Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:026276
Data do Acordão:03/13/2002
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ALMEIDA LOPES
Descritores:RECLAMAÇÃO.
LIQUIDAÇÃO.
IRS.
COMISSÃO DE REVISÃO DOS LUCROS TRIBUTÁVEIS.
NULIDADE DE SENTENÇA.
Sumário:A reclamação para a comissão de revisão só é condição de impugnação judicial quando esta tenha por exclusivo fundamento a errónea quantificação da matéria tributável, e não já quando também tenha por fundamento a incompetência ou a duplicação de colecta.
Nº Convencional:JSTA00057336
Nº do Documento:SA220020313026276
Data de Entrada:05/30/2001
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TT1INST DO PORTO.
Decisão:PROVIDO.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - IMPUGN JUDICIAL.
Legislação Nacional:CPT ART84 N1 ART136 N1 ART144.
Aditamento:
Texto Integral: Relatório
Com fundamento em duplicação de colecta (por haver duas liquidações, a impugnada e outra que está em execução), incompetência (por falta de indicação da delegação de competências) e em errónea quantificação da matéria colectável (pelo facto de as correcções efectuadas não corresponderem à realidade), A ... e mulher B ..., residentes no lugar de... , concelho de Felgueiras, deduziram impugnação judicial contra o acto de liquidação de IRS de 1993, praticado pelo 1º Serviço de Finanças de Felgueiras.
Por sentença de fls. 113 e seguintes, a Mª Juíza do Tribunal Tributário do Porto (2º Juízo) julgou procedente a excepção de caducidade do direito de deduzir impugnação judicial, pois os impugnantes não cumpriram a condição legal prévia de deduzirem reclamação atempada para a Comissão de Revisão contra o erro na quantificação ou nos pressupostos de determinação da matéria tributável por métodos indirectos.
Inconformados com esta sentença, os impugnantes recorreram para este STA, tendo apresentado as suas alegações de fls. 126 e seguintes, nas quais concluíram pelo erro de julgamento da sentença, pois alegaram, além da errónea qualificação e quantificação da matéria colectável, o vício de incompetência, sendo certo que o conhecimento deste não depende de prévia reclamação para a Comissão de Revisão.
Não houve contra-alegações.
Neste STA, o MºPº emitiu douto parecer nos termos do qual o recurso merece provimento, sendo de qualificar como nulidade da sentença a falta de conhecimento das duas questões postas na impugnação e que não dependem de reclamação prévia para a Comissão de Revisão.
Corridos os vistos cumpre decidir a questão de saber se a decisão recorrida deve ser confirmada ou reformada, sendo certo que vem dado como provado que em 4 de Fevereiro de 1997 os impugnantes apresentaram reclamação dirigida à Comissão de Revisão, a qual foi rejeitada por ser extemporânea.
Fundamentos
A questão de direito que se discute é a de saber se, em Fevereiro de 1997, a reclamação para a Comissão de Revisão da decisão de fixação da matéria tributável era condição de impugnação judicial somente com fundamento em errónea quantificação da matéria tributável, ou era também condição de impugnação com outros fundamentos, como a duplicação de colecta e a incompetência.
A Mª Juíza a quo entendeu que a reclamação era condição da impugnação, qualquer que fosse o vício nesta alegado. Por sua vez, os recorrentes entendem que a reclamação só era condição de impugnação com fundamento em errónea quantificação da matéria tributável.
Importa, desde já, decidir se estamos em face de uma nulidade da sentença, como pretende o MºPº.
Há nulidade de sentença quando há falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar (artº 144º do CPT).
Ora, a Mª Juíza a quo não se deixou de pronunciar sobre as questões que lhe foram postas. O que acontece é que está implícito no seu julgamento que a reclamação para a Comissão de Revisão é condição prévia de qualquer impugnação, qualquer que seja a sua fundamentação ou os vícios nela alegados. Se este julgamento está ou não correcto é uma questão de fundo, que nada tem a ver com um vício formal da sentença. A ser verdadeiro o julgamento feito pela Mª Juíza a quo, ela não precisava de se pronunciar sobre os vícios da duplicação de colecta e de incompetência.
Logo, não há nulidade de sentença, pois não houve omissão de pronúncia. O que há é erro de julgamento, como se vai demonstrar.
Nos termos do artº 84º, nº 1, do CPT, a decisão que fixe a matéria colectável COM FUNDAMENTO NA SUA ERRÓNEA QUANTIFICAÇÃO, cabe reclamação dirigida à comissão de revisão. De acordo com o nº 3, a reclamação para a comissão de revisão É CONDIÇÃO DA IMPUGNAÇÃO JUDICIAL COM FUNDAMENTO EM ERRÓNEA QUANTIFICAÇÃO DA MATÉRIA TRIBUTÁVEL. De acordo com o artº 136º, nº 1, do CPT, A IMPUGNAÇÃO DOS ACTOS TRIBUTÁRIOS COM BASE EM ERRO NA QUANTIFICAÇÃO DA MATÉRIA TRIBUTÁVEL DEPENDE DE PRÉVIA RECLAMAÇÃO PARA A COMISSÃO DE REVISÃO.
Ora, resulta destas disposições que a reclamação para a comissão de revisão só é condição da impugnação judicial quando esta tenha como exclusivo fundamento A ERRÓNEA QUANTIFICAÇÃO DA MATÉRIA TRIBUTÁVEL. Se o fundamento da impugnação judicial for outro, mormente uma questão de direito, já a reclamação para a comissão de revisão não é condição de impugnação judicial. E compreende-se que assim seja, pois os membros da comissão de revisão podem não ser juristas e podem não ter competência técnica para a resolução de questões de direito. A sua competência está direccionada para a decisão de questões técnicas, de questões de quantificação a partir de métodos de prova indirecta, como seja presunções e estimativas. O vício de duplicação de colecta põe ao órgão decisor uma questão de direito. O vício de incompetência também coloca uma questão de direito.
Poderia dizer-se que a falta de reclamação prévia atempada para a comissão de revisão torna definitiva a matéria colectável, pelo que o contribuinte jamais poderá discutir a matéria colectável definitivamente fixada. Mas acontece que o acto de liquidação pode estar afectado por outros vícios que nada tenham a ver com a determinação da matéria colectável. A errónea quantificação da matéria colectável não é o único vício que pode afectar uma liquidação, pois pode haver outras ilegalidades e a lei tem de ser respeitada, seja material ou adjectiva.
Aliás, na sentença reconhece-se que a reclamação para a comissão de revisão é condição da impugnação judicial “fundada em erro na quantificação ou nos pressupostos de determinação da matéria tributável por métodos indirectos”.
Só por lapso se disse, depois, que a reclamação para a comissão de revisão é uma “condição de procedibilidade”. É condição de procedibilidade apenas quanto ao vício de errónea quantificação da matéria tributável, mas não é condição de procedibilidade para outros vícios do acto de liquidação.
Deste modo, a sentença recorrida não pode deixar de ser reformada, a fim de o tribunal recorrido proferir nova sentença a conhecer dos vícios alegados (duplicação de colecta e incompetência), pois estes nada têm a ver com a errónea quantificação da matéria tributável.
Decisão
Nestes termos, acordam os juízes deste STA em conceder provimento ao recurso e em revogar a sentença recorrida, devendo os autos voltar à 1ª instância para aí serem conhecidos os vícios que não sejam a errónea quantificação da matéria tributável.
Sem custas.
Lisboa, 13 de Março de 2002
José Joaquim Almeida Lopes - (Relator) - Alfredo Madureira - Brandão de Pinho