Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:09/18.8BEAVR 0775/18
Data do Acordão:01/17/2019
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:ANA PAULA PORTELA
Descritores:PRAZO
TEMPESTIVIDADE
Sumário:I - Com a entrada em vigor do DL nº 214-G/2015, de 02-10, foram introduzidas alterações ao CPTA tendo passado a constar do seu artigo 58º, nº 2 que, sem prejuízo do disposto no n.º 4 do artigo 59.º, os prazos estabelecidos no nº 1 contam-se nos termos do artigo 279.º do Código Civil.
II - E, não há porque não aplicar aos prazos de interposição de processos de intimação do art. 105º, nº 2, do CPTA a mesma lógica da natureza de prazo substantivo dos prazos de impugnação dos atos administrativos do artigo 58º do mesmo Código, sob pena de falta de coerência e harmonia do sistema, assim o impondo os elementos a ter em consideração na interpretação da lei como sejam os elementos literais, históricos, lógicos e sistemáticos.
III - E em nada tal é posto em causa por estarmos perante um processo urgente.
IV - Em suma, o prazo do art. 105º nº 2 do CC conta-se de modo contínuo, sem suspensão durante as férias judiciais, mas se o prazo terminar em férias judiciais, é prolongado para o primeiro dia útil seguinte como resulta do referido art. 279º, al. e), do CC.
Nº Convencional:JSTA000P24099
Nº do Documento:SA12019011709/18
Data de Entrada:08/09/2018
Recorrente:A............ E OUTROS
Recorrido 1:CÂMARA MUNICIPAL DE VAGOS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: I-RELATÓRIO
1. B………… e A…………, devidamente identificados nos autos, instauraram no TAF de Aveiro um processo de INTIMAÇÃO PARA PASSAGEM DE CERTIDÃO, contra o MUNICÍPIO DE VAGOS, requerendo que o Requerido seja intimado a “emitir certidão da qual conste que “o prédio sito na Av. ………, 3840-…… ……… – Gafanha da Boa Hora, registado na Conservatória do Registo Predial de Vagos sob o nº 1001 e inscrito na respetiva matriz urbana sob o artigo 456, do Distrito de Aveiro, Concelho de Vagos, freguesia da Gafanha da Boa Hora se encontra ocupado por construção anterior a 1951, em prazo não superior a dez dias, sob pena de aplicação de sanção pecuniária compulsória em caso de incumprimento, por cada dia de atraso conforme estipula o art. 108º do CPTA.”

2. O MUNICÍPIO DE VAGOS, deduziu a sua contestação, suscitando:

- A extemporaneidade da petição inicial, por os requerentes terem sido notificados, em 6.12.2017, da certidão - cujo pedido não foi integralmente satisfeito pelo requerido - por si emitida em 21 de novembro de 2017, pelo que o prazo para efetuar o presente pedido de intimação, teria terminado em 26.12.2017;

- A inexistência dos requisitos a que alude o art. 105º nº 2 do CPTA, já que o Município emitiu a certidão em conformidade com a informação de que dispunha nos seus arquivos, não tendo obtido prova de que o prédio supra identificado se encontrava ocupado por construção anterior a 1951.

- e que não se recusou à emissão da certidão solicitada, antes o fez com os elementos constantes nos arquivos municipais, não lhe incumbindo certificar informações constantes noutros organismos.

Conclui pela absolvição do pedido e, caso assim não se entenda, deve a ação ser julgada improcedente.

3. O TAF de Aveiro, por sentença proferida em 26.02.2018, julgando procedente a caducidade do direito de ação, absolveu da instância a entidade requerida.

4. Inconformados, os Requerentes interpuseram recurso para o TCAN.

5. O TCAN, por acórdão de 30.5.2018, retificado em 15.6.2018, negou provimento ao recurso, mantendo a decisão recorrida.

6. Uma vez notificados do acórdão, B………… e A………… vieram dele interpor recurso para este STA, ao abrigo do art. 150º, nº 1 CPTA.

Para tanto concluem as suas alegações da seguinte forma:

"1.ª O TRIBUNAL A QUO FAZ ERRADA INTERPRETAÇÃO DA LEI E DO DIREITO AO DECIDIR QUE QUANDO OS AQUI RECORRENTES REQUERERAM EM 02/01/2018 O PROCESSO URGENTE DE INTIMAÇÃO PARA A PRESTAÇÃO DE INFORMAÇÕES, CONSULTA DE PROCESSOS OU PASSAGEM DE CERTIDÕES NOS TERMOS E AO ABRIGO DO DISPOSTO NOS ARTIGOS 104.º E SEGUINTES DO CPTA "JÁ SE MOSTRAVA ESGOTADO O PRAZO LEGAL PARA O EFEITO.".

2.ª A QUESTÃO TRAZIDA AO ESCRUTÍNIO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO CONFIGURA QUESTÃO, CLARAMENTE ESSENCIAL PARA UMA MELHOR APLICAÇÃO DO DIREITO, TRATA-SE DE QUESTÃO RELACIONADA COM CONTAGEM DO PRAZO PARA A PROPOSITURA DE PROCESSO URGENTE, lN CASU, DE INTIMAÇÃO PARA A PRESTAÇÃO DE INFORMAÇÕES, CONSULTA DE PROCESSOS, OU PASSAGEM DE CERTIDÕES PREVISTO NOS ARTIGOS 104.º E SEGUINTES DO CPTA.

3.ª A QUESTÃO JURÍDICA TEM, INEQUIVOCAMENTE, A VIRTUALIDADE DE SE REPERCUTIR EM INÚMERAS OUTRAS SITUAÇÕES ATENTA A ESPECIAL RELEVÂNCIA JURÍDICA QUE ASSUME, ESTANDO, POIS, VERIFICADOS OS PRESSUPOSTOS PREVISTOS NO ARTIGO 150.º DO CPTA PARA A ADMISSÃO DA PRESENTE REVISTA EXCECIONAL.

4.ª UM PROCESSO DE NATUREZA URGENTE SÓ ADQUIRE ESTA NATUREZA APÓS TER SIDO INSTAURADO NO TRIBUNAL COMPETENTE PARA O DECIDIR.

5.ª SÓ A PARTIR DA INSTAURAÇÃO DO PROCESSO É QUE SE APLICAM AS REGRAS GERAIS DA CONTAGEM DOS PRAZOS, DESIGNADAMENTE DOS PRAZOS PROCESSUAIS, PORQUANTO ATÉ ESSE MOMENTO TRATA-SE DE PRAZO SUBSTANTIVO, lN CASU, DE CADUCIDADE DE DIREITO DE AÇÃO.

6.ª NO CASO SUB JUDICE ESTAMOS PERANTE PRAZO SUBSTANTIVO DE CADUCIDADE DO DIREITO DE AÇÃO, ISTO É, DE PROPOSITURA EM JUÍZO DE UM PROCESSO.

7.ª TRATANDO-SE DE PRAZO DE CADUCIDADE DO DIREITO DE AÇÃO INEQUIVOCAMENTE SE APLICAM - INDEPENDENTEMENTE DE SE TRATAR DE PROCESSO QUE IRÁ ADQUIRIR A NATUREZA DE PROCESSO URGENTE OU NÃO - QUANTO À FIXAÇÃO DO TERMO DO PRAZO, AS REGRAS ESTATUÍDAS NO ARTIGO 279.º DO CÓD. CIV., DESIGNADAMENTE, A REGRA CONSTANTE DA SUA AL. E) QUE DETERMINA QUE "O PRAZO QUE TERMINE EM DOMINGO OU DIA FERIADO TRANSFERE-SE PARA O PRIMEIRO DIA ÚTIL; AOS DOMINGOS E DIAS FERIADOS SÃO EQUIPARADAS AS FÉRIAS JUDICIAIS, SE O ATO SUJEITO A PRAZO TIVER DE SER PRATICADO EM JUÍZO.”.

8.ª O PRAZO DE 20 DIAS A QUE ALUDE O ARTIGO 105.°, N.º 2 DO CPTA PARA APRESENTAR EM JUÍZO O PROCESSO DE INTIMAÇÃO CONFIGURA PRAZO SUBSTANTIVO DE CADUCIDADE DO DIREITO DE AÇÃO, PORQUANTO, ATÉ ESSE MOMENTO INEXISTE, AINDA, PROCESSO JUDICIAL PARA QUE SE POSSA APLICAR AS REGRAS DE CONTAGEM DOS PRAZOS PROCESSUAIS.

9.ª A INTIMAÇÃO REQUERIDA PELOS RECORRENTES SÓ ADQUIRIU A NATUREZA URGENTE APÓS TER SIDO APRESENTADA EM JUÍZO EM 02/01/2018, SENDO QUE SÓ A PARTIR DESSE MOMENTO SE APLICA O DISPOSTO NO ARTIGO 36.º, N.º2 DO CPTA.

10.ª TAL ENTENDIMENTO É O QUE MELHOR SE COADUNA COM A JURISPRUDÊNCIA EXISTENTE EM MATÉRIA DE CONTAGEM DO PRAZO DE CADUCIDADE PARA A PROPOSITURA DE PROCESSOS URGENTES - CFR. O AC DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL, DATADO DE 25/07/2016, PROCESSO N.º 09820/16 E ACÓRDÃO DA RELAÇÃO DE LISBOA, DATADO DE 13/05/2015, PROCESSO N.º 2897/13.5TTLSB.L1-4.

11.ª APLICAR O N.º 4 DO ARTIGO 138.° DO CPC AO CASO SUB JUDICE, POR FORÇA DO ARTIGO 1.º DO CPTA COM A INTERPRETAÇÃO VERTIDA NO ACÓRDÃO RECORRIDO IMPLICARIA DESTRUIR A UNIDADE DO SISTEMA JURÍDICO, PORQUANTO, IRÍAMOS TER REGRAS PROCESSUAIS CLARAMENTE VIOLADORAS DAS REGRAS SUBSTANTIVAS, O QUE NÃO CORRESPONDE AO PENSAMENTO DO LEGISLADOR.

12.ª O ACÓRDÃO RECORRIDO VIOLOU OS ARTIGOS 279.°, AL. E) E 328.° E SEGUINTES DO COD. CIV., BEM COMO O Nº 4 DO ARTIGO 138.° DO CPC APLICÁVEL POR FORÇA DO ARTIGO 1° DO CPTA, BEM COMO AS REGRAS DA INTERPRETAÇÃO JURÍDICA INSERTAS NO ARTIGO 9.° DO CPTA.

13.ª ATENTA A QUESTÃO JURÍDICA SUPRA DESCRITA, RESSALTA EVIDENCIADO QUE ESTÃO VERIFICADOS OS REQUISITOS INSERTOS NO ARTIGO 150.° DO CPTA PARA A ADMISSÃO DA REVISTA PELA CLARA NECESSIDADE DE MELHOR APLICAÇÃO DO DIREITO.

Nestes termos e nos mais de Direito, deve ser admitida a presente revista e, por consequência,… o Acórdão Recorrido ser revogado e substituído por outro que decida que a Intimação requerida pelos Recorrentes é tempestiva. Assim se fazendo justiça!"

7. O Recorrido não apresentou contra-alegações.

8. Foi proferido acórdão em 22.10.2018 por este STA nos termos do art. 150° do CPTA a admitir o presente recurso de revista.

9. O MP emitiu parecer no sentido da procedência do recurso já que os prazos para formular o pedido de intimação são de natureza substantiva, por serem prazos de caducidade, pelo que seguem a regra constante da alínea e), do art. 279º do CC, sendo-lhe inaplicável o nº4, do art. 138º, do CPC, por não se tratar de um prazo de natureza processual, o qual só se aplica aos processos urgentes após a sua instauração.

10. O processo veio submetido à conferência para julgamento, com dispensa de vistos, nos termos do art. 36º, nº 2, do CPTA.


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II – FUNDAMENTAÇÃO

A 1ª instância, para decidir a verificação prévia dos pressupostos da ação, deu como assente a seguinte matéria:

1. A 17 de fevereiro de 2017 foi emitida certidão pelo Município de Vagos onde consta a declaração que " ... o prédio sido na Av.ª ……… - ……… - Gafanha da Boa Hora, inscrito na matriz urbana sob o n.º 456, Vagos, [...] se encontra em zona que tem as características para se poder considerar uma zona urbana consolidada ..."; (Facto Confessado - artigo 1.º do DOC 1 junto à «Pl» - e provado por documento a fls. 1 e segs. dos autos - paginação eletrónica)

2. Em 4 de outubro de 2017 é subscrito documento pela autora requerendo passagem certidão ao Município, pelo facto da anterior certidão apenas ter parcialmente satisfeito a sua pretensão, ali constando:

“1. Em 17.02.2017 foi emitida por esta edilidade certidão com a Refª 2017,3,S,C,150 onde foi certificado designadamente que o prédio sito na Av.ª ………, 3840-…… ……… – Gafanha da Boa Hora, registado na Conservatória do Registo Predial de Vagos sob o nº 1001 e inscrito na respetiva matriz urbana sob o artigo 456, do Distrito de Aveiro, Concelho de Vagos, freguesia da Gafanha da Boa Hora se encontra em zona que “(…) tem as características para se poder considerar uma zona urbana consolidada”.

2. No entanto, faltou certificar que o prédio supra identificado se encontra ocupado por construção anterior a 7 de agosto de 1951”.

(Facto Provado por documento, constante em DOC 1, junto à «PI»)

3. Em 21 de novembro de 2017 é emitida certidão pelo Município de Vagos onde consta em particular:

“----- …………, Coordenador Técnico da Câmara Municipal do Concelho de Vagos ---------------------------

----- CERTIFICO, a requerimento de …………… – Advogada, residente na ………, advogada, com escritório sito na Rua ………, n.º ……, …… em Coimbra, entrado nesta Câmara Municipal em 09 de outubro de 2017 e registado sob o número 2912/17 e em cumprimento do despacho exarado no mesmo requerimento que, relativamente ao prédio sito na Av.ª ………, na ………, freguesia de Gafanha da Boa Hora, concelho de Vagos, registado na Conservatória do Registo Predial de Vagos, sob o n.º 1001 e inscrito na respetiva matriz urbana sob o artigo 456, da freguesia de Gafanha da Boa Hora, através dos elementos existentes nos arquivos municipais, não é possível certificar que a data da construção é anterior a 1951.-------------------------------------

----- Por ser verdade mandei passar a presente certidão que vou assinar e faço autenticar com o selo branco em uso nesta Secretaria. -----------------------

Vagos, 21 de novembro de 2017 …”

(Facto Provado por documento, a fls. 1 e segs. dos autos - paginação eletrónica)

4. Em 2 de janeiro de 2018 os requerentes intentam o processo de intimação n.º 9/2018.8BELRA no TAF-Aveiro; (Facto Provado por documento, a fls. 1 e segs. dos autos - paginação eletrónica)


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Ao abrigo do disposto no artigo 662.º do CPC a 2ª instância aditou a seguinte matéria de facto a incluir entre os pontos 3. e 4.:

3.1. A certidão referida no ponto 3. emitida em 21 de novembro de 2017 foi notificada ao Requerente em 6 de dezembro de 2017 - (Facto Provado por acordo).

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O DIREITO

Como se considerou no Acórdão deste STA que admitiu o recurso de revista a questão a decidir nestes autos é a de saber se o prazo referido no art. 105º, nº 2, do CPTA é um prazo sujeito ao regime do art. 36º, nº 1, al. d) e 2, do CPTA (prazos processuais, que nos processos urgentes, correm durante as férias judiciais), ou sujeito ao regime do art. 279º, al. e), do CC.

As instâncias entenderam que o art. 36º, n.ºs 1, al. d) e 2 do CPTA se aplica ao prazo a que alude o art. 105º, n.º 2 do CPTA, por este ser um processo urgente, pelo que corre e termina em férias, não se transferindo para o primeiro dia após as mesmas.

Extrai-se, assim, da decisão recorrida que:

“Como já se viu, o meio de intimação urgente em causa - destinado a permitir aos interessados a obtenção de prestações materializadas em informações, certidões ou no acesso a documentos, seja pela via do direito a informação procedimental ou do direito de acesso aos arquivos e registos administrativos em todas as suas modalidades - deve ser requerido ao tribunal competente, no prazo de 20 dias, que se inicia com a verificação das seguintes circunstâncias: a) decurso do prazo legalmente estabelecido, sem que a entidade requerida satisfaça a pretensão; (b) indeferimento do pedido; (c) satisfação parcial do pedido - cfr. n.º 2 do artigo 105.º e 104.º do CPTA.

Ora, no caso de indeferimento da prestação requerida, o prazo de 20 dias para instauração do processo de intimação conta-se desde a respetiva notificação - cfr. entre outros, Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2017, Almedina.

E corre em férias judiciais e em contínuo - cfr. artigo 138° do CPC, aplicável supletivamente, com as necessárias adaptações, por remissão do artigo 1.º do CPTA, o qual se reporta especificamente a processos que a lei considere urgentes - vide, entre outros, o Acórdão do TCAS de 30/4/2015 no proc.11869/15.

Nos termos dos n.ºs 2 e 3 do artigo 138.º do CPC se o prazo em causa terminar em dias em que os tribunais estejam encerrados (fim de semana, dia de feriado ou de tolerância de ponto) transfere-se para o 1º dia útil seguinte.

Já o mesmo não sucedendo nos períodos das férias judiciais legalmente previstos, diversamente do que sustentam os Recorrentes, uma vez que os tribunais não encerram as suas portas, continuando a prestar serviço em processos de natureza urgente e a realizar atos urgentes - cfr. artigo 36.º do CPTA e n.ºs 2 e 3 do artigo 138.º do CPC.

Estas regras, por força do n.º 4 do artigo 138.º e artigo 1.º do CPTA, aplicam-se também aos prazos de propositura de ações, salvo, naturalmente, estipulação em contrário.

Pelo exposto, as férias judiciais não constituem "encerramento dos tribunais", para efeitos da transferência do prazo em questão, prevista no artigo 138°, n° 2, aplicável por remissão do artigo 1.º do CPTA.

Assim, tendo os Recorrentes sido notificados da certidão em causa - no sentido de não ser possível certificar "através dos elementos disponíveis nos arquivos municipais" que a construção do prédio urbano em causa, nele identificado, é anterior a 7 de agosto de 1951 - que consideram equivaler a indeferimento da sua pretensão, em 6.12.2017, o prazo de 20 dias para requerer a presente Intimação (iniciado em 07.12.2017- cfr. aI. b) do artigo 279.º do CC) terminou em 26.12.2017 (terça-feira).

Em 26.12.2017 o Governo concedeu tolerância de ponto aos trabalhadores que exercem funções públicas- cfr. Despacho n.º 11071/2017 in DR n.º 242/2017, Série II de 19.12.2017.

Por conseguinte, e de acordo com o disposto no n.º 3 do artigo 138.º do CPC, o termo do prazo para os Recorrentes requererem a presente Intimação transferiu-se para o 1º dia útil seguinte (27.12.2017 - quarta-feira).

Do que se conclui que em 02.02.2018, data em que os Recorrentes intentaram o processo de intimação no TAF-Aveiro, já se mostrava esgotado o prazo legal para o efeito.

Conclui-se, assim, na decisão recorrida que na data da propositura desta intimação já havia decorrido o prazo de 20 dias previsto no art. 105º, nº 2, do CPTA.

Entendem os recorrentes que o facto de se tratar de processo urgente não afasta o facto de estarmos perante um prazo de caducidade e, por isso, de natureza substantiva ao qual é aplicável a alínea e) do art. 279º do CC segundo a qual “aos domingos e feriados são equiparados as férias judiciais se o ato sujeito a prazo tiver de ser praticado em juízo” e não o art. 138º, nº 4, do CPC.

A primeira questão a abordar é, pois, a da natureza deste prazo de 20 dias a que alude o art. 105º, nº 2, do CPTA, se processual se substantiva.

E quais as consequências a retirar pelo facto de se tratar de um processo urgente.

Desde logo estamos perante um prazo que diz respeito à propositura em tribunal de um pedido de intimação o que só por si indicia que estamos perante um prazo de caducidade e, por isso, de natureza substantiva, estando, assim, sujeito à regra do art. 279º do CC.

Contudo, o art. 58º do CPTA na versão anterior ao DL nº 214-G/2015, de 02-10, dispunha que:

“1 - A impugnação de atos nulos ou inexistentes não está sujeita a prazo.

2 - Salvo disposição em contrário, a impugnação de atos anuláveis tem lugar no prazo de:

a) Um ano, se promovida pelo Ministério Público;

b) Três meses, nos restantes casos.

3 - A contagem dos prazos referidos no número anterior obedece ao regime aplicável aos prazos para a propositura de ações que se encontram previstos no Código de Processo Civil. 4-...”

Ou seja, determinava que era aplicável o art. 144º do CPC, depois alterado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, de cujo art. 138º resulta que:

“Regra da continuidade dos prazos

1 - O prazo processual, estabelecido por lei ou fixado por despacho do juiz, é contínuo, suspendendo-se, no entanto, durante as férias judiciais, salvo se a sua duração for igual ou superior a seis meses ou se tratar de atos a praticar em processos que a lei considere urgentes.

2 - Quando o prazo para a prática do ato processual terminar em dia em que os tribunais estiverem encerrados, transfere-se o seu termo para o 1.º dia útil seguinte.

3 - Para efeitos do disposto no número anterior, consideram-se encerrados os tribunais quando for concedida tolerância de ponto. 4 - Os prazos para a propositura de ações previstos neste Código seguem o regime dos números anteriores.”

Ou seja, determinava-se a aplicação de um prazo processual mesmo quando estivesse em causa a propositura de ação não obstante relativamente aos processos urgentes se determinasse que não se suspendia nas férias.

E que levaria ao entendimento seguido na decisão recorrida.

Contudo, com a entrada em vigor do DL nº 214-G/2015, de 02-10 foram introduzidas alterações ao CPTA tendo o artigo 58º, nº 2, passado a assumir a em toda a sua dimensão a natureza substantiva do prazo de impugnação dos atos administrativos, natureza essa que é válida também para a qualificação do prazo do art. 105º, nº 2, do CPTA para a intimação para passagem de certidão.

Como se extrai do mesmo:

“1 - Salvo disposição legal em contrário, a impugnação de atos nulos não está sujeita a prazo e a de atos anuláveis tem lugar no prazo de: (...)

2 - Sem prejuízo do disposto no n.º 4 do artigo 59.º, os prazos estabelecidos no número anterior contam-se nos termos do artigo 279.º do Código Civil. 3 –(...).”

Podemos, assim, concluir que estamos perante um prazo de natureza substantiva com o que não interfere o facto de o processo ser urgente ou não.

É que, não há porque não aplicar aos prazos de interposição de processos de intimação do art. 105º, nº 2, do CPTA a mesma lógica da natureza de prazo substantivo dos prazos de impugnação dos atos administrativos do artigo 58º do mesmo Código, sob pena de falta de coerência e harmonia do sistema.

Assim o impõe os elementos a ter em consideração na interpretação da lei como sejam os elementos literais, históricos, lógicos e sistemáticos.

E em nada tal é posto em causa por estarmos perante um processo urgente.

A urgência a que se reporta o artigo 36º do CPTA e nomeadamente o nº 2 que dispõe “2 - Os processos urgentes e respetivos incidentes correm em férias, com dispensa de vistos prévios, mesmo em fase de recurso jurisdicional, e os atos da secretaria são praticados no próprio dia, com precedência sobre quaisquer outros” diz respeito à tramitação do processo em juízo não interferindo com a forma de contagem do prazo para interposição da intimação.

E, a este prazo é única e exclusivamente aplicável, como vimos, a regra do art. 58º do CPTA que remete para o art. 279º do CC, nos termos do qual:

“À fixação do termo são aplicáveis, em caso de dúvida, as seguintes regras:

a) Se o termo se referir ao princípio, meio ou fim do mês, entende-se como tal, respetivamente, o primeiro dia, o dia 15 e o último dia do mês; se for fixado no princípio, meio ou fim do ano, entende-se, respetivamente, o primeiro dia do ano, o dia 30 de junho e o dia 31 de dezembro;

b) Na contagem de qualquer prazo não se inclui o dia, nem a hora, se o prazo for de horas, em que ocorrer o evento a partir do qual o prazo começa a correr;

c) O prazo fixado em semanas, meses ou anos, a contar de certa data, termina às 24 horas do dia que corresponda, dentro da última semana, mês ou ano, a essa data; mas, se no último mês não existir dia correspondente, o prazo finda no último dia desse mês;

d) É havido, respetivamente, como prazo de uma ou duas semanas o designado por oito ou quinze dias, sendo havido como prazo de um ou dois dias o designado por 24 ou 48 horas;

e) O prazo que termine em domingo ou dia feriado transfere-se para o primeiro dia útil; aos domingos e dias feriados são equiparadas as férias judiciais, se o ato sujeito a prazo tiver de ser praticado em juízo.”

Sendo assim os prazos contam-se de modo contínuo, sem suspensão durante as férias judiciais, mas se o prazo terminar em férias judiciais, é prolongado para o primeiro dia útil seguinte já que, como resulta do referido art. 279º, al. e), do CC "aos domingos e feriados são equiparados as férias judiciais se o ato sujeito a prazo tiver de ser praticado em juízo".

Tendo os recorrentes recebido a certidão pedida em 21-11-2017, em 06-12-2017, o prazo de 20 dias para requerer a intimação terminava a 26-12-2017, portanto, no decurso do período de férias judiciais de Natal.

Nos termos supra referidos o referido prazo transmitiu-se para o primeiro dia útil após férias, ou seja, para o dia 04-01-2018.

Pelo que, a presente intimação ao ter dado entrada no TAF de Aveiro em 03-01-2018 foi tempestiva.

Sendo assim procede o recurso.

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Em face de todo o exposto acordam os juízes deste STA em:

a) julgar procedente o presente recurso de revista, com a consequente revogação do acórdão recorrido,

b) determinar a remessa dos autos à 1ª instância para aí prosseguirem os seus termos.

Sem custas.

N.

Lisboa, 17 de Janeiro de 2019. – Ana Paula Soares Leite Martins Portela (relatora) – Jorge Artur Madeira dos Santos - Carlos Luís Medeiros de Carvalho.