Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01960/20.0BEPRT
Data do Acordão:09/09/2021
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:CARLOS CARVALHO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
CONTRATAÇÃO PÚBLICA
PLANO DE TRABALHOS
ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:Justifica-se a admissão do recurso de revista dado estarem em discussão questão suscetível de poder projetar-se ou de ser transponível para outras situações e que se mostra dotada de complexidade jurídica, revelada pelo facto da sua análise envolver o cotejo e ponderação normativa e principiológica carecida de devida dilucidação por este Supremo Tribunal.
Nº Convencional:JSTA000P28146
Nº do Documento:SA12021090901960/20
Data de Entrada:07/16/2021
Recorrente:B............, SA
Recorrido 1:MUNICÍPIO DE FELGUEIRAS E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
Acordam, em apreciação preliminar, na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

1. B…………, SA [doravante CI], invocando o disposto no art. 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos [CPTA], peticiona a admissão do recurso de revista por si interposto do acórdão de 21.05.2021 do Tribunal Central Administrativo Norte [doravante TCA/N] [cfr. fls. 547/599 - paginação «SITAF» tal como as ulteriores referências à mesma, salvo expressa indicação em contrário], que negou provimento ao recurso e que manteve a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto - Juízo dos Contratos Públicos [doravante TAF/PRT-JCP], que julgou totalmente procedente a ação administrativa urgente de contencioso pré-contratual instaurada por A…………, Lda [doravante A.] e que, em consequência, anulou «o despacho de 7.10.2020 do Presidente da Câmara Municipal de Felgueiras que aprovou o relatório final, e determinou a exclusão da proposta da A. … e adjudicou à B…………, SA o contrato de empreitada de “Beneficiação do CM 1181”» e condenou «o Município de Felgueiras a admitir a proposta da A. ao procedimento concursal em causa empreitada da obra de “Beneficiação do CM 1181” e a adjudicar à A. o contrato relativo à empreitada da obra de “Beneficiação do CM 1181”, seguindo os demais trâmites no sentido da habilitação e celebração do contrato com a A.».

2. Motiva a admissão do recurso de revista [cfr. fls. 609/642] na relevância jurídica e social e, bem assim, para efeitos de uma «melhor aplicação do direito», fundando tal posição no acometido erro de julgamento em que terá incorrido o TCA/N no acórdão sob impugnação, já que lavrado em infração, nomeadamente do disposto nos arts. 57.º, n.º 2, al. b), 70.º, n.º 2, als. a) e f), 72.º e 361.º, todos do Código dos Contratos Públicos [CCP].

3. A A. produziu contra-alegações em sede de recurso de revista [cfr. fls. 655/677] nas quais pugna, desde logo, pela sua não admissão.
Apreciando:

4. Dispõe-se no n.º 1 do art. 150.º do CPTA que «[d]as decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

5. Do referido preceito extrai-se, assim, que as decisões proferidas pelos TCA’s no uso dos poderes conferidos pelo art. 149.º do CPTA, conhecendo em segundo grau de jurisdição, não são, em regra, suscetíveis de recurso ordinário, dado a sua admissibilidade apenas poder ter lugar quando: i) esteja em causa apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, revista de importância fundamental; ou, ii) o recurso revelar ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

6. O TAF/PRT-JCP julgou a ação totalmente procedente, para tal tendo considerado que o ato de exclusão da proposta da A. se mostrava inquinado de ilegalidade [erro sobre os pressupostos (infração, mormente, dos arts. 57.º, n.º 2, al. b), 146.º, n.º 2, al. d), e 361.º do CCP e ponto 20.º, n.º 1, al. e), do Programa de Concurso) e violação do princípio da concorrência] [cfr. fls. 348/375], juízo esse que foi mantido integralmente pelo TCA/N.

7. Compulsados os autos importa, destarte, apreciar, «preliminar» e «sumariamente», se se verificam os pressupostos de admissibilidade referidos no n.º 1 do citado art. 150.º do CPTA quanto ao recurso de revista, mormente, se está em causa questão que «pela sua relevância jurídica» assume «importância fundamental», ou se a intervenção deste Supremo Tribunal se apresenta como «claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

8. Discute-se na presente revista se o oferecimento, com a proposta, de um plano de trabalhos (exigido no procedimento) carecido dos detalhes previstos no art. 361.º do CCP devia trazer a exclusão da proposta [como entendeu a entidade adjudicante] ou simplesmente suscitar pedidos de esclarecimento por parte do júri, admitindo os mesmos [como o sustenta a A.].

9. Tal quaestio juris encerra dificuldades óbvias e é suscetível de recolocação, seja administrativamente noutros procedimentos de formação de contratos, seja, também, em sede judicial, apresentando-se, nesse contexto, como relevante revisitar, desenvolver e aprofundar a jurisprudência deste Supremo firmada no Ac. de 14.06.2018 - Proc. n.º 0395/18.

10. Flui, assim, do exposto a necessidade de intervenção clarificadora deste Tribunal, e daí que se justifique a admissão da revista.
DECISÃO
Nestes termos e de harmonia com o disposto no art. 150.º do CPTA, acordam os juízes da formação de apreciação preliminar da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal em admitir a revista.
Sem custas.
D.N..

Lisboa, 09 de setembro de 2021
[O relator consigna e atesta, que nos termos do disposto no art. 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13.03, aditado pelo art. 03.º do DL n.º 20/2020, de 01.05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes integrantes da formação de julgamento, a Conselheira Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa e o Conselheiro José Augusto de Araújo Veloso] Carlos Luís Medeiros de Carvalho