Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0227/18.9BECTB
Data do Acordão:12/16/2021
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:TERESA DE SOUSA
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
REVISTA
PROGRAMA
PRESCRIÇÃO
Sumário:Não é de admitir revista se o acórdão recorrido apreciou de forma detalhada e fundamentada a alegação da Recorrente quanto à aplicação de um outro regime de prescrição, que não o do Regulamento (CE EURATOM) nº 2988/95, do Conselho, de 18.12, afastando aquele a aplicação do Regulamento (CE) nº 796/2004 “por não estar em causa um ajuda direta”, sendo certo que no presente recurso a Recorrente em nada contraria os fundamentos do acórdão recorrido, limitando-se a reafirmar a sua tese.
Nº Convencional:JSTA000P28717
Nº do Documento:SA1202112160227/18
Data de Entrada:11/23/2021
Recorrente:SOCIEDADE AGRO-PECUÁRIA A…………., LDA
Recorrido 1:IFAP - INSTITUTO DE FINANCIAMENTO DA AGRICULTURA
E PESCAS, IP
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar


Acordam no Supremo Tribunal Administrativo


1. Relatório

Sociedade Agro-Pecuária A………….., Lda intentou no TAF de Castelo Branco acção administrativa de impugnação de acto administrativo contra o Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas, IP [IFAP], visando a declaração de nulidade ou a anulação da decisão proferida que exige à A. a reposição da quantia de €32.000,00, que foi concedida no âmbito da Acção “Instalação de Jovens Agricultores”, do Programa de Desenvolvimento Rural do Continente (PRODER).

O TAF de Castelo Branco por sentença de 25.06.2020 julgou a acção improcedente.

A Autora interpôs recurso desta decisão e, por acórdão de 07.07.2021, o TCA Sul considerou ser de manter a sentença de 1ª instância (bem como o despacho saneador de 29.01.2020), negando provimento ao recurso.

A Autora interpõe a presente revista deste acórdão, nos termos do art. 150º do CPTA, com fundamento na necessidade de uma melhor aplicação do direito.

Em contra-alegações o IFAP defende que a revista não deve ser admitida, ou que, caso assim não se entenda, deverá improceder.

2. Os Factos
Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. O Direito
O art. 150º, nº 1 do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo “quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de uma importância fundamental” ou “quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”.
Como resulta do próprio texto legal, e a jurisprudência deste STA tem repetidamente sublinhado, trata-se de um recurso excepcional, como, aliás, o legislador sublinhou na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando o preceito como uma “válvula de segurança do sistema”, que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.

A Autora propôs a presente acção administrativa contra o IFAP, visando a declaração de nulidade ou a anulação da decisão tomada pelo Presidente do Conselho Directivo do Réu que considerou indevido o pagamento de ajudas e, da consequente decisão de determinar que aquela procedesse à reposição da quantia de €32.000,00, que lhe foi concedida no âmbito da Acção “Instalação de Jovens Agricultores”.

Como já se disse o TAF julgou improcedente a acção, considerando, além do mais, que não ocorrera a prescrição, face ao regime aplicável à presente situação.

No recurso que interpôs para o TCA Sul a aqui Recorrente imputou à sentença (no que aqui interessa) erro na apreciação de direito, quanto à prescrição do direito ao reembolso das quantias recebidas pela mesma invocando a aplicação do Regulamento (CE) nº 1698/2005, do Conselho, de 20.09 e do Regulamento (CE) nº 796/2004 da Comissão, de 21.04 – art. 73º, nº 6 -, em detrimento do Regulamento (CE EURATOM) nº 2988/95, do Conselho, de 18.12, como entendido na sentença recorrida.
O acórdão recorrido, tendo em conta esta alegação, delimitou a questão objecto do recurso como, exclusivamente, a de analisar se a sentença de 1ª instância, incorrera em erro de julgamento quanto ao regime da prescrição aplicável à presente acção, relativa à “Instalação de Jovens Agricultores”, integrada no Programa de Desenvolvimento Rural do Continente, (PRODER).
Apreciou o invocado erro de julgamento nos seguintes termos: “A candidatura aprovada e o consequente contrato celebrado entre as partes respeita à Ação “Instalação de Jovens Agricultores”, do Programa de Desenvolvimento Rural do Continente, (PRODER), sendo esta Ação regulada pelo Regulamento (CE) n.º 1698/2005, de 20/09 e a nível nacional, pela Portaria n.º 357-A/2008, de 09/05.
Em caso de incumprimento ou de qualquer irregularidade detetada, nomeadamente no âmbito dos controlos realizados, prescreve o artigo 15.º da Portaria n.º 357-A/2008, de 09/05, que são aplicáveis as reduções e as exclusões previstas no Regulamento (CE) n.º 1975/2006, da Comissão, de 07/12.
Compulsado o Regulamento (CE) n.º 1975/2006, da Comissão, de 07/12, decorre do seu artigo 1.º, quanto ao seu âmbito de aplicação que o presente regulamento estabelece as regras de execução relativas aos procedimentos de controlo e à condicionalidade no que respeita às medidas cofinanciadas de apoio ao desenvolvimento rural, adotados ao abrigo do Regulamento (CE) n.º 1698/2005, de 20/09.
Por isso, ao contrário do defendido pela Recorrente, não tem aplicação a disciplina prevista no Regulamento (CE) n.º 796/2004, de 21/04, por não estar em causa uma ajuda direta, além de este Regulamento estabelecer regras de execução relativas à condicionalidade, à modulação e ao sistema integrado de gestão e de controlo (sistema integrado), estabelecido no Título II do Regulamento (CE) n.º 1782/2003, que não é aquele a que respeita a Ação e o respetivo contrato outorgado, regulados pelo Regulamento (CE) n.º 1698/2005, de 20/09.
Não disciplinando tais normativos quaisquer regras de prescrição e considerando a natureza da verba a restituir, sendo as condições e regras específicas aplicáveis ao financiamento das despesas do FEADER reguladas no Regulamento (CE) n.º 1290/2005, em matéria de prescrição tem aplicação o Regulamento (CE, Euratom) n.º 2988/95, do Conselho, de 18/12.
Donde, relevar a aplicação do disposto no Regulamento (CE, Euratom) n.º 2988/95, do Conselho, que estabelece disposições para lutar “contra a fraude lesiva dos interesses financeiros das Comunidades Europeias” e que, entre outras, regula a matéria da prescrição relativa a irregularidades no âmbito das ajudas comunitárias.”
(…)
Extrai-se do teor da alínea C) do julgamento da matéria de facto, de entre o mais aí constante que, nos termos do contrato assinado entre as partes, foi fixada a execução material da operação como tendo o seu início em 31/07/2009 e o seu fim em 31/07/2014, sendo que o termo da operação ocorreria em 05/04/2015 e como condicionantes foram fixadas o cumprimento do plano de formação e do plano empresarial até ao último pedido de pagamento, tendo a Autora assumido o compromisso de cumprir o plano empresarial aprovado e a adquirir, no prazo de 36 meses, a aptidão e competência profissional adequada, assim como a formação complementar de interesse relevante para o exercício das atividades de exploração agrícola e a manter os requisitos de concessão do apoio e as condicionantes estabelecidas.
(…)
Tendo o contrato sido outorgado em 17/05/2010, até 17/05/2013 não poderia ser verificado um incumprimento do plano de formação, por a Autora dispor desse período de 36 meses para obter a formação exigida destinada á aptidão profissional adequada, assim como para obter a formação complementar relevante.
Decorrido o período de 36 meses sem a Autora comprovar a condicionante estabelecida quanto ao cumprimento do plano de formação, inicia-se o cometimento da irregularidade.
Sendo a irregularidade continuada, por perdurar durante todo o período de execução da Ação, a mesma apenas pode ser aferida a partir de 17/05/2013, data a partir da qual se inicia a contagem do prazo de prescrição de 4 anos, nos termos do artigo 3.º, n.º 1 do Regulamento (CE, Euratom) n.º 2988/95, do Conselho.
No presente caso, a interrupção da contagem da prescrição logrou ocorrer em 14/04/2014, ao realizar-se a ação de fiscalização e ao serem detetadas irregularidades, assim como em 10/03/2016, ao ser exigido à Autora o envio do comprovativo do certificado de formação ou, em 14/04/2016, aquando a visita ao local e a constatação do incumprimento do plano de formação ou, seguramente, em 03/04/2017 quando a Autora foi novamente notificada para juntar o comprovativo do certificado de formação em falta, sob pena de remessa do processo para decisão final (vide alíneas G), E) e N) do julgamento da matéria de facto.
Em qualquer das citadas datas, não havia ainda decorrido o prazo de prescrição de 4 anos, contados da data em poderia ser aferido o incumprimento contratual em relação ao plano de formação, em 17/05/2013.
Iniciada a contagem de novo prazo de prescrição, na data em que a Autora foi notificada da decisão final, em 07/03/2018, não havia decorrido o dobro do prazo de prescrição.
Assim, (…), não tem fundamento provimento o fundamento do recurso, quanto ao regime normativo aplicável e quanto à questão da prescrição, porque não só não tem aplicação o regime invocado pela Recorrente, como não se verifica a prescrição.

Na presente revista a Recorrente reafirma o antes alegado na apelação no sentido de que, em matéria de prescrição, seria de aplicar o disposto no art. 73º do Regulamento nº 796/2004, de 21.04 que é aplicável às situações reguladas no Regulamento nº 1698/2005, de 20.09, e não o Regulamento (CE EURATOM) nº 2988/95, do Conselho, de 18.12, como entendeu o acórdão recorrido, em erro de julgamento, em seu entender.
Diremos, desde já que a Recorrente não convence nos erros que imputa ao acórdão recorrido.
Com efeito, o acórdão recorrido apreciou de forma detalhada e fundamentada a alegação da Recorrente quanto à aplicação de um outro regime de prescrição, afastando a aplicação do Regulamento (CE) nº 796/2004 “por não estar em causa um ajuda direta”, além dos restantes fundamentos acima transcritos. Ora, na presente revista a Recorrente em nada contraria os fundamentos do acórdão recorrido, limitando-se a reafirmar a sua tese.
Assim sendo, e porque o acórdão recorrido parece estar correctamente fundamentado, através de um discurso convincente, coerente e plausível, a revista agora interposta não deve ser admitida, por não estar em causa questão de particular relevância jurídica, nem se vislumbrar que seja necessária a intervenção deste STA, com vista a uma melhor aplicação do direito, não se justificando postergar a regra da excepcionalidade da revista.

4. Decisão
Face ao exposto, acordam em não admitir a revista.
Custas pela Recorrente.

Lisboa, 16 de Dezembro de 2021. – Teresa de Sousa (relatora) – Carlos Carvalho – José Veloso.