Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02474/12.8BELSB
Data do Acordão:01/11/2019
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:MADEIRA DOS SANTOS
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
PENA DE DEMISSÃO
INVIABILIDADE DA MANUTENÇÃO DA RELAÇÃO FUNCIONAL
Sumário:É de admitir a revista do aresto que anulou uma pena de demissão, por entender que não estava provada a inviabilidade da manutenção da relação funcional, se os contornos do caso – em que o arguido, ante uma ordem de alteração das suas funções e do seu horário de trabalho, anunciou que a não cumpriria e assim procedeu por muito tempo – apontam para a necessidade de uma reapreciação do assunto.
Nº Convencional:JSTA000P24081
Nº do Documento:SA12019011102474/12
Recorrente:RTP-RADIOTELEVISÃO PORTUGUESA, S.A.
Recorrido 1:A......
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, no Supremo Tribunal Administrativo:


A Rádio e Televisão de Portugal, SA, interpôs esta revista do aresto do TCA Sul confirmativo da sentença em que o TAC de Lisboa, julgando procedente a acção administrativa especial intentada por A……., identificado nos autos, anulou o acto que havia aplicado ao autor a pena disciplinar de demissão.

A recorrente pugna pelo recebimento da revista por ela incidir sobre uma questão relevante e mal decidida.
O autor e aqui recorrido, ao invés, defende a inadmissibilidade da revista.

Cumpre decidir.
Em princípio, as decisões proferidas em 2.ª instância pelos TCA’s não são susceptíveis de recurso para o STA. Mas, excepcionalmente, tais decisões podem ser objecto de recurso de revista em duas hipóteses: quando estiver em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, assuma uma importância fundamental; ou quando a admissão da revista for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito («vide» o art. 150º, n.º 1, do CPTA).
O ora recorrido foi sancionado com a pena disciplinar de demissão porque, perante uma ordem que alterava as suas funções e o seu horário de trabalho, comunicou superiormente que, por ela ser ilegal, a não cumpriria – o que fez, comparecendo repetidamente ao serviço no horário anterior.
O TAC disse que essa ordem, apesar de formalmente viciada, era obrigatória; mas anulou o acto punitivo por entender que se não demonstrara a inviabilidade da manutenção da relação funcional. Pronúncia que o TCA confirmou, embora só por maioria.
Na sua revista, a recorrente insurge-se contra a decisão anulatória das instâncias, por entender que os contornos do caso são demonstrativos daquela inviabilidade. E aduz ainda que o TAC e o TCA não dispunham, «in casu», de poderes cognitivos para questionar e destruir o juízo da Administração sobre essa matéria.
Ora, a posição das instâncias é controversa. Com efeito, a recusa expressa do arguido, aliás assumida «ex ante», de não cumprir as novas tarefas num diferente horário – o que parece ofender os deveres de obediência e de assiduidade, referidos no acto – suscita dúvidas sobre a bondade da decisão anulatória emitida. Pelo que se justifica o recebimento do recurso, para reanálise do assunto.
Acresce que a problemática sobre a inviabilidade da manutenção da relação funcional, sempre presente nas penas expulsivas, surge repetidamente nesta jurisdição. E convém que o Supremo lhe traga um novo «apport», quanto aos poderes cognitivos dos tribunais na matéria e quanto ao modo de os exercer.

Nestes termos, acordam em admitir a revista.
Sem custas.

Porto, 11 de Janeiro de 2019. – Madeira dos Santos (relator) – Costa Reis – São Pedro.