Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01073/13
Data do Acordão:11/27/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:OPOSIÇÃO
INDEFERIMENTO LIMINAR
ILEGALIDADE ABSTRACTA
ILEGALIDADE CONCRETA
RECURSO
DECISÃO DE APLICAÇÃO DE COIMA
Sumário:A alegada preterição do disposto no artigo 25.º do RGIT (na redacção que lhe foi conferida pela Lei do Orçamento do Estado para 2009) nas decisões de aplicação de coimas fiscais, não configura fundamento de oposição subsumível na alínea a) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT.
Nº Convencional:JSTA000P16616
Nº do Documento:SA22013112701073
Data de Entrada:06/14/2013
Recorrente:A... LDA
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

- Relatório-
1 – A……………….., LDA, com os sinais dos autos, recorreu para o Tribunal Central Administrativo Norte da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, de 10 de Julho de 2012, que, nos termos do artigo 209.º n.º 1 alíneas b) e c) do CPPT e 493.º, n.º 2, 494.º e 288.º, n.º 1, al. e) do CPC (ex vi al. e) do art. 2.º do CPPT), rejeitou liminarmente a petição inicial de oposição por si apresentada contra a execução fiscal n.º 3425201201025074, instaurada no Serviço de Finanças de Braga – 2 para cobrança coerciva de coimas no valor de € 32.297,06, apresentando para tal as seguintes conclusões:
15º O tribunal a quo, rejeitou liminarmente a oposição deduzida pela então oponente, ora Recorrente, alegando, em síntese, que o fundamento da mesma não se encontra consignado no art. 204.º do CPPT.
16º Sucede que, com a devida vénia, muito mal andou o Meritíssimo Juiz do tribunal a quo ao proferir aquela decisão.
17º Com efeito, a oposição à execução fiscal então deduzida, funda-se, justamente, no disposto no n.º 1, alínea a) do art. 204.º do CPPT.
18.º Objectivamente, no caso sub judice, o que está em causa é a inobservância pela Fazenda Pública do disposto no art. 25.º do RGIT, com a redacção dada pela Lei n.º 64-A/2008 de 31 de Dezembro
19.º Ora, tal inobservância consubstancia a prática de uma ilegalidade em abstracto ou absoluta, a qual constitui fundamento de oposição à execução fiscal nos termos do disposto em n.º 1, alínea a) do art. 204º do CPPT.
20.º Na verdade e no rigor, a Fazenda Pública aplicou coimas ao S.P. ora Recorrente por violação do disposto nos arts 27º, nº 1 e 41º, nº 1, alínea a), ambos do CIVA ao arrepio do disposto no art. 25º do RGIT, na Redacção dada pela Lei 64-A/2008 de 31 de Dezembro.
21.º Ao actuar desta forma, a Fazenda Pública, praticou aquilo a que a doutrina e jurisprudência designam por uma ilegalidade abstracta ou absoluta a qual se distingue da ilegalidade em concreto pelo facto de naquela estar em causa a própria ilegalidade do acto tributário.
22.º Assim sendo, dúvidas não há nem pode haver, que o então Oponente ora Recorrente, lançou mão do mecanismo jurídico adequado e legalmente previsto para se opor à ilegalidade praticada pela Fazenda Nacional.
Nestes termos e outros de direito que Vªs Excªs doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente e, em consonância, ser revogada a decisão recorrida, ordenando-se que a oposição seja admitida e julgado o mérito da mesma, fazendo-se, assim, JUSTIÇA.

2 – Não foram apresentadas contra-alegações.

3 – Por Acórdão de 14 de Março de 2013 (a fls. 83 a 86 dos autos) o Tribunal Central Administrativo Norte declarou-se incompetente em razão da hierarquia para conhecimento do objecto do recurso e competente este Supremo Tribunal, no entendimento de que o recurso tem por fundamento exclusivamente matéria de direito, tendo os autos sido remetidos ao STA precedendo requerimento da recorrente nesse sentido (fls. 92 dos autos).

4 – O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu o parecer de fls. 99 e 99 dos autos concluindo no sentido de que deve negar-se provimento ao presente recurso jurisdicional, e manter-se a decisão recorrida na ordem jurídica.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
- Fundamentação -

5 – Questão a decidir
É apenas a de saber se bem andou a decisão recorrida ao indeferir liminarmente a petição de oposição.

6 – Apreciando.
6.1 Do indeferimento liminar da petição de oposição
A decisão recorrida, a fls. 34 e 35 dos autos, rejeitou liminarmente a oposição deduzida pela ora recorrente, com fundamento no disposto nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 209.º do CPPT e 493.º, n.º 2, 494.º e 288.º, n.º 1, al. e) do CPC (ex vi do art. 2.º, alínea e) do CPPT), absolvendo a Fazenda Pública da instância, no entendimento de que o fundamento de oposição invocado pela recorrente – de que não lhe deviam ter sido impostas duas coimas, mas sim uma coima única (face ao disposto no artigo 25.º do RGIT, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro) – não é subsumível em nenhum dos fundamentos de oposição taxativamente previstos no art. 204.º, n.º 1 do CPPT, antes deveria a oponente ter apresentado oportunamente o respectivo recurso da decisão de aplicação das coimas, nos termos e prazos previstos no art. 80.º do RGIT (cfr. decisão recorrida a fls. 34/35 dos autos).
O decidido merece inteira concordância do Excelentíssimo Procurador-Geral adjunto junto deste Supremo Tribunal.
Não se conformando com o decidido, alega a recorrente que a oposição à execução fiscal então deduzida, funda-se, justamente, no disposto no n.º 1, alínea a) do art. 204.º do CPPT, porquanto no caso sub judice, o que está em causa é a inobservância pela Fazenda Pública do disposto no art. 25.º do RGIT, com a redacção dada pela Lei n.º 64-A/2008 de 31 de Dezembro e tal inobservância consubstancia a prática de uma ilegalidade em abstracto ou absoluta, a qual constitui fundamento de oposição à execução fiscal nos termos do disposto em n.º 1, alínea a) do art. 204º do CPPT, pelo que o então Oponente ora Recorrente, lançou mão do mecanismo jurídico adequado e legalmente previsto para se opor à ilegalidade praticada pela Fazenda Nacional.
Manifesto é, porém, que não lhe assiste razão.
A ilegalidade em abstracto a que se refere a alínea a) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT – inexistência do imposto, taxa ou contribuição nas leis em vigor à data dos factos a que respeita a obrigação ou, se for o caso, não estar autorizada a sua cobrança à data em que tiver ocorrido a respectiva liquidação – é uma “ilegalidade normativa”, e não meramente do acto de aplicação da norma legal, uma ilegalidade que, nas palavras de Jorge Lopes de Sousa (Código de Procedimento e de Processo Tributário: Anotado e Comentado, Volume III, 6.ª edição, 2011, p. 443 e 446 – nota 4 ao art. 204.º do CPPT), não reside directamente no acto que faz aplicação da lei ao caso concreto, mas na própria lei cuja aplicação é feita, não sendo, por isso, a existência de vício dependente da situação real a que a lei foi aplicada nem do circunstancialismo em que o acto foi praticado, (...), cabendo neste conceito de ilegalidade abstracta todos os casos de actos que aplicam normas que violam regras de hierarquia superior, designadamente, além das normas constitucionais, as de direito comunitário ou internacional vigente em Portugal ou mesmo normas legislativas de direito ordinário quando é feita aplicação de normas regulamentares.
No caso dos autos está em causa a alegada preterição do disposto no artigo 25.º do RGIT (na redacção que lhe foi conferida pela Lei do Orçamento do Estado para 2009) nas decisões de aplicação de coimas fiscais, residindo a alegada ilegalidade no próprio acto de aplicação das coimas (por desconsideração de que às duas infracções em concurso seria aplicável uma coima única, determinada segundo as regras do cúmulo jurídico, nos termos do referido artigo 25.º do RGIT), não se configurando a alegada ilegalidade numa ilegalidade abstracta, absoluta ou normativa, mas numa ilegalidade concreta, da decisão de aplicação da coima, à qual a recorrente podia ter reagido, como bem se disse na decisão recorrida, através do meio próprio que a lei lhe faculta, a saber, o recurso da decisão de aplicação da coima - artigo 80.º do RGIT – a interpor no prazo de 20 dias após a respectiva notificação da decisão, sendo que, como bem decidido, também não é possível convolar a petição de oposição em recurso de decisão de aplicação da coima por manifesta intempestividade.
Ora, não sendo o fundamento invocado enquadrável na alínea a) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, ao contrário do alegado, nem sendo subsumível em qualquer outra alínea deste preceito legal – designadamente na sua alínea h), porquanto a lei assegura meio judicial de recurso contra a decisão de aplicação da coima -, tem de concluir-se que a decisão recorrida, de indeferimento liminar da oposição, não merece qualquer censura, estando o recurso votado ao insucesso.
- Decisão -
7 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 27 de Novembro de 2013. – Isabel Marques da Silva (relatora) – Dulce NetoCasimiro Gonçalves.