Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01023/16
Data do Acordão:12/06/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FONSECA CARVALHO
Descritores:ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL
DECISÃO
RECURSO HIERÁRQUICO IMPRÓPRIO
PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL
INTERPOSIÇÃO
VEREADOR
Sumário:I - A decisão do Vereador do Pelouro das Finanças da Câmara Municipal de Lisboa praticado sob delegação de competência do Presidente da Câmara é um acto administrativo que quando lesivo por direitos da recorrente e como tal imediatamente impugnável.
II - Não existindo relação hierárquica entre o Vereador do Pelouro das Finanças e o Presidente da Câmara delegante nem prevendo a lei recurso do acto assim praticado o recurso hierárquico interposto tem de haver-se como recurso hierárquico impróprio, de natureza facultativa.
III - Limitando-se o acto proferido em sede de recurso hierárquico impróprio a manter o acto praticado pelo Vereador, com adesão à fundamentação por este exarada, tal acto tem natureza confirmativa e como tal é irrecorrível.
Nº Convencional:JSTA000P22657
Nº do Documento:SA22017120601023
Data de Entrada:09/12/2016
Recorrente:A.., LDA
Recorrido 1:CM DE LISBOA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: RELATÓRIO:

Não se conformando com a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que rejeitou a acção administrativa instaurada por A……………… Ldª contra o despacho do recurso hierárquico do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa que indeferiu o recurso hierárquico interposto do despacho do Vereador do Pelouro de Finanças de 30 05 2001 que indeferiu o pedido de pagamento de juros indemnizatórios veio a autora A………………….. Ldª dele interpor recurso para a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo formulando as seguintes conclusões:

1 O despacho do Tribunal a quo de folhas 299 decidiu admitir o recurso para o Venerando Supremo Tribunal Administrativo nos termos previstos no artigo 102 da LPTA nº 1 do artigo 685 do CPC (redacção anterior ao DL 303/2007 de 24 Agosto com subida imediata e nos próprios autos e efeito meramente devolutivo conforme nº 1 e 2 do artigo 105 da LPTA.
2 Como se decidiu no acórdão do STA proferido no presente processo em 2009 01 07 e já transitado em julgado no âmbito de recurso semelhante interposto da sentença do mesmo tribunal de folhas 130 a 135 dos autos
“Estando em causa um recurso jurisdicional interposto de decisão judicial que recaiu sobe recurso contencioso (despacho de folhas 37) ao qual se aplica o ETAF de 1984 e a LPTA o mesmo deverá ter subida imediata nos próprios autos e com efeito suspensivo (artigos 734 nº 1 al a) e 736 ambos do CPC e artigo 105 nº 1 da LPTA. Nesta conformidade sendo certo que a decisão que admitiu o recurso fixou a sua espécie e determinou o efeito não vincula o Tribunal (artigo 687 nº 4 do CPC) fixa-se ao presente recurso efeito suspensivo com subida imediata nos próprios autos
3 O efeito suspensivo do recurso resulta expressamente do disposto nos artigos 105/1 da LPTA e 740/1 do CPC na redacção anterior ao DL 303/2007 de 24 Agosto Jorge de Sousa in CPPT anotado 6ª edição vol. IV pp 323 e 324
4 Ao presente recurso deverá assim ser atribuído efeito suspensivo ex. vi do artigo 105/1 da LPTA e dos artigos 687/4 e 740/1 do CPC na redacção anterior ao DL 303 /2007 de 24 Agosto (artigo 102 da LPTA).
B Da recorribilidade do despacho “sub judice”
5 Contrariamente ao decidido na sentença recorrida o acto “sub judice” é contenciosamente impugnável como resulta do disposto nos artigos 76 e 97/1 (p) do CPPT pois (i) indeferiu o recurso hierárquico interposto pela ora recorrente da decisão de reclamação graciosa deduzida contra a recusa de pagamento de juros indemnizatórios por parte da entidade recorrida (artigos 66 e 67 do CPPT) cfr alíneas A a G dos factos provados acórdão do STA de 2012 04 12 processo 122/12 de 2008 10 09 processo 567/08 de 2007 11 07 proc 0418/07 de 2007 09 12 Proc 0417/07 de 2007 07 12 proc 0318/07 de 2004 11 04 proc 01787/03 e (ii) integra claramente um acto administrativo relativo a questões tributárias 8 v art 97/1p do CPPT
6 O despacho do senhor Vereador do Pelouro das Finanças de 2001 05 03 indeferiu a reclamação graciosa deduzida pela recorrente e foi proferido em matéria tributária no âmbito de poderes delegados como resulta inequivocamente dos documentos de folhas 223 e segs dos autos. cfr al. A dos factos provados pelo que é manifesto que o despacho “sub judice” do senhor presidente da CML em consequência do recurso hierárquico impróprio (v artigos 39 166 e segs e 176/3 do CPA integra acto lesivo contenciosamente impugnável artigos 268/4 da CRP cfr art 76/2 do CPPT
7 Aliás a sentença em análise violou ostensivamente o decidido com trânsito em julgado do ac do STA de 2009 01 07 proferido no presente processo ver artigos 613 620 e 621 do NCPC artigos 666 e segs do anterior CPC que impõe a consideração da inexistente identidade de sujeitos fundamentação e decisão de cada um dos actos em análise de que resulta que o acto “sub judice” que procedeu à reanálise do pedido apresentado pela requerente ver folhas 12 dos autos) com novidade de fundamentos ver ac do TCA Norte de 2014 02 14 processo 03303/10 BEPRT não é meramente confirmativo do despacho do Vereador do Pelouro das Finanças da CML de 2001 05 30 ac STA de 2005 02 01 processo 0971/04 de 2004 06 23 proc 01679/03 de 2004 04 29 processo 0786/02 de 2003 04 29 proc 0363/03 de 2003 02 06 processo 0818/02 de 2000 11 28 processo 045940
8 Contrariamente ao decidido na sentença recorrida o despacho “sub Judice” violou os direitos e interesses protegidos da ora recorrente e tem eficácia externa pelo que a sua recorribilidade sempre resultaria dos artigos 20 e 268/4 da CRP cfr art 2º do CPPT e 51 do NCPTA).
9 A sentença recorrida enferma assim de manifestos erros de julgamento tendo violado frontalmente além do mais os artigos 39 e 166 e segs e 176/3 do CPA os artigos 102 e 105/1 da LPTA e artigos 666 e segs 687/4 e 740/1 do CPC na redacção anterior ao DL 303 /2007 de 14 Agosto artigo 51/1 do NCPTA

Contra alegou a Câmara Municipal de Lisboa assim concluindo:
I Nos presentes autos presenciamos o aproveitamento por parte da recorrente das normas legais e processuais aplicáveis criadas para garantir o cumprimento dos princípios processuais previstos na lei e Constituição com o intuito de impedir o cumprimento de uma sentença transitada em julgado tendo levado ao arrastamento nos tribunais por mais de 14 anos de uma questão cujo desfecho nunca poderá ser contrário ao caso julgado conforme inexplicavelmente pretende a recorrente que por demais resulta evidente nos presentes autos
II Despacho do Vereador do Pelouro de Finanças não foi proferidos em resposta a uma agora invocada reclamação mas tão só em resposta a uma pretensão da então requerente que vá-se lá entender-se porque razão entendeu que a sentença de 2000 que expressamente determinava que não há lugar a juros indemnizatórios se deva entender precisamente o contrário
III O recurso hierárquico que se seguiu tinha natureza facultativa conforme resulta do disposto no artigo 67 do CPPT
IV A recorrente não impugnou contenciosamente o acto proferido pelo Vereador do Pelouro das Finanças mas mesmo que o tivesse impugnado sempre subsistiria a sua irrecorribilidade porquanto o mesmo nem definiu a situação jurídica da recorrente nem consequentemente teve carácter inovatório na ordem jurídica limitando-se a cumprir uma decisão judicial transitada em julgado conforme é obrigação constitucional quer do recorrido quer dos autores em causa
V Os efeitos jurídicos na situação individual e concreta da recorrente operaram por via da sentença de 2000 da qual aquela não recorreu tendo-se consolidado na ordem jurídica e não por via do acto objecto dos autos
VI O acto objecto nos autos são pois irrecorrível por não consistir numa decisão de órgão da administração que ao abrigo de normas de direito público visasse produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta
VII Devendo em consequência ser recusado o presente recurso por falta de objecto e mantida a sentença recorrida na ordem jurídica

O Mº Pº neste Supremo Tribunal emitiu o seguinte parecer:
A recorrente vem sindicar a sentença de folhas 279/291 de 19 Abril 2016 que julgou que julgou improcedente recurso contencioso de anulação deduzido contra o despacho do senhor Presidente da CML que indeferiu o recurso hierárquico interposto do despacho do Vereador do Pelouro das Finanças no entendimento de que o despacho sindicado é irrecorrível
A recorrente termina as suas alegações com as conclusões de folhas 329/331 que como é sabido salvo questões de conhecimento oficioso e desde que dos autos constem todos os elementos necessários à sua integração delimitam o objecto do recurso nos termos do estatuído nos artigos 635/4 e 639/1 do CPC ex. vi do artigo 102 da LPTA
O recorrido Município de Lisboa contra alegou tendo concluído nos termos de folhas 365/366 A nosso ver o recurso não merece provimento pelas razões aduzidas pelo Mº Pº junto da 1ª instância folhas 102/104 e 253/254 cujo discurso fundamentador se subscreve
Como resulta do probatório e dos autos a recorrente em 02 04 2001 requereu na CML a execução integral da sentença devidamente identificada na pi tendo pedido o pagamento de juros indemnizatórios por entender serem devidos pela privação das quantas que lhe foram cobradas e entretanto restituídas
Essa pretensão foi indeferida por despacho de 30 05 2001 pelo Vereador do Pelouro das Finanças no uso de poderes delegados
Dessa decisão interpôs a recorrente recurso hierárquico para o presidente da CML que por despacho de 24 07 2001 indeferiu a pretensão que foi objecto do presente recurso contencioso de anulação
Como resulta da Lei das Autarquias Locais (LAL) Lei 169/99 de 18 09) entre o Vereador de Finanças e o Presidente da Câmara inexiste cadeia hierárquica pelo que está afastada a possibilidade de haver recurso hierárquico
Nestas situações em que não há hierarquia poderá a lei admitir recurso hierárquico impróprio sendo a lei omissa nos actos em que o delegante pode revogar os actos do delegado o interessado poderá sempre interpor recurso hierárquico impróprio.
Que será meramente facultativo quando os actos do delegado sejam definitivos como acontece no caso em análise atento o disposto nos artigos 39/2 158/2 al b) 167 e 176 do CPA 80 da LGT e 67/1 do CPPT (Curso de Direito Administrativo 2ª edição Vol I pp 676 prof. Freitas do Amaral e artigo 176 do velho CPA.
O acto praticado pelo Vereador do Pelouro das Finanças no uso de poderes delegados é definitivo e executório e lesivo e portanto contenciosamente sindicáveis artigos 268/4 da CRP e 25 da LPTA
O acto sindicado que indeferiu o recurso hierárquico é meramente confirmativo e uma vez que o acto primário foi devidamente notificado à recorrente é irrecorrível nos termos do disposto no artigo 55 da LPTA
De facto acto confirmativo é o acto administrativo pelo qual um órgão da administração reitera e mantém em vigor acto administrativo anterior que se limita a repetir um acto administrativo anterior sem nada acrescentar ou retirar ao seu conteúdo cfr Freitas do Amaral opus citada
Ora como resulta do probatório e dos autos e ressalvado melhor juízo o acto sindicado proferido em sede de recurso hierárquico limitou-se a manter o despacho de indeferimento proferido pelo Vereador do Pelouro das Finanças com a mesma fundamentação de facto e de direito não se vislumbrando fundamentos inovatórios trazidos à liça.
E não se diga como faz a recorrente que o recurso hierárquico foi interposto da reclamação graciosa nos termos e para os efeitos do estatuído nos artigos 68 e 76/1 do CPPT
De facto o requerimento estruturado pela recorrente a peticionar o pagamento de juros indemnizatórios alegadamente devidos não consubstancia qualquer procedimento de reclamação graciosa pois que o procedimento de reclamação graciosa visa apenas a impugnação dos actos tributários que para este efeito serão apenas os actos de liquidação de tributos os actos de fixação da matéria tributável quando não houver lugar a liquidação, os actos de auto liquidação - artigo 131 do CPPT de retenção na fonte artigo 132 nº 3 e de pagamentos por conta artigo 133 nº 2 do CPPT
Assim sendo bem andou a decisão recorrida ao rejeitar o recurso por falta de objecto ao abrigo do estatuído nos artigos 25 da LPTA e 57 § 4º do Regulamento do STA
A sentença recorrida a nosso ver não merece censura.
Termos em que deve negar-se provimento ao recurso e manter-se a sentença recorrida

Colhidos os vistos cumpre decidir.

FUNDAMENTAÇÃO:

De facto:
O Tribunal dá aqui por provados os seguintes factos que não foram questionados pelas partes:
A Em 29 de Janeiro de 1998 o Presidente da Câmara Municipal de Lisboa proferiu despacho nº 28-B /P/98 de delegação e subdelegação de poderes de competências publicado no Suplemento ao Boletim Municipal nº 206 com o seguinte teor.
Nos termos e ao abrigo do disposto no nº 2 do artigo 52 dos nºs 1 e 2 do artigo 53 e dos nºs 1 e 2 do artigo 54 do DL nº 100/84 de 29 Março (com a redacção que lhe foi dada pela Lei nº 18/91 de 12 Junho) tendo ainda em atenção o disposto nos artigos 35 e segs do DL 442/91 de 15 de Novembro e considerando as delegações de poderes efectuada pela Câmara Municipal no Presidente através das deliberações nºs 61/CM/98 e 62/M /98 delego nos Vereadores abaixo indicados as minhas competências próprias e subdelego as que me estão delegadas afim de poderem gerir e orientar os assuntos a seguir mencionados por referência às áreas de gestão e aos serviços municipais
1.8 Vereador ……………..
A Finanças e Património
Compreende a prática dos actos administrativos e a gestão das matérias que constituem funções da Direcção Municipal das Finanças Planeamento e Controlo de Gestão
B Comércio e Abastecimento
Compreende prática dos actos administrativos e a gestão das matérias que constituem funções da Direcção Municipal de Abastecimento e Consumo
Cfr folhas 222 a 229 dos autos.
B Por sentença de 03 10 2000 foi a recorrente julgada parte ilegítima quanto ao valor de 17 508 000$00 (€ 87 325,54) absolvendo nessa parte da instância a Câmara Municipal de Lisboa e julgada parcialmente extinta por inutilidade superveniente da lide quanto ao valor de 1 312 500$00 (€ 6 546,72) e parcialmente procedente declarando nula e de nenhum efeito a liquidação das compensações por aumento de volumetria ou mais valias no valor de 31 096 800$00 (€ 155 110,18 e 19 104 000$00 (€ 95 290,35) por inexistência legal com as demais consequências, Cfr folhas 74 a 89 vsº dos autos
C Em 02 04 2001 a recorrente requereu ao Presidente da Câmara Municipal de Lisboa através do processo nº 5542/DOGEC/2001 a execução integral da sentença requerendo ainda o pagamento de juros indemnizatórios devidos pelos prejuízos resultantes da privação dos capitais em causa desde a data do seu pagamento até integral restituição
Cfr processo administrativo junto aos autos
D Através do despacho de 30 05 2001 exarado na informação nº 55/DR/NAT/2001 por delegação de competências o Vereador do Pelouro das Finanças …………… indeferiu o pedido de pagamento de juros indemnizatórios
Cfr folhas 9 a 11 do PA
E Em 07 06 2001 a autora foi notificada através do ofício nº 1855/DR/DCEF/2001 do indeferimento do pedido de pagamento de juros indemnizatórios cujos fundamentos se dão por reproduzidos.
Cfr folhas 12 a 14 do PA
F Em 10 07 2001 a autora deu entrada de recurso hierárquico da comunicação de indeferimento atrás referido.
Cfr folhas 15 a 21 do PA
G Em 23 08 2001 a autora foi notificada através do ofício nº 2.484/DR/CDEF/01 de 22 08 2001 e bem assim o seu mandatário através do ofício nº 2535/DR/DCEF/01 em 06 09 2001 de que por despacho datado de 24 07 2001 do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa não obteve provimento o recurso hierárquico do despacho do Vereador do Pelouro das Finanças de 30 05 2001

De direito:
Tendo a recorrente requerido em 02 04 2001 ao Presidente da CML a execução da sentença de folhas 74 a 89 que julgou parcialmente procedente a acção por si intentada declarou nula e de nenhum efeito a liquidação das compensações por aumento de área, de volumetria ou mais valias no valor de esc 31.096.800$00 e 19 104.000$00 bem como o pagamento de juros indemnizatórios devidos pelos prejuízos resultantes da privação dos capitais em causa desde a data do seu pagamento até integral restituição viu indeferido o pedido quanto ao pagamento de juros indemnizatórios através do despacho datado de 30 05 2001 exarado na informação nº 55/DR/NAT/2001 por delegação de competências pelo Vereador do Pelouro das Finanças ………………
E tendo interposto recurso hierárquico desse despacho para o Presidente da CML em 10 07 2001 viu-lhe negado provimento por despacho datado de 24 07 2001 do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa.
Inconformada interpôs a recorrente acção administrativa especial pedindo a declaração de inexistência anulação deste acto.
Todavia o Tribunal a quo perante a factualidade dada como provada rejeitou esta acção por falta de objecto.
Inconformada veio a autora recorrer para a Secção do Contencioso Tributário pedindo desde logo que ao recurso fosse atribuído efeito suspensivo.
Depois e quanto ao não recebimento da acção entende a recorrente como se vê do teor das suas conclusões de recurso e do demais por si alegado que contrariamente ao decidido que o indeferimento do recurso hierárquico era um acto administrativo recorrível por se tratar de recurso hierárquico de decisão de indeferimento de reclamação graciosa contra a recusa do pagamento de juros indemnizatórios e que o indeferimento do recurso hierárquico de decisão que recusa tal pagamento é um acto lesivo e por isso contenciosamente impugnável.
A recorrida CML pugna pela manutenção do decidido alegando em síntese que o despacho do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa é meramente confirmativo do acto administrativo praticado pelo Vereador do Pelouro das Finanças no uso de poderes delegados não definidor da situação jurídica da recorrente por não inovar mas a apenas dar cumprimento a uma ordem judicial transitada em julgado mas que em todo o caso não tendo tal acto sido impugnado contenciosamente se consolidou na ordem jurídica.

Vejamos.

A questão em apreço consiste em decidir se o acto de indeferimento do recurso hierárquico impróprio praticado pelo Presidente da Câmara Municipal de Lisboa é ou não passível de ser contenciosamente impugnado.
O acto administrativo como o resulta da definição do artigo 148 do CPA é a decisão que no exercício de poderes jurídico administrativos visa produzir efeitos jurídico externo numa situação individual e concreta.
Nessa medida poderá afirmar-se como pretende a recorrente ser o indeferimento do recurso hierárquico em causa um acto que tenha produzido efeitos jurídicos na esfera jurídica da recorrente?
Em nosso entender não.
Como se vê do despacho do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa datado de 24 de Julho de 2001, que a sentença dá como reproduzido, foi negado provimento ao recurso hierárquico interposto da decisão do Vereador do Pelouro das Finanças, tendo em consideração a argumentação expendida no pedido da execução da sentença que foi objecto de indeferimento, indeferimento esse que a entidade recorrida considera bem fundamentado mantendo com a mesma fundamentação a recusa do pagamento dos juros: indemnizatórios.
O acto objecto de recurso hierárquico, do senhor Vereador do Pelouro das Finanças foi praticado por delegação de competências do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa.
Os actos praticados ao abrigo de delegação ou subdelegação de poderes valem como se sabe como se tivessem sido praticados pelo delegante ou subdelegante.
Esta validade encontra-se agora expressamente consagrada no nº 5 do artigo 44 do CPA.
Sendo certo que nos termos do artigo 39/2 do CPA na redacção anterior o órgão delegante tem poderes de avocar, bem como o de revogar o acto praticado pelo delegado ao abrigo da delegação ou subdelegação.
O que no caso em apreço se não verificou como se depreende do anteriormente referido.
Nesta medida o acto do senhor Presidente da Câmara Municipal de Lisboa que contém uma declaração de vontade que mantém a vontade expressa pelo Vereador o Pelouro das Finanças não pode deixar de ser considerado um acto administrativo confirmativo.
Ora um acto administrativo confirmativo de um acto administrativo anterior é juridicamente inócuo já que o primeiro acto é que contém a declaração originária lesiva dos interesses, por ser tal acto o que produziu efeitos jurídicos na esfera do administrado.
E tal acto no caso em apreço tem-se como caso resolvido por não ter sido impugnado contenciosamente, em tempo.
E sendo assim atento o disposto no artigo 25 da LPTA a rejeição do recurso não merece censura.
Efectivamente estatuía o artigo citado:
“O recurso só pode ser rejeitado com fundamento no carácter meramente confirmativo do acto
Recorrido quando o acto anterior tiver sido objecto de notificação ao recorrente, de publicação imposta por lei ou de impugnação deduzida por aquele.”
Entende, contudo, a recorrente que o pedido do pagamento de juros tem no caso a natureza de reclamação graciosa na medida em que está em causa um acto de natureza tributária.
Nessa medida o indeferimento do recurso hierárquico seria impugnável nos termos do disposto nos artigos 66 e 67 do CPPT.
O procedimento de reclamação graciosa visa como resulta do preceituado no artigo 68 do CPPT a anulação parcial ou total dos actos tributários, por iniciativa do contribuinte incluindo nos termos da lei os substitutos e os responsáveis.
Cabendo, nos termos do nº 1 do artigo 76 do CPPT, do seu indeferimento total ou parcial, recurso hierárquico.
Sendo a decisão que sobre ele recair susceptível de recurso contencioso salvo se de tal decisão já tiver sido deduzida impugnação judicial com o mesmo objecto.
Sucede porém que não é qualquer acto que tendo natureza tributária é susceptível de reclamação graciosa.
Este procedimento administrativo abrange apenas os actos tributários da liquidação de tributos os actos de fixação da matéria tributável quando não houver lugar a liquidação, os actos de auto liquidação – artigo 131 do CPPT de retenção na fonte artigo 132 nº 3 e de pagamentos por conta artigo 133 nº 2 do CPPT.
O caso dos autos é assim como a própria recorrente sustenta um caso de recurso hierárquico impróprio previsto no artigo 176 do CPA vigente à data dos factos.
Efectivamente se tivermos em conta o disposto no artigo 176 do CPA vigente à data dos factos em que se considera impróprio o recurso hierárquico interposto para um órgão que exerça poder de supervisão sobre outro órgão da mesma pessoa colectiva fora do âmbito da hierarquia administrativa não existindo norma legal que expressamente preveja recurso hierárquico para o presidente da Câmara Municipal de acto praticado por vereador dessa mesma Câmara ou de acto praticado no uso de poderes delegados para o Presidente da Câmara delegante o recurso em causa não pode deixar de ser considerado recurso hierárquico impróprio e de natureza facultativa.
Sendo o acto administrativo praticado pelo Vereador no uso de poderes delegados um acto lesivo dos interesses da recorrente e consequentemente e desde logo contenciosamente impugnável.
E sendo a decisão primária – a do vereador – impugnável, tendo o recurso hierárquico natureza facultativa, tal recurso não contendia com a possibilidade de imediatamente se interpor recurso contencioso do acto recorrido não suspendendo nem interrompendo o prazo para tal recurso contencioso.
De facto o que importa e releva para determinar a natureza confirmativa da decisão do presidente da Câmara em causa é a constatação dos fundamentos em que a mesma assenta. Se a decisão do Presidente, como sucede no caso em apreço não traz fundamentos novos mas mantém os fundamentos do acto recorrido este acto do Presidente nada inova tratando-se assim de um acto confirmativo como antes se disse.
O recurso hierárquico impróprio dado a sua natureza facultativa e sobretudo por ser um acto confirmativo não tem força para reabrir a via contenciosa da decisão do acto do Vereador, acto este que, como já anteriormente se disse, é que lesa os interesses da recorrente.

DECISÃO:
Face ao todo o exposto acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.
Custas pela recorrente.

Lisboa, 6 de Dezembro de 2017. - Fonseca Carvalho (relator) - Casimiro Gonçalves - Pedro Delgado.