Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:03185/22.1BELSB
Data do Acordão:03/14/2024
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SUZANA TAVARES DA SILVA
Descritores:RECURSO PER SALTUM
QUESTÃO DE FACTO
Sumário:Não pode ser admitido como recurso per saltum um recurso em que as partes pretendem, claramente, ver reapreciadas questões de facto emergentes de ilações de facto que estão subjacentes à decisão proferida.
Nº Convencional:JSTA000P32015
Nº do Documento:SA12024031403185/22
Recorrente:A... E OUTROS
Recorrido 1:SANTA CASA MISERICÓRDIA ...
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo

I. RELATÓRIO

1. A..., com os sinais dos autos, apresentou no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa – Juízo dos Contratos Públicos a presente acção administrativa de contencioso pré-contratual urgente, contra a Santa Casa da Misericórdia ..., devidamente identificada nos autos, indicando como contra-interessada a B..., S.A., igual com os sinais dos autos; acção que tinha por objecto o concurso público internacional n.º ...21 para aquisição de licenciamento de software de jogo para exploração de lotaria instantânea no portal jogos santa casa e integração com a aplicação mobile jogos santa casa,

2. Por sentença daquele Tribunal, de 31.03.2023, foi decidido julgar a acção parcialmente procedente, por provada, e, em consequência, determinar a anulação do acto administrativo que estipulou a adjudicação à Contra-interessada B..., do concurso público internacional n.º ...21 – Aquisição de licenciamento de software de jogo para exploração de lotaria instantânea no portal Jogos da Santa Casa e Integração com aplicação mobile Jogos Santa Casa.

3. Não se conformando com aquela decisão, a A... interpôs recurso para o Tribunal Central Administrativo Sul.

4. A Contra-interessada B..., S.A., melhor sinalizada nos autos veio interpor recurso subordinado da sentença do TAC de Lisboa

5. Por Decisão Sumária de 16.10.2023 (fls. 2811 do SITAF), o TCAS decidiu declarar esse tribunal incompetente, em razão da hierarquia, para conhecer do presente recurso jurisdicional, declarando competente, para o efeito, o Supremo Tribunal Administrativo.

6. A B..., S.A., Contra-interessada, notificada da decisão que antecede, vem, ao abrigo do artigo 146.º, n.º 3 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (fls. 2823 do SITAF), pronunciar-se no sentido de considerar que o recurso subordinado não encerra apenas questões de direito, mas que abrange também questões de facto, designadamente quanto ao thema decidendum do recurso subordinado.

7. Por nova Decisão Sumária de 06.01.2024 (fls. 2833 do SITAF), o TCAS interpretou o requerimento antes mencionado como uma arguição de nulidade da decisão sumária anterior por violação do princípio do contraditório e decidiu declarar aquela decisão nula com esse fundamento, mas, após ouvir as partes, praticar nova decisão sumária, com o mesmo conteúdo, ou seja, declarando aquele tribunal incompetente, em razão da hierarquia e competente para conhecer dos recursos o Supremo Tribunal Administrativo.

8. Por despacho tabular da relatora original de 01.02.2024 (fls. 2848 do SITAF), foi aceite o recurso per saltum.

9. Porém, compulsados os autos pela nova relatora (fls. 2853 do SITAF), verifica-se que, quer o recurso principal, quer o recurso subordinado, envolvem, inelutavelmente formulações de juízos de facto e não podem, nessa medida, ser conhecidos por este Supremo Tribunal Administrativo sem afectar a garantia da tutela jurisdicional efectiva dos Recorrentes.

Com efeito, uma das questões suscitadas no recurso principal e que é também a questão central do recurso subordinado prende-se com a existência ou não de um erro de julgamento da sentença na ilação de facto em que faz assentar a sua decisão de considerar que os elementos de facto respeitantes à proposta da B... não permitem apurar com rigor se nela estão ou não enunciadas nove mecânicas de jogo diferentes. Ora, para saber se esta decisão é ou não acertada, o tribunal ad quem tem de verificar os factos e confrontar a decisão com os mesmos, algo que está legalmente vedado a este STA.

Tal é suficiente para sustentar a decisão de que os recursos em apreço ultrapassam o âmbito da revista.

Assim, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do artigo 151.º, n.º 4 do CPTA, em rejeitar a admissão do recurso e ordenar a baixa dos autos ao TCA Sul.

Sem custas.

R. N.

Lisboa, 14 de Março de 2024. – Suzana Maria Calvo Loureiro Tavares da Silva (relatora) – Maria do Céu Dias Rosa das Neves – Cláudio Ramos Monteiro.