Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0313/16.0BEAVR
Data do Acordão:03/06/2024
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JOSÉ GOMES CORREIA
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
IRC
MENOS VALIAS
TRIBUTAÇÃO
Sumário:I - O art. 81º nº 2, al. b) do CIRC não só qualificava como menos-valia a diferença negativa entre o resultado da partilha e o custo de aquisição das partes sociais no caso da dissolução e partilha da sociedade, como também fixava o respectivo regime, especial, para a tributação do resultado da partilha, com uma forma própria de cálculo e com deduções específicas.
II - Dado o regime especial assim fixado e na ausência de remissão para o regime de limitação da dedutibilidade então fixado pelo n.º 3 do art. 45.º do CIRC, este não é aplicável àquela situação.
Nº Convencional:JSTA000P31997
Nº do Documento:SA2202403060313/16
Recorrente:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A..., SGPS S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo


1. – Relatório

Vem interposto recurso jurisdicional pelo REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA, visando a revogação da sentença de 05-07-2023, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, que julgou a impugnação intentada por A... SGPS SA, melhor sinalizada nos autos, parcialmente procedente, anulando-se parcialmente a liquidação de IRC de 2012 aqui impugnada, subsistindo esta apenas na parte em que reflecte a correcção no valor de EUR 28.322,66 efectuada à sociedade “B... SA”, sociedade por si dominada.

Irresignado, nas suas alegações, formulou o recorrente Representante da Fazenda Pública, as seguintes conclusões:

I. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida por A..., SGPS, S.A. contra a liquidação adicional de IRC referente ao exercício de 2012, pretendendo a recorrente a sua revogação e substituição por decisão que considere tal impugnação improcedente no segmento respeitante à desconsideração das menos-valias resultantes da liquidação das sociedades participadas.
II. Conformando-se a recorrente com a parte da decisão referente às correcções efectuadas ao abrigo da Circular 7/2004, o objecto do presente recurso centra-se em saber se o douto Tribunal recorrido laborou em erro de julgamento de direito, por incorrecta interpretação e consequente não aplicação do regime previsto no (então) n.º 2 do artigo 32.º do EBF ao caso em apreço, que precludia a concorrência, para a formação do lucro tributável, das menos-valias realizadas pelas SGPS de partes de capital de que fossem titulares.
III. Na sentença, para concluir pela procedência anulatória neste segmento, fez-se apelo à doutrina vertida no douto acórdão do STA de 16-02-2022, proferido no âmbito do processo n.º 0194/15.0BEAVR, considerando ser aqui inteiramente aplicável o entendimento nele vertido.
IV. Porém, o douto Tribunal a quo laborou aqui em erro de julgamento, dado que são distintas as questões que se discutem em cada um dos autos.
V. No caso em dissídio no processo n.º 194/15.0BEAVR, o Tribunal recorrido considerou que a menos-valia, gerada na esfera da impugnante por força da liquidação e partilha de uma das suas participadas, concorria integralmente para a formação do lucro tributável, e não apenas em 50% do seu montante, como pretendia a AT.
VI. Deste modo, a questão aí em apreço prendia-se unicamente com a aplicabilidade ou inaplicabilidade do previsto no n.º 3 do artigo 42.º do Código do IRC ao regime de liquidação preceituado no (então) artigo 75.º do mesmo diploma.
VII. No entanto, nos presentes autos não se discute, face à fundamentação vertida no RIT, se a menos-valia obtida em resultado da liquidação das participadas é dedutível em 50% ou na totalidade do seu valor por via da articulação entre o regime do artigo 75.º e o do artigo 42.º, ambos do Código do IRC, mas simplesmente se esta menos-valia é ou não dedutível por se tratar de uma SGPS, atendendo à redacção em vigor, à data dos factos (2012), do n.º 2 do artigo 32.º do EBF.
VIII. Deste modo, a correcção aqui realizada pelos SIT não se funda na inaplicabilidade ao caso da alínea b) do n.º 2 do artigo 81.º do Código do IRC (anterior artigo 75.º), mas sim na circunstância de, por via da aplicação do regime especialmente previsto para as SGPS, constante no n.º 2 do artigo 32.º do EBF, tal menos-valia, apesar de existente, não poder concorrer para a formação do lucro tributável dessas sociedades.
IX. Com a alteração que introduzida pela Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro, todas as mais e menos-valias realizadas pelas SGPS passaram a não concorrer para a formação do seu resultado fiscal, quando, anteriormente, apenas não concorriam as mais e menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital.
X. A lei, através do n.º 2 do artigo 32.º do EBF, “não desconsidera propriamente as menos-valias em termos fiscais; diz apenas – num benefício fiscal de carinho a este tipo de contribuintes – que o saldo das mais e menos-valias (se detidas por 12 meses) não é tributado. O que se pretende é isentar as mais-valias de imposto (…). Mas como usual regra de reciprocidade – retira também efeito tributário às menos-valias realizadas”.
XI. Deste modo, por razões de reciprocidade, razões técnicas e razões operacionais, o legislador não pretendeu que as menos-valias concorressem para a formação do lucro tributável das SGPS.
XII. Por conseguinte, “a recusa fiscal das menos-valias de partes de capital realizadas pelas SGPS é uma condição adequada, lógica e proporcionada face à criação de uma isenção para as mais-valias realizadas pelas SGPS com a alienação com ganho de partes de capital de que sejam titulares”.
XIII. Em suma, e com o devido respeito que a sentença nos merece, as menos-valias realizadas pela impugnante aquando da liquidação das sociedades dominadas não são dedutíveis ao rendimento tributável daquela, nos termos do n.º 2 do artigo 32.º do EBF, assim laborando o douto Tribunal a quo em erro de julgamento, por incorrecta interpretação e consequente não aplicação daquela mesma norma.
Nestes termos, deverá o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a douta decisão judicial na parte recorrida, por padecer a mesma de erro de julgamento de direito, assim se fazendo JUSTIÇA.

A recorrida A... SGPS, SA, veio apresentar contra-alegações, que rematou com as seguintes conclusões:

1. Conforme resulta das alegações de recurso da FP, este restringe-se ao semento decisório relativo à desconsideração fiscal das menos-valias resultantes da liquidação de sociedades participadas,
2. mais concretamente, ao segmento decisório em que a douta Sentença recorrida julgou a Impugnação procedente e anulou as correcções efectuadas pela AT ao lucro tributável da sociedade participada “C..., SA” (C...), no total € 12.729.539,21 (com influência no resultado fiscal do grupo),
3. assim subdivididas: (i) perdas/menos-valias na liquidação e partilha da sociedade participada D..., SA, (D...) no valor de € 13.866,67; e (ii) perdas/menos-valias na liquidação e partilha da sociedade participada E..., Lda. (E...), no valor de € 12.715.672,54.
4. Ora, contrariamente ao entendimento da FP/Recorrente, a douta Sentença recorrida não merece qualquer censura.
Com efeito,
5. As correcções em questão, operadas pela AT, assentam, segundo a própria AT, no facto das menos-valias emergentes da dissolução e liquidação das participadas D... e E... terem sido apuradas por uma SGPS - as quais não seriam aceites para efeitos fiscais por força do disposto no artigo 32º nº 2 do EBF, redacção aplicável, segundo a AT.
6. Ou seja, as correcções aqui impugnadas fundamentaram-se no facto da AT considerar que aquele artigo 32º nº 2 do EBF impedia em absoluto a relevação das menos-valias incorridas com participações sociais, sejam elas emergentes da sua transmissão, sejam elas decorrentes da liquidação das sociedades participadas em causa.
7. Segundo a douta Sentença recorrida, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, as menos valias apuradas na dissolução e liquidação das sociedades participadas, segundo o disposto no artigo 81º nº 2 b) do CIRC, devem ser aceites na íntegra para efeitos fiscais,
8. por aquele regime constituir um regime jurídico-fiscal especial, autónomo e bastante, relativo aos casos específicos de perdas/menos-valias apuradas na liquidação e partilha de sociedades participadas, como aqui comprovadamente sucedeu,
9. não havendo, por isso, razão para fazer qualquer apelo a quaisquer outras normas relativas às menos-valias, nomeadamente ao regime do artigo 32º nº 2 do EBF previsto para as SGPS’s (ou ao regime geral do artigo 45º nº 3 do CIRC).
10. Como, aliás, é Jurisprudência uniforme e sistemática, designadamente deste Venerando STA, como bem se assinala na douta Sentença recorrida.
11. Ao contrário do pressuposto pela Recorrente/AT, as correcções aqui concretamente em causa não se fundamentaram na factualidade mencionada em D. dos factos provados segundo a douta Sentença recorrida.
12. Com efeito, a factualidade mencionada em D. dos factos provados reporta-se outrossim a correcções relativas a encargos financeiros, na esfera da sociedade “A... SGPS SA” (cfr. também B. a G. dos factos provados),
13. e não a correcções relativas a menos-valias apuradas na dissolução e liquidação de sociedades, apuradas na esfera da sociedade C..., aquelas que aqui estão em causa (cfr. H., I. e J. dos factos provados).
14. Acresce que, como se retira da factualidade provada (cfr. A., H., I. e J. dos factos provados), a sociedade que apurou as menos-valias em questão – a C..., SA (C...) - não é uma SGPS.
15. Com efeito, conforme se retira da factualidade provada, as sobreditas sociedades participadas D... e E..., cuja dissolução/liquidação estava em causa, eram participadas da C..., e não de qualquer SGPS.
16. Pelo que, logicamente, às menos-valias/perdas apuradas na dissolução/liquidação daquelas sociedades não pode ser aplicado o regime do artigo 32º nº 2 do EBF, redacção de 2012 - já que este, como é manifesto em face da letra da lei, era exclusivamente aplicável a SGPS’s.
17. E essas menos-valias, emergentes da liquidação daquelas sociedades participadas, foram obviamente apuradas na esfera da respectiva sócia - a C..., SA (C...).
18. Aquele artigo 32º nº 2 do EBF, redacção de 2012, pressupunha que tivessem sido realizadas menos-valias e que essas menos-valias tivessem sido realizadas por SGPS.
19. Logo, a essas menos-valias, decorrentes da dissolução e partilha daquelas sociedades participadas, é exclusivamente aplicável o regime especial previsto para essas situações específicas – partilha de sociedades participadas – no artigo 81º nº 1 b) do CIRC, como bem decidiu a douta Sentença recorrida.
20. Com efeito, este regime, aplicável aos casos especiais do resultado apurado pelo sócio na sequência de dissolução, liquidação e partilha de sociedade participada (como é o caso), é um regime especial, autónomo e bastante para regular estes casos específicos (de dissolução, liquidação e partilha de sociedades), como é Jurisprudência unânime.
21. É certo que no caso do douto Acórdão do STA (processo n.º 0194/15.0BEAVR) mencionado na Sentença recorrida estava em causa considerar a menos-valia (apurada na dissolução, liquidação e partilha de sociedade participada) em apenas 50% do seu valor, por aplicação do artigo 45º nº 3 do CIRC (redacção de 2008; revogado),
22. versus a desconsideração dessa menos valia em 100%, por aplicação do sobredito regime do artigo 81º nº 2 b) do CIRC, correspondente ao anterior artigo 75º nº 1 b) do CIRC, na redacção então (2008) em vigor.
23. Contudo, o entendimento daquele Acórdão é perfeitamente transponível para o caso concreto em apreço, como bem se salienta na douta Sentença recorrida, pois a conclusão é exactamente a mesma: o referido regime do artigo 81º nº 2 b) do CIRC (anterior 75º nº 2 b) do mesmo diploma legal), aplicável aos casos especiais do resultado apurado pelo sócio na sequência de dissolução, liquidação e partilha de sociedade participada (como é o caso) é um regime especial, autónomo e bastante para regular estes casos específicos (de dissolução, liquidação e partilha de sociedades participadas),
24. não havendo, por isso, razão para apelar a quaisquer outras normas relativas às menos-valias, nomeadamente ao regime do artigo 32º nº 2 do EBF previsto para as SGPS’s (ou ao regime geral do artigo 45º nº 3 do CIRC).
25. Aliás, conforme se deduz do teor do sobredito artigo 32º nº 2 do EBF, redacção de 2012, este é aplicável única e exclusivamente em caso de realização de menos-valias.
26. E essa realização de menos-valias pressupõe naturalmente a transmissão onerosa das partes sociais, como se deduz do disposto no artigo 46º nº 1 do CIRC (Conceito de mais-valias e de menos-valias), redacção de 2012: “Consideram-se mais-valias ou menos-valias realizadas os ganhos obtidos ou as perdas sofridas mediante transmissão onerosa, qualquer que seja o título por que se opere e, bem assim, os decorrentes de sinistros ou os resultantes da afectação permanente a fins alheios à actividade exercida, respeitantes a: (…)”.
27. Ora, como é evidente, em caso de dissolução, liquidação e partilha de sociedades participadas não ocorre qualquer transmissão onerosa de partes sociais – outrossim, estas são extintas, em virtude da extinção das sociedades a que respeitam.
28. E do disposto no sobredito artigo 81º nº 2 b) do CIRC não se extrai o contrário.
29. Com efeito, como resulta do seu teor, este preceito legal limita-se a ficcionar que, caso a diferença entre o valor atribuído aos sócios, em resultado da partilha da sociedade participada, e o custo de aquisição das respectivas partes sociais, seja negativo, essa diferença negativa “é considerada como menos-valia”.
30. Ou seja, a lei limita-se a equiparar essa diferença negativa a uma menos-valia.
31. Daí não se extraindo, pois, que a lei alguma vez considere que na dissolução, liquidação e partilha de sociedades ocorra qualquer realização de mais ou menos-valias por parte do sócio.
32. Com efeito, essa “realização” pressupõe necessariamente a alienação onerosa das partes sociais, como acima se mencionou e deduz do disposto no artigo 46º nº 1 do CIRC – o que não sucede no caso de dissolução, liquidação e partilha de sociedades.
33. Daí que o disposto no artigo 32º nº 2 do EBF, redacção de 2012, seja inaplicável ao caso – contrariamente ao entendimento da AT e da Recorrente/FP.
34. Com efeito, ao contrário do que afirma a FP/Recorrente, o artigo 32º nº 2 do EBF, redacção de 2012, não é aplicável a todas e quaisquer situações.
35. Desde logo, não é aplicação às situações especiais da dissolução, liquidação e partilha de sociedades participadas, pois quanto a essas existe regime especial, autónomo e bastante – o regime do sobredito artigo 81º do CIRC.
36. Sendo certo que a lei especial prevalece sobre a lei geral (cfr. artigo 7º nº 3 do CCivil).
37. As diferenças entre aquele regime especial do artigo 81º do CIRC face ao regime das mais-valias e menos-valias com a transmissão de partes sociais são múltiplas.
38. Em primeiro lugar, o ganho de liquidação não é sequer sempre qualificado como mais-valia, sendo rendimento de capital pela diferença positiva entre o valor recebido em partilha e as entradas de capital.
39. Por outro lado, a perda decorrente da diferença negativa que o legislador não qualificou (“considera-se menos-valia”) apenas é relevante volvidos que sejam três anos sobre a aquisição das partes sociais extintas por liquidação/dissolução/partilha.
40. Mais ainda, não se prevê para os ganhos ou para as perdas que sejam qualificadas como mais-valias ou menos-valias de liquidação/dissolução/partilha qualquer correcção por desvalorização monetária do valor de aquisição das partes sociais extintas.
41. Assim, as perdas decorrentes da dissolução/liquidação/partilha das sociedades participadas estão submetidas a uma disciplina fiscal privativa, que as afasta do quadro fiscal do regime das mais-valias e menos-valias.
42. A transmissão de partes sociais pressupõe a estipulação de um preço, preço esse que resulta da convergência de vontades dos agentes envolvidos.
43. Ora, isto não sucede no caso de uma dissolução/liquidação/partilha de uma sociedade participada: o valor recebido é o valor objectivo dos bens partilhados e não um montante acordado entre as partes.
44. Assim, o facto tributário em presença é sempre a menos-valia de uma extinção de partes sociais, que tem subjacente a extinção duma sociedade - e não qualquer transmissão onerosa dessas mesmas partes sociais
45. E essa perda na liquidação de partes sociais, que o legislador equipara a menos-valia, tem um tratamento fiscal próprio,
46. que o CIRC acolhe exaustivamente no seu artigo 81º, ao prever especificamente a tributação do “resultado da partilha” em face da liquidação e extinção da sociedade participada, sem qualquer remissão para qualquer outro regime legal.
Nestes termos, nos melhores de Direito e com o douto suprimento de V. Exas., negando provimento ao presente recurso e mantendo a douta Sentença recorrida, V. Exas., como sempre, farão inteira JUSTIÇA

Neste Supremo Tribunal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, notificado nos termos do art. 146.º, n.º 1, do CPTA, pronunciou-se no sentido de ser negado provimento ao recurso, com a seguinte fundamentação:

A Fazenda Pública vem interpor recurso da sentença do Mmº Juiz do TAF de Aveiro na parte em que julgou procedente a impugnação judicial do despacho que indeferiu a reclamação graciosa apresentada contra liquidação adicional de IRC, respeitante ao exercício fiscal de 2012.
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É jurisprudência pacífica que o âmbito do recurso é definido pelas conclusões extraídas pela recorrente das respectivas alegações.
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O recurso é delimitado ao segmento decisório respeitante à ilegalidade das correcções que a AT efectuou ao apuramento do lucro tributável da sociedade participada “C..., SA”, por ter desconsiderado as menos-valias resultantes da liquidação e partilha das sociedades participadas D..., SA e E..., Lda.
Alega que o julgador incorreu em erro de julgamento de direito, por incorrecta interpretação e consequente não aplicação do regime previsto no (então) n.º 2 do artigo 32.º do EBF às menos-valias realizadas pela recorrida aquando da liquidação das sociedades dominadas, ao entender que antes se lhe aplica o disposto no artigo 81º nº 2 b) do CIRC ( na redacção em vigor á data), segundo o qual estas devem ser aceites na íntegra para efeitos fiscais, conforme menciona em sede conclusiva, que aqui se dá por reproduzida para todos os efeitos legais e para cuja leitura remetemos
A A..., SGPS, S.A. contra-alegou.
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Versando o recurso exclusivamente sobre matéria de direito, tem-se como fixada a matéria de facto dada como provada na decisão e que aqui se dá por reproduzida, para todos os efeitos legais.
A questão a dirimir, prende-se, primordialmente, em saber se as menos-valias realizadas pela ora recorrida aquando da liquidação das sociedades dominadas não são dedutíveis ao rendimento tributável daquela, nos termos do artigo 32º nº2 do EBF (versão da Fazenda Pública), ou ao invés, devem ser aceites, por se lhes aplicar o regime próprio do artigo 81º nº 2 b) do CIRC.
Dispunham as normas em confronto:
O artigo 32.º nº 2, na redacção introduzida pela Lei n.º 32-B/2002, de 20 de Dezembro, que vigorou até 31/12/2012:
“As mais-valias e as menos-valias realizadas pelas SGPS e pelas SCR mediante a transmissão onerosa, qualquer que seja o título por que se opere, de partes de capital de que sejam titulares, desde que detidas por período não inferior a um ano, e, bem assim os encargos financeiros suportados com a sua aquisição, não concorrem para a formação do lucro tributável destas sociedades.
Artigo 81.º - Resultado da partilha
1 - É englobado para efeitos de tributação dos sócios, no período de tributação em que for posto à sua disposição, o valor que for atribuído a cada um deles em resultado da partilha, abatido do custo de aquisição das correspondentes partes sociais.
2 - No englobamento, para efeitos de tributação da diferença referida no número anterior, deve observar-se o seguinte:
b) Essa diferença, quando negativa, é considerada como menos-valia, sendo dedutível apenas quando as partes sociais tenham permanecido na titularidade do sujeito passivo durante os três anos imediatamente anteriores à data da dissolução, e pelo montante que exceder os prejuízos fiscais transmitidos no âmbito da aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades e desde que a entidade liquidada não seja residente em país, território ou região com regime fiscal claramente mais favorável que conste de lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças.
O art.º 32.º do EBF é uma norma especial aplicável à SGPS, visando as mais-valias e as menos-valias realizadas pelas SGPS, de partes de capital de que sejam titulares.
O art.º 81.º do CIRC aplica-se na parte respeitante á qualificação do rendimento ou perda resultante da partilha da sociedade.
Estabelecia o seu nº 2 o regime e as regras, especiais, aplicáveis ao apuramento das mais e menos-valias decorrentes da partilha pelos sócios, fixando condições para a dedutibilidade das menos-valias apuradas, a saber: i) as participações têm de permanecer na titularidade do sócio nos três anos imediatamente anteriores à dissolução; ii) as participações têm de estar registadas por montante que exceda os prejuízos fiscais transmitidos no âmbito da aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades; iii) a entidade liquidada não pode ser residente em país, território ou região com regime fiscal claramente mais favorável que conste de lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças.
No caso em apreço, estamos perante menos-valias derivada da partilha, resultante da dissolução, das sociedades participadas D..., SA e E..., Lda.
O que está em causa é partilhar todo o património da sociedade (não apenas o capital).
Como refere o Ministério Público, no seu parecer no TAF de Aveiro, “o facto tributário em presença é sempre a menos-valia de uma liquidação de partes sociais que têm subjacente a extinção duma sociedade e não qualquer transmissão dessas mesmas partes sociais.”
Citando o Ac. do STA de 17/2/2016, no processo 01401/14, in www.dgsi.pt:
“O art. 81.º, n.º 2, alínea b), do CIRC, não só qualificava como menos-valia a diferença negativa entre o resultado da partilha e o custo de aquisição das partes sociais no caso da dissolução e partilha da sociedade, como também fixava o respectivo regime, especial, para a tributação do resultado da partilha, com uma forma própria de cálculo e com deduções específicas.”
Neste sentido, v. igualmente o Ac. do STA de 14/10/2020, no processo 01055/18.7BEBRG, in www.dgsi.pt.
Face ao exposto, a realidade económica que se provou é a que se coaduna com o normativo do artigo 81º do CIRC e não com o disposto no então artigo 32º nº2 do EBF.
Falecem assim as premissas da recorrente, no tocante ao eventual erro de julgamento em matéria de direito, sendo nosso parecer que se deve confirmar a bondade do decidido, de julgar aplicável o artigo 81º do CIRC, negando-se provimento ao recurso.
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Os autos vêm à conferência corridos os vistos legais.

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2. FUNDAMENTAÇÃO:

2.1. - Dos Factos:

Na decisão recorrida foi fixado o seguinte probatório reputado relevante para a decisão:

A. A Impugnante é a sociedade dominante do grupo de sociedades cujas restantes empresas são:
(i) E..., Lda. - NIF ...97, até ../../2011;
(ii) F... SGPS, S.A - NIF ...29;
(iii) G..., Lda. - NIF ...40;
(iv) H... - NIF ...23;
(v) I..., S.A - NIF ...98;
(vi) J... SGPS, S.A - NIF ...74 até ../../2012;
(vii) K..., S.A - NIF ...65;
(viii) L..., Lda. - NIF ...73;
(ix) M..., S.A - NIF ...19;
(x) C..., S.A - NIF ...88;
(xi) N..., Lda. - NIF ...92;
(xii) O... e Participações SGPS, S.A - NIF ...10;
(xiii) P..., S.A - ...61;
(xiv) Q..., S.A - ...26 a partir de ../../2012.
[facto incontrovertido e que resulta do RIT elaborado a coberto da inspeção efetuada a coberto da ordem de serviço ...61 constante do procedimento administrativo apenso – fls. 3 e 4 do PA]
B. A “A... SGPS SA” foi objeto de ação inspetiva efetuada a coberto do procedimento inspetivo iniciado com a ordem de serviço ...61 com referência aos exercícios de 2011 e 2012 [cfr. RIT constante do procedimento administrativo apenso, fls. 1 e ss.]
C. No âmbito da ação inspetiva referida no facto precedente foi corrigida a matéria tributável de IRC para o ano de 2012 no valor de EUR 3.912.296,62 [cfr. RIT que adiante se fará referência – fls. 2 do procedimento administrativo].
D. As correções anteriormente referidas tiveram a seguinte motivação no RIT:
“(…)
III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS
III.1. EM SEDE DE IRC — ANO DE 2012
Tendo em conta os valores declarados pelo sujeito passivo em termos individuais em sede de IRC, relativamente ao ano de 2012 este registou um resultado líquido do exercício negativo de € 2.627.725,23 e um prejuízo fiscal de € 2.627.537,73.
Conforme se verifica na demonstração dos resultados do sujeito passivo relativa ao ano de 2012, os gastos com juros suportados no valor de € 3.953.171,97 são muito superiores aos ganhos com juros obtidos no valor de € 1.342.153,89.
De 2011 para 2012 verificou-se um incremento significativo de empréstimos obtidos de empresas do grupo. Através de notificação pessoal de 09-09-2014 efetuada ao sujeito passivo na pessoa de AA, na qualidade de Diretor administrativo (Anexo 3), no seu ponto 1. referimos que "...Através dos registos contabilísticos n.ºs 41 e 43 de 28-06-2012 no diário 09 - Operações Diversas, o sujeito passivo obteve empréstimos no valor de e 45.859.000,00 da sua participada O... e Participações SGPS, S.A e no valor de € 52.688.000,00 da empresa do grupo K…, SGPS, SA. Do exposto, solicitamos que nos indiquem para que destinaram esses empréstimos, indicando ainda por empréstimo mencionado, qual o gasto registado em 2012 relativo a juros suportados e outros gastos desses empréstimos..."
Da resposta obtida (ver Anexo 3), o sujeito passivo esclarece que esses empréstimos obtidos destinaram-se a reforçar os fundos de tesouraria de forma a dar cumprimento a operações que implicavam aquelas necessidades de tesouraria.
No ponto 2. da referida notificação referimos que "... No ano de 2012, o sujeito passivo no apuramento do resultado fiscal de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) não acresceu qualquer valor relativo a encargos financeiros não dedutíveis afetos à aquisição de participações sociais nos termos do n.º 2 do artigo 32º do Estatuto dos Benefícios Fiscais EBF). Do exposto, solicitamos que justifiquem o não acréscimo desses encargos nesse ano..."
Relativamente a este ponto, o sujeito passivo esclarece que "...Na declaração modelo 22 do exercício de 2012 não foi acrescido qualquer valor de encargos financeiros em virtude de não terem ocorrido quaisquer transações de valores mobiliários que originassem mais-valias ou menos-valias, pelo que, em face do disposto no artº 32º, n.º 2 do Estatuto dos Benefícios Fiscais não existe assim lugar a apuramento de encargos financeiros suportados com a sua aquisição..."
O sujeito passivo adquiriu no ano de 2000 uma participação social relativa à totalidade do capital social da O… pelo valor de € 291.201.919,29.
Por forma a reforçar os fundos de tesouraria, o sujeito passivo não alienou no todo ou em parte essa participação social, tendo optado pela contração de empréstimos que originaram gastos suportados com juros.
De acordo com o n.º 2 do artigo 32º do EBF, "...as mais-valias e as menos-valias realizadas pelas SGPS (...) de partes de capital de que sejam titulares, desde que detidas por período não inferior a um ano, e, bem assim, os encargos financeiros suportados com a sua aquisição não concorrem para a formação do lucro tributável destas sociedades..."
Conforme já foi referido, no ano de 2012 o sujeito passivo não acresceu qualquer valor relativo a encargos financeiros suportados imputados à aquisição de partes de capital, conforme o estipulado neste artigo.
De referir que de acordo com o n.º 2 do artigo 32º do EBF, não concorre para o lucro tributável os encargos financeiros suportados com a aquisição de participações sociais, sendo que esse acréscimo nada tem a ver com não terem ocorrido quaisquer transações de valores mobiliários que originassem mais-valias ou menos-valias no ano de 2012, conforme foi mencionado pelo sujeito passivo para o apuramento dos encargos financeiros suportados afetos à aquisição de participações sociais no ano de 2012 recorremos à Circular 7/2004 de 30 de Março da Direção de Serviços de IRC. Esta Circular estipula que os encargos financeiros deverão ser desconsiderados como custos, para efeitos fiscais, no exercício a que os mesmos dizem respeito, isto é, dever-se-á proceder à correção fiscal dos que tiverem sido suportados com a aquisição de participações que sejam suscetíveis de virem a beneficiar do regime especial estabelecido no n.º 2 do artigo 32º do EBF, independentemente de se encontrarem já reunidas todas as condições para a aplicação do regime especial de tributação das mais-valias. Caso se conclua, no momento da alienação das participações, que não se verificam todos os requisitos para aplicação daquele regime, proceder-se-á, nesse exercício, à consideração como custo fiscal dos encargos financeiros que não foram considerados como custo nos exercícios anteriores.
Quanto ao método a utilizar para efeitos de afetação dos encargos financeiros suportados com a aquisição de participações sociais, dada a extrema dificuldade de utilização de um método de afetação direta ou específica e à possibilidade de manipulação que o mesmo permitiria, deverá essa imputação ser efetuada com base numa fórmula que atenda ao seguinte: os passivos remunerados das SGPS deverão ser imputados, em primeiro lugar, aos empréstimos remunerados por estas concedidos às empresas participadas e aos outros investimentos geradores de juros, afetando-se o remanescente aos restantes ativos, nomeadamente participações sociais, proporcionalmente ao respetivo custo de aquisição.
Tendo em conta os registos contabilísticos do sujeito passivo, nomeadamente o balancete contabilístico do ano de 2012 (Anexo 4) e as informações obtidas no decurso da presente ação de inspeção tributária, aplicando a fórmula da Circular 7/2004 de 30 de Março, resultam encargos financeiros afetos à aquisição de participações sociais que deveriam ter sido acrescidos pelo sujeito passivo no apuramento do resultado fiscal de IRC de € 3.912.296,62 no ano de 2012, calculados de acordo com o quadro seguinte:

[IMAGEM]

Tendo em conta a correção apurada, resulta o apuramento de um lucro tributável em sede de IRC corrigido de € 1.284.758,89 no ano de 2012, calculado de acordo com o quadro seguinte:

[IMAGEM]

(…)”
[cfr. resulta do relatório inspetivo constante do procedimento administrativo apenso – fls. 1 a 8].
E. A “A... SGPS SA” foi objeto de ação inspetiva efetuada a coberto do procedimento inspetivo iniciado com a ordem de serviço ...63 com referência ao exercício de 2012 [cfr. RIT constante do procedimento administrativo apenso, fls. 46 e ss.]
F. No âmbito da ação inspetiva referida no facto precedente foi corrigida a matéria tributável de IRC para o ano de 2012 no valor de EUR 1.344.635,17 e corrigidos os prejuízos fiscais dedutíveis em EUR 8.850.590,28 [cfr. RIT que adiante se fará referência – fls. 47 do procedimento administrativo].
G. As correções anteriormente referidas tiveram a seguinte motivação no RIT:
“(…)
III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS
III.1. ANO DE 2012
III.1.1. Em sede de IRC
III.1.1.1. Correção aos resultados fiscais do grupo de sociedades em que o sujeito passivo é a sociedade dominante
Tendo em conta os valores declarados na declaração do grupo de sociedades em que o sujeito passivo é a sociedade dominante, relativamente ao ano de 2012 este registou um resultado fiscal negativo de 19.201.984,83 nos termos do artigo 70º do Código do IRC.
Relativamente ao ano de 2012, o sujeito passivo e mais duas empresas do seu grupo tiveram ações de inspeção tributária externas com correções ao resultado fiscal em sede de IRC, conforme se descreve no quadro seguinte:

[IMAGEM]

No âmbito destas ações de inspeção tributária, as empresas foram notificadas para exercer o direito de audição relativamente a estas correções, não tendo exercido esse direito.
Face a estas correções, e tendo em conta o artigo 70º do Código do IRC, resulta o apuramento de um resultado fiscal corrigido em sede de IRC do grupo de sociedades em que o sujeito passivo é a sociedade dominante de € 1.344.635,17, conforme o quadro seguinte:

[IMAGEM]

III.1.1.2. Correção aos prejuízos fiscais do grupo de sociedades em que o sujeito passivo é a sociedade dominante
Face à declaração de rendimentos de IRC do grupo de sociedades entregue pelo sujeito passivo relativa ao ano de 2012 em que este é a sociedade dominante, registou prejuízos fiscais dedutíveis de € 21.133.728,15.
Tendo em conta as últimas declarações de rendimentos de IRC, bem como dos documentos de correção (DC's) emitidos em cada ano cujos prejuízos fiscais podem ser deduzidos no ano de 2012, nos termos do artigo 522 e 712 desse código, apura-se um prejuízo fiscal dedutível corrigido de € 12.283.137,87 de acordo com o quadro seguinte:

[IMAGEM]

Relativamente ao ano de 2012, de acordo com a alínea b) do n.º 1 do artigo 71.º e com o n.º 2 do artigo 52º, ambos do Código do IRC, "...A dedução a efetuar em cada um dos períodos de tributação não pode exceder o montante correspondente a 75% do respetivo lucro tributável...", do que resulta que relativamente a este ano, o sujeito passivo pode deduzir prejuízos fiscais de € 1.008.476,38 (1.344.635,17 x 75%).
(…)”
[cfr. resulta do relatório inspetivo constante do procedimento administrativo apenso – fls. 48 a 53].
H. A “B... SA” foi objeto de ação inspetiva efetuada a coberto do procedimento inspetivo a coberto da ordem de serviço ...19 com referência aos exercícios de 2011 e 2012 [cfr. RIT constante do procedimento administrativo apenso, fls. 67 e ss.]
I. No âmbito da ação inspetiva referida no facto precedente foi corrigida a matéria tributável de IRC para o ano de 2012 no valor de EUR 12.757.851,87 [cfr. RIT que adiante se fará referência – fls. 68 do procedimento administrativo].
J. As correções anteriormente referidas tiveram a seguinte motivação no RIT:
“(…)
III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS
III.1. EM SEDE DE IRC — ANO DE 2012
Tendo em conta os valores declarados pelo sujeito passivo em sede de IRC, relativamente ao ano de 2012 este registou um resultado líquido do exercício positivo de € 1.805.722,36 e um prejuízo fiscal de € 10.190.128,57. Da análise efetuada aos valores registados e declarados pelo sujeito passivo nesse ano, apuraram-se as seguintes correções fiscais:
1. Perdas registadas relativas à liquidação da empresa participada D..., S.A
Na subconta ...64 — Outros gastos e perdas — Gastos e perdas em filiais e associadas — D..., o sujeito passivo no ano de 2012 registou uma perda de € 187.200,00 resultante da liquidação da sociedade participada D..., S.A (Anexo 3). No apuramento do resultado fiscal de IRC, o sujeito passivo relativamente a essa perda acresceu o valor de € 173.333,33.
Através de notificação pessoal de 26-06-2014 efetuada ao sujeito passivo na pessoa de AA, na qualidade de Diretor administrativo (Anexo 4), no seu ponto 2. referimos que "...No ano de 2012, na subconta ...64 — Outros gastos e perdas — Gastos e perdas em filiais e associadas — D..., o sujeito passivo registou um gasto de e 187.200,00 da liquidação da sociedade participada D..., S.A. (D...). No apuramento do resultado fiscal de IRC, o sujeito passivo relativamente a esse gasto acresceu o valor de € 173.333,33. Do exposto, solicita-se justificação da dedução desse valor e a não totalidade do gasto contabilizado com a perda obtida da liquidação da D..., tendo em conta o disposto a alínea b) do n.° 2 do artigo 81° do Código do IRC e o n.° 2 do artigo 32° do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF) (legislação à data)..."
Da resposta obtida, relativamente a esta perda, o sujeito refere que "...os gastos registados na subconta ...64 no valor de 187.200,00 são relativos à perda na liquidação da subsidiária D... (D...). Para efeitos de apuramento daquele valor considerou-se a natureza de cada parcela que compõem o valor nominal da participação na D..., que se distinguem pelo período de detenção dos títulos em causa, tendo-se aplicado o respetivo valor proporcional atribuído na partilha. Assim, relativamente à menos valia apurada, no valor de € 13.866,67, quanto à participação detida há mais de 3 anos, a mesma foi considerada gasto fiscal. No que respeita à menos valia, no valor de € 173.333,33 referente às restantes participações, detidas por prazo inferior a 3 anos, foi acrescida para efeitos de apuramento do lucro tributável..."
Tendo em conta o disposto a alínea b) do n.° 2 do artigo 81º do Código do IRC (legislação à data), o resultado da partilha atribuído aos sócios resultante da liquidação de uma sociedade abatido do custo de aquisição das correspondentes partes sociais, quando negativo é considerada como menos-valia dedutível apenas quando as partes sociais tenham permanecido na titularidade do sujeito passivo durante os três anos imediatamente anteriores à data da dissolução e pelo montante que exceder os prejuízos fiscais transmitidos no âmbito da aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades.
O regime especial relativo às mais e menos valias registadas pelas SGPS's está consagrado no n.° 2 do artigo 32° do Estatuto dos Benefícios (EBF — legislação à data), o qual refere que "...As mais-valias e as menos-valias realizadas pelas SGPS, pelas SCR e pelos ICR de partes de capital de que sejam titulares, desde que detidas por período não inferior a uni ano, e, bem assim, os encargos financeiros suportados com a sua aquisição não concorrem para a formação do lucro tributável destas sociedades..."
De referir que de acordo com a informação n.º ...8 da Direção de Serviços de IRC, com a alteração do n.° 2 do artigo 31º (atual artigo 32º) do EBF efetuada através da Lei n.° 67-A /2007 de 31-12, todas as mais e menos valias realizadas pelas SGPS's passaram a não concorrer para a formação do resultado fiscal, sendo que antes desta alteração, só não concorriam para o resultado fiscal de IRC as mais e menos valias realizadas pelas SGPS's mediante a transmissão onerosa de partes de capital.
Assim sendo, todas as mais e menos valias realizadas pelas SGPS's relativas a partes de capital não concorrem para o apuramento do resultado fiscal de IRC.
De acordo com a alínea b) do n.° 2 do artigo 81° do Código do IRC (legislação à data), o resultado da partilha atribuído aos sócios resultante da liquidação de uma sociedade abatido do custo de aquisição das correspondentes partes sociais, quando negativo é considerada como menos-valia.
Do exposto, a totalidade da perda registada resultante da liquidação da sociedade participada D..., S.A não concorre para o apuramento do resultado fiscal de IRC relativo ao ano de 2012, do que resulta uma correção de € 13.866,67 (187.200,00-173.333,33).
2. Perdas registadas relativas à liquidação da empresa participada E..., Lda.
Também no ano de 2012, na subconta ...60 - Outros gastos e perdas — Gastos e perdas em filiais e associadas - E...., Lda, o sujeito passivo registou um gasto de € 12.715.672,54 da liquidação da sociedade participada E..., Lda. (Anexo 5). No apuramento do resultado fiscal de IRC, o sujeito passivo relativamente a essa perda não acresceu qualquer valor.
Através de notificação pessoal de 26-06-2014 efetuada ao sujeito passivo referida no n.° anterior (ver Anexo 4), no seu ponto 3. referimos que "... Também no ano de 2012, na subconta ...60 - Outros gastos e perdas — Gastos e perdas em filiais e associadas - E...., Lda, o sujeito passivo registou um gasto de € 12.715.672,54 da liquidação da sociedade participada E..., Lda." (E...). No apuramento do resultado fiscal de IRC, o sujeito passivo não acresceu qualquer valor relativamente a esse gasto no apuramento do resultado fiscal de IRC, pelo que solicita-se justificação da não dedução desse gasto, tendo em conta o disposto a alínea b) do n.° 2 do artigo 81° do Código do IRC e o n.° 2 do artigo 32° do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF) (legislação à data)..."
Da resposta obtida, relativamente a esta perda, o sujeito refere que "...os gastos registados na subconta ...60 no valor de € 12.715.672,54 são relativos à perda na liquidação da subsidiária E..., Lda. (E...), quanto à participação detida há mais de 3 anos, pelo que a mesma releva fiscalmente como gasto fiscal nos termos do art.° 81°, n.° 2, alínea b) do Código do IRC..."
Tal como já foi explanado no n.° anterior, o resultado da partilha atribuído aos sócios resultante da liquidação de uma sociedade abatido do custo de aquisição das correspondentes partes sociais, quando negativo é considerada como menos-valia. Também de acordo com o n.° 2 do artigo 32° do EBF (legislação à data), todas as mais e menos valias realizadas pelas SGPS's relativas a partes de capital não concorrem para o apuramento do resultado fiscal de IRC.
Do exposto, a totalidade da perda registada resultante da liquidação da sociedade participada E..., Lda. não concorre para o apuramento do resultado fiscal de IRC relativo ao ano de 2012, do que resulta uma correção de € 12.715.672,54.
3. Perdas registadas da responsabilidade da empresa R...
No ano de 2012, na subconta ...23 — Fornecimentos e Serviços externos — Contencioso e notariado - M.I. – Iva N.D. 23%, o sujeito passivo registou gastos da responsabilidade da empresa R... no valor de € 28.322,66 (Anexo 6).
Através de notificação pessoal de 26-06-2014 efetuada ao sujeito passivo referida nos n.°s anteriores (ver Anexo 4), no seu ponto 4. referimos que "... No ano de 2012, na subconta ...23 — Fornecimentos e Serviços externos — Contencioso e notariado - M.I. - Iva N.D. 23%, o sujeito passivo registou gastos da responsabilidade da empresa R... no valor de € 28.322,66. Do exposto, solicitamos que justifiquem a dedutibilidade deste gasto, tendo em conta a alínea c) do n.° 1 do artigo 45° do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) (legislação à data)..."
Da resposta obtida, relativamente a esta perda, o sujeito refere que "... Como em tempos a C... teve participação indireta na S..., assumiu então o compromisso de suportar alguns tipos de gastos que pudessem vir a verificar-se inerentes àquela participação, facto que, tendo ocorrido, ao custear, por lapso do qual se solicita a devida revelação, não procedeu ao respetivo acréscimo do valor de € 28.322,66 para efeitos do apuramento do lucro tributável do exercício de 2012..."
Verifica-se assim que o sujeito passivo confirma que não acresceu por lapso os gastos registados da responsabilidade da empresa R... nos termos da alínea c) do n.° 1 do artigo 45° do Código do IRC, do que resulta uma correção ao resultado fiscal declarado do ano de 2012 de € 28.322,66.
4. Total das correções ao resultado fiscal declarado pelo sujeito passivo relativas ao ano de 2012
Face ao descrito nos n.°s anteriores, resulta o apuramento de um lucro tributável em sede de IRC corrigido de € 2.567.733,30 no ano de 2012, calculado de acordo com o quadro seguinte:

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(…)”
[cfr. resulta do relatório inspetivo constante do procedimento administrativo apenso – fls. 67 a 73 verso].
K. A “O... e Participações SGPS SA” foi objeto de ação inspetiva efetuada a coberto do procedimento inspetivo a coberto da ordem de serviço ...29 com referência aos exercícios de 2011 e 2012 [cfr. RIT constante do procedimento administrativo apenso, fls. 159 e ss.]
L. No âmbito da ação inspetiva referida no facto precedente foi corrigida a matéria tributável de IRC para o ano de 2012 no valor de EUR 3.876.461,51 [cfr. RIT que adiante se fará referência – fls. 160 do procedimento administrativo].
M. As correções anteriormente referidas tiveram a seguinte motivação no RIT:
“(…)
III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS
III.1. EM SEDE DE IRC - ANO DE 2012
Tendo em conta os valores declarados pelo sujeito passivo em sede de IRC, relativamente ao ano de 2012 este registou um resultado líquido do exercício positivo de € 7.827.357,19 e um prejuízo fiscal de € 7.537.533,06.
Através de notificação pessoal de 11-06-2014 efetuada ao sujeito passivo na pessoa de AA, na qualidade de Diretor administrativo (Anexo 4), no seu ponto 2. referimos que "...No ano de 2011, o sujeito passivo no apuramento do resultado fiscal de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) acresceu encargos financeiros não dedutíveis afetos à aquisição de participações sociais nos termos do n.° 2 do artigo 32° do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF) no valor de € 2.498.552,79, não tendo acrescido qualquer valor relativo a esses encargos no ano de 2012. Do exposto solicitamos os cálculos utilizados para o apuramento dos encargos financeiros afetos a participações sociais dos anos de 2011 e 2012, justificando o não acréscimo efetuado no ano de 2012..."
Da resposta obtida, relativamente a esses encargos financeiros afetos a participações sociais, no ano de 2011 o sujeito passivo apresenta os cálculos efetuados que resultam da aplicação da Circular 7/2004 de 30 de Março da Direção de Serviços de IRC, apurando-se o valor de € 2.498.552,79 que foi acrescido no apuramento do resultado fiscal nos termos do n.º 2 do artigo 329 do EBF (ver Anexo 4). Este valor foi validado, conforme quadro de apuramento desses encargos financeiros que se segue:

[IMAGEM]

De referir que no ano de 2011, não foi efetuada qualquer transação de valores mobiliários que originasse mais ou menos valias.
Relativamente ao ano de 2012, o sujeito passivo da resposta obtida refere que "... Na declaração modelo 22 do exercício de 2012 não foi acrescido qualquer valor de encargos financeiros em virtude de não terem ocorrido quaisquer transações de valores mobiliários que originassem mais-valias ou menos-valias, pelo que, em face do disposto no artº 32º, n.º 2 do Estatuto dos Benefícios Fiscais não existe assim lugar a apuramento de encargos financeiros suportados com a sua aquisição..."
Como já referimos, no ano de 2011, não foi efetuada qualquer transação de valores mobiliários que originasse mais ou menos valias e o sujeito passivo acresceu corretamente encargos financeiros afetos à aquisição de participações sociais nos termos do n.º 2 do artigo 32º do EBF, apurando esse valor pela aplicação da Circular 7/2004 de 30 de Março da Direção de Serviços de IRC.
O sujeito passivo adquiriu participações sociais de diversas empresas do grupo, conforme quadro resumo constante no Capítulo II.3.1., cujo valor de aquisição foi de € 196.366.952,26.
De acordo com o n.º 2 do artigo 32º do EBF, "...as mais-valias e as menos-valias realizadas pelas SGPS (...) de partes de capital de que sejam titulares, desde que detidas por período não inferior a um ano, e, bem assim, os encargos financeiros suportados com a sua aquisição não concorrem para a formação do lucro tributável destas sociedades..."
Conforme já foi referido, no ano de 2012 o sujeito passivo não acresceu qualquer valor relativo a encargos financeiros suportados imputados à aquisição de partes de capital, conforme o estipulado neste artigo.
De referir que de acordo com o n.º 2 do artigo 32º do EBF, não concorre para o lucro tributável os encargos financeiros suportados com a aquisição de participações sociais, sendo que esse acréscimo nada tem a ver com não terem ocorrido quaisquer transações de valores mobiliários que originassem mais-valias ou menos-valias no ano de 2012, conforme foi mencionado pelo sujeito passivo.
De referir ainda que no ano de 2011, o sujeito passivo no apuramento do resultado fiscal de IRC, acresceu corretamente encargos financeiros afetos à aquisição de participações sociais, utilizando a Circular 7/2004 de 30 de Março da Direção de Serviços de IRC. Nesse ano também não efetuou qualquer transação de valores mobiliários que originasse mais ou menos valias.
Ainda de acordo com as informações obtidas da resposta à notificação efetuada ao sujeito passivo, obtivemos as seguintes informações (ver Anexo 4):
1. Relativamente aos empréstimos obtidos de empresas participadas registados nas subcontas contabilísticas "254 — Financiamentos obtidos — subsidiárias, associadas e empreendimentos conjuntos", foram remunerados nos anos de 2011 e 2012;
2. Relativamente aos empréstimos concedidos registados nas subcontas "266 — Empréstimos concedidos à empresa mãe" e "267 — Empréstimos concedidos a subsidiárias e associadas", todos são remunerados nos anos de 2011 e 2012, com exceção dos suprimentos concedidos à T... BV;
3. Relativamente às Prestações Acessórias efetuadas a empresas participadas registadas nas subcontas "4114 — Prestações acessórias a subsidiárias", todas não foram remuneradas nos anos de 2011 e 2012.
Para o apuramento dos encargos financeiros suportados afetos à aquisição de participações sociais no ano de 2012, e tal como foi efetuado pelo sujeito passivo no ano de 2011, recorremos à Circular 7/2004 de 30 de Março da Direção de Serviços de IRC. Esta Circular estipula que os encargos financeiros deverão ser desconsiderados como custos, para efeitos fiscais, no exercício a que os mesmos dizem respeito, isto é, dever-se-á proceder à correção fiscal dos que tiverem sido suportados com a aquisição de participações que sejam suscetíveis de virem a beneficiar do regime especial estabelecido no n.º 2 do artigo 32.º do EBF, independentemente de se encontrarem já reunidas todas as condições para a aplicação do regime especial de tributação das mais-valias. Caso se conclua, no momento da alienação das participações, que não se verificam todos os requisitos para aplicação daquele regime, proceder-se-á, nesse exercício, à consideração como custo fiscal dos encargos financeiros que não foram considerados como custo nos exercícios anteriores.
Quanto ao método a utilizar para efeitos de afetação dos encargos financeiros suportados com a aquisição de participações sociais, dada a extrema dificuldade de utilização de um método de afetação direta ou específica e à possibilidade de manipulação que o mesmo permitiria, deverá essa imputação ser efetuada com base numa fórmula que atenda ao seguinte: os passivos remunerados das SGPS deverão ser imputados, em primeiro lugar, aos empréstimos remunerados por estas concedidos às empresas participadas e aos outros investimentos geradores de juros, afetando-se o remanescente aos restantes ativos, nomeadamente participações sociais, proporcionalmente ao respetivo custo de aquisição.
Tendo em conta os registos contabilísticos do sujeito passivo, nomeadamente o balancete contabilístico do ano de 2012 (Anexo 5) e as informações obtidas no decurso da presente ação de inspeção tributária, aplicando a fórmula da Circular 7/2004 de 30 de Março, resultam encargos financeiros afetos à aquisição de participações sociais que deveriam ter sido acrescidos pelo sujeito passivo no apuramento do resultado fiscal de IRC de € 3.876.461,51 no ano de 2012, calculados de acordo com o quadro seguinte:

[IMAGEM]

Tendo em conta a correção apurada, resulta o apuramento de um prejuízo fiscal em sede de IRC corrigido de € 3.661.071,55 no ano de 2012, calculado de acordo com o quadro seguinte:

[IMAGEM]

(…)”
[cfr. resulta do relatório inspetivo constante do procedimento administrativo apenso – fls. 159 a 166].
N. Com fundamento nas correções anteriormente referidas foi emitida a liquidação de IRC respeitante ao ano de 2012 detentora do n.º ...30, em 18 de maio de 2015, onde foi apurado o valor a reembolsar de EUR 414.237,50:

[IMAGEM]

[cfr. liquidação anexa à petição de reclamação graciosa e constante de fls. 237 do procedimento administrativo apenso].
O. A liquidação referida no facto precedente foi levada à conta corrente da Impugnante dando origem à emissão de nota de cobrança com a seguinte discriminação e valor a pagar

[IMAGEM]

[cfr. liquidação anexa à petição de reclamação graciosa e constante de fls. 237 do procedimento administrativo apenso].
Atenta a conformação da instância efetuada pelas partes, nomeadamente em função dos pedidos formulados e respetivas causas de pedir, não se alegaram nem provaram outros factos com pertinência para a decisão a proferir.
*

2.2.- Motivação de Direito

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA e 2º., al. e) do CPPT.
No caso, em face dos termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso pela recorrente, a questão que cumpre decidir subsume-se a saber se a decisão vertida na sentença, a qual julgou parcialmente procedente a impugnação, padece de erro de julgamento de direito, por incorrecta interpretação e consequente não aplicação do regime previsto no (então) n.º 2 do artigo 32.º do EBF às menos-valias realizadas pela recorrida, aquando da liquidação das sociedades dominadas, ao entender que antes se lhe aplica o disposto no artigo 81º, nº 2, b) do CIRC (na redacção em vigor à data), segundo o qual estas devem ser aceites na íntegra para efeitos fiscais.
Releva para a solução do pleito, antes de tudo, atentar na normação ínsita em cada um dos preceitos em confronto.
Assim, o artigo 32.º nº 2, na redacção introduzida pela Lei n.º 32-B/2002, de 20 de Dezembro e que vigorou até 31/12/2012 estatuía que “As mais-valias e as menos-valias realizadas pelas SGPS e pelas SCR mediante a transmissão onerosa, qualquer que seja o título por que se opere, de partes de capital de que sejam titulares, desde que detidas por período não inferior a um ano, e, bem assim os encargos financeiros suportados com a sua aquisição, não concorrem para a formação do lucro tributável destas sociedades.”
Por seu turno, prescrevia o Artigo 81.º sob a epígrafe “Resultado da partilha”:
1 - É englobado para efeitos de tributação dos sócios, no período de tributação em que for posto à sua disposição, o valor que for atribuído a cada um deles em resultado da partilha, abatido do custo de aquisição das correspondentes partes sociais.
2 - No englobamento, para efeitos de tributação da diferença referida no número anterior, deve observar-se o seguinte:
b) Essa diferença, quando negativa, é considerada como menos-valia, sendo dedutível apenas quando as partes sociais tenham permanecido na titularidade do sujeito passivo durante os três anos imediatamente anteriores à data da dissolução, e pelo montante que exceder os prejuízos fiscais transmitidos no âmbito da aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades e desde que a entidade liquidada não seja residente em país, território ou região com regime fiscal claramente mais favorável que conste de lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças.”
Do cotejo das normas transcritas brota cristalino, da sua letra e do seu espírito, que enquanto o art.º 32.º do EBF é uma norma especial aplicável à SGPS, visando as mais-valias e as menos-valias realizadas pelas SGPS, de partes de capital de que sejam titulares, o art.º 81.º do CIRC aplica-se na parte relativa à qualificação do rendimento ou perda resultante da partilha da sociedade.
Cingido a essa ratio instituía o nº 2 desse normativo o regime e as regras, especiais, aplicáveis ao apuramento das mais e menos-valias decorrentes da partilha pelos sócios, fixando as seguintes condições para a dedutibilidade das menos-valias apuradas:
(i) as participações têm de permanecer na titularidade do sócio nos três anos imediatamente anteriores à dissolução;
(ii) as participações têm de estar registadas por montante que exceda os prejuízos fiscais transmitidos no âmbito da aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades;
(iii) a entidade liquidada não pode ser residente em país, território ou região com regime fiscal claramente mais favorável que conste de lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças.
Ora, no caso sub judice questionam-se menos-valias decorrentes da partilha a que houve lugar por causa da dissolução das sociedades participadas D..., SA e E..., Lda.
Dito de outro modo: o que está em causa é partilhar todo o património da sociedade e não somente o capital pelo que colhe de pleno a asserção do Ministério Público, de que “o facto tributário em presença é sempre a menos-valia de uma liquidação de partes sociais que têm subjacente a extinção duma sociedade e não qualquer transmissão dessas mesmas partes sociais.”
Nesse sentido, faz-se apelo ao doutrinado no Ac. do STA de 17/2/2016, no processo 01401/14, in www.dgsi.pt no sentido de que “O art. 81.º, n.º 2, alínea b), do CIRC, não só qualificava como menos-valia a diferença negativa entre o resultado da partilha e o custo de aquisição das partes sociais no caso da dissolução e partilha da sociedade, como também fixava o respectivo regime, especial, para a tributação do resultado da partilha, com uma forma própria de cálculo e com deduções específicas.”
Por esse diapasão alinhou o Ac. do STA de 14/10/2020, no processo 01055/18.7BEBRG, in www.dgsi.pt. remetendo para o seguinte bloco fundamentador do primeiro aresto citado:
“… A determinação do lucro tributável dos sujeitos passivos de IRC faz-se nos termos do n.º 1 do art. 17.º do respectivo Código: «O lucro tributável das pessoas colectivas e outras entidades mencionadas na alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º é constituído pela soma algébrica do resultado líquido do exercício e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período e não reflectidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade e eventualmente corrigidos nos termos deste Código».
De acordo com o disposto no art. 20.º, n.º 1, alínea h), do CIRC, «[c]onsideram-se rendimentos [antes, proveitos e ganhos] os resultantes de operações de qualquer natureza, em consequência de uma acção normal ou ocasional, básica ou meramente acessória, nomeadamente (…) h) Mais-valias realizadas; (…)»
No art. 23.º, n.º 1, do mesmo Código especificam-se quais gastos [antes, custos ou perdas] que a lei releva. Após uma definição ampla do conceito de gastos fiscais – «os que comprovadamente sejam indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora» –, o preceito faz uma enumeração meramente exemplificativa, na qual inclui as «menos-valias realizadas» [cfr. alínea l)].
Quanto às variações patrimoniais positivas, diz o n.º 1 do art. 21.º do CIRC: «Concorrem ainda para a formação do lucro tributável as variações patrimoniais positivas não reflectidas no período de tributação, excepto (…) b) As mais-valias potenciais ou latentes, ainda que expressas na contabilidade, incluindo as reservas de reavaliação ao abrigo de legislação de carácter fiscal».
Paralelamente, quanto às variações patrimoniais negativas, dispõe o art. 24.º, n.º 1, do mesmo Código: «Nas mesmas condições referidas para os gastos, concorrem ainda para a formação do lucro tributável as variações patrimoniais negativas não reflectidas no resultado líquido do período de tributação, excepto (…) b) As menos-valias potenciais ou latentes, ainda que expressas na contabilidade».
O n.º 1 do art. 46.º do CIRC dá-nos a definição de mais e menos-valias: «Consideram-se mais-valias ou menos-valias realizadas os ganhos obtidos ou as perdas sofridas mediante transmissão onerosa, qualquer que seja o título por que se opere e, bem assim, os decorrentes de sinistros ou os resultantes da afectação permanente a fins alheios à actividade exercida, respeitantes a: a) Activos fixos tangíveis, activos intangíveis, activos biológicos que não sejam consumíveis e propriedades de investimento, ainda que qualquer destes activos tenha sido reclassificado como activo não corrente detido para venda; b) Instrumentos financeiros, com excepção dos reconhecidos pelo justo valor nos termos das alíneas a) e b) do n.º 9 do artigo 18.º».
O n.º 2 do mesmo artigo indica o método para o respectivo cálculo: «As mais-valias e as menos-valias são dadas pela diferença entre o valor de realização, líquido dos encargos que lhe sejam inerentes, e o valor de aquisição deduzido das perdas por imparidade e outras correcções de valor previstas no artigo 35.º, bem como das depreciações ou amortizações aceites fiscalmente, sem prejuízo da parte final do n.º 5 do artigo 30.º». O valor de realização é definido no n.º 3 do mesmo artigo.
Ou seja, em princípio (Desde que respeitem os requisitos do art. 23.º do CIRC.), as menos-valias e as perdas realizadas por uma sociedade com uma determinada operação comercial concorrem, negativamente, para a formação do lucro tributável do respectivo exercício.
Mas existem algumas limitações, entre as quais ora nos interessa considerar a do art. 45.º do CIRC, com a epígrafe «Encargos não dedutíveis para efeitos fiscais», que no seu n.º 3 estabelecia: «A diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, bem como outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares, concorrem para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor».
Esta norma restritiva do montante de menos-valia susceptível de dedução não existia na versão original do CIRC (Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de Novembro.). Designadamente, no art. 42.º, que correspondia ao referido art. 45.º, nenhuma restrição havia relativamente à dedução das menos-valias. Como deixámos já dito, apenas se afirmava, na alínea l) do n.º 1 do art. 23.º do CIRC, que se consideravam gastos «as menos-valias realizadas».
A referida norma foi aditada (sob o n.º 3) ao então art. 42.º do CIRC (depois 45.º) pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro (Orçamento do Estado ara 2003), com a seguinte redacção: «A diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, incluindo a sua remissão e amortização com redução de capital, concorre para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor».
O Relatório do Ministério das Finanças para o Orçamento do Estado de 2003 (Disponível em
http://www.dgo.pt/politicaorcamental/Paginas/OEpagina.aspx?Ano=2003&TipoOE=Proposta+de+Or%u00e7amento+do+Estado&TipoDocumentos=Lei+%2f+Mapas+Lei+%2f+Relat%u00f3rio.), após referir «[n]o que respeita às receitas, estabelecem-se desde logo duas prioridades, a saber, o combate à fraude e evasão fiscais e o alargamento da base tributável» (pág. 34), enquadrou a medida de «exclusão parcial (50%) das menos-valias registadas na alienação de partes sociais pela generalidade das empresas» no âmbito das alterações em sede de IRC em ordem ao «alargamento da base tributável e medidas de moralização e neutralidade» (pág. 53).
Ulteriormente, com a entrada em vigor da Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2006), o referido n.º 3 do então art. 42.º do CIRC recebeu a seguinte redacção: «A diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, bem como outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares, concorrem para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor».
O Relatório do Ministério das Finanças para este Orçamento (Disponível em
http://www.dgo.pt/politicaorcamental/Paginas/OEpagina.aspx?Ano=2006&TipoOE=Proposta+de+Or%u00e7amento+do+Estado&TipoDocumentos=Lei+%2f+Mapas+Lei+%2f+Relat%u00f3rio.) enquadrou esta alteração no âmbito do «combate à fraude e evasão fiscais e outras medidas direccionadas à consolidação orçamental» (pág. 31).
Ou seja, o n.º 3 introduzido no art. 42.º do CIRC (depois, art. 45.º) pelo Orçamento do Estado para 2003 veio impor uma limitação à dedutibilidade das perdas resultantes de menos-valias, nos termos da qual a diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital concorre em apenas metade do seu valor para a formação do lucro tributável. Sob essa óptica, na realização de uma menos-valia seria determinante apurar se esta resulta da transmissão onerosa de partes de capital. Na afirmativa, haveria de se aplicar a limitação dos 50% da diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias.
Com o Orçamento do Estado para o ano de 2006, a referida limitação viu o seu âmbito de aplicação ser alargado: para além das menos-valias resultantes de alienações onerosas, passou também a incluir as transmissões onerosas de «outras componentes do capital próprio».
A norma, em qualquer das suas versões, integra uma medida anti-abuso, na medida em que o legislador terá pretendido (para além do alargamento da base tributável) evitar a manipulação do resultado fiscal.
Tenha-se presente que, após a republicação do CIRC, efectuada pelo Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de Julho, a norma em questão passou a ser o n.º 3 do art. 45.º.
Vejamos agora o que se passa relativamente à liquidação de sociedades, em ordem a indagar do tratamento fiscal a conceder aos rendimentos dela (rectius, da partilha) eventualmente resultantes para os sócios que sejam pessoas colectivas.
Com a dissolução da sociedade [cfr. arts. 141.º a 145.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC)] inicia-se, normalmente, a fase de liquidação, consistindo esta no conjunto de actos realizados com a finalidade de dar satisfação aos direitos de terceiros e realização de activos, assim se criando as condições para atribuição aos sócios dos valores a partilhar (cfr. arts. 146.º, 147.º e 156.º do CSC) (Para maior desenvolvimento, RAÚL VENTURA, Dissolução e Liquidação de Sociedades, Comentário ao Código das Sociedades Comerciais, Almedina, 1987, pág. 210 e segs.).
Os liquidatários deverão pagar todas as dívidas da sociedade para as quais seja suficiente o activo social (art. 154.º do CSC), a começar pelas dívidas fiscais (Sob pena de ficarem pessoal e solidariamente responsáveis pelas importâncias respectivas (cfr. art. 26.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária).), devendo o activo restante ser destinado, em primeiro lugar, ao reembolso do montante das entradas efectivamente realizadas. Se depois de feito o reembolso integral se registar saldo, este deve ser repartido na proporção aplicável à distribuição dos lucros, devendo, caso contrário, o activo existente ser distribuído pelos sócios, por forma que a diferença para menos recaia em cada um deles na proporção da parte que lhes competir nas perdas da sociedade (n.ºs 3 e 4 do art. 156.º do CSC).
O art. 81.º do CIRC define a natureza dos rendimentos gerados numa operação de partilha, estabelecendo que «[é] englobado para efeitos de tributação dos sócios, no exercício em que for posto à sua disposição, o valor que for atribuído a cada um deles em resultado da partilha, abatido do preço de aquisição das correspondentes partes sociais» (n.º 1) e que «[n]o englobamento, para efeitos de tributação da diferença referida no número anterior, deve observar-se o seguinte: a) Essa diferença, quando positiva, é considerada como rendimento de aplicação de capitais até ao limite da diferença entre o valor que for atribuído e o que, face à contabilidade da sociedade liquidada, corresponda a entradas efectivamente verificadas para realização do capital, tendo o eventual excesso a natureza de mais-valia tributável; b) Essa diferença, quando negativa, é considerada como menos-valia, sendo dedutível apenas quando as partes sociais tenham permanecido na titularidade do sujeito passivo durante os três anos imediatamente anteriores à data da dissolução, e pelo montante que exceder os prejuízos fiscais transmitidos no âmbito da aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades e desde que a entidade liquidada não seja residente em país, território ou região com regime fiscal claramente mais favorável que conste de lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças» (n.º 2).
Ou seja, o art. 81.º estabelecia, nos termos citados, o regime e as regras, especiais, aplicáveis ao apuramento das mais e menos-valias decorrentes da partilha pelos sócios, fixando condições para a dedutibilidade das menos-valias apuradas, a saber: i) as participações têm de permanecer na titularidade do sócio nos três anos imediatamente anteriores à dissolução; ii) as participações têm de estar registadas por montante que exceda os prejuízos fiscais transmitidos no âmbito da aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades; iii) a entidade liquidada não pode ser residente em país, território ou região com regime fiscal claramente mais favorável que conste de lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças.
No caso sub judice, a Fazenda Pública não questiona a existência de uma menos-valia com a partilha das sociedades em consequência da sua liquidação, não questiona o montante da mesma, nem questiona a verificação das referidas condições de dedutibilidade previstas no art. 81.º do CIRC.
Sustenta, no entanto, que essa menos-valia só poderá concorrer para a formação do lucro tributável do exercício do ano de 2010 por metade do seu valor, atento o disposto no n.º 3 do art. 45.º do CIRC. Não porque as menos-valias em causa resultem da alienação onerosa de partes de capital - pois a AT admite que, porque advêm de liquidação e partilha de sociedades, não resultam -, mas porque considera que as mesmas são subsumíveis à 2.ª parte daquele preceito, ou seja, ao conceito de «outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio».
Recordemos aqui a exposição do acórdão arbitral de 25 de Novembro de 2013, proferido no processo n.º 108/2013-T (Disponível em
https://caad.org.pt/tributario/decisoes/decisao.php?s_processo=108%2F2013&s_data_ini=&s_data_fim=&s_resumo=&s_artigos=&s_texto=&id=200.), relatado pelo Conselheiro JORGE LOPES DE SOUSA, no que se refere à interpretação do n.º 3 do art. 45.º do CIRC:
«[…]
A análise do texto normativo revela com clareza que o legislador elegeu, para nele incluir, três tipos de situações que se deverão ter, em função da presunção de boa técnica legislativa, por distintas, a saber:
a. “A diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital”;
b. “outras perdas (...) relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio”;
c. “outras (...) variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio”».
A própria AT reconhece que a situação sub judice não se enquadra na situação da alínea a), pelo que resta verificar da possibilidade de enquadramento nas alíneas b) e c) supra, sendo que a AT sustenta, conclusivamente, que a situação se enquadra na segunda parte da norma (a aditada pelo Orçamento para 2006), afirmando que «o legislador pretendeu abarcar outras situações que não decorressem unicamente de transmissões onerosas da partes de capital» (cfr. conclusões X e seguintes, maxime XII).
Retomemos a exposição do citado acórdão arbitral:
«A aparente abrangência indiscriminada das previsões em causa [refere-se às situações elencadas sob as alíneas b) e c)], poderá, contudo, ser razoavelmente mitigada se se atentar que “perdas” e “outras variações patrimoniais negativas”, serão conceitos, não redundantes, mas dotados de um sentido próprio e distinto.
Para compreender tal facto, será necessário recuar aos artigos 23.º e 24.º do mesmo Código, atentando na evolução terminológica operada pelo artigo [leia-se, pelo Decreto-Lei n.º] 159/2009, de 13 de Dezembro.
Com efeito, antes da entrada em vigor deste último diploma, os artigos referidos do CIRC referiam, respectivamente, que:
· “Consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, nomeadamente os seguintes: (...)”;
· “Nas mesmas condições referidas para os custos ou perdas, concorrem ainda para a formação do lucro tributável as variações patrimoniais negativas não reflectidas no resultado líquido do exercício, excepto: (...)”.
Verifica-se, deste modo, que aquando da consagração da redacção actual do artigo 45.º/3 do CIRC, este Código distinguiu expressamente, para o que aqui releva, três tipos de situações, a saber:
a. Custos;
b. Perdas;
c. Variações patrimoniais negativas não reflectidas no resultado líquido do exercício.
A previsão do artigo 42.º/3 (predecessor do actual 45.º/3), dever-se-á considerar, assim, por reportada a estes conceitos, definidos nos artigos 23.º e 24.º. Deste modo, e por razões óbvias, da previsão daquela norma dever-se-ão ter por excluídos os custos relativos “a partes de capital ou outras componentes do capital próprio”, incluindo-se ali, unicamente, as perdas (tal como definidas no artigo 23.º) e variações patrimoniais negativas (tal como definidas no artigo 24.º), relativas àquelas partes.
E que assim é, ou seja, que a expressão “outras perdas ou variações patrimoniais negativas” utilizada no actual artigo 45.º/3 do CIRC não tem um sentido indiscriminadamente abrangente, mas antes um sentido preciso, definido nos artigos 23.º e 24.º, decorre desde logo do facto de o legislador ter empregue a mesma distinção.
[…]
A alteração normativa implementada pelo Decreto-Lei 159/2009, de 13 de Julho, não terá alterado nada de relevante na matéria em causa. Com efeito, não obstante o corpo do artigo 23.º ter passado a referir-se unicamente a gastos, o certo é que o CIRC continua a utilizar a expressão “perdas”, incluindo no próprio artigo 23.º (cfr. n.º 1, alínea h)). Tal ocorre em coerência, aliás, com o SNC, que nos termos do ponto 2.1.3.e) do anexo ao Decreto-Lei 158/2009 de 12 de Julho, mantém a distinção entre “gastos” e “perdas”.
Deste modo, conclui-se que o artigo 45.º/3 do CIRC aplicável, se reportará a:
a. diferenças negativas entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital;
b. outras perdas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio; e
c. outras variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, sendo que por “perdas” se deve entender os factos qualificáveis como tal à luz do CIRC, e por “variações patrimoniais negativas” se deverá entender variações patrimoniais negativas não reflectidas no resultado líquido do exercício, tal como definidas no artigo 24.º.
Não se incluirão deste modo, no âmbito da norma em causa, os factos qualificáveis como “gastos”, à luz do CIRC, ainda que relativos a partes de capital ou outras componentes do capital próprio.
A própria AT parece reconhecer isto mesmo, já que no “Manual de Preenchimento do Quadro 07, Modelo 22” [a fls. 31 (Disponível em
http://info.portaldasfinancas.gov.pt/NR/rdonlyres/BAFFC60A-E1B8-4217-89E1-17440629A6BA/0/ManualQ07201104052V.pdf.)], a propósito do campo 737, refere que “Neste campo são inscritas, em 50%, as importâncias relativas a outras perdas (que não sejam menos-valias, dado que estas obedecem ao “mecanismo” das mais-valias e menos-valias) relativas a partes de capital ou outras componentes de capital próprio. […]».
Tendo presente o que vimos de dizer, podemos avançar no sentido de que as referidas menos-valias também não se enquadram nas situações previstas sob as alíneas b) e c) acima descritas. Desde logo, porque sendo o art. 81.º, n.º 2, alínea b), do CIRC que, qualificando a natureza dos rendimentos, equipara a menos-valias a diferença negativa entre o resultado da partilha e o custo de aquisição das partes sociais, não faria sentido considerar agora essa diferença como outra perda ou outra variação patrimonial negativa.
Aliás, como bem referiu a Recorrida, existindo, como existe, um regime especial para tributação do resultado da partilha de sociedades no âmbito do qual as menos-valias resultantes da liquidação e partilha de sociedades têm uma forma própria de cálculo e com deduções específicas, mal se compreenderia que lhe fosse também aplicado o regime geral do n.º 3 do art. 45.º do CIRC, a menos que o legislador expressamente remetesse para o mesmo, o que não fez.
Como também salientou a Recorrida, a AT já afirmou que «o art. 67.º, n.º 2, alíneas a) e b) [correspondente ao citado art. 81.º, n.º 2, alíneas a) e b)] não se limita a qualificar como mais-valia a diferença positiva entre o valor das entradas efectivamente verificadas para a realização do capital social e o custo de aquisição das partes sociais e como menos-valia a diferença negativa entre o resultado da partilha e o custo de aquisição das partes sociais, pois define também o respectivo regime de tributação, não lhes sendo, portanto, aplicável, dada a sua distinta natureza, o disposto nos arts. 42.º a 44.º do Código do IRC» (Cfr. Parecer n.º 103/96 do CEF, sancionado por Despacho do Director Geral dos Impostos de 12.03.97). Mais se diz no citado parecer que «[…] ainda que o legislador […] declare que a diferença positiva entre o valor das entradas efectivamente verificadas para a realização do capital social e o custo de aquisição das partes sociais tem a natureza de mais-valia e que a diferença negativa entre o resultado da partilha e o custo de aquisição é considerada menos-valia dedutível não acrescenta que lhe é aplicável o regime fiscal previsto para as mais-valias e menos-valias realizadas, decerto porque não cabem na definição geral dada pelo n.º 1 do art. 42.º [depois, 46.º], o qual atende, sobretudo, à natureza da operação de transferência dos elementos do activo imobilizado».
Ou seja, a própria AT reconhece que a norma do n.º 2 do art. 81.º do CIRC não se limita a qualificar a natureza do ganho como mais-valia, mas também lhe define o respectivo regime tributário, com exclusão do regime fiscal das mais-valias e menos-valias.
Acresce que, como igualmente bem salientou a Recorrida, poderá até haver uma justificação para a não aplicação da medida anti-abuso (limitação a metade do montante dedutível da menos-valia) no caso em que está em causa a diferença negativa entre o resultado da partilha e o custo de aquisição das partes sociais no caso da dissolução e partilha da sociedade e que a lei equipara a menos-valia: é que os riscos de evasão fiscal por manipulação do resultado fiscal não são tão evidentes nos casos da dissolução e partilha de uma sociedade como nos casos de transmissão onerosa de partes sociais.
Assim, a nosso ver nada obsta a que a menos-valia apurada nos termos do art. 81.º, n.º 2, alínea b), do CIRC, concorra integralmente para a formação do lucro tributável do ano de 2010. …”.
Em concomitância com o que se concluiu no Ac. do STA de 14/10/2020, no processo 01055/18.7BEBRG, “…perante o carácter assertivo do que ficou exposto e porque concordamos integralmente com o que ali ficou decidido e respectivos fundamentos, sem olvidar o disposto no n.º 3 do art. 8.º do Código Civil, resta apenas reiterar o que ficou ali consignado, até porque as alegações da Recorrente não têm a virtualidade de colocar em crise o que ficou dito no aresto apontado.
De facto, o artigo 81º nº 2 al. b) do CIRC (na redacção à data do facto tributário) qualificava como menos-valias a diferença negativa entre o resultado da partilha e o custo de aquisição das partes sociais no caso de dissolução e partilha de entidade em causa, como também fixava o respectivo regime especial, para a tributação do resultado da partilha, com um forma própria de cálculo e com deduções específicas e face a esse regime especial e na ausência de remissão para o regime fixado no artigo 45º nº 3 do CIRC este não é aplicável à aquela realidade.
Poderá até haver uma justificação para a não aplicação da medida anti abuso do artigo 45º nº 3 do CIRC, uma vez que os riscos de evasão fiscal por manipulação do resultado fiscal não serão tão evidentes no caso de dissolução e partilha de sociedades e outras entidades como no caso de transmissão onerosa de parte sociais.

Tal significa, como também denota o Ministério Público, que a realidade económica que se provou é a que se coaduna com o normativo do artigo 81º do CIRC e não com o disposto no então artigo 32º nº2 do EBF, pelo que perecem as premissas da recorrente, no tocante ao eventual erro de julgamento em matéria de direito, sendo de confirmar a decisão recorrida ao julgar aplicável o artigo 81º do CIRC, negando-se provimento ao recurso.

*

3. - Decisão:

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.
Custas pela Recorrente.
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Lisboa, 6 de Março de 2024. - José Gomes Correia (relator) - Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia – Anabela Ferreira Alves e Russo.