Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:015/13.9BEVIS
Data do Acordão:11/09/2018
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SÃO PEDRO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL
Sumário:Não se justifica admitir recurso de revista relativamente a questões sem projecção fora do caso concreto e que tenham sido decididas através de um discurso fundamentado e juridicamente plausível.
Nº Convencional:JSTA000P23822
Nº do Documento:SA120181109015/13
Data de Entrada:09/18/2018
Recorrente:MUNICÍPIO DE VISEU
Recorrido 1:A... LDA E OUTRO
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar – art. 150º, 1, do CPTA.

Acordam no Supremo Tribunal Administrativo (art. 150º, 1 do CPTA)

1. Relatório

1.1. O MUNICÍPIO DE VISEU recorreu, nos termos do art. 150º, 1, do CPTA, para este Supremo Tribunal Administrativo do acórdão do TCA Norte, proferido em 6 de Abril de 2018, que confirmou a sentença proferida pelo TAF de Viseu, a qual na acção de contencioso pré - contratual intentada contra si e contra a B……….., Lda. por A……….. LDA anulou a deliberação de adjudicação de serviço público de transportes colectivos urbanos e locais para as freguesias de Boa aldeia e Farminhão em Viseu e condenou o réu (ora recorrente) a adoptar todos os actos e operações necessárias para reconstituir a situação que existiria se o acto de adjudicação não tivesse sido praticado e celebrado o respectivo contrato, decidindo pela adjudicação à autora.

1.2. Fundamenta a admissibilidade da revista para melhor aplicação do direito e pela relevância das questões relativas à contratação pública.

1.3. Não foram apresentadas contra-alegações.

2. Matéria de facto

Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. Matéria de Direito

3.1. O artigo 150.º, n.º 1, do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». Como decorre do próprio texto legal e a jurisprudência deste STA, tem repetidamente sublinhado trata-se de um recurso excepcional, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando-o como uma «válvula de segurança do sistema», que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.

3.2. A decisão do TAF de Viseu apreciou várias questões, tendo dado razão à autora nas seguintes:

(i) aplicação do critério de desempate. Entendeu, neste ponto, - maior numero de anos de experiência em transportes colectivos urbanos – que o conceito de “transportes colectivos urbanos” aplicado não era o correcto. Concluiu, neste ponto, que a definição seguida pelo júri do concurso no relatório preliminar não resultava das normas legais aplicáveis, isto é que “todas as concessões para fora do perímetro urbano do concelho são carreiras de transportes colectivos e não transportes colectivos urbanos”.

(ii) avaliação das propostas relativamente ao 3º subfactor do 2º factor (área de estacionamento). Entendeu o TAF de Viseu que a classificação atribuída padece de erro. A área referida no relatório final (6035 m2) não correspondia à área descoberta de aparcamento, indicadas pela B……….. Lda.na sua proposta.

Perante os vícios que reconheceu no acto de adjudicação o TAF de Viseu colocou a questão do afastamento do efeito anulatório, nos termos do art.283º, 4 do CCP, concluindo que, no caso, tal não era aplicável. Consequentemente anulou o contrato já celebrado em 25-1-2013.

3.3. O TCA Norte manteve no essencial o entendimento do TAF de Viseu. Quanto ao critério de desempate adiantou o argumento de que o concurso em causa visava, precisamente, a concessão de serviço de transportes urbanos colectivos para as freguesias de Boa aldeia e Farminhão, em Viseu, sendo que a autora apresentou experiência relativamente aos circuitos em causa correspondentes aos transportes de Viseu para as freguesias de Boa aldeia e Farminhão, desde 1-10-1971. “Como tal, nem se compreende, num registo de boa-fé a defesa do contrário (…) O erro, logo o vício de que padece o acto impugnado é – diz o acórdão – flagrante”.

Relativamente aos vícios reconhecidos no acto de adjudicação não se justifica admitir a revista, desde logo, porque os mesmos resultam em grande medida da matéria de facto dada como provada (área de parqueamento), sendo por esse motivo claramente limitados a este concreto concurso, sem qualquer projecção em casos futuros. O critério do desempate tem, é certo, uma componente jurídica relevante, uma vez que o conceito de transporte colectivo urbano foi recortado através da análise das normas legais aplicáveis à regulação do sector. Todavia, e como sublinhou o TCA Norte, a própria autoridade administrativa caracterizou a concessão de serviços públicos de transportes urbanos colectivos para as freguesias de Boa aldeia e Farminhão, para os quais a autora realiza transportes colectivos. Daí que o entendimento acolhido não justifique a admissão de um recurso excepcional de revista.

Também se afigura não ser necessária a admissão da revista para discutir a questão da separação de poderes, localizado na interpretação que o TCA fez das áreas com que o candidato B………… se apresentou a concurso, por se evidente que a interpretação do conteúdo das propostas – designadamente a veracidade dos factos ali invocados – não é matéria subtraída à fiscalização judicial da actividade administrativa.

Quanto à ponderação de interesses que levou a 1ª instância a decidir-se pela anulação do acto de adjudicação, também não se justifica admitir a revista, pois é também evidente que o juízo de ponderação de interesses a que se refere o art. 283º, 4 do CCP, não afecta o principio da separação de poderes, precisamente por ser o próprio preceito a impor ao tribunal essa operação e não se imputar ao preceito qualquer inconstitucionalidade.

Deste modo, por estarem em causa questões que apenas dizem respeito ao concreto procedimento e por ambas as decisões serem concordantes, mostrando-se o acórdão recorrido fundamentado através de um discurso jurídico plausível, não se justifica admitir a revista.

4. Decisão

Face ao exposto não se admite a revista.

Custas pelo recorrente.

Porto, de 9 de Novembro de 2018. – São Pedro (relator) – Costa Reis – Madeira dos Santos.