Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:061/08.4BEBRG
Data do Acordão:05/21/2020
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:MADEIRA DOS SANTOS
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
EMPARCELAMENTO
LOTEAMENTO
LICENÇA DE CONSTRUÇÃO
LICENÇA DE UTILIZAÇÃO
Sumário:Não é de admitir a revista do acórdão revogatório que julgou improcedente a acção dos autos – onde o MºPº pedia a declaração da nulidade de actos que licenciaram a construção e a utilização de edifícios sem a prévia ocorrência de uma operação de loteamento por emparcelamento – se a matéria de facto coligida pelas instâncias esclarece que o local das construções nunca formou um único lote, necessitado (segundo a «lex temporis») do loteamento que o constituísse.
Nº Convencional:JSTA000P25946
Nº do Documento:SA120200521061/08
Data de Entrada:02/21/2020
Recorrente:MINISTÉRIO PÚBLICO
Recorrido 1:MUNICÍPIO DA PÓVOA DE LANHOSO (E OUTROS)
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, no Supremo Tribunal Administrativo:

O MºPº interpôs a presente revista do aresto do TCA Norte que, revogando o acórdão emitido no TAF de Braga – o qual indeferiu a reclamação da sentença declarativa da nulidade de dois actos do Presidente da CM da Póvoa de Lanhoso, relativos à construção de edifícios – julgou improcedente a acção administrativa especial instaurada pelo aqui recorrente.

O MºPº pugna pelo recebimento da revista por esta incidir sobre uma questão relevante e mal julgada pelo tribunal «a quo».
Contra-alegaram os recorridos Município da Póvoa de Lanhoso e A…….., SA, defendendo, nas suas minutas, a inadmissibilidade da revista.

Cumpre decidir.
Em princípio, as decisões proferidas em 2.ª instância pelos TCA’s não são susceptíveis de recurso para o STA. Mas, excepcionalmente, tais decisões podem ser objecto de recurso de revista em duas hipóteses: quando estiver em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, assuma uma importância fundamental; ou quando a admissão da revista for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito («vide» o art. 150º, n.º 1, do CPTA).
O MºPº pediu «in judicio» a declaração de nulidade dos actos impugnados – que licenciaram a construção e a utilização de edifícios implantados em prédios rústicos e destinados ao funcionamento de um Instituto Politécnico – porque eles não foram precedidos da operação de loteamento legalmente exigível para que se efectivasse a reunião dos ditos prédios.
O TAF concordou com essa tese do MºPº e julgou a acção procedente. Mas o TCA disse que a obra licenciada não operou «uma unificação material e jurídica dos prédios», razão por que não houve «uma operação de loteamento por emparcelamento» cuja falta trouxesse a nulidade dos actos atacados. Assim, o acórdão recorrido revogou a pronúncia do TAF e julgou a acção improcedente.
Na sua revista, e para além de sugerir uma nova causa de invalidade – denúncia que é agora anacrónica e ofensiva do princípio da estabilidade da instância – o MºPº insiste na ideia de que houve um emparcelamento caracterizador, à luz do art. 2º, al. i), do DL n.º 555/99, de 16/12 (na redacção ao tempo vigente), de uma real operação de loteamento, todavia não instaurada nem tramitada.
Mas uma «summaria cognitio» aponta, de imediato, para a exactidão do aresto «sub censura». O emparcelamento que o RJUE então submetia ao regime geral dos loteamentos era o que culminava na constituição de um lote (destinado à edificação urbana); tratava-se, portanto, de um emparcelamento «de jure», isto é, de um processo ordenado à eliminação da individualidade das parcelas e à sua fusão ou reunião num novo e único prédio – para que surgisse um novo bem unitário, substitutivo dos que o integraram por agregação.
Sendo as coisas assim, o MºPº só teria razão «in casu» se essa realidade incindível constasse da matéria de facto – de modo a concluir-se que os actos impugnados haviam recaído sobre um único lote. Porém, a factualidade provada esclarece que as construções licenciadas estão implantadas em terrenos descritos na Conservatória sob números distintos. Ora, isto logo exclui, «eo ipso», que tenha ocorrido a constituição de um único lote – e, assim sendo, que se haja preterido a operação de loteamento tendente a constituí-lo.
Portanto, não se justifica receber o recurso para melhoria da aplicação do direito. E a «quaestio juris» em presença, para além de tecnicamente simples, também carece de relevância – até porque, hoje, o RJUE já não alude aos loteamentos fundados em «emparcelamento».
Deve, pois, prevalecer «in hoc casu» a regra da excepcionalidade das revistas.

Nestes termos, acordam em não admitir a revista.
Sem custas.
Lisboa, 21 de Maio de 2020. - Madeira dos Santos (relator) - Teresa de Sousa - Carlos Carvalho.