Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0525/18
Data do Acordão:06/27/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ARAGÃO SEIA
Descritores:CASO JULGADO
PEDIDO
FUNDAMENTOS
Sumário:-O caso julgado material estende-se ao juízo que o tribunal faz sobre os pressupostos de que depende o exercício do poder consubstanciado no acto ou sobre a ocorrência de factos impeditivos ou extintivos que obstem a esse exercício.
-Há identidade de objecto se já existir uma sentença transitada em julgado que apreciou os concretos fundamentos de facto e de direito em que se baseia a pretensão anulatória do acto impugnado.
Nº Convencional:JSTA000P23453
Nº do Documento:SA2201806270525
Data de Entrada:05/23/2018
Recorrente:A......
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

A………., executado por reversão no processo nº 2259200201006398, instaurado por dívidas da executada originária, B………… Lda, inconformado, interpôs recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja (TAF de Beja) datada de 27 de Janeiro de 2018, que julgou improcedente o pedido de condenação do reclamante no pagamento de indemnização e multa por litigância de má-fé, bem como, julgou improcedente a reclamação deduzida contra a decisão do Chefe do Serviço de Finanças de Sines, que recusou conhecer do requerimento que lhe apresentou em 10 de Outubro de 2017.

Alegou, tendo apresentado conclusões, como se segue:
1ª Na aliás douta sentença recorrida foi decidido que “... a decisão judicial proferida no processo 200/15.9BEBJA, ao julgar “totalmente improcedente a reclamação apresentada, mantendo-se a decisão reclamada”, em face do pedido de anulação da venda que lhe foi formulado pelo Autor, tem claramente implícito um juízo de que essa venda não é inválida”.
2ª No entendimento assim acolhido, a decisão judicial que julgue improcedente o vício, ou vícios, atribuídos a um ato, contém o julgamento implícito de que o acto impugnado não padece de qualquer outro vício, com o que se alarga a autoridade de caso julgado muito além do que a lei estatui e tem pacificamente tem sido entendido:
3ª A exceção de caso julgado impede que seja objeto do processo o mesmo litigio já decidido por sentença transitada em julgado, surpreendendo-se a identidade do litígio na identidade de sujeitos, de pedido e de causa de pedir, a autoridade do caso julgado impede que o litígio já decidido incidentalmente, como pressuposto da decisão proferida, seja novamente decidido.
4ª Mas não há julgamentos implícitos: a sentença só constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga (cf. artigo 621° do CPC). Ora,
5ª Entre os presentes autos e os autos de reclamação de actos do órgão de execução fiscal que correram termos sob o número 200/15.9BEBJA pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, há identidade de sujeitos, mas não identidade de pedido (ali estava em causa a anulabilidade e aqui a nulidade), nem de causa de pedir (ali estava em causa a inutilidade, inadmissibilidade da penhora, ilegitimidade e prescrição da prestação tributária; nos autos está em causa a nulidade, por ter sido adjudicado a quem não o podia adquirir e por o preço ter sido pago com violação das normas legais). Ora,
6ª A exceção e a autoridade de caso julgado impedem que se repita uma questão já decidida, de forma a evitar que o Tribunal fique colocado na situação de repetir ou contradizer anterior julgamento, o que no caso não se verifica, por as questões suscitadas nunca terem sido decididas. Aliás, sempre se dirá,
7ª No entendimento sufragado pela aliás douta sentença recorrida, os artigos 581° e 621° do CPC seriam inconstitucionais por violação dos artigos 18.°, n.° 2 e 20.° da Constituição, o que sempre impediria a sua aplicação: negar o conhecimento de questão suscitada em defesa de direitos com fundamento em questão diferente judicialmente já conhecida, constitui restrição desproporcionada e gratuita de direitos. Com efeito,
8ª Nos autos exige-se ao Reclamante o pagamento de dívida de sociedade de que foi gerente durante 6 meses e 26 dias, um mês dos quais e dezasseis dias no exercício a que respeitará a divida de IRC reclamada na execução e, para o obter, a casa do recorrente foi vendida por 70% (103.000/146.569,05 — cfr. doc. n°. 5 junto pela compradora) do respetivo valor patrimonial tributário ou 59,73% do valor de mercado, a considerar-se o valor patrimonial tributário igual a 85% do valor do mercado [103.000/(146.569,05/0,85)], como era propósito do legislador.
9ª A injustiça é evidente: é exigido ao Reclamante o pagamento de dívida tributária cujos facto constitutivo e termo do prazo legal de pagamento não se verificaram no período de exercício do seu cargo, sem qualquer invocação da (impossível) culpa sua na insuficiência do património da pessoa colectiva e, portanto, sem qualquer apoio legal (cfr. artigos 13° do CPT, ao tempo em vigor, ou artigo 23° da L.G.T., citado no despacho de reversão), ou seja, é exigido ao Reclamante o pagamento de dívida pela qual, manifestamente, não é responsável, de facto ou de Direito, pois nada fez para que existisse e nada poderia ter feito para que a executada originária a pagasse.
10ª Para satisfazer esta exigência, a casa do reclamante é vendida a entidade cujo regime jurídico não permite identificar os titulares efectivos do seu capital, em violação da al. b) do nº 1 do artigo 256° do CPPT, por valor ruinoso para exequente e reclamante, porque inferior a 60% do seu valor de mercado.
11ª Mas porque, no curto prazo de que dispunha para o efeito, o reclamante deduziu pedido de anulação no qual não invocou os vícios que só posteriormente veio a apurar, a nulidade fica sanada e prevalece a venda, realizada em 2014 para cobrança de dívida de IRC de 1996, em prejuízo do interesse público da exequente e particular do recorrente, isto é, prevalece o interesse da adquirente do prédio, que assim beneficia da desgraça de todos os outros mas, principalmente, do Recorrente. Acresce que,
12ª As alegadas nulidades são evidentes: não podem adquirir bens por venda em processo de execução fiscal (cf. al. b) do n°. 1 do artigo 256° do CPPT) as

Não houve contra-alegações.

O Ministério Público notificado, pronunciou-se no sentido da revogação da sentença, determinando-se a baixa dos autos a fim de serem conhecidas as questões suscitadas pelo Reclamante. Em síntese, entende que, relativamente ao trânsito em julgado da decisão proferida no processo n° 200/15.9BEBJA, “(…) os efeitos preclusivos projetados por essa decisão circunscrevem-se aos termos da decisão (art. 621° do CPC), ou seja, sobre o objeto daquele processo e não sobre a tutela jurisdicional requerida pelo autor da ação e manifestada na pretensão deduzida.(…)”.

Colhidos os vistos legais cumpre decidir.

Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte factualidade concreta:
a) Em 19.06.2002, no serviço de finanças de Sines, foram apensados ao processo de execução fiscal n.º 2259-00/100721.1, os processos de execução fiscal n.°s 2259- 01/101038.7; 2259-02/100635.5; 2259-02/100639.8; 2259-03/100169.8; 2259- 03/100205.8; 2259-03/100247.3 e 2259-03/100313.5, os quais se encontravam a correr termos naquele serviço de finanças contra B……….. LDA, para cobrança coerciva de uma dívida total, naquela data, de € 64 271,92;
b) Em 23.06.2003, através de despacho do chefe do serviço de finanças de Sines cujo teor consta de fls 18 e 19 do processo de execução fiscal apenso aos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido, foi determinada a notificação de …………., ………….., A……….. e ………….., para exercício de audição prévia sobre a reversão contra si, na qualidade de responsáveis subsidiários, do processo de execução fiscal n.º 2259-00/100721.1 e apensos;
c) Com data de 24.06.2003, foi endereçada a A………., carta assinada pelo chefe do serviço de finanças de Sines com o teor que consta de fls 21 do processo de execução fiscal apenso aos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzido, informando-o do direito a pronunciar-se sobre o projecto de decisão de reversão, a proferir no processo de execução fiscal n.º 2259-00/100721.1 e apensos, instaurado contra B…………. Lda;
d) Com data de 21.06.2007, no processo de execução fiscal n.º 2259-00/100721.1 e apensos, o chefe do serviço de finanças de Sines proferiu despacho com o teor que consta de fls 39 do apenso aos autos, dele constando, nomeadamente, o seguinte:
“(...)
4. Quanto aos gerentes …………, A……….. e …………. não exerceram o direito de audição pelo que também contra eles considero definitivo o referido projecto de reversão.
(...);
e) Com data de 22.06.2007, foi endereçada a A…………., carta assinada pelo chefe do serviço de finanças de Sines, com o teor que consta de fls 44 e 45 do processo de execução apenso aos autos, o qual aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual consta, além do mais, o seguinte:
Pelo presente fica V. Exª citado, nos termos do art.º 160.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), de que é executado por reversão na qualidade de responsável subsidiário no processo de execução fiscal n.º C 2259-00/100721.1 e apensos, instaurado contra B…….. Lda, devendo, no prazo de (trinta) 30 dias a contar desta citação efectuar o pagamento da quantia de 18 305,02 € (dezoito mil trezentos e cinco euros e dois cêntimos) de que era originária devedora a executada supra indicada,...
(...);
f) A carta descrita em e) foi recebida no respectivo destino em 27.06.2007;
g) Com data de 31.08.2007, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 2259- 2000100721.1, pelo chefe do serviço de finanças de Sines, foi lavrado auto de penhora do prédio urbano inscrito na matriz predial da Freguesia de Santo André, Concelho de Santiago do Cacém, sob o art.º 5955, com o teor que consta de fls 52 e 53 do processo de execução fiscal apenso aos autos, o qual aqui se dá por integralmente reproduzido;
h) Com data de 04.09.2007, foi endereçada carta a A……….., carta assinada pelo chefe de finanças de Sines com o teor que consta de fls 50 do processo apenso aos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido, e de que consta, nomeadamente, o seguinte:
Desta forma fica V. Ex notificado(a) de que foi nomeado fiel depositário do bem abaixo indicado penhorado no processo de execução fiscal n.º 225920000100721.1 e apensos constante do auto de penhora de que se junta fotocópia, ficando intimado para não dispor dele sem ordem deste Serviço de Finanças, sob pena de ficar sujeito à penalidade cominada aos infiéis depositários prescrita no art.° 233.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário conjugado com o artigo 854.º do Código de Processo Civil”
(…);
i) Com data de 07.11.2014, pelo chefe do serviço de finanças de Sines, foi proferido despacho com o teor que consta de fls 204 do processo de execução fiscal apenso aos autos, o qual aqui se dá por integralmente reproduzido, através do qual foi determinado que se procedesse à venda do prédio urbano inscrito sob o art.º 5955 na matriz predial da freguesia de Santo André, Concelho de Santiago do Cacém, o qual havia sido penhorado por auto de fls 52 do processo de execução fiscal;
j) Com data de 07.11.2014, foi endereçada a A………….. carta assinada pelo chefe do serviço de finanças de Sines, com o teor que consta de fls 208 do processo de execução fiscal apenso aos autos, o qual aqui se dá por integralmente reproduzido, dele constando, além do mais, o seguinte:
Fica V. Exª por este meio notificado de que foi designado o dia 30.12.2014, pelas 10 horas, neste Serviço de Finanças, para a abertura das propostas por leilão electrónico do bem penhorado no processo executivo n.° 2259200201006398, por dívida de IRC do ano de 1996 no montante de € 17.965,34 e acréscimos legais, de que foi originária devedora B…………. Lda,…”,
k) Aquela carta chegou ao seu destino em 13.11.2014;
1) Com data de 10.11.2014, pelo chefe do serviço de finanças de Sines foi elaborado edital anunciando a venda daquele imóvel, através de leilão electrónico, e convocando os credores sobre o mesmo, tudo com o teor que consta de fls 206 do processo de execução fiscal apenso aos autos, o qual aqui se dá por integralmente reproduzido;
m) Com a mesma data, foi elaborada certidão de afixação daquele edital;
n) Em 25.11.2014, foi apresentada reclamação nos termos do art° 276.º do CPPT de decisão de marcação da venda proferida no processo de execução fiscal 2259200202006398;
o) Com data de 30.12.2014, foi endereçada a SOC PREDIAL …………., SARL, carta assinada pelo chefe do serviço de finanças de Sines, com o seguinte teor:
Assunto: VENDA JUDICIAL - ACEITAÇÃO DE PROPOSTAS
Exm.º (ª) Senhor(ª)
Por não ter estado presente no dia e hora marcados para a abertura das propostas, 2014-12-31, 10h00, no âmbito da venda judicial n.º 2259.2014.89) promovida pela Autoridade Tributária e Aduaneira contra o executado A………….. (NIF …………),fica por este meio notificado que foi aceite a sua proposta, por ser a de maior valor (103.000,00).
Mais fica notificado para, no prazo de 15 (quinze) dias a contar da assinatura do aviso de recepção, efectuar o pagamento da totalidade do preço oferecido, nos termos do art.° 256.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), conjugado com o n.º 2 do art.º 897.º do Código de Processo Civil (CPC) mediante guias a solicitar neste Serviço de Finanças, sob pena, se não o fizer, da aplicação das sanções previstas na lei do processo civil, nomeadamente as previstas no art.° 898.º do CPC.”
p) A descrita em carta o), chegou a seu destino em 07.01.2015;
q) Em 02.01.2015, deu entrada no serviço de finanças de Sines, via correio electrónico, requerimento da Sociedade ………….. S.A. dirigido ao chefe daquele serviço de finanças, com o seguinte teor:
Na sequência da adjudicação do bem descrito no Auto de Abertura e Adjudicação de Propostas, adquirido no leilão 2259.2014.89, a 2014-12-30 às 10:00, vimos por este meio requerer a V.Exª, no âmbito do Art.° 256, alínea f) do CPPT, a depósito de um terço do valor, obrigando-nos a entregar a parte restante no prazo máximo de oito meses, necessário para mobilizarmos os necessários recursos financeiros.
(…)
No caso, dado que o valor de adjudicação foi 103.000,00 € (cento e três mil euros), o valor a liquidar será de 34.334,00€ (trinta e quatro mil, trezentos e trinta e quatro euros).
(…);
r) Em 05.01.2015, deu entrada no serviço de finanças de Sines requerimento de Sociedade Predial ………….. S.A., dirigido ao respectivo chefe, com o teor que consta de fls 229 do processo de execução fiscal apenso aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, dele constando, além do mais o seguinte:
(…)
“Na sequência da adjudicação do bem descrito no Auto de Abertura e Adjudicação de Propostas, adquirido no leilão 2259.2014.89, a 2014-12-30 às 10:00, vimos por este meio requerer a V.Exª, no âmbito do Art.º 256, alínea f) do CPPT, o depósito de um terço do valor, obrigando-nos a entregar a parte restante no prazo máximo de oito meses, necessário para mobilizarmos os necessários recursos financeiros.
(…)
No caso, dado que o valor de adjudicação foi 103.000,00€ (cento e três mil euros), o valor a liquidar será de 34.334,00 € (trinta e quatro mil, trezentos e trinta e quatro euros).
s) Com a mesma data de 05.01.2015, sobre esta carta foi aposto despacho com o seguinte teor:
Defiro. Notifique e esclareça o signatário como requerido.
t) Com data de 12.01.2015, deu entrada no serviço de finanças de Sines, via correio electrónico, carta com o teor que consta do documento de fls 243 do processo administrativo apenso aos autos, o qual aqui se dá por integralmente reproduzido, dele constando, além do mais, o seguinte:
(…)
Na sequência do mail infra em que remeteram Documento Único de Cobrança referente à liquidação de 1/3 do preço oferecido na venda n.º 2259.2014.89, que agradecemos, solicitamos:
1.Resposta à questão de como poderemos tomar posse do bem, nomeadamente se o SF de Sines dispõe das chaves de acesso ao imóvel ou notificou o anterior proprietário para o efeito e qual o protocolo de entrega do bem.
2. Isenção de IMT, conforme previsto no art.º 7.º do CIMT (…);
u) Com data de 15.01.2015, foi endereçada a Sociedade Predial …………. Lda, carta do serviço de finanças de Sines com o seguinte teor:
Assunto: VENDA N.º NOTIFICAÇÃO
Exmº (ª) Senhor(a)
Fica por este meio notificado que foi deferida o pedido de pagamento do valor oferecido na venda supra mencionada, na modalidade prevista na al. f) do art.º 256.º do CPPT.
Mais informo de que é possível proceder ao pagamento em qualquer Serviço de Finanças, multibanco, home-banking da internet, multibanco, correios e bancos aderentes.
Após liquidação do valor deverá notificar o fiel depositário para proceder à entrega da chave do imóvel”;
v) Com data de 15.01.2015, via correio electrónico, deu entrada no serviço de finanças de Sines carta de Sociedade Predial …………, com o teor que consta de fls 246 do processo de execução apenso aos autos, o qual aqui se dá por integralmente reproduzido, dele constando, nomeadamente, o seguinte:
(…)
Mais informamos que tentámos contactar no local e telefonicamente o executado, Sr A………., telefone ………, por diversos ocasiões sem sucesso.
Informam os que já liquidamos o IMT e Imposto de Selo respectivo
Solicitamos:
a) Documentos necessários ao registo (IRN)

b) Posse do bem
Sendo o bem adquirido livre de ónus e encargos, e dada a impossibilidade em contactar o executado, solicitamos a SF de Sines qual o protocolo de entrega do bem. Dispõe o SF de Sines de Chaves de acesso, poderemos entrar na imóvel…”;
w) Em 29.01.2015, foi efectuado o pagamento de € 34 334,00, constante de documento único de cobrança emitido em nome de Sociedade Predial ……….. SARL, com data limite de pagamento de 30.01.2015;
x) Com data de 10.02.2015, deu entrada no serviço de finanças de Sines carta assinada por administradora da Sociedade Predial …………. S.A. com o seguinte teor:
Na sequência da adjudicação à Sociedade Predial …………. SA., no Portal das Finanças, leilão 2259.2014.69, a 2014- 12-30 às 10:00 horas, do prédio urbano artigo 5955, destinado a habitação, sito em …………., lote ….. (correspondente à Rua ………e nº ………, conforme certidão nº 138/2014 da Câmara Municipal de Santiago do Cacém) 7500-……… Vila Nova de Santo André, concelho de Santiago do Cacém, informamos que, por carta registada com aviso de recepção, solicitámos ao Fiel Depositário, Sr. A………….., a entrega das chaves do imóvel (Anexos 1 e 2).
A referida carta foi endereçada a “Rua ………..”, 7500-………. Vila Nova de Santo André, por esta morada corresponder a “………., lote …….”, na mesma localidade, conforme Certidão 138/2014 do Município de Santiago do Cacém (Anexo 3).
A carta foi devolvida com a indicação prestada pelos CTT “mudou-se” (Anexos 4,5 e 6).
Assim, e nos termos dos números 2 e 3 do Artigo 256.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, requeremos ao Serviço de Finanças de Sines a entrega do bem,
y) Com data de 24.02.2015, e na sequência do requerimento descrito em x), o chefe de serviço de finanças de Sines, proferiu despacho com o seguinte teor:
Informe a requerente acerca do estado actual do processo executivo, esclarecendo de que, após a apreciação pelo TAF de Beja do pedido apresentado pelo executado, se poderá dar seguimento ao requerido”; Cfr doc de fls 261 do pef apenso aos autos
z) Em 04.06.2015, foi instaurada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja a Reclamação de actos do órgão de execução fiscal que correu termos sob o n.º 200/15.9BEBJA, deduzida pelo ora Autor contra o despacho do chefe do serviço de finanças de Sines, que recaiu sobre o pedido de anulação de venda realizada em 30.12.2014, no processo de execução fiscal n.º 2259200201006398; Cfr doc de fls 261,262 do pef apenso aos autos, consulta ao sitaf cfr artº 412.º n°2 do CPC)
aa) Como fundamentos do pedido formulado nessa acção o Reclamante alegou que:
(…)
III - No caso dos autos a venda ordenada pelo Sr. Chefe de Serviço de Finanças é um acto inútil (art° 130.º do CPC ex vi art 2.º do CPPT) relativamente ao pagamento da quantia exequenda, uma vez que o valor fixado e pelo qual foi vendido o bem imóvel é insuficiente para o pagamento ao credor hipotecário Banco Santander/Totta/que pelo produto da venda, tem preferência sobre o crédito exequendo.
IV- Os actos inúteis são nulos. (a ilicitude de um acto inútil determina o sua nulidade)
(…)
VI-A venda é nulo porque lesou o património do executado sem que cumpra a sua função essencial, ou seja o seu produto não se destina ao pagamento da quantia exequenda na execução em que foi efectuada, pagamento ao exequente de cuja verificação depende exclusivamente dada a sua caracterização como instrumental daquele.
(...)
VIII-Acresce que, No âmbito das Reclamações deduzidas pelo aqui arguente, retida a sua subida ao Tribunal pelo Sr. Chefe de Serviço de Finanças, até à realização da venda, foram invocados excepções que conduzem à extinção da instância executiva, e em consequência à anulação da venda em causa.
IX-Excepções que consistem no seguinte:
- Inadmissibilidade da penhora dos bens concretamente apreendidos — A penhora enquanto fase do processo executivo extingue-se com a extinção da execução da qual depende e se insere, o que sucede nomeadamente com a extinção por determinação judicial/sentença; por prescrição da obrigação em que se funda; por ilegitimidade do executado, no caso por invalidade/inexistência da Reversão.
- Incidência sobre bens que não respondem nos termos do direito substantivo pela dívida exequenda, nem deviam ser abrangidos pela penhora — A extinção determina a extinção da penhora nos termos supra indicados, pelo que os bens do Reclamante não respondem pela dívida exequenda;
(…)
5 - Padecendo tal informação dos vícios de facto a seguir identificados, não teve em consideração o que é fundamental nesta matéria ou seja:
a) O aqui Reclamante arguente da venda não pode apresentar nos termos da alínea b) do n.° 1 do art.° 257.º do CPPT qualquer fundamento de oposição à execução no prazo normal de 30 dias após a citação ou a penhora, tal como previsto na alínea a) do n.º 1 do art 203.º do CPPT, pela singular razão de não ter sido citado/notificado do despacho que determinou a reversão, nem notificação da penhora.
b)Tais factos são fundamento das reclamações em curso no Tribunal Tributário de Beja a que lhes foi atribuído o n.º 23715.5BEBJA.
(…)
7-A procedência de qualquer das supra indicadas excepções (ilegitimidade e prescrição) são fundamento para a requerida anulação da venda tal como previsto no n.º 1 alíneas a) e b) do art.º 839.º do CPC na redacção da Lei 4/2013 de 26 de Junho.
E manifesto que:
8-o) Ilegitimidade - Ausência de responsabilidade do aqui reclamante nos termos previstos no art.º 24.º n.º 2 alínea b) da LGT à contrário no que diz respeito à suposta Reversão quanto a ele operada (art.º 24.º da LGT n.º 2 alínea b) - ... Os administradores, directores e gerentes e outros pessoas que exerçam, ainda que somente de facto...
b) Prescrição da prestação tributária, por decurso do prazo de oito anos previsto no art.º 48.º n.º 1 da LGT.
c)A extinção da execução nos termos supra indicados, determina a extinção da penhora, pelo que os bens do reclamante não respondem pela dívida exequenda.” Cfr consulta ao SITAF nos termos do art.º 412.° n. 2 do CPC)
bb) Foi o seguinte o pedido formulado ao Tribunal pelo ora Autor na petição inicial que deu origem àquela acção 200/15.9BEBJA:
(…)
O pedido de anulação da venda em causa, fundado no que supra se deixou alegado e demonstrado, deve proceder, e em consequência ser o arguente da anulação restituído no bem imóvel objecto de penhora e vendido…” (consulta ao sitaf nos termos do art.° 412.º n.º 2 do CPC)
cc) Em 08.06.2015, foi pago o documento único de cobrança1510212259722110000006, emitido com referência ao processo 2259200201006398, no valor de € 68 666,00 e com data limite de pagamento de 30.06.2015; cfr doc de fls 265 do pef apenso aos autos
dd) Em 08.06.2015, deu entrada no serviço de finanças de Sines via correio electrónico, carta de Sociedade Predial …………… S.A., com o seguinte teor:
Enviamos em anexo comprovativo do valor remanescente da venda do bem adquirido no leilão 2259.2014.89.
Fica a partir desta data liquidado integralmente o bem, assim como o IMT e o Imposto de selo, pagos em Janeiro p.p.
(…)”;
ee) Em 10.09.2015, na reclamação de actos do órgão de execução fiscal n.º 200/15.BEBJA, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja foi proferida sentença com o teor que consta de fls 277 a 295 do pef apenso aos autos, o qual aqui se dá por integralmente reproduzido, julgando a acção totalmente improcedente e mantendo a decisão reclamada;
ff) Essa sentença foi objecto de recurso para o Tribunal Central Administrativo Sul;
gg) Em 18.02.2016, pelo Tribunal Central Administrativo Sul, em sede de recurso da sentença proferida no âmbito do processo 200/15.9BEBJA, foi proferido acórdão com o teor que consta de fls 330 a 336 do processo de execução apenso aos autos, o qual aqui se dá por integralmente reproduzido, através do qual foi negado provimento ao recurso e confirmada a sentença recorrida; Cfr doc de fls 330 a 336 do pef apenso aos autos, consulta ao sitaf art° 412.º n.º2 do CPC)
hh) O Reclamante deduziu incidente de nulidade do acórdão do TCA SUL prolatado em 18.02.2016, que veio a ser indeferido por acórdão do mesmo Tribunal em 09.06.2016;
ii) O Reclamante interpôs recurso por oposição de acórdãos, invocando que o acórdão do TCA Sul proferido em 18.02.2016 em sede de recurso da sentença proferida no processo 200/15.9BEBJA, estava em oposição com o acórdão do STA - 2.ª secção, datado de 12/02/2014, o qual foi rejeitado em 12.08.2016, por inexistência de requisitos para a alegada oposição de julgados;
jj) O Reclamante interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo desta decisão do Tribunal Central Administrativo Sul;
kk) Em 23.06.2017, o ora Reclamante dirigiu ao Presidente do Supremo Tribunal Administrativo requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, que foi admitido;
ll) Pelo Tribunal Constitucional foi proferida decisão sumária sobre recurso interposto pelo ora Reclamante com o teor que consta de fls 113 verso a 117 dos autos, o qual aqui se dá por reproduzido, na qual foi decidido não conhecer do objecto do recurso por inadmissibilidade do mesmo; Cfr doc de fls 114 a 117 dos autos
mm) Em 29.11.2016, o Reclamante foi notificado pelo serviço de finanças de Sines, no âmbito do processo 2259200201006398, para efectuar a entrega das chaves do imóvel de que era depositário no prazo de 5 dias;
nn) Com data de 29.11.2016, deu entrada no serviço de finanças de Sines requerimento do Reclamante com o seguinte teor:
A………….. Executado nos autos acima referenciados, notificado para a entrega das chaves do seu imóvel identificado nos autos supra, vem dizer que tal entrega não tem qualquer fundamento, e por isso constitui um ato discricionário, a por isso Nulo, da AT, uma vez que, como é do conhecimento do Sr. Chefe de serviço de Finanças, deduziu judicialmente anulação da venda, processo que corre seus termos no Supremo tribunal Administrativo, conforme documento que anexa. (Doc. N°1)
Assim, e com todo o respeito por opinião diversa, não tem, de entregar quaisquer chaves, enquanto inexistir decisão definitiva quanto à invalidade da venda
Junta: Um documento
oo) Com data de 27.01.2017, pelo chefe do serviço de finanças de Sines, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 2259200201006398, foi proferido despacho com o seguinte teor:
Em cumprimento do disposto no art.º 260.° do Código de Procedimento e de Processo Tributário ordeno o levantamento da penhora e respetivo cancelamento do registo que impende sobre o prédio urbano inscrito na matriz da freguesia de Santo André, concelho de Santiago do Cacém sob o artigo 5955, descrito na Conservatória do Registo Predial de Santiago do Cacém sob o n.° 3683/20010824, bem como o cancelamento dos registos dos direitos reais que caducam, nos termos do n.º 2 do art.º 824.º do Código Civil, a saber: Ap. 9 de 2002/11/26: Ap. 10 de 2002/11/26 e ,Ap. 18 de 2007/09/05 Ap. 19 de 2007/09/05 Ap. 23 de 2007/09/05 Ap. 2542 de 2012/03/08 Ap. 3519 de 2012/11/27.
pp) Em 18.04.2017, deu entrada no serviço de Finanças de Sines requerimento do ora Reclamante com o seguinte teor:
EXECUÇÃO n.º 2259200201006398
EXMO SENHOR CHEFE DE SERVIÇO DE FINANÇAS
A………….. titular do NIF…………, executado nos autos acima identificados, tendo conhecimento das diligências efectuadas pela compradora do seu imóvel através da venda cuja anulação se encontra pendente, vem arguir a nulidade dos atos a seguir identificados:
1.º Auto de Adjudicação (Doc. Nº 1)
2.º Depósito do remanescente do preço datado de 30.06.2015 (Doc. Nº 2)
Realizada a venda e depositada parte do preço, foi proferido despacho pelo Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Sines em 24.02.2015, a determinar a suspensão dos termos da execução/venda até à decisão final do processo de reclamação judicial deduzido pelo aqui requerente contra a venda (Doc. Nº 3)
2-Até à presente data não foi proferida nem transitou em julgado decisão definitiva sobre o objeto da reclamação.
Todavia.
3-Foi admitido o depósito do remanescente do preço da venda em 30.05.2015, contra o despacho de 24.02.2015;
4-Foi elaborado e emitido “auto de adjudicação” datado de 15.01.2215. com expressa referência ao pagamento da totalidade do preço àquela data, do IMT e do Imp. Selo.
(…)
São Nulos os atos administrativos eivados de falsidade manifesta como os presentes (art. 161º do CPA e 59º nºs 1 e 2 da LGT)
Termos em que,
Devem ser declarados nulos os atos ora reclamados com as legais consequências.
Junta: Três docs.
qq) Foram juntos a esse requerimento, um auto de adjudicação, um documento único de cobrança e uma certidão, com o teor que consta de fls 404 a 406 do pef apenso aos autos, o qual aqui se dá por integralmente reproduzido;
rr) Em 10.10.2017, deu entrada no serviço de finanças de Sines requerimento do ora Reclamante, dirigido ao chefe do serviço de finanças, com o seguinte teor:
A…………., residente na Avenida ………., Lote …….., 7520-……… Sines, contribuinte fiscal número …………, executado por reversão por dívidas da devedora originária B………., Lda., nos autos à margem identificados, tendo compulsado os autos, vem expor e requerer o seguinte:
1. Nos autos foi penhorado ao executado o prédio urbano sito em ………., Lote ……. Santo André, freguesia de Santo André, concelho de Santiago do Cacém, inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo 5955º.
2. Por despacho proferido por V. Exa. em 07.11.2014 foi determinada a venda do mesmo prédio, na modalidade de leilão electrónico, pelo preço de 102.598€ e designados os dias 15.12.2014 para abertura e 30.12.2014 para encerramento do leilão (cfr. fls. 204).
3. No dia 30.12.2014 o prédio foi adjudicado à Sociedade Predial ………., SARL, pessoa coletiva número ………….., pelo preço de 103.000€ (fls. 222).
4. No dia 2.01.2015 a Sociedade Predial ……….., SARL, requereu autorização, nos termos do artigo 256°, al. f) do CPPT, para depositar um terço do preço e o restante no prazo máximo de 8 meses (fls. 226).
5. No pedido apresentado, a referida sociedade não apresentou qualquer justificação para a dispensa de pagamento imediato (fls. 227). Assim.
6. Por ofício de V. Exa. de 15.01.2015, a mesma. Sociedade, foi notificada do deferimento do pedido, na modalidade pretendida, mas sem invocação de qualquer fundamento ou razão de ser (cfr.. fls. 231).
7. Somente no dia 29 a Sociedade Predial …………, SARL, procedeu ao depósito de €34.334,00 (cfr. fls. 248), correspondente a 1/3 do valor do preço.
8. No dia 8.06.2015 a mesma sociedade pagou o restante do preço, no montante de € 68.666,00.
9. O executado apenas tomou conhecimento destes factos através de consulta ao processo realizada no dia 26.09.2017.
10. A Sociedade Predial ………, SARL, é uma sociedade comercial anónima, cujo capital é representado por acções, que podem ser nominativas ou ao portador, reciprocamente convertíveis, a pedido do accionista.
11. O executado apenas tomou conhecimento deste facto através de certidão do pacto social da mesma sociedade, requerida no dia 30.09.2017.
Ora.
12. Nos termos da al. b) do n.º 1 do artigo 256° do CPPT, com a redacção dada pela Lei n° 15/2001, de. 5 de Junho, as entidades cujos regimes jurídicos não permitam identificar os titulares efectivos do capital, não podem adquirir bens por venda em processo de execução fiscal.
13. As sociedades anónimas cujo capital social seja representado por acções ao portador não permitem a identificação dos titulares efectivos do seu capital.
14. Sociedade anónima é uma forma jurídica de constituição de empresas na qual o capital social não se encontra atribuído a um nome em específico, mas está dividido em ações que podem ser transaccionadas livremente, sem necessidade de escritura pública ou outro ato notarial.
15. A Sociedade Predial …………, SARL não podia por isso ser admitida a apresentar propostas no leilão promovido nos autos à margem identificados e, tendo-o feito, a sua proposta não podia ser aceite, nem o bem lhe podia ser adjudicado.
16. Conforme refere o Exmo. Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, in CPPT anotado volume IV, 6.ª edição, na página 206, que se transcreve: “Não se trata, aqui de uma proibição da prática de um acto ditada por razões processuais, que tenham a ver com o exame ou a decisão do processo de execução fiscal, mas sim de uma verdadeira norma de direito substantivo, incluída na regulamentação do processo de execução fiscal, precisamente com a mesma natureza que tem a norma da alínea a) do mesmo art. 256°, cuja natureza substantiva é evidente, em face de estar incluída no CC.
Sendo assim, pelas razões que se referiram em nota à anotação anterior, é de entender que se trata de uma situação de nulidade da venda que acresce às indicadas no art. 257.° do CPPT e nos arts. 908.° e 909.° do CPC.
Tratando-se de uma invalidade substantiva, o seu regime é o da nulidade, por força do disposto no art. 294.° do CC, podendo ser arguida a todo o tempo, por qualquer interessado e conhecida oficiosamente, a todo o tempo, pelo tribunal (art. 286,° do CC).”
Por outro lado,
17. Nos termos da al. f) do artigo 256°, do CPPT, pode ser autorizado o depósito, no prazo de 15 dias a contar da decisão de adjudicação, de apenas parte do preço, não inferior a um terço, ficando o proponente obrigado à entrega da parte restante no prazo máximo de oito meses.
18. A autorização é concedida a pedido fundamentado do proponente, isto é, a pedido no qual se invoquem motivos para afastar o regime regra do depósito integral do preço proposto.
19. Ora, in casu a proponente limitou-se a referir como “fundamentação” que, “obrigando-nos a entregar a parte restante no prazo máximo de oito meses necessário para mobilizarmos os necessários recursos financeiros.”
Além disso,
20. Ao menos parte do preço tem de ser depositado até ao termo do prazo de 15 dias contado da data da decisão de adjudicação, isto é,
21. No caso dos autos, atenta a data de adjudicação, 30.12.2014 (cfr. fls. 222), no mínimo 1/3 do preço teria de ser depositado até ao dia 14.01.2015.
22. No entanto, o preço apenas foi depositado no dia 29.01.2015, quando o direito a fazê-lo já se encontrava caducado. Ora,
23. A inobservância, destes requisitos traduziu-se na prática de atos que a lei não permite, susceptíveis influir na decisão da causa, pelo que são nulos, nulidade que vicia os atos subsequentes.
24. Como se escreve no Acórdão do Pleno: da Secção Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 26-02-2014, Proc. 01224/13, disponível em www.dgsi.pt, que convocamos face à sua relevância, para o caso em apreço,
…na sequência da falta de pagamento do preço da venda, a omissão dos actos referidos no predito art° 898°, n° 3, podendo ter influência na decisão do processo não pode deixar de considerar-se nulidade processual (cfr.. art.º 201°, n° 1 do CPC), que afecta os actos que deles dependem, designadamente os relativos à venda”.
A existência de uma nulidade processual susceptível de afectar o acto da venda, constitui uma causa de nulidade desta, nos termos do referido nº 1 do art° 195º (anterior 201°) e da al. c) do n° 1 do art° 839º (anterior 909°) do CPC, aplicáveis por força do disposto na al. c) do n° 1 do art° 257° do CPPT”.
25. No mesmo sentido o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 24.09.2008 Proc. 0740/08, disponível em www.dgsi.pt do qual foi Relator o Exmo. Conselheiro Lúcio Alberto de Assunção Barbosa, cujo sumário se transcreve:
“EXECUÇÃO FISCAL
VENDA TRANSMISSÃO DA PROPRIEDADE
Sumário: I — Na venda de bens em processo de execução fiscal, a transmissão da propriedade opera-se com a aceitação da proposta do comprador.
II — Mas tal venda só se concretiza com o depósito imediato da totalidade do preço ou, pelo menos, de uma parte deste, não inferior a um terço — art. 256° do CPPT.
III — Assim, se o proponente apresenta uma proposta, que é aceite, mas não deposita no acto a totalidade do preço ou pelo menos uma parte do preço, não inferior à um terço, a transmissão da propriedade não se concretiza.” (negrito e sublinhado nossos)
26. Devem, pois, ser declarados nulos os atos de aceitação da proposta apresentada pela Sociedade Predial ………….., SARL no âmbito da venda judicial realizada nos autos, nos termos da alínea b) do n° 1 do artigo 256° do CPPT e todos os atos praticados posteriormente ou, a assim não se entender, a decisão de aceitar o pagamento do preço oferecido, na modalidade prevista na al. f) do artigo 256° do CPPT e de adjudicar ao proponente o imóvel objeto da venda, por falta de fundamentação e incumprimento da obrigação de depositar pelo menos um terço do preço no prazo de 15 dias a contar da data de adjudicação.
Termos em que, com o douto suprimento de V. Exa., se requer
a) sejam declarados nulos os atos de aceitação da proposta apresentada pela Sociedade Predial …………, SARL no âmbito da venda judicial realizada nos autos, nos termos da alínea b) do n° 1 do artigo 256° do CPPT por a aquisição ser vedada a sociedades anónimas, pelo que o órgão de execução fiscal não lhe podia vender, que vicia a venda e todos os atos praticados posteriormente de nulidade, que pode ser arguida a todo o tempo;
b) ou, a assim não se entender, seja declarada nula a decisão de aceitar o pagamento do preço oferecido, na modalidade prevista na al. f) do artigo 256° do CPPT por inexistência da fundamentação a que a lei obriga.
e) ou, ainda a assim’ não se entender, sempre sem conceder; seja declarada nula a decisão de adjudicar ao proponente o imóvel objeto da venda, por incumprimento da obrigação legal de depositar pelo menos um terço do preço no prazo de 15 dias a contar da data de adjudicação que tem necessariamente como consequência a não produção de efeitos da venda, e a inadmissibilidade do proponente a adquirir novamente o bem;
d) e ordenando-se ainda o cancelamento dos registos que tenham sido realizados, de acordo com o disposto no n° 1 do art° 195° e da al. c) do n°1 do art° 839° do CPC aplicáveis por força do disposto na al. c) do n° 1 do art° 257° do CPPT (cfr. no Acórdão do Pleno da Secção Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 26 02-2014, Proc;., 01224/13, disponível em www.dgsi.pt).
ss) Com data de 25.10.2017, foi proferido pelo chefe do serviço de finanças de Sines, no do processo de execução fiscal n.º 2259200201006398, despacho com o seguinte teor:
Por petição de 10.10.2017 vem A…………, representado por Mandatário Judicial, requerer a anulação da venda e efeitos subsequentes efectuada nos autos em referência.
Acerca do mesmo assunto foi proferida decisão judicial, com trânsito em julgado em 29.08 2016, no âmbito do processo n.° 200/15.9BEBJA, motivo que impede este órgão da execução fiscal de se pronunciar acerca do pedido — art.° 205°, n.° 2 de Constituição da Republica Portuguesa e 95.° da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos.
Notifique.
tt) Com data de 26.10.2017, foi endereçado ao mandatário do reclamante ofício assinado pelo chefe do serviço de finanças de Sines dando-lhe conhecimento do teor daquele despacho;
uu) A petição inicial que deu origem à presente Reclamação de actos do órgão de execução fiscal deu entrada no serviço de finanças de Sines em 07.11.2017.
Nada mais se deu como provado.

Há agora que apreciar o recurso que nos vem dirigido e, desde já, se poderá afirmar, após uma leitura atenta da sentença recorrida e dos argumentos trazidos aos autos em sede de alegações de recurso pelo recorrente, que aquela sentença não se poderá manter.
Também o Sr. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da revogação da sentença recorrida, o qual, por uma questão de simplicidade no tratamento da questão, seguiremos de perto, terminando a final por dar provimento ao recurso que nos vem dirigido.

O tribunal recorrido elegeu como questão decidenda a de saber se a decisão do órgão de execução fiscal padecia de ilegalidade, por não ter apreciado o pedido de declaração de nulidade do ato de venda, com base no facto de tal pretensão já ter sido apreciada em sede do processo nº 200/15.9BEBJA, cuja decisão já transitara em julgado.
Considerou o tribunal "a quo" que, ainda que com base em diferentes vícios de atos anteriores ao ato de venda, a pretensão manifestada no requerimento dirigido ao órgão de execução fiscal era idêntica à pretensão que havia sido apreciada em sede do processo nº 200/15.9BEBJA, e que consistia na "anulação do ato de venda do imóvel", em decorrência da verificação daqueles vícios.
Entendeu o tribunal "a quo" que «a autoridade do caso julgado não exige a verificação de identidade de sujeitos, de causa de pedir e de pedido, mas apenas que a nova decisão a proferir sobre questão essencialmente idêntica à que foi objecto de decisão anterior, possa com ela ser contraditória». Tendo concluído que «o acto reclamado, ao ter recusado apreciar o pedido de declaração de nulidades processuais ali invocadas pelo ora Reclamante, na medida em que a sua apreciação invadiria os limites do caso julgado resultante da sentença proferida no processo 200/15.9BEBJA, não sofre de qualquer invalidade, razão pela qual terá que ser mantido na ordem jurídica».
Assim, a questão que se coloca consiste em saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento ao ter considerado que a autoridade do caso julgado impedia a apreciação da pretensão deduzida pelo Reclamante.
Decorre da matéria de facto assente na sentença recorrida que o Recorrente já anteriormente suscitara junto do órgão de execução fiscal a apreciação de pretensão de anulação do ato de venda, tendo do seu indeferimento sido apresentada reclamação para o tribunal tributário, que deu origem ao processo nº 200/15.9BEBJA, que correu termos no TAF de Beja, e cuja decisão já transitou em julgado.
Decorre igualmente da sentença que a decisão proferida naquele processo pelo TAF de Beja, confirmada posteriormente por acórdão do TCA Sul, julgou improcedente a reclamação apresentada do ato do órgão de execução fiscal de indeferimento do pedido de anulação de venda, com os seguintes fundamentos:
a) Por a pretensão de anulação do ato determinativo da venda ser já objecto de apreciação no processo nº 23/15.BEBJA;
b) Por a reclamação do ato de indeferimento do pedido de anulação de venda não ser o meio processual adequado para a apreciação da invocada ilegitimidade do executado;
c) Por a anulação da dívida exequenda invocada não respeitar à dívida tributária em causa nos autos.
Resulta de tais elementos que a decisão do TAF de Beja proferida no processo nº 200/15.9BEBJA, embora tenha tido como objecto a pretensão de anulação do ato de venda, não conheceu de qualquer vício respeitante ao mesmo ato, limitando-se a rejeitar o conhecimento das questões suscitadas por razões meramente formais. Daí que o tribunal não se tenha pronunciado sobre a validade ou invalidade do ato da venda executiva, subjacente à pretensão da sua anulação e que constituía o objecto do processo.
Daí que a questão que se coloca é a de saber se a autoridade do caso julgado invocada pelo tribunal "a quo" se impõe neste caso.
No acórdão do STJ de 21/03/2013, proc. 3210/07, que evoca a lição do professor Manuel de Andrade, refere-se que «o fundamento do caso julgado reside no prestígio dos tribunais (considerando que «tal prestígio seria comprometido em alto grau se mesma situação concreta uma vez definida por eles em dado sentido, pudesse depois ser validamente definida em sentido diferente») e numa razão de certeza ou segurança jurídica (e sem o caso julgado estaríamos caídos numa situação de instabilidade jurídica verdadeiramente desastrosa»). Assim, ainda que se não verifique o concurso dos requisitos ou pressupostos para que exista a excepção de caso julgado (exceptio rei judicatae), pode estar em causa o prestígio dos tribunais ou a certeza ou segurança jurídica das decisões judiciais se uma decisão, mesmo que proferida em outro processo, com outras partes, vier dispor em sentido diverso sobre o mesmo objecto da decisão anterior transitada em julgado, abalando assim a autoridade desta».
Todavia, refere-se igualmente no mesmo aresto, invocando-se o disposto no atual artigo 621º do CPC, «Mesmo para quem entenda que relativamente à autoridade do caso julgado não é exigível a coexistência da tríplice identidade, como parece ser o caso da maioria jurisprudencial, será sempre em função do teor da decisão que se mede a extensão objectiva do caso julgado e, consequentemente, a autoridade deste».
Refere igualmente a este respeito Miguel Teixeira de Sousa (in" O objecto da sentença e o caso julgado material", BMJ 325, pág. 49 e segs.) que a « ... excepção do caso julgado visa evitar que o órgão jurisdicional, duplicando as decisões sobre idêntico objecto processual, contrarie na decisão posterior o sentido da decisão anterior ou repita na decisão posterior o conteúdo da decisão anterior: a excepção do caso julgado garante não apenas a impossibilidade de o Tribunal decidir sobre o mesmo objecto duas vezes de maneira diferente ( ... ), mas também a inviabilidade do Tribunal decidir sobre o mesmo objecto duas vezes de maneira idêntica ( ... ).
Quando vigora como autoridade do caso julgado, o caso julgado material manifesta-se no seu aspecto positivo de proibição de contradição da decisão transitada: a autoridade do caso julgado é o comando de acção ou a proibição de omissão respeitante à vinculação subjectiva a repetição no processo subsequente do conteúdo da decisão anterior e à não contradição no processo posterior do conteúdo da decisão antecedente»
Também o STJ considerou, fazendo-se a distinção entre a figura da "exceção do caso julgado", em que se exige a tríplice identidade (sujeitos, causa de pedir e pedido), e a figura da "autoridade do caso julgado", que a « ... excepção de caso julgado destina-se a evitar uma nova decisão inútil (razões de economia processual), o que implica uma não decisão sobre a nova acção, pressupondo uma total identidade entre ambas as causas; A autoridade de caso julgado importa a aceitação de uma decisão proferida em acção anterior, que se insere, quanto ao seu objecto, no objecto da segunda, visando obstar a que a relação ou situação jurídica material definida por uma sentença possa ser validamente definida de modo diverso por outra sentença (razão de certeza ou segurança jurídica)»,
Aplicando ao caso concreto tais ensinamentos doutrinais, que são adotados de forma maioritária na jurisprudência, temos que a validade ou invalidade do ato de venda não foi objeto de qualquer pronuncia pelo tribunal na ação que deu origem ao processo nº 200/15.9BEBJA, cuja decisão transitou em julgado, como se infere dos elementos supra enunciados a esse propósito. De facto e como se deixou supra exarado, embora tendo como objecto a pretensão de anulação do ato de venda, o tribunal não conheceu de qualquer vício respeitante ao mesmo ato, limitando-se a rejeitar o conhecimento das questões suscitadas pelo Reclamante por razões meramente formais. Não se coloca assim a situação de a questão decidida anteriormente pelo tribunal poder ser objecto de nova ou outra definição por parte do mesmo tribunal e nessa medida correr-se o risco de decisões contraditórias.
Tanto basta para que a invocação da "autoridade do caso julgado" não se mostre pertinente no caso concreto, pois não se coloca a questão da decisão anterior do TAF de Beja sobre a validade ou invalidade do ato de venda se impor ao mesmo tribunal neste processo, mostrando-se respeitado o disposto no artigo 621º do CPC.
Carece, assim, de sustentação a asserção retirada na sentença recorrida, no sentido de que «ao julgar» totalmente improcedente a reclamação apresentada, mantendo-se a decisão reclamada, em face do pedido de anulação da venda que lhe foi formulado pelo Autor, tem claramente implícito um juízo de que essa venda não é inválida». Por outro lado e ainda que seja controversa na doutrina a extensão dos efeitos do caso julgado aos juízos implícitos, estes não podem deixar de estar intimamente imbricados com a parte dispositiva da sentenças. Ora, no caso concreto não é isso que ocorre, pois o que levou o TAF de Beja a julgar improcedente a pretensão de anulação do ato de venda no processo nº 200/15.9BEBJA, assentou na circunstância de os factos alegados como causa de pedir ou não serem passíveis de conhecimento na ação por razões formais ou não terem qualquer conexão com o objeto do processo. Não há nesta apreciação efetuada pelo tribunal qualquer juízo sobre a validade ou invalidade do ato de venda que importe acautelar como valor de certeza e segurança jurídica na relação de conflito entre as partes envolvidas. E é neste ponto que a doutrina distingue os efeitos preclusivos da figura da "autoridade do caso julgado" da figura da "exceção do caso julgado", ou seja, a "autoridade do caso julgado" impõe-se de forma positiva ("proibição de contradição e permissão de repetição", como refere Miguel Teixeira de Sousa, na ob. cit., pág.1796).
Também enferma de erro de julgamento o entendimento acolhido na sentença recorrida, no sentido de que com o trânsito em julgado da decisão proferida no processo nº 200/15.9BEBJA o ato de venda consolidou-se na ordem jurídica, pois a única coisa que podemos dizer que se consolidou foi a decisão proferida no processo. Mas os efeitos preclusivos projetados por essa decisão circunscrevem-se aos termos da decisão (art. 621º do CPC), ou seja, sobre o objeto daquele processo e não sobre a tutela jurisdicional requerida pelo autor da ação e manifestada na pretensão deduzida.
De resto, este entendimento agora expresso já foi anteriormente reconhecido por este Supremo Tribunal no acórdão datado de 07.12.2011, recurso n.º 0419/11, com o seguinte sumário:
I - Os limites objectivos do caso julgado definem-se por referência ao objecto do processo.
II - No processo de anulação de actos tributários o objecto do processo define-se necessariamente por referência a um acto inválido: o pedido imediato do impugnante corresponde à eliminação do acto impugnado da ordem jurídica, e com ela, a cessação da situação lesiva por ele causada; e a causa de pedir, às específicas causas de invalidade invocadas.
III - Mas o facto do acto ser um elemento essencial da acção impugnatória, não permite concluir que o objecto do processo se identifique com ele, pois, subjacente à pretensão anulatória existe sempre uma relação material constituída pela definição introduzida pelo acto na ordem jurídica e pela lesão que ele causa à posição jurídica subjectiva do impugnante.
IV - O caso julgado material estende-se assim ao juízo que o tribunal faz sobre os pressupostos de que depende o exercício do poder consubstanciado no acto ou sobre a ocorrência de factos impeditivos ou extintivos que obstem a esse exercício.
V - Por isso, há identidade de objecto se já existir uma sentença transitada em julgado que apreciou os concretos fundamentos de facto e de direito em que se baseia a pretensão anulatória do acto impugnado.

Assim, por estas razões procede o recurso que nos vem dirigido.

Pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em:
a) Conceder provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida;
b) Ordenar a baixa dos autos ao tribunal “a quo” para que aí sejam conhecidas as questões e pedido formulados pelo recorrente.
Custas pela recorrida, sem t.j. uma vez que não contra-alegou.
D.n.

Lisboa, 27 de Junho de 2018. – Aragão Seia (relator) – Dulce Neto – Pedro Delgado.