Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:011/20.0BELLE
Data do Acordão:12/09/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:SUZANA TAVARES DA SILVA
Descritores:RGIT
PAGAMENTO POR CONTA
CONTRA-ORDENAÇÃO
Sumário:O STA, há longa data e pela intervenção de várias gerações de Conselheiros, versando todo o tipo de argumentação, entende que não havendo imposto devido a final do exercício a que respeita o pagamento por conta omitido (mesmo que seja o segundo), fica excluída a ilicitude da conduta - artigo 114.º, n.ºs 1, 2, e 5, alínea f) do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT).
Nº Convencional:JSTA000P28647
Nº do Documento:SA220211209011/20
Data de Entrada:07/02/2021
Recorrente:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A……………., LDA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

I - Relatório

1 – A……………, Lda., com os sinais dos autos, recorreu para o TAF de Loulé da decisão do Chefe do Serviço de Finanças de Lagos, datada de 2 de Dezembro de 2019, que, com fundamento na “falta de entrega de Pagamento por Conta”, em sede de Imposto sobre Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC), lhe aplicou uma coima no valor de € 5.215,29, no processo de contra-ordenação n.º 1074-2019/06000000054463.

2 – Por sentença de 30 de Março de 2021, o TAF de Loulé julgou procedente o recurso.

3 – A Representante da Fazenda Pública, inconformada com sentença do TAF de Loulé, vem dela interpor recurso, apresentando, para tanto, alegações que remata com as seguintes conclusões:
«[…]
I. Decidiu o Meritíssimo Juiz “a quo” pela procedência dos autos de Recurso, por considerar que durante o ano de 2019, a recorrente efectuou dois pagamentos por conta, com base no rendimento que declarou para o exercício de 2018, contudo dessa falta de pagamento não resultou prejuízo para o Estado, pois em 2019 a Recorrente apurou IRC a recuperar, não havendo por esse motivo, nesse ano, qualquer montante a pagar de imposto ao Estado;

II. O Mm.º Juiz “a quo” considerou que no exercício de 2019 a Arguida apresentou um valor de IRC a recuperar de € 32.809,32 e, assim sendo, a sua conduta não preencheu os elementos constitutivos da infracção prevista na alínea f), do n.º 5, do art.º 114.º do RGIT, por se verificar uma causa de exclusão da ilicitude a respeito da sua omissão, o que deverá conduzir à sua absolvição”.

III. A questão decidenda prende-se com a (não) aplicabilidade à situação dos autos da previsão do disposto na alínea f) do n.º 5 do artigo 114.º do RGIT, apesar ser reconhecido pela Arguida e pela sentença “a quo” a falta de entrega dentro do prazo do segundo pagamento por conta do imposto (IRC), no montante de €17.265,00, por se verificar que, para o mesmo período (ano de 2019), a Arguida “apurou imposto a recuperar de € 32.809,32”;

IV. Ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 107.º do CIRC, quando o sujeito passivo verificar, pelos elementos de que disponha, que o montante do pagamento por conta já efetuado é igual ou superior ao imposto que será devido com base na matéria coletável do período de tributação, pode, efetivamente, deixar de efetuar o terceiro pagamento por conta, mas não o segundo;

V. Atuou devidamente, porque conforme à lei, a AT ao sancionar a conduta da arguida por esta violar o disposto na supra citada alínea a) do n.º 1 do artigo 104.º do CIRC, incorrendo assim na prática de uma contraordenação prevista e punida pelos artigos 114.º, n.º 2 e n.º 5 alínea f) do mesmo diploma e artigo 26.º, n.º 4 do RGIT;

VI. Com efeito, é aplicável a coima mesmo que a conduta seja a título de negligência e ainda que o período de não entrega não ultrapasse os 90 dias conforme o dispõe o n.º 2 do art.º 114.º do RGIT;

VII. Ao decidir pela procedência do pedido, incorreu o Mmº Juiz a quo em erro de julgamento e violou o disposto nos art.º 79.º n.º 1 e 114.º n.º 1 e 2 do RGIT, bem como o n.º 1 do artigo 107.º do CIRC.

Pelo exposto e com mui douto suprimento de V. Exas., deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, revogada a sentença recorrida como é de inteira JUSTIÇA.
[…]».


3 – A A……………, Lda, contra-alegou, formulando as seguintes conclusões:
«[…]
I. A jurisprudência tem decidido que a liquidação dos pagamentos por conta não lesam [sic] o Estado, pelo que, para que os referidos pagamentos constituam uma infração tributária equiparada à falta de entrega da prestação tributária, é essencial que exista lucro tributável ao final do período de imposto do respectivo pagamento por conta;

II. Conforme constam nos autos, relativamente ao exercício do ano de 2019, a aqui Arguida apresentou um valor de IRC a recuperar de € 32.809,32 (trinta e dois mil, oitocentos e nove euros e trinta e dois cêntimos);

III. Assim sendo, a aqui Arguida não teve qualquer lucro tributável no período fiscal referente ao exercício do ano de 2019, pelo que se encontra excluída a ilicitude da conduta desta pelo seu comportamento omissivo, considerando, também, que a sua actuação não preenche todos os elementos que constam na infracção tipificada na alínea f), do nº.5, do artº.114.º, do R.G.I.T, nem lesa o Estado;

IV. Mais, não havendo imposto devido a final como resulta dos autos, não se aplica o n.º 1 do art.º 107.º do CIRC.

V. A aplicação da coima à aqui Arguida colocaria em causa os princípios constitucionais da tributação do lucro real, da justiça, da legalidade e da proporcionalidade, sendo que o contribuinte deve ser tributado de acordo com a sua capacidade e lucro tributável do período, se existir.

VI. Consequentemente, esteve bem o Tribunal a Quo ao decidir pela absolvição da aqui Arguida.

Por tudo o exposto, e sem necessidade de mais amplas considerações, deverá a apelação ser julgada improcedente, por não provada, e, consequentemente, confirmar a decisão proferida pelo tribunal a quo com todos efeitos legais.

[…]».



4 - O Excelentíssimo Representante do MP junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido ser negado provimento ao recurso.

Cumpre apreciar e decidir.

II – Fundamentação


1. De facto
A decisão recorrida deu como provada a seguinte factualidade concreta:
[…]

1. Em 16 de Outubro de 2019, no Serviço de Finanças de Lagos, foi autuado contra a Arguida A…………, Lda., o processo de contra-ordenação n.º 1074-2019/06000000054463, por infracção ao artigo 104.º, n.º 1, alínea a), do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas: “falta de entrega de Pagamento por Conta” – cfr. fls. 14 dos autos;

2. O processo de contra-ordenação referido no ponto anterior teve por base o Auto de Notícia n.º C0004041256/2019, de 15 de Outubro de 2019, no qual consta, designadamente, o seguinte:

[IMAGEM]

- cfr. fls. 15 dos autos;

3. No dia 2 de Dezembro de 2019, o Chefe do Serviço de Finanças de Lagos proferiu decisão de aplicação de coima à Arguida, – a qual se dá aqui por integralmente reproduzida -, e na qual consta, designadamente, o seguinte:

[IMAGEM]

- cfr. fls. 52 dos autos;

4. A Arguida efectuou o primeiro pagamento por conta do imposto do ano de 2019 em 1 de Agosto de 2019 – cfr. fls. 47 dos autos; a

5. A Arguida efectuou o primeiro pagamento por conta em referência no dia 22 de Outubro de 2019 – cfr. fls. 7 e 8 dos autos.

6. No exercício do ano de 2019, a Arguida apresentou um valor de IRC a recuperar de € 32.809,32 – cfr. fls. 116 dos autos, numeração SITAF.

Inexistem quaisquer factos, com interesse para a decisão da causa, que importe dar como não provados.

[…]».

2. Questões a decidir
A única questão que vem suscitada no âmbito do presente recurso é a de saber se existe erro de julgamento do Tribunal a quo quando considera que, não havendo imposto devido a final do exercício a que respeita o pagamento por conta omitido, fica excluída a ilicitude da conduta tipificada no artigo 114.º, n.ºs 1, 2, e 5, alínea f) do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT).


3. De direito
A questão que vem suscitada no âmbito do presente recurso tem sido decidida de forma reiterada e unânime pela jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo no sentido firmado na decisão recorrida.

No acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 2 de Dezembro de 2020 (proc. 02482/17.2BEBRG), disponível em www.dgsi.pt, em que se discutia o direito aplicável a uma factualidade semelhante, afirmou-se o seguinte:

“(…) A sentença recorrida absolveu a arguida da contraordenação por entender que a sua conduta não era ilícita no que toca à omissão do pagamento por conta, por inexistência de lucro tributável no período fiscal a que aquela conduta omissiva se reportava.

A Recorrente não se conforma com este entendimento e defende que a não entrega do pagamento por conta só pode acontecer na situação prevista no artigo 107.º do CIRC, na redação em vigor à data dos factos, ou seja, aquando do terceiro pagamento (em causa nos autos está o segundo pagamento), caso o sujeito passivo verifique, pelos elementos de que disponha, que o montante do pagamento por conta já efetuado é igual ou superior ao imposto que será devido com base na matéria coletável do período de tributação.

Mas carece de razão.

A questão que se coloca nos autos, saber se a inexistência de lucro tributável no período fiscal a que se reporta o pagamento por conta omitido, afasta a ilicitude da conduta do sujeito passivo, foi apreciada no acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 09/10/2019, proferido no processo 0329/18.1BELLE, publicado em www.dgsi.pt, citado pela Recorrida e pelo Ministério Público, nele se podendo ler: “A norma punitiva (que identifica os elementos objectivos e subjectivos do tipo de ilícito contra-ordenacional) da conduta em causa nos presentes autos é a constante do art.º 114.ç, nºs. 1, 2 e 5, al. f), do R.G.I.T., na versão em vigor no ano de 2015 (versão da Lei 64-B/2011, de 30/12 - O.E. de 2012), a qual tinha o seguinte conteúdo:

Artigo 114.º (Falta de entrega da prestação tributária)

1-A não entrega, total ou parcial, pelo período até 90 dias, ou por período superior, desde que os factos não constituam crime, ao credor tributário, da prestação tributária deduzida nos termos da lei é punível com coima variável entre o valor da prestação em falta e o seu dobro, sem que possa ultrapassar o limite máximo abstractamente estabelecido.

2-Se a conduta prevista no número anterior for imputável a título de negligência, e ainda que o período da não entrega ultrapasse os 90 dias, será aplicável coima variável entre 15% e metade do imposto em falta, sem que possa ultrapassar o limite máximo abstractamente estabelecido.
(…)
5-Para efeitos contra-ordenacionais são puníveis como falta de entrega da prestação tributária:
(...)
f) A falta de pagamento, total ou parcial, da prestação tributária devida a título de pagamento por conta do imposto devido a final, incluindo as situações de pagamento especial por conta.

Por prestação tributária entende-se qualquer tributo que caiba cobrar à Administração Fiscal ou à Administração da S. Social (cfr. art.º 11.º, al. a), do R.G.I.T.).

No caso de não existir dolo, a falta de entrega da prestação deduzida nos termos da lei é susceptível de constituir a infracção por negligência, prevista no nº.2 deste artigo, sendo esta a espécie (ao nível do nexo de culpa - cfr. art.º 24.º, nº. 1, do R.G.I.T. (No R.G.I.T., ao contrário do que sucede no R.G.C.O. – art.º 8.º, nº. 1 - consagra-se, genericamente, a punibilidade a título de negligência, afastando-se a punição a este título apenas quando existir disposição expressa em sentido contrário - cfr. citado art.º 24.º, n.º 1, do R.G.I.T.).) de contra-ordenação imputada à sociedade arguida neste processo (cfr. n.º 2 do probatório).

No n.º 5 do preceito sob exegese, prevêem-se várias situações em que não há falta de entrega de prestação tributária recebida e que deva ser entregue à A. Fiscal, mas sim omissões que têm como consequência a falta de cobrança de imposto devido (cuja punibilidade o legislador equipara à citada falta de entrega da prestação tributária), nomeadamente, nos casos de falta de pagamentos por conta que o sujeito passivo deva efectuar, por conta do imposto devido a final, assim se remetendo para a violação das regras do pagamento por conta previstas, no ano de 2015, nos art.º 104.º, 105.º e 107.º, do C.I.R.C. (cfr. Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos, Regime Geral das Infracções Tributárias anotado, 4.ª edição, 2010, Áreas Editora, pág. 812).

No âmbito do Código do I.R.C., enquanto regime de pagamento antecipado do imposto (diferente é o pagamento especial por conta previsto no art.º 106.º, do C.I.R.C.), o pagamento por conta é devido pelos sujeitos passivos que exerçam a título principal atividades de natureza comercial, industrial ou agrícola, bem como pelas entidades não residentes com estabelecimento estável em território nacional (cfr. art.º 104.º, n.º 1, do C.I.R.C.; art.º 33.º, da L.G.T.).

Os pagamentos por conta (com vencimento nos meses de Julho, Setembro e 15 de Dezembro do próprio ano a que respeita o lucro tributável) devem ser calculados com base no imposto liquidado relativamente ao período de tributação imediatamente anterior àquele em que se devam efectuar esses pagamentos, líquido das retenções na fonte. Por outro lado, a lei prevê que o contribuinte fique dispensado de tal obrigação quando tenha tido, no exercício anterior, um lucro inferior a determinado montante (€ 200,00). Por último, se o valor do lucro tributável do exercício em curso for inferior ao do anterior, os pagamentos por conta a que o sujeito passivo está obrigado resultam excessivos, assim correspondendo ao adiantamento de um imposto não devido. Para obviar a essas situações a lei permite que o sujeito passivo suspenda os pagamentos por conta, mais concretamente, o terceiro pagamento a realizar em 15 de Dezembro do próprio ano (cfr. art.ºs 104.º, n.ºs 1 e 4, e 107.º, n.º 1, do C.I.R.C.; Rui Duarte Morais, Apontamentos ao IRC, Almedina, 2009, pág. 218 e seg.; Rui Marques, Código do IRC anotado e comentado, Almedina, 2019, pág. 878 e seg.).

Os pagamentos por conta revestem natureza provisória, apenas se podendo tornar definitivos quando o montante de imposto a pagar estiver efectivamente determinado, pelo que se verifica apenas um adiantamento do pagamento do imposto devido a final. Deste modo, o pagamento antecipado produzirá os seus efeitos se couber dentro da dívida de imposto, a qual apenas ficará determinada no momento da liquidação, sendo que a estruturação desta, em regra, implica a existência de uma obrigação acessória declarativa do sujeito passivo (cfr. v.g. art.ºs 89.º, al. a), e 90.º, n.º 1, al. a), do C.I.R.C.; José Maria Fernandes Pires e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Almedina, 2015, pág.291).

Tendo presente o quadro normativo de referência acabado de transcrever e a factualidade considerada assente nos presentes autos, julgamos, com o Tribunal "a quo", que a conduta da sociedade recorrida não preenche os pressupostos do ilícito contra-ordenacional tipificado no citado art.º 114.º, n.ºs 1, 2 e 5, al. f), do R.G.I.T. (existência de lucro tributável/imposto que seja devido no final do período fiscal em causa).

É que o "pagamento por conta" é, nos próprios termos da lei, uma entrega pecuniária antecipada, realizada por conta do imposto devido a final, no período de formação do facto tributário (cfr. art.º 33.º, da L.G.T.). O que significa, ainda, que o "pagamento por conta" tem de ser aferido face à situação contabilística da empresa no fim do período fiscal a que se refere o mesmo. Ora, se nenhuma quantia pecuniária houver de ser (antecipadamente) entregue por conta do imposto devido a final, no concernente ao período de formação do facto tributário (a que se refere o "pagamento por conta") - mormente por inexistência de lucro tributável revelado pela contabilidade, a esse tempo - aquele "pagamento por conta" não tem fundamento substantivo (nenhum relevo tendo o exame do citado art.º 107.º, n.º 1, do C.I.R.C., na sua redacção actual, a resultante da Lei 66-B/2012, de 31/12, contrariamente ao que defende a entidade apelante).
E, assim, se não houver lucro tributável, não há imposto devido. E, não havendo imposto devido, não se verifica o evento jurídico-material de que a lei faz depender a punição - porquanto não se verifica a lesão do interesse protegido pela norma. A falta de entrega da prestação por conta pode existir, mas, se não ocorrer a efectiva lesão do interesse protegido pela norma incriminadora, a infracção não se verifica, mais não podendo haver punição. Se não houver imposto devido (por não haver lucro tributável), a punição, para além de não respeitar a norma tipificadora da infracção, desrespeitaria também a valoração jurídica decorrente da harmonia do sistema fiscal, onde se contêm normas a requerer a tributação de acordo com o lucro tributável do período e segundo a capacidade contributiva do devedor - conforme, aliás, a uma visão do Direito como ordem jurídica sistémica e unitária, onde, a propósito, ganham proeminência os princípios constitucionais da tributação do lucro real, da justiça, da legalidade e da proporcionalidade. Em conclusão, nestas condições, a inexistência de lucro tributável no período fiscal a que se reporta o pagamento por conta em falta, encontra-se excluída a ilicitude da sua conduta no tocante à omissão do contribuinte (cfr. art.º 31.º, do C.Penal; art.º 2.º, n.º 1, do R.G.I.T.; ac. S.T.A.-2.ª Secção, 28/2/2007, rec.1221/06; ac. S.T.A.-2.ª Secção, 7/3/2007, rec.877/06; ac.T.C.A.Sul-2.ª Secção, 19/11/2015, proc.8920/15).
Ora, adotando este mesmo entendimento e revertendo-o para o caso sub judice, não consta na decisão administração que aplicou a coima, que a arguida tenha tido lucro tributável no final do período do pagamento por conta, antes resultando do probatório que no exercício de 2016 registou um prejuízo para efeitos fiscais de €73.947,71 (facto provado “C”). Assim, a inexistência de lucro tributável no período fiscal a que se reporta o pagamento por conta em falta, excluí a ilicitude da sua conduta no tocante à omissão da arguida, pelo que deve ser manter a decisão recorrida.

A tese da Recorrente segundo a qual a arguida estava obrigada a efetuar o pagamento por conta, porque se tratava do segundo pagamento, e que de acordo com o disposto no artigo 107.º, n.º 1 do CIRC, só podia deixar de efetuar o terceiro nas condições previstas na norma, não tem aplicação ao caso.

Na verdade, o artigo 107.º do CIRC [que dispõe: “1 - Se o sujeito passivo verificar, pelos elementos de que disponha, que o montante do pagamento por conta já efetuado é igual ou superior ao imposto que será devido com base na matéria coletável do período de tributação, pode deixar de efetuar o terceiro pagamento por conta.”], pressupõe a existência de lucro no final do exercício a que se reporta o pagamento por conta, permitindo ao contribuinte não pagar a última prestação se verificar com base na matéria tributável que o imposto devido a final será igual ou inferior ao imposto já entregue. Não havendo simplesmente imposto devido a final, a norma não tem aplicação.

(…)”

Por último, sumariou-se no acórdão de 27 de Outubro de 2021 (proc. 0336/18.4BELLE), disponível em www.dgsi.pt, o seguinte:

“O STA, há longa data e pela intervenção de várias gerações de Conselheiros, versando todo o tipo de argumentação, entende que não havendo imposto devido a final do exercício a que respeita o pagamento por conta omitido (mesmo que seja o segundo), fica excluída a ilicitude da conduta - artigo 114.º, n.ºs 1, 2, e 5, alínea f) do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT)”.

E nenhuma razão decorre destes autos para que se inflicta o sentido do assim decidido na jurisprudência antes indicada e para a qual aqui se remete nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 663.º, n.º 5 do CPC, aplicável ex vi do disposto no artigo 281.º do CPPT, sem necessidade de juntar cópia daquelas decisões, atento o facto de as mesmas estarem disponíveis, na íntegra, em www.dgsi.pt.

Cabe assim também considerar que, neste caso, a inexistência de lucro tributável no período fiscal a que se reporta a omissão do segundo pagamento por conta em falta, excluí a ilicitude da conduta da aqui arguida, como bem decidiu o TAF de Loulé.

III - Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes que compõem esta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.


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Sem custas.
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Lisboa, 09 de Dezembro de 2021. - Suzana Maria Calvo Loureiro Tavares da Silva (relatora) - Pedro Nuno Pinto Vergueiro - Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia.