Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 01423/12 |
Data do Acordão: | 10/09/2014 |
Tribunal: | 1 SECÇÃO |
Relator: | JOSÉ VELOSO |
Descritores: | OMISSÃO DE PRONÚNCIA |
Sumário: | I – Só a omissão de pronúncia sobre uma questão é sancionada com a nulidade, pois a argumentação jurídica utilizada para a decidir, quer seja da iniciativa das partes quer seja do tribunal, apenas pode gerar erro de julgamento de direito. II – Só se impõe esclarecer aquilo que é obscuro, porque confuso ou duvidoso, e não do que emerge claro e unívoco de uma normal interpretação. |
Nº Convencional: | JSTA000P18046 |
Nº do Documento: | SA12014100901423 |
Data de Entrada: | 12/19/2012 |
Recorrente: | A... |
Recorrido 1: | MNE |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: | |
Texto Integral: | I. Relatório 1. O MINISTÉRIO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS [MNE], na qualidade de recorrido, vem arguir a nulidade do acórdão proferido no âmbito deste recurso de revista [folhas 493 a 505 dos autos], por alegada omissão de pronúncia [artigo 668º, nº1 alínea d), do CPC aplicável, ex vi 1º do CPTA], e, subsidiariamente, requerer o esclarecimento da decisão nele tomada, e seus fundamentos, por obscuridade no tocante à identificação da entidade sobre quem recai a condenação [artigo 669º, nº1 alínea a), do CPC aplicável, ex vi 1º CPTA]. 2. A………………., na qualidade de recorrente, reagiu a essa arguição e requerimento por entender que o MNE carece totalmente de razão, e que mais não pretende do que protelar o pagamento daquilo que lhe é devido enquanto vencedora da acção. 3. O MINISTÉRIO PÚBLICO, ouvido a respeito, pronunciou-se pelo indeferimento tanto da arguição de nulidade como do pretendido esclarecimento. Cumpre decidir. II. Apreciação 1. O recorrido MNE diz ter apresentado contra-alegações ao recurso de revista em 31.10.2012, mas que, apesar disso, no acórdão se consigna que «não foram apresentadas contra-alegações» [ver 1.2 - folha 495 autos]. Ora, isto significa, diz, que não foram tidas em consideração pelo STA as razões de facto e de direito vertidas nessas contra-alegações, o que acarreta a nulidade do acórdão por omissão de pronúncia. O MNE instrui esta arguição de nulidade com cópia das «contra-alegações» que afirma ter enviado à recorrente e ao TCA Sul em 31.10.2012 [folhas 520 a 534 autos]. Vejamos. Como se sabe, a omissão de pronúncia só ocorre quando o julgador deixe de se pronunciar sobre questões que deveria apreciar, seja porque essas questões lhe foram colocadas pelas partes seja porque eram do seu conhecimento oficioso. A noção de questão, para este efeito, não se confunde com a de fundamentos ou razões jurídicas apresentadas pelas partes, sendo reservada às pretensões que estas formularam no processo, e que requerem a decisão do tribunal, bem como aos pressupostos de ordem geral, ou específicos de determinado acto, quando debatidos entre elas [Antunes Varela, RLJ, Ano 122º, página 112; Alberto dos Reis, Comentário ao Código de Processo Civil, volume V, página 143; e Rodrigues Bastos, Notas ao Código de Processo Civil, volume III, 1972, página 228; entre outros, AC STJ de 09.10.2003, Rº03B1816; AC STJ de 12.05.2005, Rº05B840; AC STA/Pleno de 21.02.2002, Rº034852; AC STA de 02.06.2004, Rº046570; e AC STA de 10.03.2005, Rº046862]. A questão desagua numa pretensão a que o juiz tem de dar resposta, enquanto os fundamentos, ou razões, cimentam o caminho que a tal resposta conduz. A questão tem a ver com a tese adoptada, e os fundamentos são as razões pelas quais ela se adopta. Só a omissão de pronúncia sobre uma «questão» é sancionada com a nulidade, pois a argumentação jurídica utilizada para a decidir, quer seja da iniciativa das partes quer seja do tribunal, apenas pode gerar erro de julgamento de direito. No caso em apreço, consultada a cópia das contra-alegações agora juntas pelo recorrido MNE constatamos que nelas não é suscitada qualquer questão que se impusesse ao STA conhecer, apenas sendo alinhadas razões para a confirmação do decidido pelo TCA Sul. Assim, mesmo a terem sido devida e atempadamente juntas aos autos as ditas contra-alegações, o acórdão que decidiu o recurso de revista nunca poderia ser nulo por omissão de conhecimento de questão que devesse conhecer. Em complemento disto, e porque a arguição de nulidade mistura tais assuntos, sempre diremos mais o seguinte: Se acaso foi indevidamente «omitida a junção» aos autos das contra-alegações, que o MNE diz ter enviado ao TCA Sul em 31.10.2012, e os serviços deste dizem não ter recebido, certo é que essa eventual omissão, que consubstanciaria uma irregularidade processual, não foi atempadamente suscitada pelo recorrido MNE. Na verdade, só em Dezembro de 2013 o recorrido MNE a ela reagiu [folhas 513 a 519 dos autos], sendo certo que tinha conhecimento da eventual «omissão da junção» das contra-alegações desde Fevereiro de 2013, pela notificação do acórdão que foi lavrado neste STA aquando do recebimento do recurso de revista, e do qual constava já que «1.2. O ora recorrido Ministério dos Negócios Estrangeiros não contra-alegou». Foi, assim, largamente ultrapassado o prazo para poder ser arguida a eventual nulidade processual [artigos 201º e 205º do CPC aplicável, ex vi 1º CPTA], para além de que, por aquilo que já foi dito, nunca a mesma seria susceptível de «influir no exame ou na decisão da causa». Deverá, portanto, ser julgada improcedente a arguida nulidade do acórdão, seja a mesma entendida como nulidade substantiva seja como nulidade processual. 2. O recorrido MNE alega, também, que a decisão do acórdão é obscura, em si mesma e nos seus fundamentos, quanto a saber sobre que «parte processual» é que recaiu a condenação. E pede o seu esclarecimento, apenas admissível por ser aplicável ao caso o antigo artigo 669º, nº1 alínea a), do CPC [ver artigo 7º da Lei nº41/2013, de 26.06, que aprovou o NCPC]. Só se impõe o esclarecimento do que é obscuro, porque confuso ou duvidoso, e não do que emerge claro e unívoco de uma normal interpretação. Neste caso, é o erro de julgamento que aparece travestido de pedido de esclarecimento. É a discordância com o decidido que motiva, e perverte, a pretensão esclarecedora permitida por lei [referimo-nos ao CPC antigo, aqui aplicável]. Ora, do acórdão do STA resulta claro que, ao contrário daquilo que foi decidido no aresto do TCA Sul, a entidade condenada a indemnizar a autora é a «entidade demandada», ou seja, e sem sombra de dúvida, o réu MNE. É ele, não outra, a entidade demandada. E é isso que resulta claramente da fundamentação ínsita a folha 10 do acórdão em causa, que nos dispensamos de repetir por acessível nos autos. Deverá, assim, ser julgado improcedente o requerimento de esclarecimento da decisão e fundamentos do acórdão no que concerne à identificação da entidade que nele foi condenada. III. Decisão Nestes termos, decidimos julgar improcedentes a arguição de nulidade, e bem assim o requerimento de esclarecimento, apresentados pelo recorrido MNE. Custas do incidente pelo requerente. Notifique. Lisboa, 9 de Outubro de 2014. – José Augusto Araújo Veloso (relator) – Alberto Acácio de Sá Costa Reis – Alberto Augusto Andrade de Oliveira. |