Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0667/17.0BEAVR 0528/18
Data do Acordão:12/12/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO DELGADO
Descritores:EXTINÇÃO DO PROCEDIMENTO
CONTRA-ORDENAÇÃO
SOCIEDADE
INSOLVÊNCIA
Sumário:A declaração de insolvência constitui um dos fundamentos de dissolução das sociedades e essa dissolução equivale à morte do infractor, em harmonia com o disposto nos artigos 61.º e 62.º do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT) e no artigo 176.º, nº 2, alínea a) do Código de Procedimento e de Processo Tributário, daí decorrendo a extinção do procedimento contra-ordenacional.
Nº Convencional:JSTA000P23947
Nº do Documento:SA2201812120667/17
Data de Entrada:05/24/2018
Recorrente:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:MASSA INSOLVENTE DE A............, LDA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – Vem a Autoridade Tributária e Aduaneira recorrer para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, que nos autos de recurso da decisão administrativa de aplicação de coima no valor de € 13.382,84, aplicada pelo Chefe do Serviço de Finanças de Santa Maria da Feira-2 no âmbito do processo de contra-ordenação n° 3441201606000001459 declarou extinto o procedimento contra-ordenacional contra a Massa Insolvente de A…………, ldª.

Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
«1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença datada de 28/02/2018, que julgou procedente o recurso interposto nos termos do artigo 80.º do RGIT, por Massa Insolvente de A…………, Lda., da decisão administrativa de aplicação da coima única no valor de € 13.382,84, acrescida de custas no valor de € 76,50, determinando a extinção do processo de contraordenação com o n.º 34412016060000014569, em razão da declaração de insolvência da arguida, sendo esta causa extintiva da sua responsabilidade contraordenacional, a AT, não podia ter prosseguido com o procedimento de contraordenação.
2. Contudo, e salvo o devido respeito, não pode a Fazenda Pública concordar com tal entendimento, pois considera que a dissolução da arguida na sequência da sua declaração de insolvência não é equiparável à morte do arguido para efeitos do disposto no artigo 61.º, n.º 1, alínea a) do RGIT.
3. De acordo com o disposto no artigo 61.º, alínea a) do RGIT, o procedimento por contraordenação extingue-se com a morte do arguido.
4. Enquanto causa de extinção da responsabilidade contraordenacional, a morte a que a lei se refere, significa o fim da vida física de uma pessoa; é o acontecimento, físico e da natureza, que faz terminar a vida e constitui um momento inelutável da existência de cada indivíduo inerente à própria natureza do género humano, fazendo cessar a personalidade jurídica de acordo com o disposto no artigo 68.º, n.º 1 do CC.
5. Neste aspeto, a “morte”, como categoria da natureza com relevância normativo-jurídica, é co-natural ao homem. Já porém no que respeita às pessoas colectivas, o facto “morte” apresenta-se-nos sob a forma de extinção.
6. As pessoas coletivas como tal, não estão tocadas pelo momento da “morte” que faz cessar a personalidade da pessoa singular, pelo que se pode dizer que, neste sentido, não “morrem”, embora, como entidades com existência determinada por actos de vontade de criação e de extinção, possam extinguir-se, deixando, então, de ser construções instrumentais do homem para agirem como centros autónomos de imputação de direitos e deveres.
7. Daí que a assimilação, a extensão ou a equiparação da noção de “morte” exclusiva na natureza e na configuração diretamente normativo-jurídica das pessoas singulares, às formas de extinção das pessoas coletivas, salvo melhor opinião, não deva ser feita tout court, para efeitos de determinar a extinção da sua responsabilidade contraordenacional.
8. É que a extinção de uma pessoa coletiva, diversamente, por ser uma criação instrumental do direito, pode não determinar, por si mesma, que nada de si permaneça, continuando, assim, algum “substrato” afeto ao desempenho, ainda, que sob outra perspetiva jurídico-funcional, das finalidades que foram a sua razão de ser.
9. Se é certo que, por força do disposto nos artigos 141.º, n.º 1, e), 146, n.º 2 e 160.º n.º 2, todos do CSC as sociedades comerciais se dissolvem pela declaração de insolvência, também não deixa de ser verdade que, ao invés das pessoas singulares cuja personalidade cessa com a morte (artigo 68.º, n.º 1 do CC), aquelas mantêm a personalidade jurídica na fase da sua liquidação, cujo termo ocorrerá apenas aquando do registo do encerramento dessa liquidação.
10. A sociedade, dissolvida pela declaração de insolvência, entra em liquidação, não se extingue (cfr. artigo 146.º do CSC). A sua extinção só acontece mais tarde, com o registo do encerramento da liquidação, conforme determina o artigo 160.º, n.º 2 do CSC, ou seja, é necessário o preenchimento deste requisito de registo de encerramento da liquidação da sociedade para que se possa aceitar a inequívoca “morte” societária com a inerente produção dos efeitos extintivos a que se refere o artigo 61.º, alínea a) do RGIT.
11. E, no caso de insolvência só com o registo de encerramento do processo após o rateio final, se e quando o mesmo tiver lugar (cfr. artigo 234.º, n.º 3 do CIRE), sendo apenas neste momento que a extinção é equiparável à morte do arguido e não com a mera declaração de insolvência.
12. Antes de algum destes registos, a sociedade comercial mesmo que dissolvida por insolvência (cfr. artigo 141.º, n.º 1 do CSC), continua a ter personalidade jurídica, sendo-lhe aplicáveis, com as necessárias adaptações, as disposições que regem as sociedades não dissolvidas (cfr. artigo 146.º, n.º 2 do CSC), isto porque, a necessidade de exercer direitos e de cumprir obrigações, nos vários domínios, que subsistem durante a fase de liquidação justifica a manutenção da personalidade jurídica.
13. Aliás, os efeitos da dissolução da sociedade que decorrem da declaração de insolvência têm reflexo e repercutem-se, essencialmente, sobre o funcionamento dos seus órgãos sociais, cujos poderes ficam limitados ou são transferidos para o AI (cfr. artigos 81.º, 82.º e 156.º do CIRE).
14. A declaração de insolvência não implica necessariamente a dissolução e liquidação da sociedade, pois pode decidir-se pelo seu encerramento e liquidação ou recuperação e manutenção em funcionamento (cfr. artigos 192.º, 195.º, n.º 2, alínea c) e 209.º a 216.º do CIRE) acaso tal objectivo se mostre exequível e conforme ao deliberado em assembleia de credores (artigo 156.º, n.º 2 do CIRE).
15. Preservando a pessoa coletiva a sua personalidade jurídica, consequentemente, a sua personalidade tributária tal como definida no artigo 15.º da LGT), também, não é afectada com a declaração de insolvência, independentemente do destino que possa vir a ter, a sua recuperação mediante a retoma da atividade ou a sua liquidação, não tendo, por isso, lógica alternar, de forma intermitente, a responsabilidade contraordenacional da sociedade por ilícitos tributários praticados, antes de cessada, mediante o registo de encerramento da respetiva liquidação, a personalidade da entidade que os praticou.
16. Só com a conclusão da liquidação e feito o registo de encerramento da liquidação é que cessa a personalidade jurídica, só então é que se pode considerar extinta a pessoa coletiva e até esta se manter não pode ser considerada extinta a sua responsabilidade contra-ordenacional.
17. No caso concreto, a arguida foi declarada insolvente por sentença de 04/07/2016, mas ainda não foi objeto de liquidação e encerramento, com o respetivo registo, consequentemente, ainda não “morreu”, o que não permite consolidar e afirmar, como faz a douta sentença recorrida, o juízo de extinção da pessoa coletiva nos termos da alínea a) do artigo 61.º do RGIT, bem como não permite determinar a extinção do procedimento contraordenacional.
18. Pelo que, entende a Fazenda Pública com a ressalva do devido respeito, que o Tribunal “a quo” incorreu em erro de julgamento, que resulta da errónea aplicação das normas legais aplicáveis, nomeadamente, dos artigos 61.º, n.º 1, alínea a) e 62.º ambos do RGIT, do artigo 160.º n.º 2 do CSC e 234.º, n.º 3 do CIRE.
19. Termos em que, deverá a sentença de que ora se recorre, ser revogada e substituída, por uma que julgue improcedente o recurso interposto da decisão de aplicação da coima, com as legais consequências.
2 - Não foram apresentadas contra-alegações.

3 - Neste Supremo Tribunal Administrativo o Exmº Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido do provimento do recurso, argumentando, em síntese, que há razão de ser na aplicação da coima, desde logo porque confere coactividade à obrigação imposta ao sujeito passivo e por outro lado porque exerce esse condicionamento sobre os órgãos da sociedade ou sobre o administrador da insolvência, cumprindo assim a sua finalidade de dissuasão ou prevenção e de repressão da conduta ilícita.
Mais argumenta que para efeitos de extinção do procedimento contra-ordenacional só é equiparável à morte de pessoas singulares a extinção da pessoa colectiva, a qual ocorre com o registo do encerramento da liquidação e não com a sua dissolução decorrente da declaração de insolvência.

4 - Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
5 - Em sede factual apurou-se em primeira instância seguinte matéria de facto:

A) Em 13/05/2016, contra a sociedade A…………, Lda., foi levantado auto de notícia, através da ordem de serviço n.º OI20160019401, pela prática da contraordenação tipificada nos artigos 114.º, n.ºs 2 e 3 e 26.º, n.º 4 do RGIT, por infração ao disposto artigos 99.º, 100.º, 101.º e 98.º, n.º 3, todos do CIRS, do qual consta, entre o mais, o seguinte:

– cfr. fls. 7/8 dos autos.
B) Com base no referido auto de notícia, na mesma data, foi autuado o processo de contraordenação n.º 34412016060000014569 pelo Serviço de Finanças de Santa Maria da Feira-2 – cfr. fls. 5 dos autos.

C) Em 18/05/2016, o Sr. Chefe do Serviço de Finanças determinou, nos termos do artigo 55.º do RGIT, a suspensão do processo de contraordenação para efeitos de liquidação do imposto – cfr. fls. 9 dos autos.

D) Por decisão proferida em 04/07/2016, no âmbito do processo de insolvência n.º 2344/16.0TBOAZ, a correr os seus termos na Comarca de Aveiro – Instância Central – 2.ª Secção Comércio – J2, a sociedade A…………, Lda., NIPC ………, foi declarada insolvente, tendo sido nomeado como Administrador da Insolvência …………, com domicílio profissional na Rua ………, Edifício ………, ……, Anadia, 3780-…… Anadia – cfr. fls. 20/22 dos autos.

E) Pelo ofício n.º 1561/2017, expedido por correio registado em 15/03/2017, a recorrente foi notificada para apresentar defesa – cfr. fls. 14/15 dos autos.

F) Em 30/03/2017, a recorrente apresentou a sua defesa por requerimento remetido ao Serviço de Finanças, por correio eletrónico, pelo seu Administrador de Insolvência – cfr. fls. 16/19 dos autos.

G) Em 04/04/2017, foi emitida decisão de fixação de coima, da qual se extrai o seguinte:



[…]


cfr. fls. 25/27 dos autos.

H) A recorrente foi notificada da decisão a que se alude na alínea que antecede pelo ofício n.º 2063/2017, expedido por correio registado em 06/04/2017 – cfr. fls. 28/29 dos autos.

6 - Do objecto do recurso

Da análise do segmento decisório da sentença e dos fundamentos invocados pela Autoridade Tributária e Aduaneira para pedir a sua alteração, podemos concluir que a questão objecto do recurso consiste em saber se incorre em erro de julgamento a decisão recorrida ao sufragar o entendimento de que, perante a insolvência da arguida (A…………, ldª), ocorre a extinção da responsabilidade contra-ordenacional e a consequente extinção do respectivo procedimento por contra-ordenação nos termos do art. 61º, al. a) do RGIT.

Não conformada vem a Fazenda Pública interpor o presente recurso.
Alega no essencial que a sentença enferma de erro de julgamento, com violação da al. a) do art. 61° e do art. 62° do RGIT e do nº 2 do art. 160° do CSC, pois que, não obstante a arguida haja sido declarada insolvente, tal não permite afirmar o juízo de extinção da pessoa colectiva nos termos da referida al. a) do art. 61° do RGIT, bem como não permite determinar a extinção do procedimento contra-ordenacional; ou seja, a declaração de insolvência da arguida não é determinante da extinção do procedimento contra-ordenacional por morte do infractor, por não enquadrável no apontado normativo, uma vez que não pode ser equiparada a insolvência declarada por sentença transitada em julgado à extinção da pessoa colectiva.

Vejamos, pois.

Este Supremo Tribunal Administrativo já se pronunciou por diversas vezes sobre questão similar à ora suscitada e no sentido de que a declaração de insolvência constitui um dos fundamentos de dissolução das sociedades sendo que essa dissolução equivale à morte do infractor, em harmonia com o disposto nos artigos 61.º e 62.º do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT) e no artigo 176.º, nº 2, alínea a) do Código de Procedimento e de Processo Tributário, daí decorrendo a extinção do procedimento contra-ordenacional, da obrigação do pagamento de coimas e da execução fiscal instaurada tendente à sua cobrança coerciva - cf., neste sentido, Acórdãos 617/10, 1107/12 e 638/14 e, por mais recentes, os Acórdãos de 21.10.2015, recurso 610/15, de 04.11.2015, recurso 834/15, de 1.06.2016, recurso 515/16, de 20.12.2017, recurso 309/17, de 24.01.2018, recurso 1311/17, de 28.02.2018, recurso 314/17 e de 12.09.2018, recurso 505/18, todos in www.dgsi.pt.

Concordamos com esta jurisprudência cuja fundamentação jurídica tem plena aplicação também no caso vertente, e que aliás, colhe apoio da doutrina, nomeadamente de Alfredo José de Sousa e Silva Paixão (Código de Processo Tributário, 4ª ed., p. 425.), António Tolda Pinto e Jorge Manuel dos Reis Bravo (Regime Geral das Infracções Tributárias, Coimbra Editora, pag. 195) e de Jorge Lopes de Sousa, (Código de Procedimento e Processo Tributário, Anotado e Comentado, Vol. III, 6ª ed., Anotações 6 a 8 ao art. 176º, pp. 306 a 308.), obra esta em que salienta que «…é essa a única solução que se harmoniza com os fins específicos que justificam a aplicação de sanções, que são de repressão e prevenção e não de obtenção de receitas para a administração tributária».
Efectivamente de acordo com o disposto nos arts. 61º e 62º do RGIT, o procedimento por contra-ordenação extingue-se com a morte do arguido, sendo que também a obrigação de pagamento da coima e de cumprimento das sanções acessórias se extingue com a morte do infractor.
Ora à morte do infractor deve ser equiparada a extinção da pessoa colectiva arguida no processo de contra-ordenação, sendo que a sociedade se considera extinta pelo encerramento da liquidação (artº 160º do CSC).
Como sublinha Jorge Lopes de Sousa, no seu Código de Procedimento e Processo Tributário, Áreas Edit., 6ª edição, Volume 3º, pag. 307, «mantendo embora a sociedade dissolvida, em liquidação, a sua personalidade jurídica - art. 146°, n.º 2 do CSC - são, com a declaração de falência, apreendidos todos os seus bens, passando a constituir um novo património, a chamada "massa falida": um acervo de bens e direitos retirados da disponibilidade da sociedade e que serve exclusivamente, depois de liquidado, para pagar, em primeiro lugar, as custas processuais e as despesas de administração e, depois, os créditos reconhecidos.
Pelo que, então, já não encontrará razão de ser a aplicação de qualquer coima.»

Acresce que, como ficou dito nos Acórdãos desta secção de 24.01.2018 e de 12.09.2018, proferidos nos recursos 1311/17 e 505/18, respectivamente, «Também o CIRE, referindo-se ao momento da extinção das obrigações fiscais de sociedade insolvente, estabelece neste art. 65º que as mesmas (obrigações declarativas e fiscais) necessariamente se extinguem com a deliberação de encerramento da actividade do estabelecimento (nos termos do nº 2 do art. 156º), o que deve ser comunicado oficiosamente pelo Tribunal à AT para efeitos de cessação da actividade; sendo que, na falta daquela deliberação, as ditas obrigações fiscais passam a ser da responsabilidade daquele a quem a administração do insolvente tenha sido cometida e enquanto esta durar. Ou seja, em termos estritamente fiscais e, consequentemente, para aplicação de coimas por incumprimento de obrigações fiscais, também no âmbito do CIRE (e tal como já se entendia no âmbito do CPEREF e do C.S.Comerciais) não há que remeter para o encerramento da fase de liquidação e partilha da sociedade insolvente, a libertação da respectiva responsabilidade».


Sendo de manter tal jurisprudência e remetendo-se para os respectivos fundamentos, resta negar provimento ao recurso.

7. Decisão:

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.

Custas pela Fazenda Pública.
Lisboa, 12 de Dezembro de 2018. – Pedro Delgado (relator) – Isabel Marques da Silva – Ascensão Lopes.

Segue acórdão de 6 de Fevereiro de 2019:

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1. Vem a Fazenda Pública, requerer a reforma da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo proferido nos presentes autos em 12.12.2018 (fls. 112 a 120), invocando o disposto no nº 1 do art. 616º e nº 1 do art. 666º, ambos do Código de Processo Civil.

Alega, em síntese, que estamos perante um recurso em processo de contra-ordenação no qual a sentença proferida no Tribunal Tributário (TT) de Lisboa declarou extinto o Recurso de CO.

Acrescenta que o acórdão de 12.12.2018 negou provimento ao recurso e condenou a recorrente FP em custas.

Concluiu que a condenação em custas pela FP não se pode manter, porquanto, em processo de contra-ordenação tributária, inexiste norma legal que preveja a condenação da FP, quer em custas quer no pagamento de taxas de justiça.

Refere que neste sentido concluíram, entre muitos, os acórdãos do STA de 24-02-2016 processo 01408/15, de 13-12-2017 processo 712/17, de 04-10-2017 processo 0721/17, de 20-09-2017 processo 0560/17, de 13-09-2017 processo 0702/17 e de 11-01-2017 processo 01283/16.

*

2. Com dispensa de vistos dos Ex.mos Conselheiros Adjuntos, dada a simplicidade da questão a apreciar, cumpre decidir.

3. Tem razão a reclamante FP.

Com efeito a questão da condenação em custas da Fazenda Pública foi já apreciada, entre outros, nos acórdãos deste Supremo Tribunal Administrativo de 23.01.2019, recurso 03044/12.6BELRS, de 13/12/2017 e 28/02/2018, processos n.ºs 0703/17 e 01151/17, respectivamente, e nos acórdãos de 24/02/2016, recurso n.º 01408/15 e 23/11/2016, recurso n.º 01106/16, que trataram de casos idênticos.

Acompanha-se tal orientação jurisprudencial, por inexistirem motivos para dela divergir.

Fazendo uma síntese da doutrina defendida nestes arestos assim se sublinhou no Acórdão 1106/16:

«(….)Como se constata das alegações e respectivas conclusões a única questão objecto do recurso consiste em saber se padece de erro de julgamento a decisão recorrida no segmento em que determinou a condenação em custas da Fazenda Pública.

A decisão recorrida julgou verificada a nulidade insuprível prevista no artigo 63.º/1/ d), ex vi do artigo 79.º/1/ b) e c) e 27.º do RGIT, anulou a decisão de aplicação da coima e condenou a Fazenda Pública em custas, que fixou em 2 UCs.

Contra o assim decidido se insurge a Fazenda Pública argumentando que não teve, nem promoveu qualquer impulso processual nos autos tal como previsto no artº 6º, nº do RCP e que o Regime Geral das Contra-ordenações estabelece que dão lugar a pagamento de taxa de justiça as decisões judiciais desfavoráveis ao arguido (artº 93º, nº 3 do RGCO), o que não é o caso.

Mais argumenta que do artº 94º, nº 3 e 4 do RGCO resulta que as custas não imputadas ao arguido são suportadas pelo erário público.

6.1 Da responsabilidade da Fazenda Pública por custas nos processos de contra-ordenações tributárias.

Como é sabido, por força do disposto no art. 4º, n.ºs 4 e 5, do citado Dec.Lei n.º 324/2003, a Fazenda Pública perdeu a isenção de custas nos processos judiciais tributários a partir de 01.01.2004.

Todavia no caso em apreço estamos perante um recurso de decisão de aplicação de coimas e sanções por contra-ordenações tributárias que, sendo um «meio processual tributário» (art. 101.º, alínea c), da LGT), não está incluído, actualmente, no conceito de «processo judicial tributário», pois deixou de estar incluído na lista de processos judiciais tributários que consta do art. 97.º, n.º 1, do CPPT.

Como sublinham Lopes de Sousa e Simas Santos (Ob. citada, pág. 458.) «embora esta lista não seja exaustiva (como se vê pela alínea q) do mesmo número), a comparação da lista que consta deste art. 97.º, com a que constava da norma equivalente do CPT (que era o art. 118.º, n.º 2, em que expressamente se integrava o recurso judicial das decisões de aplicação das coimas e sanções acessórias entre os «processos judiciais tributários»), revela inequivocamente que se pretendeu excluir este recurso do âmbito do conceito de processo judicial tributário, opção legislativa esta que, aliás, está em consonância com a adoptada no RGIT, de aplicar subsidiariamente ao processo contra-ordenacional tributário o RGCO e a respectiva legislação complementar e não o CPPT, limitando a aplicação deste último Código apenas à execução das coimas».

Ora, em matéria de custas dos processos de contra-ordenações tributárias, a primeira norma a atender, por ter natureza especial, é a do art. 66.º do RGIT.

Dispõe aquele normativo que, sem prejuízo da aplicação subsidiária do regime geral do ilícito de mera ordenação social, nomeadamente no que respeita às custas nos processos que corram nos tribunais comuns, as custas em processo de contra-ordenação tributário regem-se pelo Regulamento das Custas dos Processos Tributários (RCPT).

Sucede que o n.º 6 do art. 4º do DL nº 324/2003, de 27 de Dezembro, revogou o RCPT, com excepção das normas relativas a actos da fase administrativa.

Assim, não havendo na legislação aprovada por aquele Decreto-Lei normas especiais para a fase judicial dos processos de contra-ordenações tributárias, haverá que fazer apelo à primeira parte do referido artº 66º do RGIT, o que conduz à aplicação subsidiária do regime de custas previsto no RGCO para as contra-ordenações comuns, nomeadamente o disposto nos artigos 92.º a 94.º do RGCO. (Vide, neste sentido, Lopes de Sousa e Simas Santos, Regime Geral das Infracções Tributárias anotado, Áreas Editora, 4ª edição, pág. 458.).

Ora nos termos do nº 3 do artº 93º do RGCO, há lugar a pagamento de taxa de justiça sempre que houver uma decisão judicial desfavorável ao arguido. E resulta também do nº 3 artº 94º do RGCO que as custas são suportadas pelo arguido em caso de aplicação de uma coima ou de uma sanção acessória, de desistência ou rejeição da impugnação judicial ou dos recursos de despacho ou sentença condenatória, sendo que, nos demais casos, as custas serão suportadas pelo erário público (nº 4 do mesmo normativo).

Em suma do regime legal de custas aplicável em processo de contra-ordenação tributária é manifesto que inexiste norma legal que preveja a condenação da Fazenda Pública em custas (Neste sentido se decidiu também no Acórdão desta Secção de Contencioso Tributário citado pelo Exmº Procurador-Geral Adjunto.).

Pelo que, por força das disposições conjugadas dos art. 66.º do RGIT e 94.º, n.ºs 3 e 4 do Regime Geral do Ilícito de Mera Ordenação Social, num processo de contraordenação tributária, como o dos presentes autos, em que tenha sido verificada a nulidade insuprível prevista no artigo 63.º/1/ d), ex vi do artigo 79.º/1/ b) e c) e 27.º do RGIT e anulada a decisão de aplicação da coima, não são devidas custas pela Fazenda Pública.

A decisão recorrida padece, pois, do erro de julgamento que lhe é imputado, pelo que não pode ser confirmada.».(fim de citação).

Tem, por isso, razão a FP que não devia ter sido condenada em custas uma vez que as mesmas não são devidas.

*

4. Termos em que acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em deferir a requerida reforma quanto a custas e determinar que o processo fique sem custas.

Sem custas.

Lisboa, 6 de Fevereiro de 2019. – Pedro Delgado (relator) – Isabel Marques da Silva – Ascensão Lopes.