Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:018/13
Data do Acordão:12/04/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:IMPOSTO MUNICIPAL SOBRE TRANSMISSÃO ONEROSA DE IMOVEIS
OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
RECLAMAÇÃO JUDICIAL
CONVOLAÇÃO
Sumário:I - Não constitui fundamento de oposição à execução fiscal a pretensa ilegalidade da liquidação adicional de IMT resultante de actualização do Valor Patrimonial Tributário do prédio.
II - O meio processual adequado para sindicar a legalidade da compensação da dívida exequenda por iniciativa da Administração tributária é a reclamação judicial prevista nos artigos 276.º e seguintes do CPPT.
III - A convolação da petição de oposição em reclamação judicial não deve ser determinada quando se traduza na prática de um acto inútil, o que sucede, designadamente, quando se apure que esta seria intempestiva.
Nº Convencional:JSTA00068486
Nº do Documento:SA220131204018
Data de Entrada:01/10/2013
Recorrente:A..........
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TT1INST LISBOA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART204 N1 A H ART276 ART277 N1 ART98 N4.
LGT08 ART97 N3.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório -

1 – A..........., S.A., com os sinais dos autos, recorre para este Supremo Tribunal da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa, de 27 de Abril de 2012, que rejeitou liminarmente a oposição por si deduzida contra o acto de compensação praticado no processo de execução fiscal n.º 1490201001001590, contra si instaurada pelo Serviço de Finanças do Cadaval para cobrança coerciva de dívida de IMT, apresentando para tal as seguintes conclusões:

A) A sentença recorrida decidiu pela rejeição liminar da oposição à execução fiscal, porquanto não “é conhecida a data em que a aqui Recorrente foi notificada da decisão para efeitos de convolação da oposição em Reclamação das Decisões do Órgão de Execução Fiscal, bem como entendeu que a oposição apresentada não tem por fundamento nenhum dos previstos no n.º 1 do art. 204.º do CPPT, designadamente os das alíneas a) e h) …”

B) Acontece que a Recorrente sempre juntou aos autos todos os documentos para os quais foi notificada e que se encontram na sua disponibilidade e alcance;

C) Em 28.07.2011, por despacho exarado pela Mma. Juiz “a quo” a fls. 103, a Oponente foi notificada para juntar “cópia da liquidação de que resultou a dívida exequenda”.

D) Em cumprimento do referido despacho a ora Oponente, em 05.08.2011, veio juntar aos autos o documento da liquidação adicional resultante de avaliação, documento com o n.º 2007 406550903, no valor de €21.336,83.

E) Por despacho datado de 26-10.2011, foi a Oponente notificada para juntar aos autos “documento ou cópia de documento de onde conste a data em que teve conhecimento do acto de compensação a que fez referência a fls. 17 da P.I”.

F) Pelo que, em 03.11.2011, o Oponente juntou aos autos, o único documento de demonstração de compensação de dívidas fiscais do qual foi notificada.

G) O documento de compensação de dívidas fiscais, encontra-se junto aos autos de execução, sendo Administração Tributária a única detentora do aviso de receção assinado pelo ora Oponente.

H) A sentença recorrida violou assim o disposto no artigo 535.º do C.P.C. e os princípios gerais de cooperação e colaboração das partes com o tribunal, designadamente da cooperação in casu com a Administração Tributária, no esclarecimento da verdade.

I) Acresce que a compensação da dívida não constitui a causa de pedir dos presentes autos de execução, outrossim a inexistência do imposto e a ilegalidade da liquidação da dívida exequenda.

J) Caso existisse alguma deficiência ou má alegação por parte da Oponente, sempre deveria o tribunal “a quo” proferir despacho de convite ao aperfeiçoamento da petição a fim da aqui Recorrente concretizar os factos tendentes à demonstração da inexistência e ilegalidade da liquidação da dívida exequenda.

K) Termos em que a sentença recorrida, deve ser revogada e substituída por outra que não seja de indeferimento liminar pelos fundamentos invocados, porquanto sempre deveria a aqui Oponente ser convidada a aperfeiçoar o seu articulado.

L) A decisão recorrida ainda padece de erro de julgamento ao considerar apenas e só como causa de pedir a compensação da dívida exequenda.

M) Na verdade, o tribunal “a quo” abstraiu-se das restantes questões suscitadas, de entre as quais a matéria relativa à inexistência do imposto de IMT cobrado à data dos factos a que respeita a obrigação, bem como a respeitante à ilegalidade da liquidação da dívida exequenda.

N) De facto, entende a aqui Recorrente que antes da compensação efetuada, ainda que também ela ilegal, é inexistente na sua esfera jurídica o imposto de IMT cobrado à data dos factos, sendo também ilegal a liquidação da dívida exequenda.

O) A questão da ilegalidade da cobrança acima descrita não mereceu a apreciação do tribunal, não tendo este, consequentemente, dado resposta a todas as questões suscitadas pela ora Recorrente na oposição que esta havia deduzido, errando na interpretação dos factos e de direito apresentados pela Oponente.

P) Julgada improcedente, a supra mencionada oposição à execução, não foi assegurado à Recorrente qualquer meio de defesa contra a inexistência e ilegalidade do imposto referido, factos alegados na oposição à execução apresentada pela ora Recorrente, ao abrigo do disposto nas alíneas a) e h) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado inteiramente procedente, devendo ser revogada a sentença proferida, substituindo-a por outra que não seja de indeferimento liminar.

2 – Não foram apresentadas contra - alegações.

3 – O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu o parecer de fls. 183 a 185 dos autos, no qual conclui que não se mostrando reunido o pressuposto da tempestividade, afigura-se-nos que bem andou a Mma. Juiz “a quo” ao rejeitar liminarmente a oposição, por falta de fundamento legal e a convolação do processo não ser admissível por não estarem reunidos todos os pressupostos legais, designadamente o da tempestividade.

4 – Notificadas a recorrente da informação prestada pela Autoridade Tributária e Aduaneira a fls. 177/178 - de que não foi possível localizar o aviso de recepção pretendido e de que consta do sistema de citações e notificações (SECIN) que a notificação da compensação de dívidas em Justiça Tributária, registada com o n.º RQ206882661PT foi recebida em 2010/03/11 – bem como do parecer do Ministério Público (fls. 186, verso, e 187 dos autos), nada veio dizer.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
- Fundamentação -

5 – Questão a decidir

É a de saber se incorreu em erro de julgamento o tribunal “a quo” ao indeferir liminarmente a petição de oposição, por erro na forma do processo insusceptível de convolação em reclamação judicial, por a oponente não ter fornecido os elementos necessários à averiguação da caducidade (ou não) do direito de impugnar.
6 – Apreciando.

6.1 Do indeferimento liminar da oposição e da sua não convolação em reclamação judicial

A decisão recorrida, a fls. 122 e 123 dos autos, rejeitou liminarmente a oposição deduzida pela ora recorrente no entendimento de que não tem a Oposição por fundamento nenhum dos previstos no n.º 1 do art. 204.º do CPPT, designadamente os das alíneas a) e h) e de que o meio próprio para sindicar o acto de compensação de dívidas com créditos seria a reclamação de decisão do órgão de execução fiscal e não a oposição à execução fiscal, não sendo possível convolar a petição inicial de oposição em reclamação porquanto não se conhecendo a data em que a Oponente foi notificada da decisão que pretende sindicar, não é possível a convolação da Oposição em Reclamação das Decisões do órgão de Execução Fiscal.

Discorda do decidido a recorrente, alegando em síntese que a sentença recorrida violou (…) o disposto no artigo 535.º do C.P.C. e os princípios gerais de cooperação e colaboração das partes com o tribunal, designadamente da cooperação in casu com a Administração Tributária, no esclarecimento da verdade e que a decisão recorrida ainda padece de erro de julgamento ao considerar apenas e só como causa de pedir a compensação da dívida exequenda, abstraindo das restantes questões suscitadas, de entre as quais a matéria relativa à inexistência do imposto de IMT cobrado à data dos factos a que respeita a obrigação, bem como a respeitante à ilegalidade da liquidação da dívida exequenda, factos alegados na oposição à execução apresentada pela ora Recorrente, ao abrigo do disposto nas alíneas a) e h) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT.

Vejamos.

Embora na sua petição inicial de oposição a então oponente tenha, a final, invocado o disposto nas alíneas a) e h) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, certo é que nada do que ali invocou constitui fundamento atendível de oposição à execução fiscal, porquanto a eventual ilegalidade da liquidação adicional de IMT que está na origem da dívida exequenda não é subsumível em qualquer das citadas alíneas do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT (ou em qualquer outra), pois que em causa estará, eventualmente, uma ilegalidade da liquidação adicional efectuada, e não uma ilegalidade abstracta ou normativa (sendo apenas esta a subsumível na alínea a) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT), para a qual a lei assegura meio judicial de impugnação contra o acto de liquidação - sendo, aliás, a pendências dos prazos para a sua utilização o fundamento invocado pela oponente para sustentar a ilegalidade da compensação efectuada (cfr. os artigos 17.º e seguintes da sua p.i. de oposição, a fls. 7 e seguintes dos autos) -, razão pela qual tal fundamento não é também subsumível na alínea h) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT).

Nenhuma censura merece, pois, a decisão recorrida quando julgou que a oposição deduzida não tinha por fundamento nenhum dos previstos no n.º 1 do art. 204.º do CPPT, designadamente os das alíneas a) e h), ou, o que conduz ao mesmo resultado enquanto fundamento de rejeição liminar da oposição, que os invocados eram manifestamente improcedentes como fundamentos de oposição à execução fiscal deduzida.

E bem andou igualmente a decisão recorrida ao julgar que o meio processual adequado para sindicar a compensação efectuada pela Administração tributária antes de esgotados os prazos de reclamação graciosa ou impugnação judicial da liquidação era a reclamação judicial prevista nos artigos 276.º e seguintes do CPPT - por se tratar de acto praticado no processo de execução fiscal, excluído dos fundamentos de oposição (decisão recorrida, a fls. 122) -, sendo esse, efectivamente, o meio processual adequado para sindicar tal acto, conforme jurisprudência pacífica deste STA.
Já menos bem andou, porém, ao decidir não convolar a oposição à execução em reclamação judicial sem previamente ter indagado junto da Administração Tributária sobre a data em que o oponente teria sido notificado do acto de compensação sindicado, pois que o princípio do inquisitório a isso o obrigava e o princípio da legalidade vedava-lhe a utilização da não convolação como “sanção” pela falta de cooperação da oponente no esclarecimento da data em que tal notificação teria tido lugar, pois que não pode haver sanção que não esteja legalmente prevista e a convolação do meio processual inadequadamente utilizado no meio processual adequado constitui um dever do juiz, e não um benefício da parte.

Não obstante, veio a apurar-se já neste Supremo Tribunal – por iniciativa do Ministério Público (promoção de fls. 166, verso), ratificada pela Relatora (despacho de fls. 166, verso) -, que a ora recorrente foi notificada da compensação por carta registada recebida em 11 de Março de 2010 (cfr. ofício de fls. 177 e 178 dos autos), sendo que, em face de tal informação - de que a recorrente foi notificada por iniciativa deste STA (fls. 186, verso e 187 dos autos) e não contestou –, é lícito agora concluir que, efectivamente, não devia a oposição ter sido convolada em reclamação judicial pois ao tempo em que aquela foi deduzida (12 de Abril de 2010 – cfr. carimbo aposto na p.i. de oposição a fls. 4 dos autos), se esgotara já o prazo de que a ora recorrente dispunha para deduzir reclamação judicial do acto de compensação, cujo prazo é de 10 dias contados da notificação da decisão (cfr. o n.º 1 do artigo 277.º do CPPT).

Ora, embora em face dos termos imperativos do disposto nos artigos 97.º, n.º 3 da LGT e 98.º, n.º 4 do CPPT e por razões de economia processual, a convolação do meio processual inadequadamente utilizado no meio processual adequado constitua dever do juiz, esta já não deve ter lugar quando se traduza na prática de um acto inútil, e como tal proibido por lei, como paradigmaticamente sucede no caso de extemporaneidade do novo meio processual para o qual fosse convolada a petição.

Ora, é isso precisamente que ocorre no caso dos autos, como se acabou por apurar, razão pela qual se há-de concluir que o recurso não merece provimento, sendo de confirmar, com a presente fundamentação, o decidido.
- Decisão -

7 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso, confirmando, com a presente fundamentação, o decidido.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 4 de Dezembro de 2013. – Isabel Marques da Silva (relatora) – Pedro DelgadoCasimiro Gonçalves.