Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02587/17.0BESLB 0806/18
Data do Acordão:09/21/2018
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SÃO PEDRO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
ASILO
PROTECÇÃO INTERNACIONAL
Sumário:Não é de admitir recurso de revista de decisão fundamentada e juridicamente plausível cuja relevância se esgota no caso concreto.
Nº Convencional:JSTA000P23638
Nº do Documento:SA12018092102587/17
Data de Entrada:09/03/2018
Recorrente:A...
Recorrido 1:SERVIÇO DE ESTRANGEIROS E FRONTEIRAS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar – art. 150º, 1, do CPTA.

Acordam no Supremo Tribunal Administrativo (art. 150º, 1 do CPTA)

1. Relatório

1.1. A…………….., por si e em representação dos seus filhos, recorreu, nos termos do art. 150º, 1, do CPTA, para este Supremo Tribunal Administrativo do acórdão do TCA Sul, proferido em 14-6-2018, que confirmou a sentença proferida pelo TAC de Lisboa, que por seu turno julgou improcedente a ACÇÃO (PREVISTA NO ART. 25º DA Lei n.º 27/2008, de 30/6) pedindo a anulação do despacho do Director Nacional do SEF que indeferiu o pedido de protecção internacional e a condenação da entidade demandada a admitir aquele pedido.

1.2. Considera estar em causa a apreciação de uma questão que pela sua relevância jurídica ou social se reveste de importância fundamental e ainda que a admissão do recurso é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, muito embora não concretize os fundamentos de tais conclusões.

1.3. A entidade recorrida não contra-alegou.

2. Matéria de facto

Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. Matéria de Direito

3.1. O artigo 150.º, n.º 1, do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». Como decorre do próprio texto legal e a jurisprudência deste STA, tem repetidamente sublinhado trata-se de um recurso excepcional, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando-o como uma «válvula de segurança do sistema», que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.

3.2. O TCA Sul apreciou duas questões: (i) ilegalidade do despacho que indeferiu a produção de prova (depoimento de parte) relativamente aos seguintes factos: “a família da parte do marido da autora, que vive na República dos Camarões, mas que vai frequentemente a Marrocos, quer forçar a conversão dos seus filhos ao islamismo, o que implica a prática de violência física de mutilação genital à sua filha; (ii) erro de direito quanto aos requisitos do art. 7º, 2, b) da Lei do Asilo.

Relativamente à primeira questão o TCA Sul manteve a decisão da 1ª instância, que por seu turno entendeu que a matéria alegada, com interesse para a decisão a proferir, não carecia da prova requerida”.

Relativamente à segunda questão entendeu o TCA Sul que o recurso nada de novo trazia contra a sentença, sendo manifestamente acertado o que foi decidido na 1ª instância, uma vez que nenhum dos factos provados permite concluir que os autores (mãe e filhos) estão numa das situações previstas no citado art. 7º da Lei do Asilo.

3.3. A sentença apreciou a questão – agora posta em destaque – do perigo de mutilação genital feminina, considerando não ser credível “… que os pais do seu marido tenham autoridade de islamizar os seus filhos e de, em consequência a sua filha ser vítima de mutilação genital, quando apenas se deslocam a Marrocos “de vez em quando” e quando segundo informações oficiais recolhidas sobre o país da sua nacionalidade, essa prática tem uma taxa de prevalência de 1,4% em todo o país de 20% nas comunidades mais afectadas e que coincidem com as áreas rurais, uma vez que nos centros urbanos de Douala e Yaounde a taxa de prevalência é inferior a 1%. Acresce que, em 2016 foi promulgada uma lei que pune criminalmente a mutilação genital; verifica-se, ainda que esta prática não tem tido o apoio da sociedade camaroesa e o governo estabeleceu um plano de acção nacional para a combater”.

Tendo em conta as razões invocadas na sentença é evidente que o indeferimento do depoimento de parte – relativamente ao perigo da mutilação genital feminina - não justifica a admissão do recurso de revista. A sentença apreciou a existência desse perigo em função dos dados estatísticos e legais a que teve acesso, admitindo os factos instrumentais concretamente alegados pela requerente – a família do seu marido pretende islamizar a sua filha.

Deste modo o presente processo foi decidido por razões específicas, não sendo previsível a sua generalização. Nestas condições as questões dos autos não se revestem de importância fundamental.

Por outro lado as decisões da primeira instância e do TCA Sul, ambas no mesmo sentido, mostram-se fundamentadas e são juridicamente plausível, sem evidenciar erro manifesto ou grosseiro a justificar, só por si, a intervenção deste STA com vista a uma melhor aplicação do direito.

4. Decisão

Face ao exposto não se admite a revista.

Sem custas.

Porto, 21 de Setembro de 2018. – São Pedro (relator) – Costa Reis – Madeira dos Santos.