Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0611/10.6BECBR
Data do Acordão:02/01/2024
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:PEDRO MACHETE
Descritores:ENSINO SUPERIOR
ENSINO UNIVERSITÁRIO
CONCURSO
AVALIAÇÃO CURRICULAR
PROFESSOR ASSOCIADO
PRINCÍPIO DA IMPARCIALIDADE
PRINCÍPIO DA TRANSPARÊNCIA
DIVULGAÇÃO DO SISTEMA DE CLASSIFICAÇÃO
Sumário: I - Os princípios da imparcialidade e da transparência são aplicáveis aos concursos para provimento de vagas do pessoal docente do ensino superior universitário.
II - Segundo tais princípios, à Administração não basta ser imparcial, mas também tem de parecer sê-lo, pelo que a criação de um perigo de atuação parcial constitui fundamento suficiente para a violação de tais princípios.
III - A fixação pelo júri dos critérios de apreciação e de classificação dos candidatos num concurso documental depois de apresentadas as candidaturas é suscetível de criar tal perigo de lesão, na medida em que potencia o risco de afeiçoar as classificações de modo a favorecer certos candidatos em detrimento de outros.
IV - Daí a necessidade de divulgação atempada do sistema de classificação final neste tipo de concursos (concurso documental / avaliação curricular): nos respetivos editais tem de ficar assegurada a publicitação, antes de conhecidas as candidaturas pelo júri, dos fatores que este irá ponderar na seleção e ordenação dos candidatos, ou seja, os métodos de avaliação e os subcritérios a que o mesmo atenderá na avaliação dos mesmos, e, bem assim, os parâmetros de avaliação de tais subcritérios.
V - Apenas a divulgação atempada da ponderação de tais fatores e subcritérios assegura a transparência da Administração Pública e coloca, efetivamente, todos os candidatos em pé de igualdade em relação ao conhecimento do modo como irão ser pontuados e avaliados, em cumprimento do princípio da imparcialidade.
VI - Esta exigência não só não põe em causa a autonomia universitária – a liberdade de cátedra –, como também não é incompatível com a discricionariedade de apreciação necessariamente concedida aos júris constituídos por académicos.
VII - Ao invés, a definição ex ante, de forma genérica e em abstrato, dos critérios e fatores que vão orientar a decisão concreta de seleção e classificação dos candidatos – uma discricionariedade de conformação normativa –, enquanto mecanismo necessário de autovinculação administrativa, corresponde a um imperativo de correto exercício da discricionariedade no âmbito de procedimentos administrativos de seleção concorrencial, como os concursos de pessoal, em que é necessário escolher entre vários interessados em aceder a um benefício a atribuir pela Administração.
Nº Convencional:JSTA000P31866
Nº do Documento:SA1202402010611/10
Recorrente:UNIVERSIDADE DE COIMBRA
Recorrido 1:AA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:


I. Relatório

1. Nos presentes autos de recurso de revista vindos do Tribunal Central Administrativo Norte (“TCAN”), vem a UNIVERSIDADE DE COIMBRA recorrer do acórdão daquele tribunal datado de 17.01.2020, que, concedendo provimento à apelação interposta por AA da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra (“TAF de Coimbra”) de 16.05.2014, revogou esta última e julgou procedente a ação administrativa especial intentada pela ora recorrida tendente à anulação da deliberação final do júri do concurso para provimento de um lugar de professor associado do Departamento de Ciências da Terra da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, aprovada em 10.05.2010.

2. A autora, ora recorrida, foi opositora ao concurso documental para provimento de uma vaga de professor associado do Departamento de Ciências da Terra da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, publicitado pelo Edital n° …/2009 (DR, II Série, n.º 21 de …), tendo ficado posicionada em 2.º lugar.
Inconformada, intentou no TAF de Coimbra ação administrativa especial, pedindo:
– A anulação da deliberação final do júri do concurso mencionado, nos termos da qual foram classificados e ordenados os candidatos e determinado o provimento do contrainteressado BB, posicionado em 1.º lugar da lista de classificação final;
– A condenação da Universidade de Coimbra a praticar o ato administrativo devido em substituição do ato impugnado, «através do qual ordene a abertura e a tramitação, até final, do mesmo Concurso, nos termos legais, designadamente no respeito pelas garantias e princípios constitucionalmente estabelecidos ou, sem conceder [...] a proferir [...] outra deliberação que considerando os vícios de erros nos seus pressupostos de facto de que está inquinada, classifique a Autora em primeiro lugar».
A autora imputou ao ato impugnado o vício de violação dos princípios da transparência, da imparcialidade e da igualdade de oportunidades (artigos 266.º, n.º 2, 59.º, 73.º, 74.º, 76.º, 81.º e 113.º, todos da Constituição e 6.º do CPA), o vício de falta de fundamentação, o vício de violação dos artigos 124.º e 125.º do CPA e de erro nos pressupostos de facto da ordenação dos candidatos decorrente da avaliação do contrainteressado BB.
Por acórdão de 16.05.2014, o TAF de Coimbra julgou a ação improcedente, por julgar não verificados os vícios imputados à impugnada deliberação do júri.

3. Irresignada, a autora interpôs recurso de apelação para o TCA Norte, ao qual, como mencionado, este concedeu provimento pelo seu acórdão de 17.01.2020 – o acórdão ora recorrido –, revogou a decisão proferida pelo TAF de Coimbra e, em consequência, julgou procedente a ação administrativa especial e anulou a deliberação impugnada. Considerou-se no acórdão ora recorrido que, pese embora o edital de abertura do concurso procedera à divulgação atempada dos critérios de avaliação e de seleção, o mesmo é omisso quanto à ponderação dos parâmetros ou subcritérios a utilizar a propósito de cada um daqueles critérios, o que implicaria a ilegalidade dos termos do concurso por falta de fixação tempestiva do “sistema de classificação final”.

4. Notificado o acórdão às partes, vem a ré, não se conformando com o que foi decidido, interpor o presente recurso de revista, tendo no final das suas alegações formulado as seguintes conclusões:
«1.ª Vem o presente recurso de revista interposto do Acórdão do Venerando Tribunal Central Administrativo Norte, de 17.01.2020, apenas no segmento em que decidiu que o ato objeto de impugnação padece do vício de violação dos princípios da transparência, da imparcialidade e da igualdade (arts. 266.º n.º 2 CRP), por não ter sido fixado no Edital de abertura do concurso o sistema de classificação final quanto aos subcritérios de avaliação.

2.ª O objeto do presente recurso e a questão à qual cumpre dar resposta incide exclusivamente na questão jurídica de aquilatar se, no âmbito de um procedimento concursal ao abrigo do ECDU, o sistema de classificação final se mostra estabelecido e se estão garantidos os princípios da transparência, da igualdade e da imparcialidade na apreciação e valoração do mérito dos candidatos, se o Edital fixar a ponderação a atribuir aos critérios de avaliação (mérito científico e capacidade pedagógica), ou se, como decidiu o Tribunal a quo, tais princípios apenas se acham garantidos se no Edital estiver também determinada a ponderação de cada um dos subcritérios que compõem os critérios de avaliação.

3.ª Justificando-se a intervenção do STA apenas em matérias de maior importância, na ótica da ora Recorrente é de extrema necessidade a admissão do presente recurso para uma melhor aplicação do direito, dada a importância inegável da questão jurídica aqui trazida, atendendo aos inúmeros procedimentos concursais lançados pela Universidade de Coimbra para ocupação de postos de trabalho, em concreto no âmbito da carreira docente, e pela necessidade imperiosa de obter uma interpretação conjugada das normas relativas aos procedimentos concursais previstas no regime legal constante do ECDU, com os princípios concursais plenamente vigentes consagrados no (embora já) revogado Decreto-Lei n.º 204/98, de 11 de Julho, de forma a definir se deve (ou não) o Edital dos concursos estabelecer, no sistema de classificação, a ponderação/valor de cada um dos subcritérios que compõem os critérios de avaliação, ou se para a garantia dos sobreditos princípios é suficiente que o sistema de classificação fixe a ponderação a atribuir aos critérios de avaliação.

4.ª A sobredita questão de direito foi já apreciada em dois processos em que é Autora a ora recorrida Doutora AA - processos n.ºs 769/14.5BECBR e 278/18.3BECBR (docs. 1 e 2 que se juntam) – tendo o entendimento vertido naquelas decisões de primeira instância ali proferidas pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, e já transitadas em julgado, sido unânime ao julgar que a inexistência de previsão de um sistema de classificação quantitativa para cada subparâmetro de avaliação especificado no Edital não redunda numa avaliação arbitrária ou que impeça o controlo da notação atribuída a cada candidato, pelo que está assim preenchido um dos pressupostos não cumulativos de admissibilidade previstos no art.º 150.° n.º 1 do CPTA – a situação carece de urgente esclarecimento jurisprudencial por parte do STA.

5.ª Em sede de primeira instância, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra entendeu que da necessidade de observar, no âmbito dos concursos regulados pelo ECDU, os princípios e garantias da imparcialidade e transparência previstos no art. 5.º do revogado Decreto-Lei n.º 204/98, de 11 de Julho, não se extrai a imposição de que o mérito dos candidatos tenha que ser apreciado em termos quantitativos, e concluiu pela improcedência da alegação da Autora, de que a decisão do júri violou os princípios da igualdade de oportunidades dos concorrentes, de transparência e da imparcialidade.

6.ª Decidindo o Venerando Tribunal a quo que, não obstante ter o edital do concurso definido a ponderação dos critérios de avaliação – mérito científico (60%), mérito pedagógico (20%) e valor pedagógico e científico de relatório (20%) – não definiu a ponderação a atribuir a cada um dos subcritérios, pelo que não está assegurada a efetiva transparência, igualdade e imparcialidade na apreciação e valoração do mérito dos candidatos, incorreu em erro de julgamento, por errada interpretação e violação das disposições do ECDU conjugadas com os princípios concursais e jus-administrativos da transparência, imparcialidade e igualdade.

7.ª O julgamento do Tribunal a quo parte de um pressuposto não demonstrado, que é o de que a lei e os princípios concursais invocados exigem uma avaliação quantitativa para cada subfactor de avaliação previsto no edital; nenhuma disposição no regime legal constante do ECDU respeitante aos concursos para recrutamento de professores catedráticos (e ainda para o recrutamento de professores associados e auxiliares) sequer exige uma apreciação do mérito dos candidatos em termos quantitativos e segundo uma grelha quantitativa pré-determinada, sendo que as normas legais aplicáveis apenas fazem referência à avaliação e à elaboração de uma lista ordenada dos candidatos que tenham sido aprovados em mérito absoluto, pelo que bem interpretaram os Meritíssimos Juízes de primeira instância, ao decidir que se tal não omissão não implica uma exclusão da possibilidade de serem ordenados com uma avaliação quantitativa, seguramente revela que a mesma não é obrigatória.

8.ª Ao estipular o ECDU, no art. 38.º, que o concurso se destina a “averiguar o mérito da obra científica dos candidatos, a sua capacidade de investigação e o valor da atividade pedagógica já desenvolvida”; ao estabelecer a composição do júri conforme arts. 45.º e 46.º; ao definir como critérios de ordenação dos candidatos a professor associado exclusivamente os dois fatores mencionados no n.º 2 do art.º 49, a saber, o mérito científico e pedagógico do candidato, com o programa, conteúdo e métodos de ensino teórico e prático das matérias da disciplina em causa ou de uma disciplina do grupo a que respeita o concurso; ao prever, até, que o júri do concurso se possa formar após o conhecimento de quem são os candidatos (art. 45º); o Legislador revela que é seu especial desígnio deixar a um júri eminentemente científico, escolhido até em função do percurso científico e pedagógico dos candidatos, uma decisão a orientar por critérios estritamente científicos e técnicos, e bem assim deixar, para tanto, a esse júri ampla discricionariedade técnica, dispensando, se não mesmo proscrevendo, qualquer forma de prévia auto-vinculação, designadamente a criação, pelo júri, de subcritérios de ordenação e sistemas de classificação.

9.ª Na elaboração do Edital do concurso sub iudice foi tida em conta uma suficiente densificação dos fatores de avaliação, respeitando, em termos qualitativos, os fatores previstos no art. 50.º do ECDU, e quantitativamente uma ponderação adequada à categoria da carreira docente a ocupar, determinando o modo como deveria ser distribuída: 60% para o Desempenho científico, 20% para o mérito pedagógico e 20% para o valor pedagógico e científico do relatório.

10.ª Dada a especial natureza da função docente universitária e a necessidade de um júri com especial competência científica, não colide com os direitos e princípios concursais e jus-administrativos o entendimento de que os princípios concursais da transparência, da imparcialidade e da igualdade não exigem ou tornam obrigatória que a obtenção de uma nota quantitativa naqueles dois fatores ou critérios de seleção tenha que passar pela prévia definição de uma escala de notação quantitativa dos subcritérios publicitados, muito menos por um método único de notação quantitativa, como decidiu o Tribunal a quo.

11.ª Da falta de fixação de critérios quantitativos para avaliação das candidaturas quanto aos subcritérios definidos no edital não resulta, só por si, a violação dos princípios constitucionais e administrativos da transparência, da imparcialidade e da igualdade, sendo necessário atentar na fundamentação da avaliação dos candidatos apresentados pelo Júri, para que se possa aferir se o cumprimento daqueles princípios foi garantido, o que é inequivocamente afirmativo no caso concreto, tendo a sentença de primeira instância, transitada em julgado quanto a esse segmento, concluído pela improcedência do vício de falta de fundamentação que a Autora também imputou ao ato impugnado.

12.ª No exercício dos poderes que lhe são legalmente conferidos, e estando sujeito à fundamentação científica, o Júri do concurso apreciou os curricula de todos os candidatos, emitindo um juízo crítico e individualizado sobre o mérito de cada um, não sendo identificável, nas declarações de voto individuais de cada membro do Júri, qualquer desvio ao princípio da legalidade, sendo perfeitamente cognoscível o iter cognoscitivo subjacente ao ato impugnado, carecendo de total sustentação o juízo formulado pelo acórdão a quo, de que o Júri poderia ter conformado a avaliação dos candidatos de acordo com o currículo do candidato que pretendia graduar em 1.º lugar.

13.ª Inexistindo exigência legal para a criação de parâmetros quantitativos para os subcritérios de avaliação previstos no Edital, e estando a deliberação do júri do concurso em apreço devida e suficientemente fundamentada, o facto de o Edital de abertura do concurso em apreço ser omisso no que concerne à pontuação de cada um dos subcritérios que compõem os critérios de avaliação, não equivale à omissão do exigido sistema de classificação e, consequentemente, à violação dos princípios da transparência, imparcialidade e igualdade.

14.ª Ao decidir que o ato impugnado padece do vício de violação desses princípios pelo facto de o Edital do concurso ser omisso no que concerne ao sistema de classificação, na medida em que não prevê a ponderação de cada um dos subcritérios de avaliação, incorreu o Tribunal a quo em erro de julgamento, por errada interpretação e violação das disposições do ECDU conjugadas com os princípios concursais e jus-administrativos da transparência, imparcialidade e igualdade.

15.ª Deve ser concedido provimento ao presente recurso e, em sua consequência, deve o acórdão recorrido ser revogado no segmento em que decidiu que o ato objeto de impugnação padece do vício de violação dos princípios da transparência, da imparcialidade e da igualdade (arts. 266.° n.º 2 CRP), por não ter sido fixado no Edital de abertura do concurso o sistema de classificação final quanto aos subcritérios de avaliação, e substituído por outro que considere que o sistema de classificação final se mostra estabelecido e foram garantidos os princípios da transparência, da igualdade e da imparcialidade na apreciação e valoração do mérito dos candidatos, por ter o Edital do concurso fixado a ponderação a atribuir aos critérios de avaliação (mérito científico e capacidade pedagógica), não sendo exigível que fosse pré-estabelecido o valor de cada um dos subcritérios,
assim se fazendo Justiça!»

5. A ora recorrida contra-alegou, sustentando a inadmissibilidade do recurso de revista e, subsidiariamente, a improcedência do respetivo mérito, tendo sintetizado a sua posição nas seguintes conclusões:
«1. A decisão recorrida do TCA Norte seguiu, expressamente, a jurisprudência do acórdão do Pleno do STA de 13/11/2007, do qual resultava que o previsto no artigo 5º do Decreto-Lei 204/98 mais não era do "....que um corolário ou concretização do princípio da imparcialidade constitucionalmente consagrado e legalmente previsto no CPA, o qual, entre outros aspetos, traduz o dever de a Administração Pública atuar de forma isenta em relação, aos particulares através de uma conduta reta que não favoreça amigos nem inimigos. Neste sentido a imparcialidade é uma aplicação da ideia de igualdade e, portanto, um corolário do princípio da justiça. (...) Assim sendo, pese embora o Decreto-Lei nº 204/98 já haver sido revogado à data da abertura do concurso em causa nos autos, nem por isso os princípios e as garantias que resultam do seu artigo 5.º deixam de ser aplicáveis, mormente a exigência de divulgação atempada dos métodos de seleção a utilizar e do sistema de classificação final, posto que os mesmos constituem, afinal um corolário do princípio da imparcialidade cuja observância é constitucionalmente imposta à atividade da Administração Pública, nos termos do disposto nos artigos 266º nº 2 da CRP e 6º do CPA.”.

2. Tal regra aqui em causa “...corresponde ao mínimo exigível para garantir a observância do princípio da igualdade de oportunidades (...), pelo que a sua adoção na generalidade dos concursos é postulada pela própria essência do Estado de Direito, como patenteia a repetida constitucional em afirmar este princípio explicitamente, em várias matérias (arts. 59º, nº 2, al. b), 73º, nº 2, 74º, nºs 1 e 2, al. h), 76º, nº 1, 81º, al. b), e 113º, nº 3, alínea b), da CRP)” (acórdão do Pleno do STA de 13/11/2007).

3. Como resulta da factualidade dada como provada, no procedimento concursal em causa (aberto por Edital n° …/2009 publicado no DR 2ª Série n.º 21 de ... - cfr. Ponto 1 da factualidade dada como provada) “..não foram estabelecidos quaisquer parâmetros de avaliação no que concerne aos subcritérios o que vale poder dizer que não foi fixado o sistema de classificação, sendo o edital completamente omissão quanto a esse aspeto.” (cfr. o afirmado no acórdão recorrido).

4. Na sequência de tal jurisprudência do Pleno do STA afirma-se no acórdão recorrido “...que não sendo pré-estabelecido o valor de cada um dos subcritérios é sempre possível ao júri conformar a avaliação dos candidatos de acordo com a valorização que faça dos mesmos, valorizando um ou outro subcritério de acordo com os respetivos currículos: por exemplo, na avaliação do mérito científico do currículo pode valorizar mais o subcritério “produção científica” e desvalorizar os restantes critérios se o currículo do candidato que se pretende graduar em 1º lugar é mais valioso nesse item.

5. O Acórdão da TCA Norte apenas aplicou corretamente à factualidade dada como provada o entendimento do direito decorrente das garantias constitucionais tal como afirmadas no Acórdão do Pleno do STA de 13/11/2007 (proferido no âmbito do Processo n° 01140/06), as quais se mantinham na ordem jurídica em … (aquando da publicação do Edital) e se mantêm ainda hoje.

6. Pelo que tendo sido seguida a jurisprudência do STA no acórdão recorrido não se afigura que estejam reunidos os requisitos de admissibilidade do recurso excecional de revista, já que se procedeu a uma adequada aplicação do direito à factualidade dada como provada em respeito da jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo.

7. Por outro lado, a Ré procura justificar a admissibilidade do presente recurso com fundamento em decisões da primeira instância, sendo que no processo 769/14.5BECBR a Autora obteve procedência na sua pretensão (encontrando-se a decorrer o prazo para execução da sentença na sequência de acórdão do TCA Norte e da não admissão do Recurso de Revista que havia sido apresentado pela UC) e no processo 278/18.3BECBR, apesar do TAF de Coimbra ter considerado a pretensão da Autora procedente, esta apresentou recurso para o TCA Norte para, entre outras questões, ser corrigida a questão corretamente decidida pelo TCA Norte no presente processo pelo que, ao contrário do afirmado pela Ré, é falso que a mesma tenha transitado em julgado!

[…]

11. Face ao exposto, o recurso de revista interposto não pode ser admitido pois a questão em causa foi decidida pelo TCA Norte em respeito da Jurisprudência do STA, não reunindo o recurso interposto quaisquer dos requisitos previstos no artigo 150º do CPTA.

12. Sem prejuízo do exposto e por dever de patrocínio sempre se dirá que a Recorrente não apresenta qualquer argumentação de facto ou de direito que coloque em causa a decisão do TCA Norte, limitando-se a afirmar uma alegada “...especial natureza da função docente universitária...” o que, como vimos. não impediu que o STA tivesse determinado já em 2007 a necessidade de um sistema de classificação final que garantisse a imparcialidade, transparência e igualdade nos procedimentos concursais previstos no ECDU.

13. A Ré/Recorrente não podia desconhecer aquando da abertura do concurso em 2009 a jurisprudência do STA de 2007 que foi seguida pelo TCA Norte no Acórdão recorrido, sendo incompreensível que a Universidade de Coimbra, em 2020, não reconheça a imposição decorrente das garantias de transparência, imparcialidade e igualdade de definir um sistema de classificação final que garanta que os critérios que virão a ser utilizados para a graduação dos candidatos não são adaptados em função do perfil curricular dos candidatos, por forma a permitir beneficiar ou prejudicar algum deles (cfr. Acórdão do STA de 13/11/2007).

14. De facto, como resulta da factualidade dada como provada, no edital apenas é indicado que o "mérito científico" teria um "peso de 60%'', o mérito pedagógico "um peso de 20%'' e "valor pedagógico e cientifico do relatório com peso de 20%", não se determinado o valor de cada um dos subcritérios que devem ser aplicados.

15. Tal como afirmado no transcrito acórdão do TCA Norte “...o sistema de classificação final não se mostra estabelecido apenas com a fixação da ponderação a atribuir aos critérios de avaliação, exigindo-se também que seja determinada a ponderação de cada um dos subcritérios que os compõem. (...) já que não sendo estabelecido o valor de cada um dos subcritérios é sempre possível ao júri conformar a avaliação dos candidatos de acordo com os respetivos currículos; por exemplo, na avaliação do mérito científico do currículo pode valorizar mais o subcritério “produção científica” desvalorizar os restantes critérios se o currículo do candidato que pretende graduar em 1º lugar é mais “valioso” nesse item.”.

16. Pelo que é manifesto não se assegurou uma efetiva transparência, igualdade e imparcialidade na apreciação e valoração do mérito dos candidatos.

17. Não oferecendo o Edital qualquer parâmetro objetivo e quantificado que permita aos candidatos conhecer a relevância relativa de quaisquer dos denominados fatores (subcritérios) referidos no Edital.

18. Ao não ter sido definido atempada e objetivamente um efetivo sistema de classificação, foi criado um vasto campo para o arbítrio, a subjetividade e a aleatoriedade na classificação de cada candidato na medida em que o júri poderia após o conhecimento do curriculum dos candidatos conformar a relevância relativa dos fatores subcritérios para favorecer um candidato em desfavor de outro.

19. Pelo exposto, era manifesta a violação no presente procedimento concursal dos princípios da imparcialidade, transparência e da igualdade de oportunidades consagrados nos arts. 266º, nº 2, 59º, nº 2, al. b), 73º, nº 2, 74º, nºs 1 e 2, al. h), 76º, nº 1, 81º, al. b), e 113º, nº 3, al. b) da Constituição da República Portuguesa e artigos 5º e 6º do CPA, tendo o TCA Norte decidido corretamente.

20. Sendo que a argumentação da Ré/Recorrente redunda na afirmação de que tais garantias e princípios não são aplicáveis aos concursos para docentes do ensino superior (cfr. conclusões 7ª a 9ª), porém tal não é posição afirmada no Acórdão do Pleno do STA de 13.11.2007, Rec. 01140/06.

21. Em função do exposto, ainda que fosse admitido o presente recurso, sempre o Tribunal ad quem deveria manter o Acórdão recorrido.»

6. O presente recurso foi admitido por acórdão de 1.10.2020, proferido nos termos do artigo 150.º, n.º 6, do CPTA, tendo a formação de apreciação preliminar fundamentado a sua decisão com base nas seguintes ordens de razão:
«A “quaestio juris” em presença encerra dificuldades várias, aliás expressas nas pronúncias contrapostas das instâncias. Ela liga-se, em geral, ao problema da conciliação entre a discricionariedade inerente a este tipo de concursos e a exigência de previamente se fixar, com objetividade mínima, os elementos a que se subordinará a operação avaliativa. E, neste caso particular, importa ver se o aviso de abertura do concurso, embora extenso na enunciação dos “fatores” aplicáveis, efetivamente omitiu o sistema de classificação final dos concorrentes por carecer de uma grelha de subfactores ou parâmetros e da respetiva pontuação.
Ora, convém colher do Supremo um novo “apport” neste campo, para melhorar a elucidação desta problemática e garantir uma exata aplicação do direito “in hoc casu”.
Justifica-se, portanto, o recebimento da revista, apesar da sua normal excecionalidade.».

7. O Ministério Público junto deste Supremo Tribunal Administrativo, notificado nos termos e para efeitos do disposto no artigo 146.º, n.º 1, do CPTA, emitiu parecer no sentido de dever ser concedido provimento ao recurso.
Tendo sido dado conhecimento do mesmo às partes ao abrigo do n.º 2 daquele preceito, estas nada disseram.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II. Fundamentação

A) De facto

8. As instâncias deram como provados os seguintes factos:

«1) Pelo Edital n.º …/2009 publicado no D.R. 2ª série n.º 21 de ….. cujo teor aqui se dá por reproduzido conforme fs. 172 do P.A. junto com a PI, foi aberto concurso documental para provimento de uma vaga de professor associado do departamento de ciências da terra da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra.

2) Do teor do edital destaca-se os capítulos I e IV;
I- Ao concurso poderão apresentar-se:
a) Os Professores Associados do mesmo grupo ou disciplina de outra Universidade ou de análogo grupo ou disciplina de outra Escola da mesma ou de diferente Universidade;
b) Os Professores Convidados do mesmo grupo ou disciplina ou de análogo grupo ou disciplina de qualquer Escola ou Departamento da mesma ou de diferente Universidade, desde que habilitados com o grau de Doutor por uma Universidade Portuguesa, ou equivalente, e com, pelo menos, cinco anos de efetivo serviço como docentes universitários;
c) Os Doutores por Universidades Portuguesas, ou com habilitação equivalente, em especialidade considerada adequada à área da disciplina ou grupo de disciplinas para que é aberto o concurso, que contem, peio menos, cinco anos de efetivo serviço na qualidade de docentes universitários.
(…)

IV - 1 - Métodos e critérios de avaliação - Os concursos para provimento de lugares de professor associado «destinam-se a averiguar o mérito da obra científica dos candidatos, a sua capacidade de investigação e o valor da atividade pedagógica já desenvolvida» (ECDU, artigo 38º). O método de seleção a utilizar é o da avaliação curriculum vitae, e de um relatório do programa conteúdo e métodos de ensino de uma disciplina, de acordo com os artigos 42º al. b), 44º e 47º do ECDU, pelo que a seleção deve ser determinada pelas potencialidades científicas e pedagógicas dos diferentes candidatos, evidenciadas nas realizações concretas, na dinâmica e na capacidade de liderança expressas nos documentos apresentados ao concurso. A averiguação do mérito dos vários candidatos, nas suas componentes científica e pedagógica, deve ser baseada num conjunto de fatores que se enunciam a seguir. Para cada factor é fornecida uma descrição que o caracteriza para efeitos deste concurso.
2 - Mérito absoluto - Serão excluídos do concurso os candidatos cujo currículo global, não apresente nível científico ou pedagógico compatível com a categoria de professor associado ou não se situe na área das Ciências da Terra (ECDU, artigo 49°, n.° 2).
3 - Critérios e fatores de avaliação com vista à ordenação dos candidatos aceites - A ordenação dos candidatos (ECDU, artigo 49º, n.º 2) fundamentar-se-á no mérito científico e pedagógico do curriculum vitae, de cada um deles e no valor pedagógico e científico do relatório referido no ponto III - 2- a) deste edital. São, pois, critérios de avaliação o mérito científico do currículo, o mérito pedagógico do currículo e o valor pedagógico e científico do relatório.
Na avaliação do mérito científico do currículo dos candidatos serão considerados os seguintes fatores.
1) Produção científica - Qualidade e a quantidade da produção científica (livros, artigos em revistas, comunicações em congressos) expressa pelo número e tipo de publicações e pelo reconhecimento que lhe é prestado pela comunidade científica (traduzida na qualidade dos locais de publicação e nas referências que lhes são feitas por outros autores).
2) Capacidade de dinamização científica - Capacidade para organizar e liderar equipas científicas, bem como a de orientar investigadores em trabalhos de pós-doutoramento, doutoramento e mestrado, incluindo a qualidade e quantidade de projectos científicos que coordenou e em que participou;
3) Intervenção nas comunidades científica e profissional - Capacidade de intervenção nas comunidades científica e profissional expressa, nomeadamente, através da organização de eventos, colaboração na edição de revistas, apresentação de palestras convidadas, participação em júris académicos fora da própria instituição, e atividades de consultoria:
4) Participação na gestão científica - Capacidade de intervenção e dinamização da atividade científica da instituição a que pertence o candidato, nomeadamente através da participação em órgão de gestão científica.
Na avaliação do mérito pedagógico do currículo dos candidatos serão considerados os seguintes fatores:
1) Atividade letiva - Qualidade da atividade letiva desenvolvida pelo candidato tendo em consideração, entre outros fatores relevantes, os resultados de recolhas de opinião alargadas (e. g.. inquéritos pedagógicos), que deverão ser mencionados no curriculum vitae, sempre que disponíveis:
2) Coordenação de projetos pedagógicos - Capacidade para coordenar e dinamizar projetos pedagógicos, como por exemplo o desenvolvimento de novos programas de disciplinas, a criação e coordenação de novos cursos ou programas de estudos, a reforma e atualização de projetos existentes, bem como a realização de projetos com impacte no processo de ensino/aprendizagem:
3j Produção de material pedagógico - Qualidade e quantidade do material pedagógico produzido pelo candidato, bem como as publicações de índole pedagógica:
4) Dinamização pedagógica - Capacidade de intervenção e dinamização da actividade pedagógica da instituição a que pertence o candidato.
Na avaliação do valor pedagógico e científico do relatório apresentado pelos candidatos serão considerados os seguintes fatores:
1) Clareza da sua estrutura e qualidade de exposição;
2) Atualidade do conteúdo e adequação do programa;
3) Enquadramento apresentado para a disciplina e o método de funcionamento proposto;
4) Bibliografia recomendada e a qualidade da respetiva justificação pelo candidato;
5) Validação empírica das propostas apresentadas, descrita no relatório;
6) Outros elementos complementares considerados relevantes como, por exemplo, a análise do impacte de futuras evoluções tecnológicas.

Definição da metodologia de seriação - Durante a reunião, e antes de se iniciarem as votações, cada membro do júri apresenta num documento escrito, que será depois entregue para a ata, a sua ordenação dos candidatos, devidamente fundamentada, nomeadamente na consideração do mérito científico, com peso de 60%, e do mérito pedagógico, com peso de 20% e do valor pedagógico e científico do relatório, com peso de 20%>. Nas várias votações, cada membro do júri deve respeitar a ordenação que apresentou, não sendo admitidas abstenções. A primeira votação destina-se a determinar o candidato a colocar em primeiro lugar. No caso de um candidato obter mais de metade dos votos, fica colocado em primeiro lugar. Se tal não acontecer, repete-se a votação depois de retirado o candidato menos votado na primeira votação. No caso de ter havido empate entre dois ou mais candidatos na posição de menos votado, e houver pelo menos um que não ficou nessa posição, faz-se uma votação apenas sobre esses que ficaram em último, para os desempatar. Se nesta votação restrita o empate persistir, o presidente do júri decide qual o candidato a eliminar O processo repete-se até um candidato obter mais de metade dos votos para o primeiro lugar. Retirado esse candidato, repete-se todo o processo para o segundo lugar, e assim sucessivamente até se obter uma lista ordenada de todos os candidatos.

V - O júri tem a seguinte constituição:
Presidente: Reitor da Universidade de Coimbra Vogais:
Doutor CC, Professor Catedrático da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa;
Doutor DD, Professor Catedrático da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto:
Doutor EE, Professor Catedrático da Universidade de Aveiro: Doutor FF, Professor Catedrático da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa:
Doutor GG, Professor Catedrático da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa,
Doutor HH, Professor Catedrático da Universidade de Aveiro:
Doutora II, Professora Catedrática da Universidade do Minho:
Doutora JJ, Professora Catedrática da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra:
Doutor KK, Professor Catedrático da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra:
Doutor LL, Professor Catedrático da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra;
Doutor MM, Professor Catedrático da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra.

3) Por despacho reitoral de 16/6/2009 (cf. fs. 71 e sgs do PA) foram admitidos ao concurso a Autora, o Cl BB (professores auxiliares da FCTUC e o Cl NN (que não apresentou contestação nem procuração nestes autos).

4) Em 29/6/2009, 27/7/2009 e 3/8/2009, respetivamente, os sobreditos candidatos entregaram a documentação das respetivas candidaturas, inclusive o relatório de uma disciplina e o curriculum vitae elaborados por cada um para o efeito, juntos ao P.A., cujo conteúdo, dos curricula, aqui se dá por reproduzido. Cf. fs. 73 e sgs do PA).

5) Os sobreditos curricula e relatórios foram enviados a cada elemento do júri em 23/9/2009. Cf. fs. 79 e sgs. do PA.

6) Em 3 de Dezembro de 2009 o júri reuniu sob a presidência do Presidente do Conselho Diretivo da FCTUC (conforme delegação de competências do Reitor publicada no DR 2ª série n 0118 de 21/6/2007) com o fim de discutir eventual exclusão de candidatos em vista do disposto no artigo 48° n.º 2 do ECD (exclusão daqueles cujo currículo global entendesse o júri não ter nível compatível), tendo deliberado por unanimidade admitir todos.

7) Nessa reunião também ficou desde logo designado o dia 18 de Janeiro seguinte para a reunião de ordenação provisória dos candidatos. Fs. 245 e sgs do PA.

8) No aprazado dia 18 de Janeiro de 2010 o Júri do Concurso, sob a presidência do Presidente da FCTUC. procedeu à ordenação provisória dos candidatos, conforme ata de fs. 281 a 278 do PA. cujo teor aqui se dá como reproduzido, nos seguintes termos:
1.º BB,
2.º AA,
3.º NN.

9) Todos os vogais do Júri compareceram à reunião de 18 de Janeiro e entregaram as suas declarações de voto, que ficaram anexas à ata integrante do processo administrativo e umas e outra aqui se dá por reproduzidas.

10) A favor da classificação do Cl BB em primeiro lugar, da Autora em segundo e do candidato NN em terceiro pronunciaram-se os vogais seguintes:
- OO, da Universidade de Aveiro
- FF, da Universidade Nova de Lisboa
- HH, da Universidade de Aveiro
- JJ, da Universidade de Coimbra
- LL, da universidade de Coimbra
- GG, da Universidade Nova de Lisboa
- MM, da Universidade de Coimbra

11) A favor da classificação da Autora em primeiro lugar, do Cl BB em segundo e do candidato NN em terceiro pronunciaram-se os restantes vogais, a saber:
- DD, da universidade do Porto
- CC, da universidade de Lisboa
- KK, da universidade de Coimbra
- II, da universidade do Minho

12) Notificada para o efeito a Autora pronunciou-se sobre aquele sentido provisório da decisão do júri, nos termos constantes de fs. 241 a 231 do PA, cujo teor aqui se dá por reproduzido.

13) Em 10 de Maio de 2010 reuniu novamente o Júri para apreciar a pronúncia da Autora e tomar a decisão final.

14) Nessa reunião o Júri decidiu por maioria tornar definitivo o projeto de ordenação dos candidatos.

16) Porém, desta feita compareceram apenas oito vogais, a saber:
- DD, Professor Catedrático da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto;
- FF, Professor Catedrático da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa;
- GG, Professor Catedrático da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa;
- II, Professora Catedrática da Universidade do Minho;
- JJ.
- KK
- LL, e
- Doutor MM, todos da universidade de Coimbra

17) O presidente do júri deu a palavra aos vogais tendo estes, com exceção do vogal KK, declarado entenderem que os elementos aduzidos na pronúncia não alteravam a seriação que cada um apresentara na reunião anterior, pelo que reiteravam as respetivas declarações, sem mais, exceto o vogal LL, que apresentou uma nova declaração apreciando a reclamação da Autora, declaração cujo teor de fs. 284 a 289 do P.A, aqui se dá por reproduzido.

18) O vogal KK pronunciou-se no sentido da exclusão do candidato BB, por entender ser procedente a alegação da Autora de que este mencionara factos falsos no curriculum.

19) Por maioria de sete contra um voto, o júri deliberou não acolher tal proposta, por entender tratar-se de exposição de factos complexos, que podem ser descritos de formas diversas.

20) Face a esta deliberação o vogal KK manteve a declaração de voto apresentada em 18 de Janeiro.

21) Do que resultou, por maioria de cinco contra três, a ordenação definitiva do Cl BB em primeiro lugar e da Autora em segundo.»

B) De direito

9. O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações (artigos 144º, n.º 2, do CPTA e 608º, n.º 2, 635.º, nºs 4 e 5, e 639.º, n.ºs 1 e 2, todos do CPC ex vi artigo 140º, n.º 3, do CPTA), pelo que, uma vez admitida a revista, importa decidir se o acórdão recorrido enferma de erro de julgamento ao considerar que o Edital n.º …/2009, de …, referente a um concurso documental para provimento de uma vaga de professor associado regido pelo Estatuto da Carreira Docente Universitária (“ECDU”), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 448/79, de 13 de novembro (com a redação dada pela Lei n.º 19/80, de 16 de julho), viola os princípios da transparência, da igualdade e da imparcialidade, em virtude de, no respeitante à apreciação e valoração do mérito dos candidatos, fixar apenas a ponderação a atribuir aos critérios de avaliação (mérito científico e pedagógico do currículo e valor pedagógico e científico do relatório), omitindo a ponderação de cada um dos subcritérios ou fatores a considerar na avaliação daqueles critérios (cfr. as cls. 2.ª, 3.ª, 6.ª, 10.ª e 13.ª das alegações da recorrente).
Com efeito, entendeu o tribunal a quo relativamente ao mencionado edital:
«Dúvidas não há que no edital do concurso são publicitados os fatores a ponderar pelo júri na seleção e ordenação dos candidatos, ou seja, os métodos de avaliação e enunciados os subcritérios a que o mesmo atenderá no que concerne à avaliação de cada um.
[…]
A verdade, porém, é que não foram estabelecidos quaisquer parâmetros de avaliação no que concerne aos subcritérios, o que vale por dizer que não foi fixado o sistema de classificação final, sendo o edital completamente omisso quanto a esse aspeto.»

10. O concurso em análise é referido no Edital n.º …/2009 como «concurso documental para provimento de uma vaga de Professor Associado [de uma universidade pública]», a reger-se pelo mesmo edital, pelos artigos 37.º a 52.º do ECDU, «e mais legislação vigente» (itálico acrescentado). Significa isto que, a atuação da universidade e do júri também se encontra sujeita ao Código do Procedimento Administrativo (“CPA”) de 1991 (aliás, nem poderia ser de outro modo – cfr. o artigo 2,º, n.ºs 5 e, 6 e 7), nomeadamente ao princípio da imparcialidade. Por outro lado, a circunstância de estar em causa o recrutamento de um professor associado para uma universidade pública impõe que se tome em consideração o direito constitucional de acesso à função pública (artigo 47.º, n.º 2, da Constituição).

11. A imparcialidade da Administração, consagrada na Constituição (artigo 266.º, n.º 2) e na lei (no artigo 6.º do CPA de 1991; e no artigo 9.º no CPA de 2015, presentemente em vigor), visa assegurar a objetividade e isenção da respetiva atuação na prossecução do interesse público. Analisando-se numa vertente negativa – a não consideração de quaisquer interesses estranhos ao exercício da função – e numa vertente positiva – a consideração de todos os interesses relevantes para tal exercício –, aquele princípio adquire densidade normativa nos planos organizatório e procedimental e constitui um parâmetro de validade da atividade administrativa não legalmente pré-determinada.
Por outro lado, o princípio da imparcialidade administrativa está intimamente ligado ao da transparência: publicidade, informação, condições de participação e conhecimento dos fundamentos e motivos da atuação da Administração.
Com efeito, a participação dos interessados, para ser útil, tem de ser informada e a recolha de informação pressupõe que as atuações administrativas sejam conhecidas (visíveis) e publicitadas, contribuindo assim para a legitimação democrática da Administração. Esta, na verdade, também pressupõe confiança, que só existe num quadro de relações baseadas na lei e que sejam transparentes. Daí que a transparência seja também uma garantia de imparcialidade: esta é posta em causa tanto por uma atuação (concreta e comprovadamente) parcial, como no caso de existir o perigo de uma atuação não isenta ou objetiva.
A jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo retirou há muito a consequência desta compreensão do princípio da imparcialidade segundo a qual à Administração não basta ser imparcial, exigindo-se também que pareça imparcial, tendo em vista evitar a prática de certas condutas da Administração que possam ser tidas como suscetíveis de afetar a imagem pública de imparcialidade. Assim, por exemplo, no Ac. STA (Pleno) de 29.05.2007, P. 1032/05:
«[V]iola o princípio da transparência e da imparcialidade o facto de os fatores e critérios de avaliação dos candidatos ao concurso serem fixados depois de conhecidos os respetivos curricula, independentemente de, em concreto se verificar uma atuação parcial da Administração — cfr. acórdãos do Pleno de 16/11/95, AP. DR de 30/9/97, 788; de 19/12/97, Proc.º n.º 28.280, in AP DR 28-5-99, 307, de 20/01/98, Proc.º n.º 36.164, in AP DR 5-4-2001,152; de 30-04-2003, Proc.º n.º 32377, in Ap DR 12-5-2004, 473; e de 12-11-2003, Proc.º n.º 39386, in AP DR 12-5-2004,1288.
[…]
Na verdade, o que está em causa é a proteção da imagem de imparcialidade e transparência da Administração, sendo que “o valor ou interesse jurídico tutelado com a transparência é o mero risco ou perigo de quebra do dever de imparcialidade, independentemente de se ter produzido, em concreto, uma efetiva atuação imparcial. O dever que aos órgãos administrativos se impõe não é apenas o de agirem com imparcialidade, mas o de se comportarem por forma a alardear essa imparcialidade, a projetá-la para o exterior. Em tempos de muita desconfiança, porventura fruto dos excessos cometidos ao longo de um processo recente de transformação social, e de perda da nitidez da fronteira entre o público e o privado, a benefício de alegados imperativos de ordem económica, tudo deve ser feito para dissipar suspeitas e reforçar a confiança dos cidadãos na Administração Pública, na construção do verdadeiro Estado de Direito.
A ilicitude da ação ou omissão administrativa reside, desde logo, naquilo que for suscetível de configurar, por critérios de razoabilidade e tendo em vista os ditames da ética, o perigo do aproveitamento ou do favorecimento, independentemente da verificação do dano.”- acórdão do Pleno de 1-10-2003, Proc.º n.º 48035, in AP DR de 12-5-2004,1075.
Daí que “sob pena de suspeição, falta de transparência e de parcialidade, não pode o órgão estabelecer essas regras e critérios depois de conhecer as candidaturas dos concorrentes. Para que não haja a tentação de afeiçoar os critérios à situação particular de um ou outro interessado e, portanto, ao resultado que se pretenda obter, devem eles ser estabelecidos antes de conhecido o currículo de cada candidato (Ac. do STA, de 21/6/94, in Ap. ao DR de 31.12.96, pag. 4999; ainda Acs. STA/Pleno, de 16/11 /95, Ap. ao DR de 30/9/97, pag. 788; de 14/5/96, in AD n.° 419/1265; do Pleno de 19/12/97, Proc. N.° 28.280; do Pleno de 21/1/98, Proc. N.° 36. 164, de 2/7/98, Proc. N°42.302).
De tal modo é assim que basta neste caso admitir a possibilidade de um tal desrespeito criar um perigo de lesão e de atuação parcial para constituir fundamento bastante para a anulação, mesmo que se desconheça em concreto a efetiva violação dos interesses de algum dos concorrentes” — acórdão de 9-12-2004, Proc.° n.° 594/04.» (v. também os Acs. STA de 13.01.2005, P. 730/04; de 25.01.2005, P. 690/04; de 3.02.2005, P. 952/04; de 15.02.2005, P. 1328/03; de 14.04.2005, P. 429/03; e de 22.02.2006, P. 1388/03; no mesmo sentido, e já depois do citado acórdão do Pleno, v. os Acs. STA de 25.09.2008, P. 318/08; de 4.03.2009, P. 504/08; ou de 29.11.2012, P. 1031/12; entre as decisões mais recentes, v., por exemplo, o Ac. TCAN de 23.09.2016, P. 331/09.4BEVIS; e os Acs. TCAS de 24.09.2020, P. 446/10.6BEBJA; e de 21.04.2022, P. 2791/16.8BELSB).

Por todas as razões indicadas, a formulação do princípio da imparcialidade administrativa, enquanto “princípio geral da atividade administrativa e norma concretizadora de preceitos constitucionais aplicável a toda e qualquer atuação da Administração Pública”, constante do artigo 9.º do CPA (de 2015) afigura-se completa e suficientemente elucidativa:
«A Administração Pública deve tratar de forma imparcial aqueles que com ela entrem em relação, designadamente, considerando com objetividade todos e apenas os interesses relevantes no contexto decisório e adotando as soluções organizatórias e procedimentais indispensáveis à preservação da isenção administrativa e à confiança nessa isenção.».

12. Um outro aspeto a considerar no caso sub iudicio é o de que o acesso à função pública se faz «em regra por via de concurso» (cfr. artigo 47.º, n.º 2, da Constituição), já que, sendo especial, a carreira universitária não deixa de ser uma carreira da função pública.
A regra do concurso constitui desde logo uma garantia de que o acesso à função pública se faça em condições de igualdade. Segundo Jorge Miranda e Rui Medeiros, importará distinguir duas vertentes:
«Uma vertente subjetiva, traduzida num direito garantido a todos os cidadãos; e uma vertente objetiva, com um fundamento institucional, que ultrapassa em muito o puro interesse do particular candidato. Ou seja, no artigo 47.º, n.º 2, o princípio de Direito objetivo aparece como integrando um direito subjetivo pessoal – um direito de igualdade, não estando o exercício de funções públicas sujeito a requisitos materialmente distintos daqueles que condicionam em geral, a liberdade de profissão. Mas há também uma dimensão objetiva, destinada a assegurar a melhor prossecução do interesse público, bem como a eficiência, a imparcialidade, a transparência e a democraticidade da Administração (Acs. 340/92, 526/99, 683/99e 61/04). Nesta dimensão, pode inclusivamente dizer-se que a garantia de igualdade no acesso à função pública constitui um “princípio fundamental da definição da composição da Administração Pública num Estado democrático” (Ac. 683/99).
[…]
A referência ao concurso tem subjacente o reconhecimento da necessidade da existência de um procedimento justo de recrutamento e seleção de candidatos à função pública. Com efeito, o concurso é precisamente considerado um procedimento regulado de seleção que privilegia a igualdade e a transparência e facilita a escolha dos mais capazes (Ac. 683/99). Desde logo, não se questionando que podem concorrer no procedimento concursal todos aqueles que reúnam os requisitos legais para se apresentar a concurso, é fundamental que as condições de acesso respeitem as normas e os princípios constitucionais aplicáveis, em especial, como já foi assinalado, o princípio da igualdade. Além disso, a satisfação dos princípios constitucionais relevantes no acesso à função pública postula a existência de um procedimento concursal no qual estejam asseguradas as regras da igualdade entre os candidatos, da imparcialidade do júri de seleção e da publicitação do anúncio e dos resultados (Acs. 162/03, 321/03 e 406/03). E, se a exigência de um concurso não impõe que o provimento num lugar da função pública decorra de uma escolha estritamente vinculada, não são legítimas decisões segundo critérios discriminatórios, conducentes a privilégios ou preferências arbitrárias, pela sua previsão ou pela desconsideração de parâmetros ou elementos que devem ser relevantes (Acs. 53/88 e 663/99).» (v. Autores cits., Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I, 2.ª ed., Universidade Católica Editora, Lisboa, 2017, anots. XX e XXI ao art. 47.º, pp. 711 e 712-713, respetivamente; v. também Joana Dias Cardoso, “Formação do vínculo de emprego público e recrutamento – O procedimento concursal como concretização do direito de acesso à função pública” in Direito das Relações Laborais na Administração Pública, e-book CEJ, 2018, p. 215 e ss., em especial pp. 220-227, com várias referências jurisprudenciais da jurisdição administrativa e fiscal concretizadoras destes princípios).

Deste modo, como concluem Gomes Canotilho e Vital Moreira, «a exigência de concurso – quer seja interno ou externo, de ingresso ou de acesso – testemunha a progressiva vinculação da administração, com a consequente redução da discricionariedade administrativa nos domínios do recrutamento e seleção de pessoal. […] A regra constitucional do concurso consubstancia um verdadeiro direito a um procedimento justo de recrutamento, vinculado aos princípios constitucionais e legais (igualdade de condições e oportunidades para todos os candidatos, liberdade das candidaturas, divulgação atempada dos métodos e provas de seleção, bem como dos respetivos programas e sistemas de classificação, aplicação de métodos e critérios objetivos de avaliação, neutralidade na composição do júri, direito de recurso). […].» (v. Autores cits., Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I, 4.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra 2007, anot. XIII ao art. 47.º, p. 661).
As exigências de igualdade, objetividade, imparcialidade e transparência neste tipo de procedimentos justificam-se igualmente – e de modo reforçado – por estar em causa uma escolha de pessoas, muitas vezes num universo relativamente pequeno e em que existem relações de proximidade entre quem tem de escolher e quem pretende ser escolhido. Esse é o caso frequente nos concursos para provimento de vagas da carreira académica, pelo que o afastamento daqueles princípios gerais carece de uma justificação particularmente robusta e convincente.

13. E isso mesmo foi tentado in casu pelo TAF de Coimbra, no seu acórdão de 16.05.2014 (numa orientação que, conforme informa a recorrente na cl. 4.ª das suas alegações, tem sido reiterada em decisões posteriores, nomeadamente nas decisões de 27.03.2018, P. 769/14.5BECBR, e de 11.01.2020, P. 278/18.3BECBR). Com efeito, segundo aquele tribunal, a simples enunciação legal dos critérios de avaliação é suficiente para garantir os referidos princípios:
«[O] Tribunal entende que da revogação do DL nº 204/98 de 11/7, ocorrida por ocasião da reforma dos vínculos e carreira iniciada com a publicação da Lei n° 12-A/2008, não resultou que tivessem sido simplesmente levados na avalanche de revogações de normas e diplomas aqueles direitos dos administrados, já que os mesmos relevam de direitos liberdades e garantias constitucionalmente consagrados e, se necessário, diretamente aplicáveis aos casos concretos (cf. artigo 18° da CRP).
Assim, depois da prolação do acórdão do pleno do STA de 13/11/2007 dado no recurso n° 01140/06 […] continua a ser claro que a exigência da divulgação atempada dos critérios de classificação final é aplicável aos concursos regulados pelo Estatuto da Carreira Docente Universitária (ECDU).
Não deixam, também, de vigorar as demais garantias de imparcialidade e transparência outrora recebidas no artº 5º do extinto Decreto-lei.
Mas daí não se pode concluir sem mais que no caso sub judice tais garantias e demais princípios concursais tenham sido violados in casu.
Vejamos:
No ECDU os critérios de avaliação das candidaturas a professor catedrático e a professor associado são essencialmente fixados por Lei, de um modo que que não só dispensa como proscreve qualquer densificação, pelo júri, após a abertura do concurso.
É isso mesmo que, em atenção à especial natureza da carreira e do objeto da matéria a apreciar, o Legislador preconiza nos artº[s] 37º a 52º do ECDU. Com efeito, ao dizer no artº 38º que o concurso se destina a “averiguar o mérito da obra científica dos candidatos a sua capacidade de investigação e o valor da atividade pedagógica já desenvolvida”, ao estabelecer a composição do júri conforme artº[s] 45º e 46º; ao definir como critérios de ordenação dos candidatos a professor associado exclusivamente os dois fatores mencionados no nº 2 do artº 49º, a saber, o mérito científico e pedagógico do curriculum vitae, e a qualidade científica e pedagógica do relatório, entregue pelo candidato, com os programa, conteúdo e métodos de ensino teórico e prático das matérias da disciplina em causa ou de uma disciplina do grupo a que respeita o concurso; ao prever, até, que o júri do concurso se possa formar após o conhecimento de quem são os candidatos (artº 45º); o Legislador revela que é seu especial desígnio deixar a um júri [e]minentemente científico, escolhido até em função do percurso científico e pedagógico dos candidatos, uma decisão a orientar por critérios estritamente científicos e técnicos, e bem assim deixar, para tanto, a esse júri ampla discricionariedade técnica, dispensando, se não mesmo proscrevendo, quaisquer formas de prévia auto-vinculação, designadamente a criação, pelo júri, de subcritérios de ordenação e sistemas de classificação.
Por outro lado, nada no regime em apreciação exige uma apreciação do mérito dos candidatos em termos quantitativos. O texto legal apenas fala de ordenação, o que, se não implica uma exclusão da possibilidade de serem ordenados com uma avaliação quantitativa, seguramente revela que a mesma não é obrigatória.
Assim, precisamente ao abster-se de definir, após a sua constituição, quaisquer fatores de ponderação e de densificação daqueles dois legais critérios, esses sim, constantes do aviso do concurso, o Júri respeitou os princípios e as garantias constitucionais, designadamente as garantias da imparcialidade e da igualdade e a proscrição da definição de fatores de avaliação ou ordenação após o conhecimento dos candidatos, que é uma implicação direta da necessidade de divulgação atempada dos métodos de seleção a utilizar.
Se o júri, uma vez constituído, tivesse gizado todo um sistema de ponderações, e classificações, densificando ao seu modo os critérios legais objeto do aviso, então sim, teria criado e divulgado extemporaneamente, critérios de classificação, introduzindo, a mais disso, no procedimento um fator de suspeição relativamente à sua imparcialidade e à garantia da igualdade de condições para todos os concorrentes.
Tal não aconteceu. Antes, como era de Lei, cada elemento do júri apresentou e fundamentou o seu voto individual tendo como única referência legal os critérios de ordenação previstos no artº 49º nº 2 do ECDU, uns ficando-se por uma menção geral dos critérios legais, outros referindo, de entre os subcritérios constantes do edital, aqueles que tiveram por dignos de nota em cada caso.
A Autora parece pretender assimilar a fundamentação dos votos individuais de cada elemento do Júri ao conceito de métodos de seleção e de sistema de classificação final, para dizer que não só foram conhecidos apenas nesse momento como variam de jurado para jurado, para afirmar que desse modo foi violada a regra de ouro da estabilidade dos critérios de avaliação.
Porém não é disso que se trata. A fundamentação de cada voto individual não é mais do que isso, isto é, a explicação da valoração que cada jurado faz pondo em confronto os curricula e os relatórios de cada candidato com os critérios legais acima referidos, para chegar a uma conclusão sobre qual dos candidatos deve ser classificado em primeiro lugar. O facto de cada voto ter diversa fundamentação é uma imposição expressa da lei – artº 52º nº 1 do ECDU – que revela toda a especialidade do regime do ECDU e, aliás, implica a exclusão, aqui, de uma decisão e fundamentação do júri diversa do cômputo dos votos, mais ou menos fundamentados, de cada um dos seus elementos.
Analisadas as declarações de voto dos jurados que votaram a favor do primeiro classificado, o Cl BB, verifica-se que, embora vão do mais circunstanciado ao mais singelo, nenhuma delas faz mais do que enunciar valorações mais ou menos concretas que no entender do vogal concorrem para que o referido Cl seja seriado a final e ou em cada um dos critérios matriz, no lugar que lhe atribuem.
Na verdade, uma coisa é o júri reunir e acrescentar, aos publicitados, novos critérios ou até subcritérios de avaliação, outra bem diversa é cada um dos elementos do júri chamar à colação considerações que em seu individual entender fundamentam as classificações dadas ao candidato ou o valor que lhe dá sob determinado critério ou subcritério publicitado no edital.
Aliás, a insistirmos na confusão entre as duas realidades, qualquer esforço de fundamentação mais concreta redundaria sempre na eleição superveniente de um subcritério não previsto no edital...
Ponto é que os aspetos chamados sejam efetivamente relevantes para a conclusão sobre a valia da candidatura em face de um dos critérios legais ou de algum dos subcritérios atempadamente publicitados. Ora, não se vê quais das considerações feitas nas motivações das declarações de voto que concorreram para a deliberação final são insuscetíveis de relevarem para os critérios legais e ou os subcritérios editais da avaliação das candidaturas.
Pelo exposto, improcede a alegação de violação dos princípios da igualdade de oportunidades dos concorrentes, de transparência e da imparcialidade da decisão do júri.» (itálicos acrescentados).

14. Já o TCAN, face ao mesmo Edital n.º …/2009, concluiu em sentido diverso.
Na verdade, as considerações e observações feitas pelo TAF de Coimbra não respondem à questão do perigo de comprometimento da isenção do júri e do risco de manipulação da ordenação dos candidatos face ao conhecimento da identidade dos mesmos e da documentação por eles apresentada para efeitos de avaliação curricular (o respetivo curriculum vitae, os exemplares dos trabalhos mencionados neste último e o relatório que inclua o programa, os conteúdos e os métodos de ensino teórico e prático das matérias da disciplina, ou de uma das disciplinas, do grupo a que respeita o concurso – cfr, os artigos 42.º, alínea b), e 44.º, ambos do ECDU). Nesse sentido, afirma-se no acórdão recorrido:
«A escolha do candidato pelo júri não pode, pois, deixar de se inserir numa ampla margem de discricionariedade técnica por parte deste, como se refere no acórdão recorrido, na medida em que do que se trata é de aferir da valia da obra científica, da capacidade de investigação e da atividade pedagógica dos candidatos, o que naturalmente implica c conhecimento da área em questão e a formulação de juízos de caráter eminentemente técnicos e científicos.
Não acompanhamos, porém, o entendimento do TAF quando afirma que essa discricionariedade dispensa “quaisquer formas de prévia auto-vinculação, designadamente a criação, pelo júri, de subcritérios de ordenação e sistemas de classificação”.
[…]
Com o acórdão do Pleno do STA. de 13/11/2007, proferido no processo n.º 01140/06 acabou por vingar o entendimento segundo o qual os princípios e garantias previstos no artigo 5.º do Decreto-lei 204/98, são aplicáveis aos concursos regulados pelo Estatuto da Carreira Docente Universitária.
Ora, como se refere no acórdão deste TCA Norte de 1/07/2016, proc. 1462/10.3BEPRT, "A divulgação atempada dos critérios de seleção/ordenação dos candidatos concursais em todos os procedimentos concursais, abertos pela Administração Pública, anteriormente prevista no Decreto-lei 204/98 mais não é do que um corolário ou concretização do princípio da imparcialidade constitucionalmente consagrado e legalmente previsto no CPA, o qual, entre, outros aspetos, traduz o “dever de a Administração Pública atuar de forma isenta em relação aos particulares, através de uma conduta reta que não favoreça amigos nem inimigos. Neste sentido, a imparcialidade é uma aplicação da ideia de igualdade e, portanto, um corolário do princípio da justiça.” […].
Neste sentido, Paulo Veiga e Moura in Função Pública, Regime jurídico. Direitos de Deveres dos Funcionários e Agentes, 1999, 1º vol., 2ª edição, pp. 91 e ss, sustenta que, em sede concursal. as regras de um concurso devem ser fixadas e divulgadas atempadamente, isto é, antes de ser conhecida a identidade dos diferentes concorrentes, pois só assim se obstará a que os fatores de ponderação sejam moldados por determinado candidato, independentemente de expressa consagração legal nesse sentido, em conformidade com os princípios da igualdade e imparcialidade constitucionalmente previstos e garantidos.
Trata-se afinal de, no âmbito dos concursos de provimento (de todos), como é o caso do dos autos, prevenir “o risco de (...) atuações parciais” “destinadas a favorecer algum dos interessados em concurso, com prejuízo de outros”, não dependendo a violação do principio da imparcialidade da verificação efetiva de tais condutas parciais – Acórdão do TCA Norte de 16.11.2016, Proc. n° 0054/05.6BCBR – bastando-se com a possibilidade de a falta de divulgação atempada de critérios, parâmetros e fatores objetivos de ponderação ou avaliação dos candidatos, potenciar o risco de alteração das regras do concurso posteriormente ao seu início, mediante a especificação de tais critérios/fatores de ponderação após conhecimento dos currículos dos candidatos, ‘afeiçoados’ ao perfil de um ou mais candidatos”.
Assim sendo, pese embora o Decreto-lei n.º 204/98 já haver sido revogado à data da abertura do concurso em causa nos autos, nem por isso os princípios e as garantias que resultam do seu artigo 5º deixam de ser aplicáveis, mormente a exigência de divulgação atempada dos métodos de seleção a utilizar e do sistema de classificação final, posto que os mesmos constituem, afinal, um corolário do princípio da imparcialidade, cuja observância é constitucionalmente imposta à atividade da Administração Pública, nos termos do disposto nos artigos 266º, nº 2 da CRP e 6º do CPA.» (cfr. o respetivo n.º 4).

E referindo-se concretamente ao caso dos presentes autos, tendo em conta que no Edital n.º …/2009 são publicitados os fatores a ponderar pelo júri na seleção e ordenação dos candidatos, ou seja, os métodos de avaliação, mas que, no respeitante aos subcritérios a considerar a propósito da avaliação de cada um desses fatores, os mesmos são apenas enunciados, omitindo-se a indicação do seu peso relativo, entendeu o tribunal a quo:
«Os critérios de seleção e os fatores a ponderar pelo júri na avaliação dos candidatos não atuam de per si, tornando-se essencial o recurso a processos/sistemas classificativos, pois são eles que irão conduzir à definição do mérito relativo de cada um e, consequentemente, à sua ordenação, de tal forma que não se podem conceber os primeiros sem os segundos.
Deste modo, para que se considere assegurada a observância dos princípios da transparência, da imparcialidade e da igualdade, não basta que do edital do concurso constem os critérios de seleção a utilizar e os fatores que concretamente irão ser ponderados pelo júri do concurso, ainda que sejam especificados quais os que irão ser objeto de especial valorização. Impõe-se também que seja enunciado o sistema de classificação final, entendido o mesmo como o “conjunto de operações matemáticas pelas quais se alcança, na sequência dos métodos de seleção, a classificação dos concorrentes” (cfr. Paulo Veiga e Moura. Função Pública, 1º vol., pág. 90).
No edital do concurso em causa nos autos apenas se refere que o mérito científico do currículo tem um peso de 60%, o mérito pedagógico do currículo 20% e o valor pedagógico e científico do relatório 20%. Contudo, nada é dito relativamente à ponderação que deve ser atribuída a cada um dos subcritérios.
Ora, o sistema de classificação final não se mostra estabelecido apenas com a fixação da ponderação a atribuir aos critérios de avaliação, exigindo-se também que seja determinada a ponderação de cada um dos subcritérios que os compõem. Só assim se assegura uma efetiva transparência, igualdade e imparcialidade na apreciação e valoração do mérito dos candidatos.
É que, não sendo pré-estabelecido o valor de cada um dos subcritérios é sempre possível ao júri conformar a avaliação dos candidatos de acordo com a valorização que faça dos mesmos, valorizando um ou outro subcritério de acordo com os respetivos currículos; por exemplo, na avaliação do mérito científico do currículo pode valorizar mais o subcritério "Produção científica” e desvalorizar os restantes critérios se o currículo do candidato que pretende graduar em 1º lugar é mais "valioso” nesse item.
Concluímos, assim, que sendo o edital de abertura do concurso totalmente omisso no que concerne ao sistema de classificação, resultam violados os princípios supra referidos, mostrando-se o procedimento concursal inválido ab initio, o que conduz à anulação do ato impugnado.» (cfr. o respetivo n.º 4, in fine).

15. Na verdade, o citado Ac. STA (Pleno) de 13.11.2007, P. 1140/06, decidiu que a divulgação atempada do sistema de classificação final exigida pelo artigo 5.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 204/98, de 11 de julho, era aplicável aos concursos regulados pelo ECDU, desde logo, porque, de acordo com o n.º 2 do artigo 3.º de tal diploma, os regimes de recrutamento e seleção de pessoal dos corpos especiais e das carreiras de regime especial podiam «obedecer a processo de concurso próprio», sem prejuízo do respeito pelos princípios e garantias consagrados no artigo 5.º. E neste preceito estabelecia-se, além do mais, que a divulgação atempada dos métodos de seleção a utilizar e do sistema de classificação final constituíam garantias dos princípios de liberdade de candidatura, de igualdade de condições e de igualdade de oportunidades para todos os candidatos. Ora, sendo as carreiras docentes qualificadas como “corpos especiais” (artigos 13.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 248/85, de 15 de Julho, e 16.º, n.º 2, alínea d), do Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de Junho), a situação daqueles autos enquadrava-se no referido artigo 3.º, sendo aplicável ao concurso em causa o regime de recrutamento previsto no ECDU, mas sem prejuízo da aplicação dos princípios e garantias consagrados no mencionado artigo 5.º do Decreto-Lei n.. 204/98. Daí a mencionada conclusão: a divulgação atempada do sistema de classificação final exigida pelo artigo 5.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 204/98 é aplicável aos concursos documentais regulados pelo ECDU.
Mas no mesmo acórdão, este Supremo Tribunal foi mais longe e afirmou que aquela divulgação correspondia a uma exigência da própria Constituição, relativizando desse modo a estatuição do artigo 5.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 204/98 (diploma entretanto revogado pela Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro – cfr. o respetivo artigo 116.º, alínea ap) ):
«Na verdade, aquela divulgação atempada, entendida como anterior ao conhecimento dos elementos curriculares dos candidatos [– e, poderá acrescentar-se, da própria identidade destes últimos –], visa dar transparência ao recrutamento, sendo o mínimo exigível como forma de assegurar que os critérios que virão a ser utilizados para graduação dos candidatos não são adaptados em função do perfil curricular dos candidatos, por forma a permitir beneficiar ou prejudicar algum deles.
Por isso, trata-se de uma regra que é corolário do princípio constitucional da imparcialidade, cuja observância é constitucionalmente imposta à generalidade da atividade da Administração Pública (art. 266.º, n.º 2, da CRP e 6.º do CPA).
Ou, noutra perspetiva, aquela regra corresponde ao mínimo exigível para garantir a observância do princípio da igualdade de oportunidades, proclamado no n.º 1 do art. 5º do Decreto-Lei n.º 204/98, pelo que a sua adoção na generalidade dos concursos é postulada pela própria essência do Estado de Direito, como patenteia a repetida preocupação constitucional em afirmar esse princípio explicitamente, em várias matérias (arts. 59.º, n.º 2, alínea b), 73.º, n.º 2, 74.º, n.ºs 1, e 2, alínea h), 76.º, n.º 1, 81.º, alínea b), e 113.º, n.º 3, alínea b), da CRP).
Por outro lado, em qualquer concurso de recrutamento de pessoal em que haja mais que um candidato haverá necessidade, inclusivamente para cumprimento da exigência constitucional de fundamentação, de aplicar, implícita ou explicitamente, algum sistema de classificação, pelo que não se pode justificar uma exceção à aplicação daquelas regras do art. 5.º com base na alegada dificuldade de determinação antecipada desses métodos e sistema, pois, antes ou depois do conhecimento do perfil dos candidatos, a dificuldade será idêntica.
A regra constitucional da autonomia das universidades de «autonomia estatutária, científica, pedagógica, administrativa e financeira» (art. 76.º, n.º 2, da CRP), para além de não implicar a atribuição de poder incontrolável e arbitrário de escolha de docentes, não pode, no caso das universidades públicas, sobrepor-se à aplicação dos princípios básicos do Estado de Direito.» (itálico acrescentado).

16. Sobre esta última questão – a compatibilidade da observância da imparcialidade nos concursos académicos com o princípio da autonomia universitária – já se pronunciou o Tribunal Constitucional no seu Acórdão n.º 248/2010 em sentido favorável e em termos que se acompanham.
Na ocasião, aquele Tribunal foi confrontado com um argumentário próximo do utilizado pelo TAF de Coimbra e pela ora recorrente nos presentes autos, nos termos do qual a autonomia universitária em matéria de recrutamento do corpo docente universitário já se encontra adequada e suficientemente densificada pelo legislador ordinário nas normas do ECDU e que, portanto, as exigências legais acrescidas de divulgação atempada dos métodos de seleção a utilizar e do sistema de classificação final, bem como a exigência da aplicação de métodos e critérios objetivos de avaliação, previstas no artigo 5.º, n.º 2, alíneas b) e c), do Decreto-Lei n.º 204/98, quando aplicadas a concursos de recrutamento de professores universitários, violariam aquela autonomia. De acordo com este entendimento, a avaliação do curriculum dos candidatos às vagas de professor teria de ser “global e concreta”, realizada através de uma avaliação pessoal dos candidatos, sendo impossível, na maioria das situações, submetê-los a uma “grelha de classificação prévia e abstrata”, uma vez que especificidades relacionadas com o âmbito do conhecimento científico e da liberdade criativa do corpo docente universitário se traduzem numa diversidade incontrolável e imprevisível de curricula universitários e de atividades profissionais que reclamam o estabelecimento de regras próprias.
A tais argumentos respondeu o Tribunal Constitucional no mencionado Acórdão n.º 248/2010:
«Esta alegada impossibilidade de aplicação de métodos e critérios objetivos de avaliação, bem como a alegada impossibilidade de divulgação atempada dos métodos de seleção a utilizar e do sistema de classificação final, relativamente ao recrutamento de professores catedráticos, estão por demonstrar e, sobretudo, não devem ser confundidas com a questão da complexidade de avaliação curricular dos candidatos a professores catedráticos.
Aliás, as alegadas impossibilidades de objetivação do recrutamento dos professores catedráticos, a terem-se por demonstradas, seriam então necessariamente acompanhadas de outras consequências, bem mais desfavoráveis para os candidatos, nomeadamente a desnecessidade de fundamentação da própria avaliação e ordenação final dos candidatos.
Pelo contrário, quando uma Universidade procede à abertura de um concurso para provimento de vagas de professor catedrático num certo departamento, a mesma tem necessariamente de saber, nesse mesmo momento, independentemente das candidaturas que vierem a ser concretamente apresentadas, quais são os critérios objetivos que irá utilizar na avaliação dos candidatos, designadamente a importância relativa e absoluta desses critérios por referência ao mérito da obra científica, à capacidade de investigação e à atividade pedagógica já desenvolvida (v.g., a definição dos indicadores relevantes em matéria de progressão na carreira universitária, de publicação de trabalhos científicos ou didáticos, de direção ou orientação de trabalhos de investigação, de formação ou orientação científica e pedagógica de docentes e investigadores, ou mesmo o estabelecimento de condições de preferência como a experiência numa determinada área científica).
A autonomia universitária – a liberdade de cátedra – não é ameaçada pela obrigação legal de definição e divulgação antecipada dos referidos critérios objetivos desde que seja a própria comunidade científica a fazê-lo livremente, sem quaisquer interferências externas. Em salvaguarda da liberdade de cátedra, a Universidade goza de uma margem de livre decisão, dir-se-ia quase total, na escolha dos critérios formais de avaliação dos candidatos a que ficará posteriormente vinculado o próprio júri do concurso e que permitirão explicar a decisão final de ordenação dos candidatos.
A liberdade de cátedra não é incompatível com o procedimento justo de recrutamento de professores […], continuando a ser possível recortar um regime específico de recrutamento derivado da autonomia universitária e materialmente distinto daquele que é observado relativamente ao recrutamento dos funcionários públicos em geral, nomeadamente no recrutamento dos funcionários não docentes das universidades.
Pelo contrário, a divulgação antecipada e a aplicação final de métodos e critérios objetivos de avaliação pela própria Universidade reforçam a sua autonomia normativa, colocam os candidatos em pé de igualdade e asseguram a imparcialidade do júri do concurso em particular, tudo isto contribuindo para a seleção dos melhores candidatos.
Aliás, mais recentemente, o legislador ordinário acabou por consagrar, de forma mais incisiva, a força irradiante do aludido princípio da transparência no próprio diploma que regula a matéria do recrutamento de professores [universitários]. Efetivamente, nos termos do disposto no novo artigo 62.º-A, n.º 2, do ECDU – acrescentado pelo Decreto-Lei n.º 205/2009, de 31 de Agosto –, os critérios de seleção e de seriação são objeto de divulgação antecipada, os quais deverão ser aplicados na decisão do júri.»

Refira-se ainda que este Supremo Tribunal Administrativo, a propósito de questão paralela à colocada nos presentes autos, mas referente ao ensino superior politécnico, e considerando já esta decisão do Tribunal Constitucional, reiterou nos seus acórdãos de 26.01.2012, P. 875/11, e de 1.10.2015, P. 1120/12, a jurisprudência do referido acórdão do Pleno de 13.11.2007, P. 1140/06.

17. Em suma, pode afirmar-se que, no procedimento concursal baseado numa avaliação curricular, como sucede no concurso para professor associado objeto dos presentes autos, a jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo é unânime ou largamente maioritária quanto à necessidade de divulgação de todos os critérios de avaliação antes do termo do prazo concedido aos interessados para apresentarem as candidaturas e o curriculum vitae. Esta exigência, de divulgação atempada, visa dar transparência ao recrutamento, sendo o mínimo exigível para assegurar que os critérios que virão a ser utilizados para graduação dos candidatos não são adaptáveis em função do perfil curricular dos mesmos, de forma a permitir beneficiar ou prejudicar algum deles, regra que é corolário do princípio constitucional da imparcialidade, cuja observância é constitucionalmente imposta à generalidade da atividade da Administração Pública (cfr., por último os Acs. STA de 8.4.2021, P. 42/20.0BALSB; e de 12.10.2023, P. 450/11.7BEPRT). Na verdade, sob pena de suspeição, falta de transparência e de parcialidade, não pode o órgão decisor estabelecer essas regras e critérios depois de conhecer as candidaturas dos concorrentes. Para que não haja a tentação de afeiçoar os critérios à situação particular de um ou outro interessado, e, portanto, ao resultado que se pretenda obter, devem eles ser estabelecidos antes de conhecido o currículo de cada candidato. De tal modo é assim que basta a possibilidade de tal desrespeito criar um perigo de lesão, e de atuação parcial, para constituir fundamento bastante de anulação, mesmo que se desconheça em concreto a efetiva violação dos interesses de algum dos concorrentes (formulação do Ac. STA de 9.12.2004, P. 594/04, que é transcrito no citado acórdão de 8.04.2021 e a que o acórdão de 12.10.2023 aderiu).
No referido Ac. STA de 12.10.2023 são acrescentadas mais duas ordens de razão que reforçam a necessidade de o edital de um concurso documental, nomeadamente nos casos de avaliações curriculares, indicar, além dos fatores a ponderar pelo júri na seleção e ordenação dos candidatos e dos subcritérios a considerar a propósito de cada um deles, também a ponderação destes subcritérios de modo a estabelecer o sistema de classificação final aplicável.
Primeira:
«12.15 – É na própria existência do instituto do concurso público que encontra justificação [a] necessidade de se assegurar a igualdade de tratamento através de um procedimento administrativo transparente.
12.16 – O procedimento administrativo concursal será transparente quando, para além do mais, assegure a objetividade da posição de quem decide abrir o concurso e de quem o conduz. A objetividade aqui exigida significa que o concurso público não pode obedecer exclusiva ou predominantemente a critérios subjetivos da Administração Pública sem acolhimento jurídico, não existindo transparência sem conhecimento prévio e sem estabilidade das regras e dos critérios de apreciação a que a Administração Pública se auto-vincula no momento da abertura do concurso (Neste sentido v. Marcelo Rebelo de Sousa, O concurso público na formação do contrato administrativo, Lex, 2004, pgs. 62 e ss.).
[…]
12.20 – Apenas a divulgação atempada de tais dados do jogo [– os métodos de seleção a utilizar e do sistema de classificação final dos candidatos –] assegura a transparência da Administração Pública e coloca, efetivamente, todos os candidatos em pé de igualdade em relação ao conhecimento dos critérios curriculares pelos quais irão ser pontuados e avaliados.».

A segunda, com referência à necessidade de prévia densificação ou definição discricionária pela Administração dos critérios a seguir no exercício de poderes de decisão em situações concorrenciais – uma situação frequente nos procedimentos administrativos de seleção concorrencial, como os concursos de pessoal, em que é necessário «escolher entre vários interessados em aceder a um “benefício” que [aquela] atribui» (cfr. Pedro Costa Gonçalves, Manual de Direito Administrativo, Vol. 1, Almedina, Coimbra, 2019 (reimpr. de 2020), p. 230):
«12.24 – [O] “imperativo de correto exercício da discricionariedade” (Pedro Costa Gonçalves, Manual de Direito Administrativo, Vol. I, Almedina, 2019, pg. 234) […] impende sobre a “Administração, por razões de igualdade, de imparcialidade e de transparência (por) est(ar) legalmente obrigada a organizar um procedimento aberto a todos os interessados. Embora possa dispor, e dispõe em geral, de discricionariedade para selecionar a melhor proposta ou a melhor oferta que vier a ser apresentada ou para avaliar os candidatos ao concurso, a Administração deverá exercer, pelo menos em parte, essa discricionariedade mediante a definição ex ante, de forma genérica e em abstrato, dos critérios ou fatores que vão orientar a decisão concreta de seleção ou de classificação. Este fenómeno de “redução da indeterminabilidade de conceitos normativos” afigura-se essencial para assegurar a transparência do procedimento concorrencial, a concorrência e a igualdade de tratamento dos concorrentes. A antecipada definição discricionária de critérios do exercício de poderes de decisão corresponde a uma forma de exercício antecipado da discricionariedade pelo próprio órgão competente para proferir a decisão concreta de seleção: designamos esta discricionariedade de escolha dos critérios e das regras de adjudicação de contratos “discricionariedade de conformação normativa”. Trata-se de um mecanismo (necessário) de autovinculação administrativa, pelo que o órgão competente para decidir em concreto fica obrigado a atuar com observância dos critérios predeterminados.” (Pedro Costa Gonçalves, op. cit. pg. 230 e 231.)».

18. Dada a omissão no Edital n.º …/2009 da indicação do peso relativo dos subcritérios ou fatores a considerar na avaliação dos critérios de avaliação (mérito científico e pedagógico do currículo e valor pedagógico e científico do relatório), os opositores ao concurso para professor associado em análise nos presentes autos não só ficaram impossibilitados de preparar a documentação apresentada a concurso de acordo com o que considerassem mais conveniente em função dos critérios efetivos de classificação, como também ficaram sujeitos ao risco de manipulações e quebras de isenção na apreciação das respetivas candidaturas e a uma margem de arbitrariedade na valorização ou desvalorização – se não mesmo desconsideração – de aspetos (subcritérios) que, nos termos do citado edital, deviam ser tidos em conta (de resto, foi exatamente isso que sucedeu in casu, conforme descrito no acórdão do TAF de Coimbra – cfr. supra o n.º 13: «cada elemento do júri apresentou e fundamentou o seu voto individual tendo como única referência legal os critérios de ordenação previstos no artº 49º nº 2 do ECDU, uns ficando-se por uma menção geral dos critérios legais, outros referindo, de entre os subcritérios constantes do edital, aqueles que tiveram por dignos de nota em cada caso»).
Ora, como se refere no acórdão recorrido, «não sendo pré-estabelecido [– relativamente ao conhecimento dos candidatos e das suas candidaturas –] o valor de cada um dos subcritérios, é sempre possível ao júri conformar a avaliação dos candidatos de acordo com a valorização que faça dos mesmos, valorizando um ou outro subcritério de acordo com os respetivos currículos; por exemplo, na avaliação do mérito científico do currículo pode valorizar mais o subcritério "Produção científica” e desvalorizar os restantes critérios se o currículo do candidato que pretende graduar em 1º lugar é mais "valioso” nesse item». Nessa medida, e devido à criação de tal risco, o citado edital não contém um verdadeiro “sistema de classificação final”, omissão essa que é condição suficiente da violação dos princípios da transparência, da igualdade e da imparcialidade.
Improcedem, assim, as conclusões das alegações da recorrente (cfr., em especial, as cls. 6.ª a 14.ª).

III. Decisão

Pelo exposto, decide-se negar provimento ao recurso e, em consequência, manter o acórdão recorrido e confirmar a anulação do ato impugnado.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 1 de fevereiro de 2024. - Pedro Manuel Pena Chancerelle de Machete - José Augusto Araújo Veloso - Maria do Céu Dias Rosa das Neves.