Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01296/21.0BEPRT
Data do Acordão:06/09/2022
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:MARIA DO CÉU NEVES
Descritores:CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL
DOCUMENTOS
HABILITAÇÃO
APRESENTAÇÃO DAS PROPOSTAS
Sumário:
Nº Convencional:JSTA00071493
Nº do Documento:SA12022060901296/21
Data de Entrada:05/10/2022
Recorrente:A............, SA.
Recorrido 1:MUNICÍPIO DE SANTA MARIA DA FEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Legislação Nacional:CCP ART 57º, Nº1, AL.C), ART 70º, Nº2, AL.A), ART 146º, ALS. D) E O)
Aditamento:
Texto Integral: ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO

1. RELATÓRIO
A............, SA., devidamente identificada nos autos, intentou no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto (TAF), acção administrativa de contencioso pré-contratual, contra o MUNICÍPIO DE SANTA MARIA DA FEIRA, indicando como contra-interessada B............, S.A., peticionando:
«(…) a procedência da acção por provada e, em consequência:
a) Ser anulado o acto administrativo de exclusão da proposta da A.;
b) Ser anulado o acto administrativo de adjudicação; e
c) Ser condenado o Réu a ordenar a proposta da A. em 1º lugar e a adjudicar-lhe a empreitada da obra da “Piscina Municipal de Canedo” – Santa Maria da Feira».
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Por sentença do TAF do Porto, proferida em 05 de Novembro de 2021, foi a acção julgada totalmente improcedente, e em consequência, absolvidas a entidade demandada e a contra interessada dos pedidos formulados pela requerente.
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A autora apelou para o TCA Norte e este, por acórdão proferido a 11 de Fevereiro de 2022, negou provimento ao recurso.
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A autora A............, SA. interpôs recurso de revista, tendo na respectiva alegação, formulado as seguintes conclusões:
«1ª) A alegação, constante do acórdão recorrido, de que a recorrente não indicou a identidade de qualquer concreto subcontratado, nem os preços parciais dos trabalhos que tal terceiro se proporia executar é matéria nova, pelo que, encontrando-se o processo já delimitado quanto ao âmbito do conhecimento do recurso e ao ónus de impugnação, não pode o Tribunal suscitar qualquer outra pretensa ilegalidade.
) Nem o artigo 60º nº 4 do CCP, nem o artigo 11º, nº 1 alínea j) do Programa do Procedimento, exigem que se junte à proposta os alvarás ou as declarações de compromisso dos subcontratados que detenham as habilitações que faltam aos concorrentes, mas apenas a Declaração contendo os preços parciais dos trabalhos.
) A A. cumpriu com esta exigência (ponto 8 dos factos provados).
) Em 7.1) do Anúncio de Procedimento nº 10263/2020, os documentos em causa estão expressamente designados como documentos de habilitação.
) As declarações através das quais os subcontratados se comprometam, incondicionalmente, a executar os trabalhos correspondentes às habilitações delas constantes, apenas deverão ser juntas pelo adjudicatário em fase de habilitação (artigo 81º nº 2 do CCP).
) O que vem sendo dito por alguma doutrina e jurisprudência é que o momento em que os concorrentes devem ser titulares dos alvarás válidos para a execução das prestações contratuais é o da apresentação da proposta, mas tal não significa que tais alvarás devam, legalmente, ser juntos com as respectivas propostas.
) Daí que, nunca a proposta da A. deveria ter sido excluída (1º acto administrativo impugnado), nem, por isso, adjudicada a empreitada da obra da “Piscina Municipal de Canedo” – Santa Maria da Feira à empresa “B............, S.A.” (2º acto administrativo impugnado), devendo a proposta da A. ser ordenada em 1º lugar, sendo-lhe adjudicada a empreitada.
) Os actos administrativos impugnados são, assim, anuláveis por vício de violação de lei.
) Os vícios imputados aos referidos atos transmitem-se ao contrato (consequente daqueles), sendo, por isso, anulável o contrato de empreitada.
10ª) A decisão recorrida viola, por isso, claramente, as normas dos artigos 57º, nº 1, alínea c), 60º nº 4, 70º nº 2 alínea a), 81º nº 2 e 146º nº 2 alínea d) todas do Código dos Contratos Públicos, bem como o artigo 3º da Portaria nº 372/17».
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O recorrido Município de Santa Maria da Feira contra-alegou, sem formular conclusões, no sentido da manutenção do julgado acórdão recorrido.
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O recurso de revista foi admitido por acórdão deste STA [formação a que alude o nº 6 do artº 150º do CPTA], proferido em 21 de Abril de 2022.
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O Ministério Público, notificado nos termos e para os efeitos do disposto nos artºs 146º, nº 1 e 147º do CPTA, não emitiu pronúncia.
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Sem vistos por não serem devidos.
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2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. MATÉRIA DE FACTO
A matéria de facto assente nos autos, é a seguinte:
«1) A Entidade Demandada fez publicar no Diário da República, 2ª Série, de 16 de setembro de 2020, o Anúncio de Procedimento nº 10263/2020, com vista à publicitação de um concurso público para a celebração de um contrato de empreitada de obras públicas com vista à construção da Piscina Municipal de Canedo, na União das Freguesias de Canedo, Vale e Vila Maior, do concelho de Santa Maria de Feira, sendo o valor do preço base do procedimento de 3.753.562,71€, o prazo de execução do contrato de 730 dias e o critério de adjudicação a melhor relação qualidade-preço (cfr. doc. nº 1 junto com a p.i.).
2) No referido anúncio quanto aos documentos de habilitação foi estabelecida a cláusula “7 – DOCUMENTOS DE HABILITAÇÃO 7.1 – Habilitação para o exercício da atividade profissional Sim Tipo: Alvará de empreiteiro de obras públicas Descrição: i) A classificação na 1.ª subcategoria da 1.ª categoria em classe que cubra o valor global da proposta; ii) A classificação na 2.ª, 3.ª, 4.ª, 5.ª, 6.ª, 7.ª e 8.ª subcategoria da 1.ª categoria em classe que cubra o valor dos trabalhos que lhe digam respeito; iii) A classificação na 1.ª, 8.ª e 9.ª subcategoria da 2.ª categoria em classe que cubra o valor dos trabalhos que lhe digam respeito; iv) A classificação na 5.ª, 9.ª, 10.ª, 12.ª, 14.ª e 18.ª subcategoria da 4.ª categoria em classe que cubra o valor dos trabalhos que lhe digam respeito; v) A classificação na 2.ª subcategoria da 5.ª categoria em classe que cubra o valor dos trabalhos que lhe digam respeito”.
3) O artigo 11º nº 1 alíneas a) a l) do Programa do Procedimento refere o seguinte (cfr. doc. nº 2): “A proposta é a declaração pela qual o concorrente manifesta à entidade adjudicante a sua vontade de contratar (art.º 56º do CCP), devendo a sua elaboração obedecer ao disposto nos números 4 e 5 do artigo 57º e no artigo 58º do Código dos Contratos Públicos e ser constituída pelos seguintes documentos, devidamente assinados com assinatura eletrónica, nos termos da Lei 96/2015 de 17 de agosto:
a) Declaração do concorrente de aceitação do conteúdo do caderno de encargos, elaborado em conformidade com o modelo constante do Anexo I. A declaração deve ser assinada pelo concorrente ou por representante que tenha poderes para o obrigar;
b) Documentos que, em função do objeto do contrato a celebrar e dos aspetos da sua execução submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, contenham os atributos da proposta, de acordo com os quais o concorrente se dispõe a contratar;
c) Documentos exigidos pelo Programa do Procedimento que contenham os termos ou condições, relativos a aspetos de execução do contrato não submetido à concorrência pelo caderno de encargos, aos quais a Entidade adjudicante pretende que o concorrente se vincule;
d) Documentos que contenham os esclarecimentos justificativos da apresentação de um preço anormalmente baixo, quando esse preço resulte, direta ou indiretamente, das peças do procedimento;
e) Nota justificativa do preço proposto;
f) Lista dos preços unitários de todas as espécies de trabalho previstos no projeto de execução, com o ordenamento dos mapas resumo de quantidades de trabalho;
g) Programa de trabalhos, incluindo plano de trabalhos, plano de mão-de-obra e plano de equipamento;
h) Plano de pagamentos e cronograma financeiro;
i) Memória justificativa e descritiva do modo de execução da obra;
j) Declaração contendo os preços parciais dos trabalhos correspondentes às habilitações contidas nos Alvarás de Construção, conforme determinado pelo nº 4 do artigo 60º do Código dos Contratos Públicos;
k) Formulário principal;
l) A proposta apresentada deverá, ainda, contemplar a seguinte informação: - O programa de trabalhos previsto na alínea g) deverá ser constituído, no mínimo, pelos seguintes elementos: i) Diagrama de barras mostrando o desenvolvimento dos trabalhos de execução da empreitada e dos rendimentos médios adotados para a execução dos diferentes tipos de trabalhos; ii) Plano de mão-de-obra para a execução dos trabalhos da empreitada; - Mapa de afetação das diferentes cargas de mão-de-obra distribuídas, quer em quantidade, quer em tempo previsto de permanência na obra; iii) Plano de equipamento para a execução dos trabalhos da empreitada – Mapa de equipamento representando os diversos tipos de equipamento, quer em quantidade, quer em tempo de afetação à obra” – cfr. Doc. 2 junto com a p.i..
4) O nº 12 do artigo 11º do Programa de Procedimento refere ainda que “A não apresentação dos documentos referidos no número anterior é considerado como motivo de exclusão”.
5) O artigo 17º nº 1 do Programa do Procedimento refere que “A adjudicação será feita segundo o critério da proposta economicamente mais vantajosa, conforme alínea a) do nº 1, do artigo 74.º do Código dos Contratos Públicos. a) Preço – 80 % b) Qualidade técnica da proposta – 20 %”.
6) O artigo 23º, nº 1, alíneas a) a f) do Programa do Procedimento refere que “O adjudicatário deverá apresentar os seguintes documentos de habilitação:
a) Declaração emitida conforme o modelo constante no Anexo II, do CCP;
b) Documento comprovativo de que não se encontra nas situações previstas nas alíneas b), d), e), e h), do nº 1 do artigo 55º, do CCP;
c) Documentos de habilitação previstos nos números 2 e 8 do artigo 81º do CCP, quando for o caso;
d) Cópia da certidão do registo comercial ou certidão permanente (aplicável a entidades comerciais);
e) Declaração do Registo do Beneficiário Efetivo ou código de acesso;
f) Documentos comprovativos da titularidade das habilitações legalmente exigidas para a empreitada em causa, de harmonia com o exigido no artigo 3º, da Portaria nº 372/2017, de 14 de dezembro e no presente Programa do Procedimento: i) A classificação na 1.ª subcategoria da 1ª categoria em classe que cubra o valor global da proposta; ii) A classificação na 2.ª, 3.ª, 4.ª, 5.ª, 6.ª, 7.ª e 8.ª subcategoria da 1.ª categoria em classe que cubra o valor dos trabalhos que lhe digam respeito; iii) A classificação na 1.ª, 8.ª e 9.ª subcategoria da 2.ª categoria em classe que cubra o valor dos trabalhos que lhe digam respeito; iv) A classificação na 5ª, 9ª, 10ª, 12ª, 14ª e 18ª subcategoria da 4.ª categoria em classe que cubra o valor dos trabalhos que lhe digam respeito; v) A classificação na 2ª subcategoria da 5ª categoria em classe que cubra o valor dos trabalhos que lhe digam respeito”.
7) O nº 2, do artigo 23º do Programa de Procedimento refere que “O órgão competente para a decisão de contratar pode sempre solicitar ao adjudicatário, ainda que tal não conste do Programa do Procedimento, a apresentação de quaisquer documentos comprovativos da titularidade das habilitações legalmente exigidas para a execução das prestações objeto do contrato a celebrar, fixando-lhe prazo para o efeito”.
8) A A. apresentou proposta ao concurso e com ela juntou a seguinte declaração:

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9) A A. é titular do alvará de empreiteiro de obras públicas com as seguintes autorizações:

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10) A proposta da A. foi admitida, sendo, em sede de Relatório Preliminar, considerada a proposta a concurso economicamente mais vantajosa, ficando classificada em primeiro lugar, pelo que o Júri propôs a adjudicação da empreitada da obra da “Piscina Municipal de Canedo” – Santa Maria da Feira à A. pelo valor de 3.525.432,32€ (três milhões quinhentos e vinte e cinco mil quatrocentos e trinta e dois euros e trinta e dois cêntimos), ao qual acrescia o IVA à taxa legal em vigor.
11) Após a realização da fase de audiência prévia, foi a A. notificada do projecto de Relatório Final com deliberação de exclusão das “(…) propostas dos concorrentes nºs 12 – E., S.A., 15 – N., S.A. e 16 – H., S.A., porque as propostas são omissas quanto “documento que devia conter um termo/condição que era atinente a aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos” (…), “de observância obrigatória” (…) e essa falta acarreta a exclusão das propostas, nos termos do disposto no art. 70º, nº 2, al. a), 57º, nº 1, al. c) e 146º, nº 2, als. d) e o), todos do CCP, uma vez que não apresentam habilitação de Alvará de Empreiteiro de Obras Públicas para a totalidade das subcategorias de Alvará exigidas no programa do procedimento nem identificam e apresentam documento de compromisso de subempreiteiros para o efeito” (cfr. doc. nº 3 junto com a p.i.).
12) No referido projecto de Relatório Final referia-se, “Em conclusão, a proposta a concurso economicamente mais vantajosa, é a da empresa “B............, S.A.”, que se encontra classificada em primeiro lugar, pelo que se propõe a adjudicação da empreitada da obra da “Piscina Municipal de Canedo” – Santa Maria da Feira, à dita empresa, pelo valor de 3.472.000,30€ (três milhões quatrocentos e setenta e dois mil e trinta cêntimos), ao qual acresce o IVA à taxa legal em vigor”.
13) A A. foi notificada para se pronunciar, o que fez, pugnando pela revogação da intenção de excluir a respectiva proposta, que a mesma fosse ordenada em 1º lugar e que lhe fosse adjudicada a empreitada acima referida (cfr. doc. nº 4 junto com a p.i.).
14) Em sede de Relatório Final, o Júri considerou o seguinte: “No epílogo do procedimento o Júri não pode permanecer na indecisão. Teve de tomar uma opção. E a opção tomada foi no sentido de seguir a jurisprudência do TCA Norte”, acrescentando que “In casu estamos perante procedimento de formação de contratos visando a celebração de um contrato de empreitada de obras públicas” (doc. nº 5) e que “O programa do procedimento exige o seguinte neste particular (vd. art. 11º, nº 1, al. j)): “Declaração contendo os preços parciais dos trabalhos correspondentes às habilitações contidas nos Alvarás de Construção, conforme determinado pelo nº 4 do artigo 60º do Código dos Contratos Públicos”, sendo que este último dispõe “no caso de se tratar de procedimento de formação de contrato de empreitada ou de concessão de obras públicas, o concorrente deve indicar na proposta os preços parciais dos trabalhos que se propõe executar correspondentes às habilitações contidas nos alvarás ou nos certificados de empreiteiro de obras públicas, ou nas declarações emitidas pelo Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção, I. P., nos termos da portaria referida no nº 2 do artigo 81º” e que “(…) o Programa do Procedimento não é omisso. Tem neste particular o mesmo grau de especificidade que aqueloutros programas que foram objeto da análise do TCA Norte” e que “Não obstante o exposto, não deixamos de expor os motivos que conduzem à opção por seguir o entendimento vertido na Jurisprudência do TCA Norte: i) Ela é, de facto, mais recente e concordante (permitindo revelar uma tendência; mas não só); ii) Ela também tem um elevado carácter de especificidade. É mesmo sobre esta matéria (e não sobre matéria atinente, aparentemente similar ou conexa, como se vê noutros arestos), no quadro de formação de contratos de empreitadas de obras públicas (a que se aplica o art. 60º, nº 4 do CCP). Vd. o Ac. TCA Norte proc. 01093/17.7BEAVR, de 04-05- 2018 “A questão nuclear trazida a este recurso prende-se com o seguinte: têm ou não de constar da proposta as declarações de compromisso subscritas pelos subcontratados destinando-se a fase de habilitação a confirmar esses mesmos compromissos?” iii) Ela não ignora a existência de jurisprudência de sentido diverso. Ou seja, não pode afirma-se que o TCA Norte a proferiu sob o erro ou o engano adveniente de desconhecimento de posições anteriores sobre a matéria (sendo que, ademais, as posições anteriores são também de dois sentidos e não de sentido único). Não é o caso. Conhece-a, aborda-a e pronuncia-se especificamente sobre a matéria. iv) É extremamente assertiva, sustentando que tal junção sempre é de observância obrigatória. Vd. o Ac. TCA NORTE, proc. 00233/20.3BECTB, de 05-02-2021: “De maneira que, tendo o Tribunal a quo apreciado e decidido que a proposta apresentada pela Contra interessada se mostrava incompleta, por não ter sido instruída com todos os documentos exigidos pela entidade adjudicante [o Réu MUNICÍPIO DE (...), ora Recorrente], mormente, com documento que devia conter um termo/condição que era atinente a aspectos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, assim queridos pela entidade contratante [mas note-se, sempre de observância obrigatória, como vimos supra face ao disposto no artigo 132.º, n.º 1, alíneas f) e h) do CCP] e que essa falta cometida devia ter sido fulminada com a exclusão da proposta, e não o tendo sido, esse julgamento não enferma dos erros na interpretação e aplicação identificados pelo Recorrente.” (cfr. doc. nº 5 junto com a p.i.).
15) Concluiu-se no Relatório Final que “(…) ponderadas as observações dos concorrentes, o Júri mantém o teor e as conclusões do relatório final, mantendo-se prejudicadas as demais questões levantadas pelos concorrentes, relacionadas com os aspetos técnicos da avaliação das propostas” e que “Verifica-se, pois, que a proposta a concurso economicamente mais vantajosa, é a da empresa “B............, S.A.”, pessoa coletiva nº ………, com sede na Rua do ……… nº ……, Parada de Tibães, 4700-…… Braga, que se encontra classificada em primeiro lugar, pelo que se propõe a adjudicação da empreitada da obra da “Piscina Municipal de Canedo” – Santa Maria da Feira, à dita empresa, pelo valor de 3.472.000,30€ (três milhões quatrocentos e setenta e dois mil e trinta cêntimos), ao qual acresce o IVA à taxa legal em vigor”.
16) Em 10/05/2021, foi a A. notificada da deliberação de 03/05/2021, da Câmara Municipal de Santa Maria da Feira que, aprovando todo o conteúdo do referido Relatório Final, adjudicou a empreitada da obra da “Piscina Municipal de Canedo” – Santa Maria da Feira à empresa “B............, S.A.” (cfr. doc. nº 6 junto com a p.i.).
17) Em 29/06/2021, Entidade Demandada e contra-interessada celebraram o contrato referente à empreitada da Piscina Municipal do Canedo, cuja formação se desenrolou no âmbito do procedimento pré-contratual em causa nos autos, pelo valor de 3.472.000,30€ (três milhões, quatrocentos e setenta e dois mil euros e trinta cêntimos), acrescido do IVA à taxa legal em vigor».
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2.2. O DIREITO
Como supra se referiu, a requerente interpôs o presente recurso de revista do Acórdão proferido pelo TCA Norte em 11.02.2022 que negou provimento ao recurso que a mesma havia deduzido da decisão do TAF do Porto que julgara a presente acção totalmente improcedente, e, em consequência, absolvera a entidade demandada e a contra-interessada da instância.
A revista foi admitida pela formação do artº 150º do CPTA tendo-se aqui consignado:
«3. A autora desta acção urgente - contencioso pré-contratual - tendo visto a sua proposta excluída e o objecto do concurso público adjudicado à contra-interessada - com a qual foi celebrado o respectivo contrato na pendência da acção - pediu ao tribunal que «anulasse» os actos de exclusão, adjudicação e contratação, e condenasse a entidade demandada a ordenar a sua proposta em 1º lugar e a adjudicar-lhe a empreitada. O tribunal de 1ª instância - TAF do Porto - negou-lhe razão, por entender, ao arrepio do que vinha defendido pela autora, que era no momento da apresentação da sua proposta que ela - que não dispunha de todas as autorizações exigidas no programa de concurso para execução do contrato - teria de ter apresentado uma declaração de compromisso com subempreiteiro que fosse titular da autorização em falta, e que, não o tendo feito, não podia a sua proposta ser admitida a concurso. E tendo, com esta base, sido a sua proposta excluída pela entidade demandada - à luz dos artigos 57°, n°1 alínea c), 70º, n°2 alínea a), e 146°, n°2 alíneas d) e o), todos do CCP - tal decisão administrativa não merecia censura legal. E o TAF do Porto invocou, em abono deste entendimento, um acórdão deste Supremo Tribunal - AC do STA de 14.01.2021, processo n°0955/19.1BEAVR.
O tribunal de 2ª instância - TCAN - corroborou a argumentação jurídica, e a decisão, da sentença aí recorrida, acrescentando resultar do PA que a recorrente - autora - não só não juntou qualquer declaração de compromisso de subcontratado, como também não indicou a identidade de qualquer concreto subcontratado, nem, nos preços parciais, os trabalhos que tal terceiro se proporia executar.
Novamente é a autora - e apelante - a discordar, e a pedir revista do assim decidido pelas instâncias. Começa por alegar - sem qualificar juridicamente a relevância do que alega - que o tribunal de apelação se excedeu ao proceder ao acréscimo que referimos no parágrafo anterior pois não o poderia fazer. E prossegue apontando erro de julgamento de direito ao acórdão recorrido, defendendo, como desde início, que os documentos, cuja junção lhe está a ser exigida, são documentos de habilitação e apenas deverão ser juntos pela adjudicatária na fase de habilitação [artigo 81°, n°2, do CCP, e que dos artigos 60º, n°4, do CCP, e 11º, n°1 alínea j) do Programa do Concurso, resulta que apenas era exigível a junção à proposta da declaração contendo os preços parciais dos trabalhos, o que ela fez.
Alude, e cita, nas suas alegações de revista, a cinco arestos deste Supremo Tribunal, a saber: - Ac STA de 04.11.2010, processo n° 795/10; - Ac STA de 30.01.2013, processo n° 846/12; - Ac STA de 21.05.2015, processo n°236/15; - Ac STA de 14.01.2021, processo n° 0955/19.1BEAVR; - Ac STA de 18.11.2021, processo n° 452/20.
(…)
Importa esclarecer, desde logo, que o alegado acréscimo reclamado pela recorrente – e a que não atribui a qualificação de nulidade por excesso de pronúncia - surge na economia do acórdão recorrido essencialmente como um obiter dictum do qual não foram retiradas quaisquer consequências ao nível da decisão. E, para além desta inofensiva alegação, a «questão nuclear» que alimenta a pretensão emerge da circunstância da ora recorrente não ser titular de habilitações para a totalidade dos trabalhos e não ter juntado à sua proposta declarações de compromisso de terceiros, subcontratados, que fossem titulares dessas habilitações em falta. Donde, a questão nuclear da revista se consubstanciar em saber se têm, ou não, de constar da proposta, essas declarações de compromisso, subscritas por subcontratados habilitados, destinando-se a fase de habilitação a confirmar apenas essas mesmas declarações.
Como vimos, os tribunais de instância entenderam que «têm de constar da proposta», alavancando-se, pelo menos o de ia instância, em acórdão deste Supremo Tribunal, já supra referido. Porém, de um outro acórdão deste Supremo - o último dos supra referidos - parece dever retirar-se, para este caso concreto, diferente solução. E é sobretudo nele que se escuda a ora recorrente.
Assim, e sem mais desenvolvimentos, por desnecessários, justifica-se a «admissão» da revista em face das dúvidas legítimas e sérias suscitadas pela solução encontrada pelas instâncias, e isto apesar da sua unanimidade (…)».
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Vejamos do acerto da decisão recorrida e das críticas que lhe são apontadas pela recorrente, sendo destituída de fundamento a alegação resultante da conclusão 1ª das alegações recursivas, de onde não é extraído qualquer desfecho, para além de que se trata de matéria que tem vindo a ser discutida, nos presentes autos, nas suas várias vertentes jurídicas.
E atentemos, desde logo, na matéria fixada em 1ª instância, que não sofreu qualquer modificação no acórdão recorrido, respeitante aos pontos 1 a 7, e que é fundamental para a decisão a proferir, ou seja, e na essência, o teor do anúncio do procedimento e os documentos de habilitação exigidos no programa do procedimento.
Exige-se nos documentos de habilitação para o exercício da actividade profissional (ponto 7 do Anúncio do concurso e ponto 3 da factualidade assente) o alvará de empreiteiro de obras públicas, de acordo com as classificações nas categorias e subcategorias ali previstas.
E no Programa do Procedimento exige-se no artº 11º (documentos que constituem a proposta), entre o mais, o seguinte:
(Alínea j) «Declaração contendo os preços parciais dos trabalhos correspondentes às habilitações contidas nos Alvarás de Construção, conforme determinado pelo nº 4 do artº 60º do CCP».
Por sua vez, no artº 60º do CCP, sob a epígrafe “Indicação do Preço”, dispõe-se o seguinte:
«(…)
4 - No caso de se tratar de procedimento de formação de contrato de empreitada ou de concessão de obras públicas, o concorrente deve indicar na proposta os preços parciais dos trabalhos que se propõe executar correspondentes às habilitações contidas nos alvarás ou nos certificados de empreiteiro de obras públicas, ou nas declarações emitidas pelo Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção, I. P., nos termos da portaria referida no n.º 2 do artigo 81.º
5 - O disposto no número anterior é aplicável aos agrupamentos concorrentes, devendo estes, para o efeito, indicar na proposta os preços parciais dos trabalhos que cada um dos seus membros se propõe executar».
*
Ou seja, no caso dos presentes autos, consta do próprio anúncio de abertura do concurso, e do Programa do Procedimento a exigência aquando da apresentação das propostas da indicação dos respectivos alvarás que comprovem as respectivas habilitações, o que logo à partida afasta o caso dos autos, do decidido no Acórdão proferido neste STA em 18.11.2021, in proc. 0452/20.2BEALM onde se sumariou:
«II Num procedimento de concurso público, os documentos de habilitação do adjudicatário – ou se subcontratado, de cujas habilitações aquele se pretenda socorrer – salvo em caso de diferente exigência da Entidade Adjudicante, só têm de ser apresentados no momento seguinte à adjudicação e não no momento da apresentação da proposta; o mesmo ocorrendo com as declarações de compromisso por parte de eventuais subcontratados (artºs 77º, nº 2, al. a) e 81º do CCP e 2º da Portaria nº 372/2017 de 14/12». sub. nosso.
Com efeito, estamos face a documentos de habilitação, exigidos no Anúncio do Procedimento, em conformidade com o exigido no artº 60º, nº 4 do CCP que exige que o concorrente indique na proposta os preços parciais dos trabalhos que se propõe executar correspondentes às habilitações contidas nos alvarás ou nos certificados de empreiteiro de obras públicas, ou nas declarações emitidas pelo Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção, IP nos termos da Portaria nº 372/2017 de 14/12.
E a verdade é que a autora/ora recorrente não apresentou o alvará da 14ª subcategoria, nem apresentou intenção de adjudicação a terceiros, nem declaração de compromisso de qualquer terceiro eventualmente contratado que seja possuidor da referida habilitação, ou seja do respectivo alvará [donde constassem os preços parciais dos trabalhos que esse terceiro se proporia executar] o que lhe era exigido nos termos supra definidos desde logo pelo programa do procedimento e pelo artº 2º, nº 2 da Portaria nº 372/2017.
A este respeito, veja-se ainda o que se dispõe na Lei nº 41/2015 de 03.06 que estabelece o Regime Jurídico aplicável ao exercício da actividade da construção: «Sem prejuízo do disposto nos artigos 19º e 20º, nos procedimentos de formação de contratos de empreitadas de obras públicas, a empresa de construção responsável pela obra deve ser detentora de habilitação contendo subcategoria em classe que cubra o valor global daquela, respeitante aos trabalhos mais expressivos da mesma, sem prejuízo da exigência de habilitações noutras classes e subcategorias relativas às restantes obras e trabalhos a executar».
E relativamente ao momento da apresentação da declaração de compromisso, veja-se o que a este respeito refere Pedro Fernández Sánchez, in Direito da Contratação Pública, vol. II, pág. 450:
«Por isso, no momento da apresentação da proposta, não se requer ao concorrente mais do que uma declaração subscrita pelo próprio, quanto à participação de terceiros na execução do contrato, no caso da sua proposta vir a obter a adjudicação, indicando a identidade de tais terceiros e as exactas prestações que lhe são atribuídas. No caso de um contrato de empreitada, é inevitável que indique também os preços parciais dos trabalhos que os terceiros se propõem executar, já que, de outro modo, não ficará completa a lista de preços parciais a que se referem os nºs 4 e 5 do artº 60º do CCP». Sub nosso.
Daí que, não tendo a autora/recorrente incluído enquanto concorrente, na proposta apresentada à presente empreitada de obras públicas, os documentos supra enumerados, sempre o júri do concurso na fase da apreciação das propostas poderia, como veio a fazê-lo, decidir pela exclusão da proposta da autora, atenta a violação do disposto nos artigos 57º, nº 1, al. c), 70º, nº 2, al. a) e 146º, nº 2, als. d) e o) do C.C.P e artº 11º do Programa do Procedimento.
Por outro lado, quanto à possibilidade de ser concedido, por parte da entidade adjudicante, um prazo adicional para a apresentação de documentos de habilitação em falta, tal só pode ocorrer no caso de essa falta resultar de um facto que não seja imputável ao adjudicatário, o que não sucedeu nos autos.
Igualmente não resulta dos autos que se estivesse perante um mero lapso material que necessitasse de ser rectificado, ou de qualquer obscuridade, mas sim de uma omissão que determina a exclusão.
Temos por conseguinte, que a decisão de exclusão da proposta da A. pela entidade adjudicante, se mostra em conformidade com o quadro legal aplicável, razão pela qual o acórdão recorrido não padece das ilegalidades apontadas pela Autora/ora recorrente.
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DECISÃO
Atento o exposto, acordam os juízes que compõem este Tribunal em negar provimento ao recurso.
Custas a cargo da recorrente [com dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente nos termos do disposto no artº 6º, nº 7 do RCP].

Lisboa, 9 de Junho de 2022. – Maria do Céu Dias Rosa das Neves (relatora) - Cláudio Ramos Monteiro – José Francisco Fonseca da Paz.