Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01245/16
Data do Acordão:02/22/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO DELGADO
Descritores:IMPOSTO MUNICIPAL SOBRE TRANSMISSÃO ONEROSA DE IMOVEIS
ISENÇÃO
REVENDA
PERMUTA
Sumário:I - As normas que regulam a isenção de imposto, na medida em que contrariam os princípios da generalidade e da igualdade da tributação, são insusceptíveis de aplicação a casos que não tenham sido expressamente contemplados no benefício concedido, devendo ser objecto de interpretação estrita ou declarativa.
II - Para efeitos da isenção prevista no artº 7º, nº 1 do CIMT não assume qualquer relevo a troca ou permuta de bens, sendo apenas de considerar a revenda no seu sentido técnico-jurídico.
Nº Convencional:JSTA00070044
Nº do Documento:SA22017022201245
Data de Entrada:11/07/2016
Recorrente:A............
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF BEJA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR FISC.
Legislação Nacional:CIMT ART7 ART11.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC 0529/12 DE 2012/11/28.; AC STA PROC01141/11 DE 2012/03/07.; AC STA PROC01626/13 DE 2015/09/17.; AC STA PROC01244/16 DE 2017/02/15.; AC STA PROC01243/16 DE 2017/02/15.; AC STA PROC02732 DE 1985/03/06.; AC STA PROC02841 DE 1985/06/19.; AC STA PROC015334 DE 1993/10/03.; AC STA PROC0642/08 DE 2008/01/28.
Referência a Doutrina:JOSÉ MARIA FERNANDES PIRES - LIÇÕES DE IMPOSTOS SOBRE O PATRIMÓNIO E DO SELO PAG420 PAG422-423.
J. SILVÉRIO MATEUS E L. CORVELO FREITAS - OS IMPOSTOS SOBRE O PATRIMÓNIO - O IMPOSTO DO SELO - ANOTADOS E COMENTADOS - ENGIFISCO (2005) PAG385 PAG386.
NUNO SÁ GOMES - MANUAL DE DIREITO FISCAL 11ED PAG323-326.
SÉRGIO VASQUES - MANUAL DE DIREITO FISCAL PAG312.
FRANCISCO PINTO FERNANDES E JOSÉ CARDOSO DOS SANTOS - CÓDIGO DA SISA E DO IMPOSTO SOBRE AS SUCESSÕES E DOAÇÕES VOLI PAG371.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo


1 – A…………, LDª, com os demais sinais dos autos, vem interpor recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja que julgou improcedente a impugnação por si deduzida, na sequência do indeferimento do recurso hierárquico deduzido sobre o também indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra a liquidação oficiosa de IMT no valor de 53.104,11€.

Apresenta as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
«É por esta circunstância que se insiste na nossa posição sobre o conceito de revenda associado ao conceito de permuta para efeitos do benefício de IMT na atividade de compra e venda de prédios.
Terá sido também por esta razão que no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo n.º 2/2015, de 17-09-2014, Processo n.º 1626/13 — Pleno da 2ª Secção, se esclarece que “se mostra há muito ultrapassada a tese sufragada no acórdão do STA de 27/05/1970, acolhida na decisão arbitral recorrida e defendida pelos Autores nela citados (SILVÉRIO MATEUS E CORVELO DE FREITAS), segundo a qual o benefício da isenção só actua desde que os prédios adquiridos para revenda sejam objecto desse destino nas mesmas condições em que se encontravam no momento em que foram adquiridos “.
Posição também assumida no Parecer n.º 119/95 do Centro de Estudos Fiscais, sancionado por despacho de 13/09/96 do Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, segundo o qual «o fundamento da isenção (de compra para revenda) em causa está na circunstância de os prédios adquiridos se manterem no activo permutável, enquanto mercadorias das empresas tributadas pelo exercício da actividade de aquisição de prédios para revenda, não sendo esta característica afectada pelo acabamento dos prédios adquiridos, ainda em construção, e pela constituição posterior da propriedade horizontal. (…) a ultimação da construção, de harmonia com o projecto aprovado, não alterou substancialmente a natureza do prédio adquirido, o mesmo sucedendo após a constituição da propriedade horizontal, sendo portanto, certo que o prédio adquirido para revenda, teve efectivamente essa aplicação, mediante a revenda respectiva por fracções autónomas.»
Conclui-se por estas duas posições que a interpretação que existia desde a aprovação do revogado “Código da Sisa”, não faz hoje sentido, apesar de numa interpretação estrita se reconhecer objetivamente que quem compra um prédio em propriedade total e o vende em frações não o vende no mesmo estado, pelo menos jurídico, em que o adquiriu;
Com essa interpretação sairia da esfera de uma atividade de “compra e venda” para uma atividade de “promoção imobiliária” que inclui o valor acrescentado do promotor quer em obras quer em alterações de registo predial e perderia o benefício previsto para aquela atividade.
A interpretação de que estaria a ser dado um destino diferente pelo fato do bem revendido não o ser exatamente no mesmo estado em que foi adquirido evoluiu para o que nos últimos anos tem vindo a ter acolhimento, desprezando aquele princípio de que por ser um benefício fiscal não pode haver interpretações extensivos e...
Sob epigrafe “interpretação económica das normas fiscais” o Prof Saldanha Sanches em Manual de Direito Fiscal, Lex identifica, no polo oposto à interpretação literal, a interpretação segundo o ponto de vista económico ou consideração económica. Para esta corrente deve atender-se não tanto à forma jurídica utilizada pelos contraentes mas sim aos efeitos do negócio jurídico. Centrada sempre nas questões das relações entre o direito privado e o direito fiscal, esta técnica interpretativa assegura uma tributação neutra que não pode ser influenciada pelas formas jurídicas escolhidas pelos particulares.
Como afloramentos que tal posição tem tido entre nós, alguma jurisprudência do STA invoca que “ao direito fiscal importa sobretudo a real configuração das situações de facto”. De uma forma mais intensa numa orientação administrativa onde se afirma “ser princípio assente que a tributação deve surpreender os factos como ocorrem na vida económica, independentemente da sua adequação ao rigor jurídico” para justificar uma mudança de tributação do imposto de selo (Despacho do secretário de estado dos assuntos fiscais de 96/05/03).
No que diz respeito às isenções referenciadas nos artigos 7.º e 8.º do CIMT, este ponto assenta essencialmente na percepção de que estas foram contempladas pelo legislador uma vez que este entende que os imóveis podem deter uma qualidade mercantil. Estas isenções na aquisição reflectem um negócio intermédio em que o adquirente não vai ser o consumidor final do bem, pelo que existe uma justificação jurídica para a sua isenção em alguns tipos de aquisição.
Por último, embora se justifique a isenção nos moldes apresentados, o legislador restringe a isenção com várias limitações. Pode então questionar-se se essas limitações restringem ou não a actividade económica dos contribuintes. De facto, como apresentado, em certos casos parece haver um prejuízo da actividade económica em troca de uma segurança a nível de evasão fiscal.
Deverá assim entender-se, contrariamente ao entendimento perfilhado na Douta Sentença recorrida, que em termos de regulamentação jurídica do negócio, não há qualquer distinção entre compra e venda e troca ou permuta, nem tão pouco, no momento presente, que prevaleça um ou o outro conforme o preço seja pago em dinheiro ou em bens.
Não é assim tão conclusiva e exacta a terminologia técnico-jurídica sobre o conceito de permuta. Não fosse esta falta de regulamentação no Direito Civil ainda como se referiu a Lei Fiscal atende preferencialmente à realidade económica, ficcionando transmissões só para efeito de IMT, como se pode verificar pela pergunta que a Administração coloca no seu “site” para melhor elucidar os cidadãos sobre o IMT, referindo “Quais as situações que o Código do IMT ficciona como transmissões onerosas de imóveis? Diversos tipos de relações contratuais conexos com imóveis, tipificados nos n.º 2, 3 e 5 do Art. 2º e do art. 3º do CIMT”; significando que independentemente do conceito técnico ou jurídico a realidade económica prevalece.»

2 – Não foram apresentadas contra alegações.

3 – O Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer com a fundamentação que, na parte relevante, se transcreve:
(…) «1. A solução da questão deve considerar as seguintes premissas argumentativas:
1ª O facto tributário gerador da obrigação do IMT consiste na transmissão, a título oneroso, do direito de propriedade ou de figuras parcelares desse direito, sobre bens imóveis situados em território nacional (art.2° n°1 CIMT)
2ª As isenções são uma categoria de benefícios fiscais, os quais constituem medidas de carácter excepcional, instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes, superiores ao da própria tributação que impedem (art.2° nºs 1 e 2 EBF); as normas de isenção não são susceptíveis de integração analógica, mas admitem interpretação extensiva (art. 9º EBF)
3ª A isenção de IMT de que gozam as aquisições de prédios para revenda está sujeita a condição resolutiva, caducando se os mesmos não forem revendidos no prazo de 3 anos após a aquisição (arts.7º nº1 e 11º nº 5 CIMT)
4ª A teleologia da norma de isenção está dirigida aos sujeitos passivos que exercem normal e habitualmente a actividade de compradores de prédios para revenda, por forma a evitar a tributação sucessiva dos mesmos bens em curto período temporal, com tendencial repercussão no preço final de venda dos imóveis (J. Silvério Mateus /L. Corve de Freitas Os Impostos sobre o Património, O Imposto de Selo: Anotados e Comentados, Lisboa Engifisco 2005 p385)
5ª O conceito de revenda pressupõe a transmissão da propriedade do imóvel através do contrato de compra e venda; distintivamente, o legislador definiu o contrato de permuta como aquele em que as prestações de ambos os permutantes compreendem bens imóveis, ainda que futuros (art.4º al. c) CIMT).
6ª Para efeitos de IMT o legislador não pretendeu equiparar a revenda ao contrato de permuta, como inequivocamente resulta de normas do CIMT que, especificamente, se referem a esta forma de transmissão de propriedade (designadamente arts.4º al. c), 5º nº 3 e 12º nº 4 4ª regra CIMT)
7ª A adequada interpretação restritiva da norma sobre a caducidade da isenção não contempla na sua previsão a permuta de imóveis, apenas sendo relevante a revenda no sentido técnico-jurídico
2.A solução propugnada alinha com jurisprudência consolidada do STA-SCT no âmbito do imposto de Sisa mas com fundamentação aplicável, sem reserva, ao IMT (acórdãos STA 6.03.1985 processo nº 2732; 19.06.1985 processo nº 2841;13.10.1993 processo nº 15 334; 28.01.2008 processo nº 642/08; 7.03.2012 processo nº 1141/11; no domínio do CIMT acórdão 28.11.2012 processo nº 529/12).
CONCLUSÃO
O recurso não merece provimento.
A sentença impugnada deve ser confirmada.»

4 - Colhidos os vistos legais, cabe decidir.

5 – O Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja considerou como provado os seguintes factos com interesse para a decisão:
A) A Impugnante é uma sociedade por quotas que exerce como actividade principal a “compra e venda de bens imobiliários”, com o CAE 68100;
B) Por escrituras públicas outorgadas em 28/11/2007, 31/10/2007 e 15/07/2008 a ora Impugnante adquiriu diversos prédios urbanos e rústicos sitos no concelho de Évora e inscritos na respectiva matriz predial;
C) A aquisição melhor identificada no ponto anterior ficou isenta de IMT uma vez que a impugnante declarou na escritura pública que os imóveis se destinavam a revenda;
D) Por escrituras públicas outorgadas em 06/07/2009 e 19/08/2009 a Impugnante celebrou contratos de permuta dos imóveis com a sociedade comercial “B…………, Lda” nos termos das quais esta lhe atribuiu o direito de propriedade sobre outros imóveis;
E) A sociedade Impugnante foi submetida a procedimento inspectivo credenciado pela ordem de serviço nº 012011008158;
F) O relatório conclusivo de tal procedimento determinou a caducidade da isenção do pagamento de IMT de que a Impugnante havia sido beneficiária na aquisição dos imóveis em 2008 nos seguintes termos:
«O conceito de revenda e de permuta
Neste ponto, o sujeito passivo vem afirmar que a permuta é considerada revenda para efeitos da isenção de IMT em análise.
Quanto a esta questão, já foi suficientemente explanado no ponto III do presente relatório o entendimento adoptado pela administração tributária e pela jurisprudência de que a expressão “revenda” deve ser entendida no seu sentido técnico-jurídico e que se deve concretizar através de um contrato de compra e venda, e que, como tal, o contrato de permuta de bens não é considerado um meio de revenda de prédios.
Tal como escrevem J. Silvério Mateus e L. Corvelo de Freitas, Os Impostos sobre o Património. O Imposto do Selo: Anotados e Comentados, Lisboa, Engifisco, 2005, pp. 404 e 405:
“Não preenche pois, a condição a celebração de contrato de promessa de compra e venda, ainda que acompanhado de tradição do bem para o promitente comprador com a consequente obrigação de pagamento do imposto que sobre este recai (...) No mesmo sentido, se considera que não releva para o efeito o contrato da troca ou permuta de bens (STA, Ac. De 19.6.1985— Rec.° 2641, bem como Desp. Do SDG, de 14.4.1989— Inf. ° 676/89, P° 15/10, L.° 18/2632, da 4ª Dir. de Serviços da DGCI), nem tampouco, a dação em cumprimento (STA, Ac. de 4.10.2000 — Rec. nº 24923).” (sublinhado nosso).
Ora, se como argumenta o sujeito passivo, a permuta consta das regras de incidência logo deveria ser considerada nas regras da isenção do art. 7°, também o contrato de promessa de compra e venda com tradição do bem e a dação em cumprimento constam das regras de incidência do IMT, logo deveriam ser considerados como meios de revenda dos prédios com relevância para efeitos da isenção prevista no art. 7º. No entanto, conforme se constatou, tal não se verifica.
Quanto ao argumento apresentado pelo sujeito passivo de que “Os acórdãos referidos no relatório referem-se exclusivamente ao revogado Imposto de Sisa, cujo termo em nada é parecido com o actual Imposto Municipal sobre as Transmissões onerosas’”, importa referir novamente o que escrevem J. Silvério Mateus e L. Corvelo de Freitas, Os Impostos sobre o Património. O Imposto do Selo: Anotados e Comentados, Lisboa, Engifisco, 2005, p. 404, sobre o n.º 5 do art. 11.º do Código do IMT:
“Corresponde, sem alterações, ao n.º 1 do artigo 16.º do CIMSISD, na redacção dada pelo Dec. Lei n.° 91/89, de 27 de Março.”
Assim, verifica-se que a disposição legal aqui analisada, o n.º 5 do art.11.º do Código do IMT, não é uma disposição inovadora em face da lei anterior, pelo contrário, a sua redacção é exactamente igual e o seu mecanismo de a também sujeito passivo notificado da renovação do prazo para exercício do direito de audição, pelo ofício n.° 8783, de 21.11.2011 (Anexo 15).
O novo direito de audição foi exercido conforme documento que deu entrada nestes serviços em 02.12.2011 (Anexo 16), tendo o sujeito passivo contestado as correcções propostas no ponto III.
A caducidade da isenção de IMT
Neste ponto, o sujeito passivo apenas vem enumerar os requisitos para a atribuição de isenção constantes do art. 7.º do Código do IMT e afirmar que cumpre todos aqueles requisitos.
No entanto, a questão da atribuição da isenção aquando da aquisição do imóvel nunca esteve em causa, tendo os requisitos da sua atribuição sido verificados pelo notário no momento da celebração das escrituras.
A situação em análise prende-se, isso sim, com a caducidade da isenção por não cumprimento dos requisitos a cumprir a posteriori pelo adquirente dos prédios, previstos no n.º 5 do art. 11.º do Código do IMT. Mais concretamente:



Mais, as operações de permuta efectuadas em 16.07.2009 e em 19.08.2009 tiveram como permutante a empresa B………… LDA, NIF ……….. Esta sociedade tem relações especiais com o sujeito passivo, nos termos do n.º 4 do art. 63.º do Código do IRC, já que o contribuinte C…………, NIF.
Face ao exposto, manter-se-á a correcção proposta ao valor tributável de IMT apurado no montante de € 3.437.500,00.»
G) Em consequência foi a sociedade Impugnante notificada para pagar o montante de 53.104,11 euros referente a IMT com data limite de pagamento em 07/08/2012;
H) Não se conformando com a mesma a Impugnante reclamou graciosamente;
I) Na qual foi proferido despacho de indeferimento;
J) Interposto relativamente a esse despacho recurso hierárquico foi o mesmo indeferido por despacho notificado à Impugnante em 11/02/2014;
L) A petição inicial da presente impugnação foi remetida via postal em 21/05/2014.

6. Do objecto do recurso
Da análise da decisão recorrida e dos fundamentos invocados pela recorrente para pedir a sua alteração, podemos concluir que a questão objecto do recurso consiste em saber se, em face da natureza jurídica dos contratos (escrituras públicas de permuta de imóveis outorgadas em 06/07/2009 e 19/08/2009) celebrados com a sociedade comercial “B…………, Lda”, os mesmos configuram uma revenda para efeitos da isenção prevista no artº 7º, nº 1 do CIMT.

A sentença recorrida considerou, citando jurisprudência condizente, nomeadamente os Acórdãos desta Secção de 07.03.2012, recurso 1141/11 e de 28.11.2012, recurso 529/12, que “a isenção de pagamento de imposto é insusceptível de aplicação a casos que não tenham sido expressamente contemplados no benefício concedido pela circunstância de que contraria os princípios da generalidade e da igualdade de tributação»
E que «numa interpretação estrita da norma contida no artº 11º, nº 5 do CIMT deve entender-se que, no caso da isenção de prédios adquiridos para revenda, a lei exige, sem mais, a efectivação da revenda como pressuposto essencial da isenção, sem equiparar a ela qualquer outro tipo de acto ou de contrato».
Inconformada com esta decisão, a recorrente sustenta que contrariamente ao decidido, a permuta deve ser equiparada à revenda para o efeito de obstar à caducidade da isenção, invocando, em apoio da sua posição, o decidido no Acórdão deste STA n.º 2/2015, de 17 de Setembro de 2015, rec. n.º 1626/13, o parecer do Centro de Estudos Fiscais n.º 119/95 - quanto ao fundamento da isenção - e a posição de SALDANHA SANCHES, aflorada nalgumas decisões do STA, quanto à “interpretação económica das normas fiscais”.

A nosso ver a decisão recorrida não merece censura, sendo de confirmar o entendimento acolhido, que, aliás, tem o apoio da doutrina e da jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo.
Com efeito este Supremo Tribunal Administrativo já se pronunciou por diversas vezes sobre questão em tudo idêntica à ora suscitada e no sentido de que para efeitos da isenção prevista no artº 7º, nº 1 do CIMT não assume qualquer relevo a troca ou permuta de bens, sendo apenas de considerar a revenda no seu sentido técnico-jurídico.

Esta jurisprudência foi acolhida, entre outros, pelos Acórdãos de 28.11.2012, recurso 529/12, e de 15.02.2017, recursos 1244/16 e 1243/16, todos in www.dgsi.pt.
Será, pois, pertinente referir o que se decidiu no supra citado Acórdão 529/12, sobre a isenção de pagamento de imposto prevista no artº 7º, nº 1 do CIMT e sobre a possibilidade de abranger a troca ou permuta de bens.

Respondeu-se a tal questão da seguinte forma:
«A isenção pela aquisição de prédios para revenda fundamenta-se na circunstância de tais prédios, destinados a integrar o activo permutável da empresa adquirente, constituírem “mercadorias” da respectiva actividade. Assim a isenção tem como fim último afastar elevados encargos financeiros que, não obstante serem custos dedutíveis para efeitos de determinação do rendimento sujeito a imposto, tenderiam a repercutir-se no preço final da venda dos bens imóveis (Cf. J. Silvério Mateus /L. Corvelo de Freitas, Os Impostos sobre o Património. O Imposto do Selo: Anotados e Comentados, Lisboa, Engifisco, 2005, p. 385)»
A lei estabelece um conjunto de pressupostos do regime de isenção em IMT dos prédios adquiridos para revenda que constituem mecanismos preventivos da sua utilização abusiva e da prática de operações de fraude fiscal.
Assim só podem beneficiar desta isenção as empresas que estejam colectadas para efeitos do IRS ou do IRC na actividade de compra de prédios para revenda (artº 7º nº 1).
O regime de isenção aplica-se exclusivamente aos prédios adquiridos para revenda pelas empresas, não se aplicando a prédios adquiridos para outros fins e posteriormente afectos ao activo permutável.
Para se aplicar a isenção deve constar do próprio contrato que o prédio adquirido se destina a revenda.
A revenda deve ser efectuada no prazo máximo de três anos (artº 11º, nº 5), sendo que o conceito de revenda pressupõe a transmissão da propriedade do imóvel através do contrato de compra e venda (Cf, neste sentido, e quanto aos pressupostos da isenção, José Maria Fernandes Pires, Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, pags. 420 e segs.).
Finalmente a revenda efectuada naquele prazo não pode ter como finalidade nova revenda (artº 11º, nº 5).
Uma correcta abordagem da questão decidenda supõe que se faça uma breve referência à interpretação das normas de benefícios e de isenção de tributação.
Com efeito os benefícios fiscais, entre os quais a isenção de tributação, são, por natureza, de carácter excepcional, pois encerram uma derrogação aos princípios gerais que presidem à tributação, visto que, de certo modo, derrogam os princípios da capacidade contributiva, da generalidade e da igualdade da tributação e apenas encontram justificação na tutela de interesses públicos constitucionalmente relevantes, superiores aos da própria tributação, sejam de carácter político, económico, social ou cultural (Manual de Direito Fiscal, 11ª edição com adenda, 2000, páginas 323/326, Nuno de Sá Gomes, citado no parecer do Exmº Procurador-Geral Adjunto)
As normas de benefícios fiscais merecem assim tratamento autónomo porque são normas anti-sistemáticas por definição, estando em tensão permanente com o princípio da capacidade contributiva, que derrogam como padrão na repartição do imposto (Vide Sérgio Vasques, Manual de Direito Fiscal, pag. 312.) .
E é essa circunstância que legitima que se sustente quanto a elas um princípio de interpretação estrita ou declarativa (strict interpretation), fundado precisamente na sua natureza excepcional ou anti-sistemática.
Daí que se entenda que, a isenção de imposto, na medida em que contraria os princípios da generalidade e da igualdade da tributação, é insusceptível de aplicação a casos que não tenham sido expressamente contemplados no benefício concedido.

Assim, numa interpretação estrita do preceito (artº 11º, nº 5 do CIMT) há-de entender-se que, no caso da isenção de prédios adquiridos para revenda, a Lei exige, sem mais, a efectivação da revenda como pressuposto essencial da isenção, sem equiparar a ela qualquer outro tipo de acto ou contrato.
Este tem sido também o entendimento tradicional da nossa jurisprudência no âmbito do Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações, cujo regime é, neste aspecto, muito semelhante ao regime do CIMT – cf. Acórdãos de 6/3/1985, rec. n.º 2732, de 19.06.1985, recurso nº 002841, de 13.10.1993, rec. º nº 15334, de 28.01.2008, rec. n.º 642/08 e de 07.03.2012, recurso 01141/11.
Como se exarou no Ac. de 13.10.1993, acima citado (publicado no Apêndice ao DR, de 20/5/1996, pp. 3279 a 3282) «perante o texto da lei aplicável e o intuito legal de, com a concessão desta isenção, se evitar a tributação sucessiva, em imposto de sisa dos mesmos bens, num curto período de tempo, não será de concluir que o legislador disse menos do que pretendia, mas antes é de reconhecer que os termos utilizados traduzem a vontade ali inequivocamente expressa, no sentido de só relevar, para o efeito aí assinalado, o acto de «revenda» do prédio em causa».
E ainda a propósito do conceito de revenda se disse também no supra citado Ac 1141/11 que “revender é vender de novo, ou vender o que se tinha comprado, ainda que sem aquele propósito, e torna-se por demais evidente que só através da venda se opera a revenda, e não…mediante simples troca ou permuta dos bens originariamente adquiridos (…) Sendo assim só a revenda assume relevância para efeitos de isenção de sisa, não a tendo a troca ou a permuta” (Acórdãos Doutrinais, nº 257, pág. 644).

Neste sentido, se vem pronunciando, de igual modo, a doutrina.
Assim Francisco Pinto Fernandes e José Cardoso dos Santos, Código da Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações, edição da Imprensa Nacional, volume I, pag. 371, J. Silvério Mateus /L. Corvelo de Freitas, ob. citada pag. 386, e José Maria Fernandes Pires, ob. citada, pags. 422-423.

Não vemos, nem o recorrente as alega, razões válidas para divergir deste entendimento» (fim de citação).

Acresce dizer, como se sublinhou no citado Acórdão 1243/16, que «o acórdão do Pleno deste STA invocado pela recorrente nas suas alegações de recurso trata de questão diversa da que é objecto dos presentes autos, sendo abusivo dele extrair consequências para o caso presente, pois que dele não cura» e que a “interpretação económica das normas fiscais”, para quem a advogue, tem o seu campo de aplicação por excelência na interpretação das normas de incidência, que não nas de benefícios fiscais, as quais, por se traduzirem em excepções ao princípio da generalidade da tributação, não devem ver o seu âmbito de aplicação alargado a casos que o legislador não tenha expressamente contemplado.»

Pelo exposto, improcedem todos os fundamentos do recurso.

7. Decisão:
Termos em que acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 22 de Fevereiro de 2017. – Pedro Delgado (relator) – Dulce Neto – Isabel Marques da Silva.