Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0948/17
Data do Acordão:09/28/2017
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SÃO PEDRO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
ASILO
Sumário:Não se justifica admitir um recurso excepcional de revista relativamente à questão de saber se os pressupostos de que depende a concessão de asilo devem verificar-se em relação ao país da nacionalidade ou da residência habitual, dado que o art. 3º, 3 da lei 27/2008, de 30/6 dá resposta clara e expressa a tal questão.
Nº Convencional:JSTA000P22305
Nº do Documento:SA1201709280948
Data de Entrada:08/16/2017
Recorrente:A...
Recorrido 1:MAI - SERVIÇO DE ESTRANGEIROS E FRONTEIRAS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar – art. 150º, 1, do CPTA.

Acordam no Supremo Tribunal Administrativo (art. 150º, 1 do CPTA)

1. Relatório

1.1. A…………. recorreu nos termos do art. 150º, 1, do CPTA, para este Supremo Tribunal Administrativo do acórdão do TCA Norte, proferido em 7-8-2017, que revogou a sentença proferida pelo TAF de Mirandela e que julgou improcedente a acção por si instaurada contra o MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA onde pedia que lhe fosse concedido asilo ou autorização de residência por protecção subsidiária.

1.2. Fundamenta a admissão da revista por entender que estamos perante uma questão jurídica de relevância fundamental e que justifica necessariamente uma melhor aplicação do direito. Questão que se traduz, por um lado, na definição de qual é o país relevante para efeitos de concessão de asilo (o país da nacionalidade, ou o país da residência) e por outro se o facto de ser homossexual e provir de um país onde esta escolha seja criminalizada é suficiente para a concessão do asilo (conclusão 2ª).

1.3. A entidade recorrida pugna pela não admissão da revista

2. Matéria de facto

Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. Matéria de Direito

3.1. O artigo 150.º, n.º 1, do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». Como decorre do próprio texto legal e a jurisprudência deste STA, tem repetidamente sublinhado trata-se de um recurso excepcional, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando-o como uma «válvula de segurança do sistema», que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.

3.2. A 1ª instância julgou a acção procedente, julgando verificados os pressupostos da concessão de asilo, previstos no art. 3º da Lei 27/2008, de 30 de Junho.

O TCA Norte revogou tal decisão e entendeu que não se verificavam os requisitos da concessão do asilo (art. 3º da Lei 27/2008, de 30 de Junho), nem da protecção subsidiária (art. 7º da mesma Lei). A justificação essencial do acórdão recorrido e porque o requerente tinha dupla nacionalidade (senegalesa e mali – ponto 11 da matéria de facto), foi a de que o requerente referiu não querer voltar ao Mali porque “(…) não conhece ninguém naquele país e recomeçar ali seria difícil”, sendo que tal motivo não encontra enquadramento na Lei de Asilo. Daí que o acórdão tenha concluído: “Deste modo, no caso concreto, não é possível concluir pela existência de uma probabilidade razoável de perseguição à luz da definição de refugiado, pois os fundamentos de facto e de direito, que determinam a concessão do estatuo de refugiado não estão, de todo, preenchidos de acordo com a previsão contida no art. 3º da lei 27/2008, com as alterações introduzidas pela Lei 26/2014. Mais concretamente, conclui o aqui recorrente e bem, que o motivo pelo qual o recorrente não quer regressar ao Senegal é o de recear a perseguição, mas no caso ele nunca sofreu de qualquer acto discriminatório ou desumano no país onde nasceu – o Mali – tendo ao invés invocado uma série de problemas, relacionados com a sua condição de homossexual, com os quais se deparou apenas e só no Senegal”.

Do exposto resulta, desde logo, que a situação dos autos é a seguinte: alguém com duas nacionalidades que relativamente a um dos países de que é nacional não mostra (ou não mostra suficientemente) a existência dos requisitos de que depende a concessão do asilo ou da protecção subsidiária relativamente a um desses países (Mali).

Todavia esta questão tem resposta clara e indiscutível na própria lei. O art. 3º, n.º 3 da lei 27/2008, de 30/6, segundo o qual

“(…)

3 - O asilo só pode ser concedido ao estrangeiro que tiver mais de uma nacionalidade quando os motivos de perseguição referidos nos números anteriores se verifiquem relativamente a todos os Estados de que seja nacional.

(…)”

Consequentemente e tendo o TCA Norte apreciado a questão em termos que se coaduna com a letra clara do art. 3º, n.º 3 da Lei 27/2008, de 30 de Junho, não se justifica a admissão da revista para reapreciação da questão.

Por outro lado, o TCA Norte adiantou ainda outra razão para o indeferimento da pretensão do autor - invocada pela autoridade recorrida – ou seja, a de que pedido de asilo ou de protecção subsidiária foi indevidamente utilizado pelo autor, por ter pretendido induzir, em erro as autoridades apresentando informações ou documentos falsos, uma vez que viajou com um passaporte falsificado e sem visto válido. Daí que, sempre seria invocável o art. 19, 1, a) da Lei 27/2008, de 30 de Junho para justificar o “infundado do pedido”:

“(…) o pedido considerado infundado quando se verifique que: a) O requerente induziu em erro as autoridades, apresentando informações ou documentos falsos ou ocultando informações ou documentos importantes a respeito da sua identidade ou nacionalidade suscetíveis de terem um impacto negativo na decisão;

(…)”.

Deste modo as questões do presente processo ou estão claramente resolvidas na lei (art. 3º, n.º 3 da Lei 27/2008, de 30/6) ou assentam em grande medida na apreciação da concreta situação de facto fora do âmbito da revista, nos termos do art. 12º, 4 do ETAF, (apresentação de informações falsas com vista a induzir em erro as autoridades). Daí que, as referidas questões não sejam de importância jurídica ou social fundamental para o efeito de admissão do recurso excepcional de revista.

Por outro lado, a decisão do TCA Norte mostra-se fundamentada e ancorada na lei aplicável não se justificando – apesar da divergência das decisões das instâncias – a intervenção deste STA com vista a uma melhor interpretação e aplicação do direito.

4. Decisão

Face ao exposto não se admite a revista.

Sem custas (art. 84º da Lei 27/2008, de 30/6).

Lisboa, 28 de Setembro de 2017. – São Pedro (relator) – Costa Reis – Madeira dos Santos.