Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01035/18.2BEAVR
Data do Acordão:03/13/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ARAGÃO SEIA
Descritores:NULIDADE DE SENTENÇA
Sumário:Se sobre determinadas questões suscitadas pelas partes o tribunal "a quo" não emite qualquer pronúncia, nem dá como prejudicadas tais questões pela resposta que tenha dado a outra questão, temos que concluir que tal omissão configura a nulidade da sentença, nos termos do artigo 125º do CPPT e artigo 615º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Civil.
Nº Convencional:JSTA000P24319
Nº do Documento:SA22019031301035/18
Data de Entrada:01/10/2019
Recorrente:BANCO A..............., SA
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

Banco A………………….. SA, inconformada, interpôs recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro (TAF de Aveiro) datada de 8 de Novembro de 2018, que julgou improcedente a reclamação judicial do despacho do Sr. Chefe de Finanças de Ovar, datado de 19 de Junho de 2018, nos termos do qual foi indeferido o pedido de reconhecimento da prescrição das dívidas relativas à execução n.º 0159200301500295, correspondentes a IRC de 1999 e 2000, da responsabilidade da sociedade B……………, S.A., no montante global de € 318.718,10.

Alegou, tendo apresentado conclusões, como se segue:
A - O douto Tribunal a quo fundou a sua convicção quanto à matéria de facto dada como provada, do “…exame crítico dos documentos e informações constantes dos autos e do processo de execução fiscal apenso, os quais não foram impugnados…”
Sucede, porém, que, não foi a Recorrente notificada do teor dos citados documentos e informações constantes dos autos e, bem assim, do teor do processo de execução fiscal apenso.
B - Ora, a falta de notificação do teor das informações oficiais - obrigação prescrita na lei (cfr. artº 115, nº3, do CPPT) - constitui irregularidade processual com o regime de arguição previsto no artº 195 e seg. do C.P.Civil, aplicável ao processo tributário "ex vi" do artº 2, al.e), do CPPT, consubstanciando omissão susceptível de influir no exame ou na decisão da causa.
C - Por outro lado, sempre se dirá que o princípio do contraditório, consagrado em termos gerais no artº 3 nº 3, do CPC, e actualmente entendido como direito de influir activamente no desenvolvimento e no êxito do processo, exige que o Tribunal, antes de decidir qualquer questão de facto ou de direito, ainda que do conhecimento oficioso, permita que as partes se pronunciem sobre ela, salvo caso de manifesta desnecessidade.
D - Com estes pressupostos deve o Tribunal assegurar às partes a possibilidade de se pronunciarem antes de ser proferida qualquer decisão.
E - Sendo que, a falta de notificação para essa pronúncia se reconduz à omissão de um acto exigido por lei que, porque susceptível de influir no exame ou na decisão da causa, constitui nulidade secundária, sujeita ao regime de arguição do citado artº 195º e seg., do C.P.Civil.
F - Assim sendo, "in casu" e desde logo, não tendo a recorrente sido notificada do teor dos ditos documentos, informações e do processo de execução fiscal, ao abrigo do citado artº 115º, nº3, do C.P.P.T., para mais eles sido essenciais para o Tribunal a quo formar a sua convicção sobre os factos dados como provados, ocorreu no processo uma omissão susceptível de influir no exame e decisão da causa, a qual tem como consequência a anulação dos termos processuais subsequentes, incluindo a decisão recorrida (cfr. artº.195º, do C.P.Civil e artº. 98, nº.3, do C.P.P.T.).
G - Sem prejuízo, a douta sentença recorrida é nula, nos termos do art.º 125.º do CPPT, por falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar;
H - Na sua Petição inicial, a Recorrente alegou, entre outros, que a interpretação e aplicação subsidiária do disposto no art.º 327º, nº1 do Código Civil, introduzido pelo Decreto-Lei n.º 47344/66 de 25 de Novembro, quanto à suspensão do processo de execução fiscal após a citação do executado estariam feridas de inconstitucionalidade material por violação do princípio da legalidade, consagrado no artigo 103.º n.º 2 da CRP, e por violação do princípio da reserva de lei da AR em matéria tributária (artigos 103.º n.º 2 e 165.º n.º 1 i) da CRP);
I - Acresce que, igualmente alegou a Recorrente que considerar que o prazo de prescrição do crédito tributário só se inicia depois de extinto o processo de execução fiscal, ou seja, depois de extinto esse crédito tributário por pagamento, implica denegar ao contribuinte qualquer possibilidade de ocorrência da prescrição do crédito tributário e viola os princípios da certeza e segurança jurídica ínsitos ao princípio do estado de direito consagrado no artigo 2º da Constituição da República Portuguesa e da garantia fundamental de defesa e protecção jurisdicional efectiva, constitucionalmente assinalados ao contribuinte nos artigos 20.º n.º 1 e 268.º n.º 4 da CRP e, ainda, no artigo 9.º da LGT;
J - Não obstante na douta sentença recorrida ter o insigne tribunal a quo constatado que "Segundo alega a Reclamante a continuidade do facto interruptivo da citação constitui uma interpretação que não tem qualquer apoio na Lei nem assento constitucional, antes configura violação dos art.ºs 2.º, 103.º, n.º 2 e 165.º. n.º1. al. i) da C.R.P." - cfr. pág. 17 da douta sentença recorrida - não se dignou esse insigne Tribunal pronunciar-se sobre tais apontados vícios;
K - De facto, analisada toda a sentença recorrida, facilmente se verifica que não existir qualquer pronúncia sobre os vícios de violação dos art.ºs 2.º, 20.º n.º 1, 103.º n.º 2, 165.º n.º 1 i) e 268.º n.º 4, todos da CRP;
L - Na verdade, na douta sentença recorrido o Tribunal a quo, limita-se a transcrever excertos de jurisprudência proferida pelo Supremo Tribunal Administrativo, designadamente dos Acórdãos de 27.01.2016, Proc. n.º 01698/15 e de 17.01.2018, Proc. n.º 01463/17, onde se conclui que a interrupção da prescrição decorrente da citação do executado, não apenas inutiliza para a prescrição o tempo decorrido até à data em que se verificou o facto interruptivo como, também, obsta ao início da contagem de novo prazo de prescrição enquanto o processo executivo não findar;
M - Pelo que, sempre se deverá concluir não ter o douto Tribunal a quo se pronunciado sobre todos os vícios alegados pela Recorrente na sua Petição Inicial. Aliás, ainda que nos referidos acórdãos estivesse em discussão a questão do efeito interruptivo da citação no decurso da contagem do prazo de prescrição de dívidas tributárias, em nenhum dos casos foi, por exemplo, levantada a questão da violação do princípio da reserva de lei da AR em matéria tributária (artigos 103.º n.º 2 e 165.º n.º 1 i) da CRP);
N - Do exposto resulta que a Recorrente consubstanciou cabalmente a alegação dos vícios de violação do princípio da legalidade, violação do princípio da reserva de lei da AR em matéria tributária (artigos 103.º n.º 2 e 165.º n.º 1 i) da CRP), violação dos princípios da certeza e segurança jurídica ínsitos ao princípio do estado de direito consagrado no artigo 2º da Constituição da República Portuguesa e da garantia fundamental de defesa e protecção jurisdicional efectiva, constitucionalmente assinalados ao contribuinte nos artigos 20.º n.º 1 e 268.º n.º 4 da CRP, submetendo-os à apreciação do Tribunal a quo, pelo que tinha este insigne Tribunal o dever de sobre eles se pronunciar;
O - De facto, nos termos do preceituado no n.º 2 do art.º 608.º do CPC, o juiz tem o dever de conhecer de todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, pelo que a douta sentença recorrida deverá ser declarada nula nos termos do art.º 125.º do CPPT, por falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar;
P - Caso assim não se entenda, sempre a douta sentença recorrida é nula por falta de fundamentação, nos termos do disposto no art.º 125.º do CPPT;
Q - De facto, da douta sentença recorrida não se vislumbra o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo Meritíssimo juiz a quo, ao decidir como decidiu;
R - Quer isto dizer que, não resultam da douta sentença recorrida as razões que levaram o meritíssimo juiz a quo a decidir que a aplicação subsidiária do art.º 327º, nº 1 do Código Civil, ao atribuir efeito suspensivo à citação, não enferma de ilegalidade, por violação do disposto nos art.º 2.º e 49.º da Lei Geral Tributária e, bem assim, não enferma de violação do princípio da reserva de lei da AR em matéria tributária (artigos 103.º n.º 2 e 165.º n.º 1 i) da CRP), violação dos princípios da certeza e segurança jurídica ínsitos ao princípio do estado de direito consagrado no artigo 2º da Constituição da República Portuguesa e da garantia fundamental de defesa e protecção jurisdicional efectiva, previstos nos artigos 20.º n.º 1 e 268.º n.º 4 da CRP;
S - Ora, como bem se refere no douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 04.03.2015, Proc. 01939/13, a fundamentação da sentença destina-se "a esclarecer as partes, primacialmente a que tiver ficado vencida, sobre os motivos da decisão, não só para ficar convencida de que não tem razão, mas também porque o conhecimento daqueles é necessário ou, pelo menos, conveniente, para poder impugnar eficazmente a decisão em recurso ou arguir nulidades, designadamente a derivada de eventual contradição entre os fundamentos e a decisão", e, por isso, "quando a fundamentação não for minimamente elucidativa das razões que levaram a decidir como se decidiu deverá entender-se que se está perante uma nulidade por falta de fundamentação";
T - ln casu, foi inexistente o percurso lógico, racional e objectivo que levou o Tribunal a quo a decidir como decidiu, tendo este limitado a citar, conclusivamente, jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo;
U - Assim, não se entende, à luz das regras da experiência comum, qual o iter cognoscitivo seguido pelo douto Tribunal a quo, para ter decidido como decidiu, não bastando, como fundamentação, a mera remissão para um Acórdão, seguida de transcrição de texto seu;
V - Pelo que, a douta sentença recorrida é nula por violação do disposto no artigo 125.º do CPPT;
X - Por outro lado, a sentença recorrida padece de erro de julgamento de direito, por não ter feito uma correcta interpretação e aplicação das normas e princípios estabelecidos quanto à prescrição das dívidas tributárias e as suas causas de suspensão e interrupção;
Z - Na verdade, a continuidade do facto interruptivo da citação, em que se apoiou a douta sentença recorrida, configura uma interpretação que não tem qualquer apoio na Lei.
AA - Com efeito, esta interpretação - de que a citação para o processo de execução fiscal constitui um facto interruptivo e simultaneamente suspensivo do prazo de prescrição - não tem apoio no texto legal aplicável - designadamente no art.º 49.º da Lei Geral Tributária;
AB - Nada se definindo na Lei Geral Tributária ou no Código de Processo e Procedimento Tributário sobre qual o efeito da interrupção da prescrição, haverá que - por força do disposto no art.º 2.º, d) da Lei Geral Tributária - buscar-se tal efeito no Código Civil, por ser este de aplicação subsidiária aos dois referidos diplomas;
AC - No entanto, apenas e tão só, quanto às consequências da interrupção do prazo de prescrição é que será necessário aplicar subsidiariamente o Código Civil, designadamente o seu artigo 326º, n.º 1;
AD - Tudo o mais e que se reporta, em termos civilistas, a uma causa de suspensão da prescrição só opera no direito civil e, no que respeita ao direito tributário, só poderia ser aplicada, caso a lei assim o determinasse;
AE - A integração de lacunas, com recurso a legislação complementar, há-de fazer-se no estrito limite da lacuna em causa, sem recolher dos regimes do Código Civil mais do que aquilo que falta na regulamentação tributária, em respeito ao que estabelece o art.º 2.º da Lei Geral Tributária que a si própria se indica como sendo a primeira lei que regula as relações jurídico tributárias;
AF - Pois, em tudo que encontre regulação na Lei Geral Tributária ou no Código de Processo e Procedimento Tributário, por estarmos perante dívidas tributárias, não haverá que recolher regulamentação no Código Civil diploma que regula as relações jurídico-privadas;
AG - Nada, em qualquer outra lei ou diploma, pode regular as relações jurídico-tributárias, como a que aqui está em causa, em detrimento do regime que expressamente para elas consagre a Lei Geral Tributária que é a primeira das legislações a elas aplicáveis;
AH - Ou seja, não podemos socorrer-nos de qualquer efeito suspensivo previsto no Código Civil porquanto o direito tributário já disciplina quais os factos que têm a virtualidade de produzir o efeito suspensivo da prescrição;
AJ - Em matéria de garantias dos contribuintes - como é o caso da prescrição das obrigações tributárias - está legalmente vedada a aplicação de normas de outros ramos de Direito, designadamente de normas de direito civil ou direito privado comum, quando o direito tributário regula na íntegra, de forma especial, a matéria em questão, abrangida pelo princípio constitucional da legalidade;
AL - Aliás, sempre estariam em causa obrigações jurídicas e ramos de direito completamente distintos - o direito fiscal, ramo de direito público, e o direito civil, ramo de direito privado - com normativos, objectos de regulação e ratios completamente distintas;
AM - Pelo que sempre faleceria a exigência do confronto de "situações análogas", ou mesmo a coincidência de "razões justificativas" de regulamentação (cf. artigo 10.º nº1 e 2 do CC);
AN - Com efeito, não é legalmente admissível aplicar o normativo do Código Civil em matérias, como a prescrição tributária, totalmente reguladas, nos seus vários aspectos, no próprio direito tributário objetivo - designadamente, não é legalmente admissível aplicar as normas civis que regem a suspensão da prescrição dos direitos de crédito civis, como é o caso do artigo 327.º n.º 1 do CC;
AO - No direito tributário, a citação não causa nenhuma suspensão do prazo de prescrição, apenas o interrompe;
AP - De facto, a interrupção e suspensão do prazo de prescrição mostram-se regulados na Lei Geral Tributária, no art.º 49.º, que no seu n.º 4 apenas admite a suspensão do prazo de prescrição nas circunstâncias ali previstas;
AQ - Na Lei Geral Tributária, enunciam-se as situações em que, no direito tributário, se deve ter por suspenso o prazo de prescrição, o que afasta, só por si a existência de qualquer lacuna sobre esta matéria;
AR - Aliás, na verdade, nada na Lei Geral Tributária ou no Código de Processo e Procedimento Tributário indicia que, a citação do executado, determinará uma suspensão do prazo de prescrição até ao encerramento do processo de execução, a acrescer o efeito interruptivo da prescrição;
AS - Concluindo, a matéria de prescrição está sujeita ao princípio da legalidade, não sendo possível adoptar interpretações que, sem apoio no texto da lei, criem efeitos suspensivos do prazo de prescrição, importados do direito civil sem que para eles haja remissão expressa, ou se verifique qualquer lacuna a preencher;
AT - Nesta conformidade, a douta sentença recorrida, a apoiar-se na aplicação subsidiária do art.º 327º, nº 1 do Código Civil e ao atribuir efeito suspensivo à citação, enferma de ilegalidade, por violação do disposto nos art.º 2.º e 49.º da Lei Geral Tributária;
AU - Por outro lado, caso se entenda ter a douto Tribunal a quo se pronunciado sobre no sentido da conformidade do despacho reclamado com os princípios constitucionais da legalidade, da reserva de lei da AR em matéria tributária (artigos 103.º n.º 2 e 165.º n.º 1 i) da CRP), da certeza e segurança jurídica ínsitos ao princípio do estado de direito consagrado no artigo 2º da Constituição da República Portuguesa e da garantia fundamental de defesa e protecção jurisdicional efectiva, previstos nos artigos 20.º n.º 1 e 268.º n.º 4 da CRP, sempre a douta sentença recorrida enfermaria de erro de interpretação e aplicação do direito;
AV - Isto porquanto, como tem sido definido de forma unânime a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, as normas que regulam o regime da prescrição da obrigação tributária, inclusivamente as relativas ao regime da sua suspensão, inserem-se nas garantias dos contribuintes, pelo que se incluem na reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República;
AX - E, sendo a finalidade das garantias dos contribuintes, precisamente, protege-los contra pretensões de liquidação e cobrança de tributos fora das condições previstas na lei, tem de concluir-se, forçosamente, que respeitam às garantias dos contribuintes as normas de que resulte, para os mesmos, a extinção do dever de pagamento de tributos;
AZ - Extinguindo-se o direito de exigir o pagamento da dívida de imposto, a prescrição incide sobre um aspecto essencial da relação jurídica tributária, sendo generalizado, na Doutrina, o entendimento de que o respectivo regime consubstancia uma garantia material dos contribuintes;
BA - Ora, sendo as causas de suspensão do prazo de prescrição uma das garantias dos contribuintes, quando referidas às relações jurídico-tributárias, estão estritamente subordinadas ao princípio da legalidade tributária de reserva de lei formal, consagrado no nº 2 do art. 103º da Constituição da República pelo que, nas palavras de Benjamim Rodrigues, - Cfr. "A Prescrição no Direito Tributário", Problemas Fundamentais do Direito Tributário, Vislis Editores, 1999, pp. 261 e 266 - "(...) todo o critério de decisão ou de qualificação de quaisquer efeitos concernentes à prescrição tem de constar da norma de tributação emitida nos sobreditos termos", incluindo, por conseguinte, a enunciação das suas causas de interrupção ou suspensão;
BB - A ser assim, como é, trata-se, indubitavelmente, de matéria sujeita a reserva de lei parlamentar e, consequentemente, a sua regulação exige lei parlamentar ou decreto-lei autorizado;
BC - Na verdade, ninguém pode ser obrigado a pagar impostos cuja cobrança não se faça nos termos da lei, de acordo com o artigo 103.º n.º 3 da CRP;
BD - E estabelece o artigo 8.º n.º 1 da LGT que estão sujeitos ao princípio da legalidade tributária a incidência, a taxa, os benefícios fiscais, as garantias dos contribuintes, a definição dos crimes fiscais e o regime geral das contra-ordenações fiscais;
BE - Por força do princípio da legalidade consagrado no n.º 2 do artigo 103.º da CRP, complementado com o disposto no artigo 11.º n.º 4 da LGT, é constitucionalmente inadmissível invocar o disposto no artigo 327.º n.º 1 do Código Civil;
BF - Sendo igualmente certo que, o n.º 4 do artigo 11.º da LGT dispõe que as lacunas resultantes de normas tributárias abrangidas na reserva de lei da Assembleia da República não são susceptíveis de integração analógica;
BG - Assim, a aplicação subsidiária do disposto no art.º 327º, nº 1 do Código Civil, introduzido pelo Decreto-Lei n.º 47344/66 de 25 de Novembro, quanto à suspensão do processo de execução após a citação do executado apresenta-se, pois, ferida de inconstitucionalidade;
BH - Pelo que, o artigo 49.º da LGT, na interpretação segundo a qual a citação protela o início do prazo de prescrição para o momento de encerramento do processo de execução, por aplicação do disposto no artigo 327.º n.º 1 do CC, padece de inconstitucionalidade material por violação do princípio da legalidade, consagrado no artigo 103.º n.º 2 da CRP, e por violação do princípio da reserva de lei da AR em matéria tributária (artigos 103.º n.º 2 e 165.º n.º 1 i) da CRP);
BI - Ainda, a aplicação subsidiária do disposto no art.º 327º, nº 1 do Código Civil, nos casos em que a citação constitui o primeiro facto interruptivo a ter em conta, conduz a que o processo de execução fiscal possa estar indefinidamente parado, desde a data da citação do Executado, sem que o prazo de prescrição esteja a correr, com as consequências gravosas que daí resultam para o executado;
BJ - Ora, atendendo à unidade do sistema jurídico não faz sentido que o legislador para punir a inércia do credor em cobrar a sua dívida estabeleça como limite 20 anos para executar, nas situações previstas no art.º 311.º do Código Civil mas não haja estabelecido qualquer prazo de prescrição para as dívidas tributárias a partir da citação do executado em processo de execução fiscal quando está em causa um valor muito superior - a segurança jurídica;
BL - A consagração legal do regime da prescrição assenta, essencialmente, em razões de certeza, de segurança e de paz jurídicas, quer para o Estado, quer para os cidadãos;
BM - No direito fiscal o instituto da prescrição encontra o seu fundamento na certeza e estabilidade das relações sociais, que não se compadecem com a cobrança de impostos cujos pressupostos, ou cujo vencimento, se situem em épocas muito remotas;
BN - De facto, razões elementares de segurança jurídica justificam que o devedor tributário seja especialmente protegido contra ius imperium do credor tributário, atenta a relação de direito público estabelecida entre as partes;
BO - Essa necessidade de segurança e estabilidade jurídica justifica-se, quer na necessidade de proteger a relação de confiança entre o contribuinte e o credor tributário, no sentido de que aquele não será mais incomodado com dívidas fiscais passado um determinado número de anos, minimamente razoável;
BP - Quer na esfera das relações que o contribuinte, por sua vez, estabelece com terceiros, na medida em que o prolongamento indefinido da discussão da legalidade da dívida exequenda pode influir na confiança de todos aqueles que tenham relações económicas com o contribuinte, dado estar em questão uma potencial responsabilidade que se pode manter anos a fio;
BQ - Inclusivamente, no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 398/98, de 17/12, que aprovou a Lei Geral Tributária, apontou-se para uma "maior segurança das relações entre a administração tributária e os contribuintes, a uniformização dos critérios de aplicação do direito tributário, de que depende a aplicação efetiva do princípio da igualdade, e a estabilidade e coerência do sistema tributário", bem como para "o encurtamento pontual ou genérico dos prazos de caducidade do direito de liquidação e de prescrição das obrigações tributárias";
BR - De facto, a ratio legis que subjaz, designadamente, ao artigo 49.º da LGT, jamais pode conduzir a interpretações como aquela segundo a qual o prazo de prescrição apenas se inicia com o fim do processo de execução fiscal, pois isso equivale a negar a ocorrência da prescrição, seja em que circunstância for;
BS - Aliás, a consagração legal do conhecimento oficioso da prescrição tributária (cfr. artigo 175.º do CPPT) constitui um sinal inequívoco de que o interesse da segurança e certeza jurídica deve prevalecer sobre o interesse patrimonial do credor tributário;
BT - Em suma, a prescrição, em direito tributário, tem de ter um prazo efectivo e esse prazo tem de ter um fim igualmente efectivo;
BU - Não sendo legalmente admissível propugnar no sentido de que o prazo de prescrição só se inicia com o fim do processo de execução fiscal;
BV - A interpretação eventualmente propugnada pelo douto Tribunal a quo implica que os créditos tributários, numa total subversão da hierarquia de valores, jamais prescrevam, pela simples razão de que o prazo de prescrição só se iniciaria depois de paga a dívida exequenda e, consequentemente, depois de extinto o crédito tributário cuja prescrição estaria em causa;
BX - O que se revela totalmente ilógico e mesmo legalmente impossível;
BZ - É notório o desacerto deste entendimento, pois isso equivale a considerar que a prescrição dos créditos tributários jamais ocorre;
CA - Aliás, se o prazo de prescrição apenas se inicia com o fim do processo de execução fiscal e se o processo de execução fiscal só finda com o pagamento, em rigor o prazo de prescrição nunca chega sequer a iniciar-se, o que, com o devido respeito, é um absurdo;
CB - É, assim, destituído de qualquer lógica preconizar um entendimento segundo o qual o prazo de prescrição só se inicia depois do contribuinte ter pago a dívida exequenda, ou seja, depois do crédito tributário ter sido extinto por pagamento - é um entendimento legalmente impossível e, por isso, claramente inconstitucional;
CD - A prescrição dos créditos tributários constitui uma das garantias dos contribuintes, expressão da necessidade de segurança jurídica para os contribuintes e de protecção das suas legítimas e fundadas expectativas, ínsitas no ideário de Estado de Direito Democrático consagrado no artigo 2.º da CRP;
CE - Logo, o contribuinte não pode ser confrontado com a exigibilidade do crédito tributário apesar de decorridas décadas sobre os factos tributários que lhe deram origem;
CF - Isso não se compadeceria com as referidas razões de protecção e segurança jurídica, associadas ao instituto da prescrição - que, aliás, se funda naquelas razões, evitando que os contribuintes venham a ser ad eternum confrontados com dívidas tributárias;
CG - De facto, a ânsia da incessante arrecadação de receita tributária, para colmatar erros sucessivos na gestão dos dinheiros públicos, aos quais os contribuintes são totalmente alheios, não pode permitir uma interpretação legal que conduza ao falecimento de um dos institutos fundamentais de garantia dos contribuintes, abrangido pelo princípio constitucional da legalidade, como é o caso da prescrição;
CH - A constatação de que - nos casos em que a citação é o facto interruptivo que ocorre em primeiro lugar - a prescrição tributária virtualmente não existe, está em contraciclo com a evolução legislativa e, mesmo, com a vontade declarada do legislador, no sentido do encurtamento dos prazos de caducidade e prescrição;
CI - Considerar que o prazo de prescrição do crédito tributário só se inicia depois de extinto o processo de execução fiscal, ou seja, depois de extinto esse crédito tributário por pagamento, implica denegar ao contribuinte qualquer possibilidade de ocorrência da prescrição do crédito tributário e viola os princípios da certeza e segurança jurídica ínsitos ao princípio do estado de direito consagrado no artigo 2º da Constituição da República Portuguesa e da garantia fundamental de defesa e protecção jurisdicional efectiva, constitucionalmente assinalados ao contribuinte nos artigos 20.º n.º 1 e 268.º n.º 4 da CRP e, ainda, no artigo 9.º da LGT, impondo-se, assim, o reconhecimento da prescrição das dívidas peticionadas no processo de execução aqui em apreço.
CJ - Por todo o exposto, o Tribunal a quo deveria ter julgado procedente a Reclamação da ora Recorrente, por verificação da prescrição das dívidas peticionadas no processo de execução aqui em apreço;
CL - Ao decidir diferentemente, incorreu em erro de julgamento, violando o disposto nos art.º 2.º e 49.º da Lei Geral Tributária e, bem assim, por violação do princípio da legalidade, consagrado no artigo 103.º n.º 2 da CRP, violação do princípio da reserva de lei da AR em matéria tributária previsto nos artigos 103.º n.º 2 e 165.º n.º 1 i) da CRP e, ainda, por violação os princípios da certeza e segurança jurídica ínsitos ao princípio do estado de direito consagrado no artigo 2º da CRP e da garantia fundamental de defesa e protecção jurisdicional efectiva, previstos nos artigos 20.º n.º 1 e 268.º n.º 4 da CRP;
CM - Nos termos referidos, não podem restar dúvidas quanto à ilegalidade da sentença recorrida, com a consequente revogação dela;

Não houve contra-alegações.

O Ministério Público notificado, pronunciou-se pelo provimento do recurso.

Cumpre decidir.

Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte factualidade concreta:
1. Em 02.07.2003 o Serviço de Finanças de Ovar 1 instaurou contra a B…………….. S.A., NIPC ………….., o processo de execução fiscal n.º 0159200301500295, para cobrança coerciva de dívidas de IRC dos anos de 1999 e 2000, no montante global de 318 718,10 €. – cfr. fls. 1 do processo de execução fiscal.
2. Servem de base à execução referida no ponto anterior as certidões de dívida n.º 2003/58431 e 2003/58432, de fls. 2/3 do processo de execução apenso, cujo teor se tem por reproduzido.
3. Por despacho datado de 02.04.2003 o Chefe do Serviço de Finanças requereu a constituição de hipoteca legal dos seguintes prédios:
3.1. Prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Ovar sob o artigo 12813, descrito na Conservatória do Registo Predial de Ovar sob o n.º 06662/080601.
3.2. Prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Ovar sob o artigo 12812, descrito na Conservatória do Registo Predial de Ovar sob o n.º 06761/160801.
4. As hipotecas legais sobre os prédios identificados no ponto 3 vieram a ser registadas em 03.04.2003, inicialmente a título provisório e ulteriormente convertidas em definitivas em 25.06.2003.
5. Sobre os prédios referidos no ponto 3 estavam registadas a favor da C…………. S.A. hipotecas voluntárias, através da Ap. 38/261198.
6. A sociedade Banco A……………, S.A., resultante da fusão por incorporação da Banco D………., S.A., da Banco E………, S.A. e da C……….., S.A., e ora Reclamante, adquiriu à sociedade executada, através de dação em cumprimento, os imóveis identificados no ponto 3.
7. A aquisição a que alude o ponto anterior foi registada a título provisório em 07.04.2003 e ulteriormente convertida em definitivo em 11.08.2003.
8. A executada foi citada para o processo de execução fiscal em 10.07.2003.
9. Em 21.01.2004 o órgão de execução fiscal procedeu à penhora dos seguintes bens imóveis:
9.1. Parcela de terreno destinado a construção, inscrita na matriz predial urbana de Ovar sob o artigo 11871 e descrita na Conservatória do Registo Predial de Ovar sob a inscrição n.º 05952/170699, da freguesia de Ovar.
9.2. Parcela de terreno destinado a construção, inscrita na matriz predial urbana de Ovar sob o artigo 8910, em nome da executada, e descrita na Conservatória do Registo Predial de Ovar sob a inscrição n.º 02207/200690, da freguesia de Ovar.
9.3. Parcela de terreno destinado a construção, com benfeitorias, inscrita na matriz predial urbana de Ovar sob o artigo 8994 e descrita na Conservatória do Registo Predial de Ovar sob a inscrição n.º 01546/100588, da freguesia de Ovar.
9.4. Terreno destinado a construção, com benfeitorias, inscrito na matriz predial urbana de Ovar sob o artigo 9216 e descrito na Conservatória do Registo Predial de Ovar sob a inscrição n.º 04487/250595, da freguesia de Ovar.
10. Através da Ap. 48/290104 foi a penhora referida no ponto 9.1. registada na Conservatória do Registo Predial de Ovar.
11. Através da Ap. 48/290104 foi a penhora referida no ponto 9.3. registada na Conservatória do Registo Predial de Ovar.
12. Através da Ap. 50/290104 foi a penhora referida no ponto 9.2. registada na Conservatória do Registo Predial de Ovar.
13. Através da Ap. 47/290104 foi a penhora referida no ponto 9.4. registada na Conservatória do Registo Predial de Ovar.
14. Em 25.01.2005 a executada remeteu ao Serviço de Finanças pedido de pagamento em prestações.
15. Por despacho datado de 17.02.2005 do Sr. Diretor de Finanças de Aveiro, por delegação, foi o requerimento a que alude o ponto anterior indeferido.
16. Por despacho datado de 04.03.2005, o Sr. Chefe de Finanças determinou a venda dos bens penhorados referidos no ponto 9, em 03.06.2005, por proposta em carta fechada.
17. Por despacho datado de 30.08.2005, o Sr. Chefe de Finanças determinou a venda dos bens penhorados referidos no ponto 9, em 05.12.2005, por proposta em carta fechada.
18. Foi adjudicado à F…………., S.A. a parcela de terreno destinada a construção urbana com benfeitorias, inscrito na matriz sob o artigo 8994, pelo valor de 725 000,00 €.
19. Em janeiro de 2006 o Serviço de Finanças celebrou com a sociedade G……………, Lda. contratos de mediação imobiliária para venda dos bens penhorados no âmbito da execução fiscal m.i na cláusula 1 dos referidos contratos.
20. Por despacho datado de 31.07.2006 foram adjudicados os seguintes artigos urbanos 11871, 8910 e 9216, todos de Ovar.
21. Por sentença datada de 07.05.2007 e transitada em julgado em 12.06.2007, foi a sociedade executada declarada insolvente, no âmbito do processo n.º 1317/06.6TBOVR, que correu termos pelo Juízo do Comércio do Baixo Vouga.
22. Em 22.05.2007 foram os autos executivos remetidos ao Juízo do Comércio do Baixo Vouga a fim de serem apensos ao processo de insolvência.
23. Em 09.09.2011 foi remetido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal ao Serviço de Finanças o processo de execução fiscal, tendo o Juízo de Comércio do Tribunal da Comarca do Baixo Vouga referido não ter interesse na apensação do referido processo.
24. Em 30.10.2012 foi proferido o despacho de encerramento do processo de insolvência.
25. Através do ofício n.º 1340, de 06.06.2018, foi a Reclamante notificada do despacho da Sra. Diretora Adjunta da Direção de Finanças de Aveiro, datado de 07.05.2018, para “vir expurgar as hipotecas legais, através do pagamento da quantia de € 321.472,39 (trezentos e vinte e um mil quatrocentos e setenta e dois euros e trinta e nove cêntimos), correspondente ao montante máximo assegurado pela hipoteca”.
26. Por requerimento remetido por correio registado em 18.06.2018, a Reclamante requereu junto do órgão de execução fiscal a extinção do processo de execução fiscal por prescrição da dívida exequenda.
27. Foi emitida pelo Serviço de Finanças a informação de fls. 724/728 do processo de execução fiscal cujo teor se tem por reproduzido.
28. O Sr. Chefe de Finanças proferiu o despacho datado de 19.06.2018, nos termos do qual indeferiu a pretensão da Requerente no que concerne ao reconhecimento da prescrição da dívida.
29. Em 21.06.2018, através do ofício n.º 1461, datado de 20.06.2018, remetido por carta registada com aviso de receção, foi a Reclamante notificada, na pessoa do seu mandatário judicial, do despacho a que alude o ponto anterior.
30. Em 03.07.2018 a Reclamante remeteu via correio registado o requerimento que deu origem aos presentes autos de reclamação.
Nada mais se deu como provado.

Há que apreciar o recurso que nos vem dirigido.
O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo TAF de Aveiro, que julgou improcedente a reclamação apresentada da decisão do órgão de execução fiscal que não reconheceu a prescrição da dívida exequenda apresentada pelo aqui Recorrente na qualidade de interessado.
Começa a Recorrente por alegar ter sido violado o princípio do contraditório, por ter ocorrido no processo uma omissão suscetível de influir no exame e decisão da causa, que tem como consequência a anulação dos termos processuais subsequentes, ao não ter sido notificado dos documentos e processo de execução fiscal em que a sentença recorrida se baseou para proferir a decisão em causa.
Seguidamente invoca a nulidade da sentença, por omissão de pronúncia, uma vez que foi invocado o vício de inconstitucionalidade material por violação dos princípios da legalidade e da reserva de lei, consagrados no artigo 103º, nº2, e 165º, nº 1, alínea i), da CRP, assim como a violação dos princípios da certeza e segurança jurídicas ínsitos ao princípio do estado de direito consagrado no artigo 2º da CRP, e dos princípios da garantia de defesa e proteção jurisdicional efetiva, consagrados nos artigos 20º, nº 1, e 268º, nº4, da CRP, e o tribunal não emitiu qualquer pronúncia sobre essas matérias.
Entende igualmente a Recorrente que a sentença padece do vício de nulidade, por falta de fundamentação, nos termos do artigo 125º do CPPT, atento que não resulta da sentença quais as razões que levaram o tribunal "a quo" a decidir que a aplicação subsidiária da disciplina do nº 1 do artigo 327º do Código Civil, ao atribuir o efeito suspensivo à citação, não enferma de ilegalidade, por violação do disposto nos artigos 2º e 49º da LGT, e por violação dos princípios supra assinalados.
Considera igualmente que o tribunal "a quo" incorreu em erro de julgamento, por errónea interpretação e aplicação das normas relativas à prescrição da obrigação tributária, uma vez que prevendo as leis tributárias normas próprias não há fundamento legal para a aplicação subsidiária das normas do Código Civil, designadamente do disposto no seu artigo 327º.
Entende igualmente que a interpretação do artigo 49º da LGT na interpretação segundo a qual a citação protela o início do prazo de prescrição para o momento de encerramento do processo de execução, por aplicação subsidiária do artigo 327º do CCivil, padece de inconstitucionalidade material por violação do princípio da legalidade, consagrado no artigo 103º, nº2, da CRP, e por violação do princípio da reserva de lei da AR em matéria tributária (arts. 103º, nº2, e 165º, nº 1, al. i), ambos da CRP).

O tribunal "a quo" começou por apreciar a questão da ilegitimidade da reclamante e aqui Recorrente suscitada pela Fazenda Pública, que julgou improcedente. De seguida apreciou a questão da prescrição da dívida exequenda, suscitada pelo Reclamante, que julgou igualmente improcedente. Para se decidir pela improcedência da ação considerou, apoiando-se na jurisprudência do STA (acórdão de 17/01/2018, proc. 01463/17), que com a citação da devedora o prazo de prescrição se interrompeu, o qual não corre enquanto se mantiver pendente a ação executiva.
Mais se considerou na sentença recorrida que o disposto no nº 2 do artigo 49º da LGT, na redação entretanto revogada, não se aplica ao caso concreto, uma vez que até à sua revogação pela Lei nº 53-A/2006, de 29 de Dezembro, o processo nunca esteve parado por prazo superior a um ano.
Por último o tribunal "a quo" apreciou a questão da falta de fundamentação do despacho reclamado, tendo considerado que a decisão do órgão de execução fiscal assentou na fundamentação de informação prestada pelos Serviços, da qual se apreendia corretamente o modo pelo qual se decidiu naquele sentido, julgando, assim, improcedente o vício assacado ao ato.

Assim, o Recorrente suscita no essencial as seguintes questões:
a) Violação do princípio do contraditório;
b) Nulidade da sentença, por omissão de pronúncia;
c) Nulidade da sentença, por falta de fundamentação;
d) Erro de julgamento, por errónea interpretação e aplicação das regras sobre prescrição da obrigação tributária;
e) Vício de inconstitucionalidade material, por violação dos princípios da legalidade e da reserva de lei da AR em matéria tributária.

A questão da nulidade por omissão de pronúncia.
O Recorrente assenta a invocação de tal vício no facto de ter alegado a ocorrência de vício de inconstitucionalidade material por violação dos princípios da legalidade e da reserva de lei consagrados no artigo 103º, nº2, e 165º, nº 1, alínea i), da CRP, assim como a violação dos princípios da certeza e segurança jurídicas ínsitos ao princípio do estado de direito consagrado no artigo 2º da CRP, e dos princípios da garantia de defesa e proteção jurisdicional efetiva, consagrados nos artigos 20º, nº 1, e 268º, nº4, da CRP, e o tribunal não ter emitido qualquer pronúncia sobre essas matérias.
Aquando da enunciação das questões decidendas o tribunal "a quo" enunciou três, sendo duas suscitadas pela reclamante: (i) prescrição da dívida exequenda e (ii) vício de falta de fundamentação do despacho reclamado.
E como vimos supra, apenas apreciou essas duas questões: prescrição da dívida exequenda e a falta de fundamentação do despacho reclamado.
Por outro lado na sentença recorrida não se deu como prejudicado o conhecimento de qualquer outra questão que tenha sido suscitada pelo Reclamante e aqui Recorrente.
Ora, no artigo 48º da sua petição o Reclamante invoca que o entendimento sufragado no despacho reclamado sustentado na aplicação do disposto no artigo 327º do CC configura uma violação do princípio da legalidade consagrado no artigo 103º, nº2, da CRP, por tais efeitos interruptivos não constarem das leis tributárias. E no artigo 59º da sua petição o Reclamante invoca igualmente a violação dos princípios da certeza e segurança jurídica ínsitos ao princípio do estado de direito consagrado no artigo 2º da Constituição, e da garantia fundamental de defesa e proteção jurisdicional efetiva, constitucionalmente assinalados ao contribuinte nos artigos 20º, nº 1, e 268º, nº4, da CRP, e ainda no artigo 9º da LGT.
Atento que sobre esta matéria o tribunal "a quo" não emitiu qualquer pronúncia, nem deu como prejudicadas tais questões pela resposta que tenha dado a outra questão, temos que concluir que tal omissão configura a invocada nulidade da sentença, nos termos do artigo 125º do CPPT e artigo 615º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Civil.
Importa igualmente referir que ocorrendo nulidade da sentença por omissão de pronúncia sobre esses vícios, não faz sentido invocar o vício de nulidade da sentença por falta de fundamentação, tendo por base esses mesmos vícios, uma vez que se não houve qualquer pronúncia sobre essas matérias, certamente que não há fundamentação. Ou seja, a verificação do primeiro vício já aglutina o segundo vício, que perde autonomia, por pressupor que pelo menos haja alguma pronúncia, ainda que viciada.
A procedência deste vício acarreta por si a revogação da sentença e a baixa dos autos à 1ª instância para efeitos de o tribunal "a quo" sanar a referida nulidade e se pronunciar sobre as questões suscitadas pelo Reclamante e aqui Recorrente e supra assinaladas.

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso nesta parte e, em consequência, julgar nula a sentença recorrida e ordenar a baixa dos autos à 1ª instância a fim de o tribunal "a quo" se pronunciar sobre as questões de inconstitucionalidade suscitadas pelo Reclamante na sua petição inicial.
Custas pela recorrida, com dispensa do remanescente da t.j. e tendo-se em conta que não contra-alegou.
D.n.

Lisboa, 13 de Março de 2019. – Aragão Seia (relator) – Ascensão Lopes – Isabel Marques da Silva.