, Lda.», a qual se obrigava com a assinatura de dois gerentes (cfr. certidão de fls. 35 a 40 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

2. Foram designados gerentes da sociedade «B………………., Lda.», o Oponente A…………………………. e C…………………… (cfr. certidão de fls. 35 a 40 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

3. Em 13-12-2004, através da AP n.º 06/20040213 foi averbada na Conservatória do Registo Comercial a cessação de funções de C………………. do cargo de gerente da sociedade «B………………….., Lda.», por renúncia em 30-10-2003 (cfr. certidão de fls. 35 a 40 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

4. Em 27-04-2005, através da AP n.º 21/20050427 foi averbada na Conservatória do Registo Comercial a designação de D………………….. para o cargo de gerente da sociedade «B…………………, Lda.», por deliberação de 30-06-2004 (cfr. certidão de fls. 35 a 40 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

5. Por escritura pública outorgada em 27-02-2006 o Oponente cedeu a quota que detinha na sociedade «B…………………., Lda.» a D………………… (cfr. escritura de fls. 42 a 44 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

6. Em 13-03-2006, através da AP n.º 30/20060313 foi averbada na Conservatória do Registo Comercial a cessação de funções do Oponente do cargo de gerente da sociedade «B………………………, Lda.», por renúncia em 27-02-2006 (cfr. certidão de fls. 35 a 40 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

7. Em 23-03-2006 foi instaurado no Serviço de Finanças de Lisboa – 5 em nome da sociedade «B……………………., Lda.», o processo de execução fiscal n.º 3263200601018426, para cobrança de dívida de IVA do ano de 2006, no valor de € 9.975,80 (cfr. fls. 3 e 25 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

8. Em 22-09-2010 foi pelo Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa – 5 proferido despacho de reversão contra o Oponente, relativamente à dívida cobrada coercivamente no processo de execução fiscal n. º 3263200601018426, no valor de € 9.975,80 do qual se extrai o seguinte teor:

[imagem]

(cfr. fls. 27 e 28 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

9. Em 24-09-2010 foi entregue ao Oponente, citação para a reversão do processo de execução fiscal n.º 3263200601018426, no valor de € 9.975,80 (cfr. fls. 29 a 32 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

10. A presente Oposição foi apresentada no Serviço de Finanças de Lisboa – 5 em 04-11-2010, tendo dado entrada neste Tribunal em 12-11-2010 (cfr. fls. 1 e 3 dos autos);

11. Em Dezembro de 2005, a conta de que a sociedade «B………………, Lda.», era titular no Banco Millennium BCP tinha um saldo bancário de € 93.563,21 (cfr. fls. 13 a 21 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

12. Em Janeiro de 2006, a conta de que a sociedade «B………………., Lda.», era titular no Banco Millennium BCP tinha um saldo bancário de € 88.107,07 (cfr. fls. 13 a 21 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

13. Em Fevereiro de 2006, a conta de que a sociedade «B……………….., Lda.», era titular no Banco Millennium BCP tinha um saldo bancário de € 74.455,62 (cfr. fls. 13 a 21 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

14. Até Dezembro de 2005 a sociedade «B………………., Lda.» era gerida pelo Oponente, que tratava da parte financeira, e D……………, que tratava da parte comercial (facto que se extrai do depoimento das testemunhas E……………….. e F…………………);

15. Em Dezembro de 2005 o Oponente que ia sair da sociedade «B………………, Lda.» e que esta passava a ser gerida por D………………. (facto que se extrai do depoimento das testemunhas E………………. e F………………..);

16. A partir de Janeiro de 2006, o Oponente deixou a gestão da sociedade «B……………….., Lda.», tendo deixado de se deslocar às instalações desta (facto que se extrai do depoimento das testemunhas E……………….., F………………… e G………………);

17. A partir de Janeiro de 2006, foi D……………….. quem assumiu a parte financeira da sociedade «B……………………, Lda.» o qual passou a gerir e efectuar os pagamentos e a chamar os funcionários para os pagamentos (facto que se extrai do depoimento das testemunhas E………………., F………………… e G…………………);

18. Após Janeiro de 2006 embora pudesse haver atrasos pontuais, os salários dos funcionários nunca deixaram de ser pagos (facto que se extrai do depoimento das testemunhas E………………, F……………… e G……………….);

3.2. Fundamentação de direito

3.1. Como ficou registado, o presente recurso vem interposto da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou, por um lado, improcedente a questão de inutilidade superveniente da lide suscitada pelo Ministério Público no seu parecer final e, por outro, procedente a Oposição por ter ficado provado que não era imputável ao Oponente a responsabilidade pelo não pagamento da dívida.

3.2. Para sustentar a sua pretensão de revogação do julgado na parte em que julgou não verificada a questão da inutilidade superveniente da lide e, consequentemente, a existência de condições processuais ao conhecimento do mérito, alegou, nuclearmente, a Recorrente que a extinção da execução fiscal à qual haja sido deduzida oposição judicial «comporta sempre e igualmente a extinção desta», por impossibilidade superveniente da lide opositória, por ter sido atingida a sua finalidade – extinção da execução fiscal na qual a Oposição foi apresentada –, bem como, por a Oposição ter perdido o seu objecto, conforme determina a alínea e) do artigo 277.º do CPC, normativo que o julgamento violou directamente com a decisão proferida e ao conhecer do mérito da pretensão deduzida pelo Oponente.

3.3. Adiantamos, desde já, que não lhe assiste razão.

3.4. Antes de explicitarmos porque assim o entendemos, importa previamente deixar claro que, tal como o Exmo. Procurador-Geral-Adjunto neste Supremo Tribunal Administrativo adiantou no seu douto parecer, pese embora as diligências complementares instrutórias que o Meritíssimo Juiz oficiosamente determinou no sentido de obter informação actualizada do “estado da dívida” – integralmente satisfeitas pela ora Recorrente conforme resulta dos autos – o certo é que, na parte formalmente reservada à fixação dos factos nada consta quanto ao momento, modo e por quem a dívida foi paga, mas, tão só, que o Oponente foi chamado a responder pela dívida exequenda, no valor de € 9.975,80 euros, na qualidade de responsável subsidiário, ao abrigo do disposto na alínea b) do nº1 do artigo 24º da LGT.

3.5. Porém, no “julgamento de direito” realizado quanto à questão de inutilidade superveniente, ficou a constar que a dívida foi paga pelo revertido e que esse pagamento integral só veio a concretizar-se durante a pendência da Oposição (“resulta dos autos, efectivamente, que o processo de execução fiscal foi extinto por força do pagamento da dívida por parte do revertido” (…) “embora o pagamento não tenha ocorrido dentro do prazo de oposição, tal não obsta à possibilidade de o responsável subsidiário discutir a legalidade da reversão”).

3.6. Em suma, ficou exarado na decisão que a dívida foi paga pelo revertido após o prazo de dedução de Oposição, factualidade e conclusões de facto estas que a Recorrente não contesta (naturalmente, por estarem suportadas nas informações que por si foram prestadas e documentadas).

3.7. Daí que, tal como o Exmo. Magistrado do Ministério Público, também nós entendamos que, no caso, sem prejuízo de censura quanto à falta de rigor como se encontra realizado o apuramento ou fixação destes factos, se nos afigure que não padece a sentença de défice instrutório susceptível de suportar um julgamento de anulação da sentença.

3.8. Posto isto, e uma vez que já dissemos que a Recorrente não tem razão quando afirma que o pagamento da dívida e a consequente extinção da execução fiscal «comporta sempre e igualmente a extinção» da Oposição Judicial que contra ela haja sido instaurada, importa fundamentar o sentido desta nossa decisão.

3.9. Começamos por recordar que a questão de que ora nos ocupamos foi em tempos muito discutida na doutrina e na jurisprudência, reconhecendo-se, inclusive, que, especialmente até ao final da década de 2000, a jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores (como se vê, designadamente, dos acórdãos que a Recorrente convoca e parcialmente transcreve), tendia, num primeiro momento, a perfilhar idêntico entendimento ao que está exposto nas conclusões de recurso e, num segundo momento, a admitir que a lide podia/devia prosseguir se o pagamento fosse realizado dentro do prazo para deduzir Oposição Judicial.

3.10. Todavia, mesmo antes da alteração legislativa implementada pela Lei do Orçamento de Estado para o ano de 2013 (Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro), pela qual foi aditado ao artigo 173.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) o regime hoje consagrado no seu n.º 3 - ou seja, mesmo antes do legislador ter determinado que a extinção do processo de execução pelo pagamento da dívida e acrescido (n.º 1) não prejudicava o controlo jurisdicional da actividade do órgão de execução fiscal caso se verificasse a utilidade desse controlo - o Supremo Tribunal Administrativo foi crescentemente entendendo que o pagamento da dívida exequenda não obstava ao prosseguimento da lide da Oposição nas situações em que este meio processual constituísse o único ao dispor do responsável subsidiário para questionar a exigibilidade da dívida exequenda, especialmente nos casos em que o fundamento arguido para afastar essa exigibilidade se subsumisse à previsão normativa contida nas alíneas a) ou h) do n.º 1 do artigo 204.º CPPT (respectivamente, nas situações de inexistência do imposto, taxa ou contribuição nas leis em vigor à data dos factos a que respeita a obrigação ou, se for o caso, não estar autorizada a sua cobrança à data em que tiver ocorrido a respectiva liquidação e Ilegalidade da liquidação da dívida exequenda, sempre que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação), permanecendo, é certo, alguma controvérsia, quanto aos demais fundamentos, como é o caso da invocada ilegitimidade do Oponente por, face ao período a que respeita a dívida, não dever ser considerado responsável pelo seu pagamento [alínea b) do citado artigo 204.º do CPPT).

3.11. Vale, pois, o que vimos dizendo, para que se conclua que, contrariamente ao que a Recorrente defende em recurso, há muito que está sedimentado o entendimento, expresso na sentença recorrida, que «embora o pagamento voluntário da dívida exequenda possa acarretar a extinção da instância de oposição por inutilidade ou impossibilidade da lide, o certo é que quando esse pagamento é efectuado pelo responsável subsidiário dentro do prazo de oposição – para assim beneficiar da isenção de custas e multa nos termos do artigo 23.º, n.º 5, da LGT – tal não pode implicar a preclusão do seu direito de impugnar o acto de onde emergem as obrigações em cobrança, porquanto o n.º 3 do artigo 9.º da LGT reconhece expressamente que «o pagamento do imposto nos termos da lei que atribua benefícios ou vantagens no conjunto de certos encargos ou condições não preclude o direito de reclamação, impugnação ou recurso, não obstante a possibilidade de renúncia expressa, nos termos da lei». E que a lide pode e deve prosseguir para apreciação de mérito, mesmo perante a realização do pagamento, nas situações em que o responsável subsidiário -revertido «invoca o fundamento previsto na alínea b) do n.º 1 o artigo 204.º do CPPT, isto é, invoca a inexistência de responsabilidade sua pelo pagamento da obrigação tributária em cobrança, porquanto o processo de oposição constitui o único e irrepetível meio processual de que ele dispõe para ver reconhecido essa sua falta de responsabilidade subsidiária».

3.12. Em conclusão, embora seja correcta a afirmação, à luz do regime vigente, por força do n.º1 do artigo 175.º do CPPT, que o processo de execução fiscal se extingue por pagamento da quantia exequenda e acrescido e, consequentemente, que a Oposição, em regra, perde a sua utilidade, por ter sido atingido o seu principal objectivo (a extinção da execução ou, pelo menos, a modificação dos termos ou amplitude em que esta foi instaurada pelo Exequente), essa regra pode e deve ser afastada nas situações em que a dívida esteja a ser exigida a quem não tem a qualidade de devedor originário e é chamado a responder pelo seu pagamento a título subsidiário, já que é nestas situações a Oposição é o único meio de sindicar os termos em que a dívida foi constituída e para discutir a legitimidade desse chamamento ao processo de execução como responsável pelo seu pagamento.

3.13. Ora, como se denota da petição inicial, é precisamente o despacho de reversão, o chamamento do Recorrido como responsável subsidiário pelo pagamento da dívida exequenda que está em causa, invocando o Recorrido a sua ilegitimidade, ao abrigo da alínea b) do artigo 204.º, n.º 1 do CPPT, por não lhe ser imputável a falta de pagamento do imposto que está na origem da dívida exequenda.

3.14. Donde, como se decidiu na sentença recorrida, apesar do pagamento da dívida exequenda ter sido efetuado para além do prazo da oposição, há que concluir que se mantém o interesse na lide, que, por essa razão, deve prosseguir, por ao responsável subsidiário dever ser reconhecido o direito de contestar os pressupostos do seu chamamento como responsável subsidiário pelo pagamento da dívida exequenda.

3.15. Improcedem, pois, integralmente, as conclusões do presente recurso jurisdicional que, por essa razão, a final, será julgado integralmente improcedente e, bem assim, determinará que a Recorrente seja condenada no pagamento das custas processuais a que deu causa (artigo 527.º, n.º 1 e 2 do CPC, aplicável “ex vi” artigo 280.º do CPPT).

4. DECISÃO

Termos em que, acordam os Juízes que integram a secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, negar provimento ao recurso, mais confirmando integralmente na ordem jurídica a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente.

Registe e notifique.

Lisboa, 13 de Julho de 2021 – Anabela Ferreira Alves e Russo (Relatora, que consigna e atesta, nos termos do disposto no artigo 15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de Maio, têm voto de conformidade com o presente acórdão os Senhores Juízes Conselheiros José Gomes Correia e Aníbal Augusto Ruivo Ferraz).