Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0842/11
Data do Acordão:06/14/2012
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:REVISÃO DO ACTO TRIBUTÁRIO DA LIQUIDAÇÃO
APLICAÇÃO RETROACTIVA
SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA
ERRO DOS SERVIÇOS
Sumário:I - Nos termos da parte final do n.º 1 do artigo 78.º da Lei Geral Tributária só no caso de erro imputável aos serviços (e de o tributo não estar pago) a revisão pode efectuar-se “a todo o tempo”.
II - Verifica-se “erro imputável aos serviços” se a liquidação adicional sindicada foi efectuada na ausência de norma cominando a responsabilidade do substituto pela totalidade do imposto em caso de indevido preenchimento do formulário certificado pelas autoridades competentes do Estado da residência apresentado atempadamente.
III - Mesmo que assim não se entendesse, com a entrada em vigor da Lei do Orçamento do Estado para 2008 sempre seria de considerar que a liquidação sindicada padecia de “erro imputável aos serviços”, pois que a determinação de aplicação retroactiva do novo regime de limitação da responsabilidade do substituto, constitui um reconhecimento explícito de que era ilegal a imputação de responsabilidade ao substituto tributário quando comprovasse a verificação dos pressupostos para a dispensa total ou parcial de retenção.
IV - A excepção contida na parte final do n.º 4 do artigo 48.º da Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro à aplicação retroactiva do novo regime apenas é aplicável aos casos em que houve lugar ao pagamento e não houve reclamação, recurso hierárquico ou impugnação da liquidação, não excluindo, pois, do seu âmbito os casos em que, na ausência de reclamação, impugnação ou recurso hierárquico, não houve também pagamento.
Nº Convencional:JSTA00067682
Nº do Documento:SA2201206140842
Data de Entrada:09/22/2011
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A..., S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF SINTRA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - REVISÃO DA LIQUIDAÇÃO
Legislação Nacional:LGT98 ART78 N1
CIRC01 ART98 ART90 N6
L 67-A/2007 DE 2007/12/31 ART48 N4
L 32-B/2002 DE 2002/12/30 ART27
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC477/09 DE 2009/10/28; AC STA PROC1246/09 DE 2010/05/05; AC STA PROC618/09 DE 2010/06/09
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório -
1 – A Fazenda Pública recorre para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra de 14 de Abril de 2011 que julgou procedente a impugnação deduzida por A……, S.A. contra o indeferimento de pedido de revisão oficiosa de liquidação adicional de IRC relativo a 2001, anulando o acto de liquidação sindicado e respectivos juros compensatórios e determinando o pagamento dos juros indemnizatórios devidos.
A recorrente conclui as suas alegações de recurso nos termos seguintes:
I – O presente recurso visa reagir contra a douta sentença que julgou procedente a impugnação judicial deduzida pela A……, S.A contra o indeferimento do pedido de revisão oficiosa do acto de liquidação adicional de IRC nº 6420002401 do ano de 2001, e respectivos juros compensatórios, no valor de € 28.103,12.
II – A fundamentação da liquidação assenta na falta de cumprimento do ónus da prova dos pressupostos para a aplicação da CDT, tendo em conta que a retenção na fonte a taxa reduzida consubstancia excepção às normas gerais de tributação e traduz-se num benefício fiscal incumbindo, pois, à impugnante o ónus da prova da verificação dos pressupostos para que tal benefício lhe fosse aplicado, atento o regime do ónus da prova constante dos artigos 74º nº1 da LGT e 342º, nº2 do CC.
III – Não obstante lhe incumbir tal ónus, não efectuou a impugnante qualquer esforço probatório em sede de procedimento inspectivo, não tendo a mesma exercido o direito de audição prévia nem procedido à junção do formulário devidamente preenchido, imprescindível para a aferição da aplicabilidade das regras da CDT, sendo que é a própria impugnante que admite na p.i. que “por lapso, aquando do preenchimento do formulário relativo ao pagamento de juros (…) declarou o montante incorrecto de € 114.419,73.”
IV – E esta omissão probatória manteve-se posteriormente à notificação da liquidação, cujo termo do prazo de pagamento voluntário terminou no dia 02-12-2003, não tendo a impugnante exercido o seu direito de reclamação ou de impugnação.
V – Assim, a liquidação adicional efectuada pela administração Fiscal em 15.10.2003 é perfeitamente legal, já que procedeu à definição da situação tributária da impugnante de acordo com o disposto nos artigos 4º, nº3, alínea c) e 69º, nº2 alínea d) do CIRC, mostrando-se verificados os pressupostos de facto e de direito exigidos pelas normas em questão;
VI – Sendo que a inaplicabilidade da taxa de retenção prevista na CDT resulta da falta de apresentação de formulário adequado devidamente preenchido, requisito necessário para accionar a CDT.
VII – Ora, o pedido de revisão oficiosa só foi apresentado no dia 19 de Maio de 2009, invocando a impugnante erro de direito imputável à Administração Tributária, bem como a aplicação das normas constantes do nº 4 do artigo 48º da lei nº 67-A/2007, de 31 de Dezembro, que determina a aplicação retroactiva do regime introduzido no artigo 90.º-A nº 6 do CIRC.
VIII – Porém, não pode a Fazenda pública concordar com o decidido pelo Tribunal “a quo” no sentido de considerar que a liquidação padece de “erro imputável aos serviços”, porquanto a liquidação foi emitida em resultado da omissão da impugnante, a qual, para além de não ter reagido contra a liquidação nos momentos próprios e através dos meios que a lei lhe concede, apenas entregou os formulários corrigidos, e que permitiam aferir da aplicabilidade da CDT, 6 anos após a data da liquidação.
IX – Não se questiona que a 2a parte do n° 1 do artigo 78° da LGT permite aos contribuintes solicitar a revisão oficiosa dos actos tributários de liquidação no prazo de quatro anos após a liquidação ou a todo o tempo se o tributo ainda não tiver sido pago, desde que o erro seja imputável aos serviços.
X – Não obstante, o conceito de erro imputável aos serviços não poderá incluir as situações em que a ilegalidade da liquidação resulta de uma actuação do sujeito passivo (in casu omissiva), e como tal a este imputável. Neste sentido se pronunciam os Ilustres Juristas Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa In Lei Geral Tributária comentada e anotada, página 406, bem como o douto Acórdão do STA, proferido no Processo n° 01009/10, de 22-03-2011, disponível em www.dgsi.pt.
XI - Desta forma, não se verifica qualquer erro imputável aos serviços mas sim à impugnante, a qual não demonstrou, como lhe incumbia os pressupostos que permitiriam afastá-la da tributação regra, nem reagiu contra a liquidação, a qual já se consolidou na ordem jurídica, tendo a Administração Fiscal actuado no estrito cumprimento da lei, designadamente das normas sobre o ónus da prova constantes dos artigos 74°, nº1, da LGT e 342°, nº2, do CC, bem como dos artigos 4°, nº3, alínea c) e 69°, n° 2 alínea d) do CIRC.
XII - Como tal, ao contrário do que dispõe a douta sentença, não podia o pedido de revisão oficiosa ser requerido a todo o tempo, sendo que a apresentação do pedido de revisão 6 anos após a data da liquidação, é manifestamente intempestiva.
XIII - E igualmente se discorda com o disposto na douta sentença recorrida quanto à aplicação retroactiva do regime introduzido no artigo 90.º-A n.º 6 do CIRC, nos termos do disposto n° 4 do artigo 48° da Lei n° 67-A/2007, de 31 de Dezembro, o qual determina a aplicação com eficácia retroactiva do regime de afastamento da responsabilidade do substituto tributário previsto no n.° 6 do art. 90-A do CIRC, excepto quando tenha havido lugar ao pagamento do imposto e não esteja pendente reclamação, recurso hierárquico ou impugnação.
XIV - Ora, "in casu" o pedido de revisão não foi aceite por ser manifesta a sua intempestividade face à inexistência de erro dos serviços, única circunstância que permitiria a sua apreciação a todo tempo, pelo que não foi verificada a questão de fundo atinente à apresentação do formulário.
XV - Por outro lado cumpre referir caso se entenda que incumbia à Administração Fiscal proceder à apreciação do formulário, que à data da entrada em vigor da Lei n° 67-A/2007 não se encontrava pendente reclamação, recurso hierárquico ou impugnação judicial, sendo que, o pedido de revisão foi efectuado nos termos da 2a parte do n° 1 do artigo 78° da LCT, não tendo, por isso, natureza de reclamação.
XVI - O pedido de revisão do acto de liquidação só poderá ser incluído no n° 4 do artigo 48º da Lei n.º 67.º-A/2007, desde que a revisão tenha sido requerida ao abrigo do disposto na 1ª parte do n° 1 do artigo 78.° da Lei Geral Tributária (LGT), isto é, desde que o pedido tenha sido apresentado no prazo de reclamação administrativa (cfr. Of. Circulado n° 20131 de 2008-04-07).
XVII - Com efeito, tem a doutrina e a jurisprudência entendido que, quando se trata de interpretar normas que fazem referência à existência de reclamação, recurso ou impugnação judicial apenas poderá ser abrangido na sua estatuição o pedido de revisão previsto na 1º parte do n° 1 do artigo 78º, já que apenas este consubstancia uma reclamação verdadeira e própria.
XVIII - Ora, "in casu" à data da entrada em vigor da Lei n° 67-A/2007 não se encontrava pendente reclamação, recurso hierárquico ou impugnação judicial, sendo que, o pedido de revisão foi efectuado nos termos da 2a parte do n° 1 do artigo 78° da LGT, não tendo, por isso, natureza de reclamação.
XIX - Pelo que, errou a douta sentença ao considerar que basta um pedido de revisão efectuado pelo contribuinte, independentemente da sua natureza, para que se aplique com eficácia retroactiva o regime de afastamento da responsabilidade do substituto tributário previsto no nº 6 do art. 90-A do CIRC.
XX - Assim, deverá o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a decisão judicial recorrida por padecer a mesma de erro na aplicação do direito, por violação do artigo 78° da LGT, e do artigo 43°, no 4, da Lei nº 67-A/2007, de 31 de Dezembro.
Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada, com as devidas consequências legais. PORÉM V. EX.AS, DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA.

2 – Contra-alegou a recorrida, concluindo nos seguintes termos:
a) A Fazenda Pública apresentou recurso da douta sentença proferida nos Autos, que julgou procedente a impugnação judicial apresentada pela recorrida contra o acto de liquidação de IRC e de juros compensatórios n.º 6420002401, no valor global de € 28.103,12 e, bem assim, contra o despacho da Senhora DIRECTORA DE SERVIÇOS DO IRC, de 11 de Março de 2010, que indeferiu expressamente o pedido para promoção da sua Revisão Oficiosa, apresentado pela recorrida no dia 19 de Maio de 2009;
b) Defende a Fazenda Pública que a sentença ora proferida enferma de erro de julgamento, essencialmente, porque: (i) na situação em apreciação, o acto de liquidação impugnado não enferma de erro imputável aos serviços, mas, antes, de um erro imputável à recorrida, pelo que não poderia ser objecto de revisão nos termos previstos na última parte do n.° 1 do artigo 78° da Lei Geral Tributária; e (ii) não pode aplicar-se, no caso em apreço, o disposto no n.° 6 do artigo 90.°- A do Código do IRC, na redacção introduzida pelo artigo 48. ° da Lei n. ° 67/A-2007, de 31 de Dezembro, porquanto o pedido de promoção da Revisão oficiosa nos termos apresentados pela recorrida não consubstancia uma reclamação graciosa, não se encontrando também pendente impugnação judicial ou recurso susceptível de permitir a sua aplicação por parte da Administração tributária;
c) Porém, como a Fazenda Pública não pode olvidar, já que foi dado como provado pelo Tribunal a quo, na data em que a recorrida entregou o imposto retido à taxa convencional nos cofres do Estado e, bem assim, na data em que o acto de liquidação de IRC foi emitido, a recorrida possuía um formulário certificado pelas Autoridades austríacas, ainda que contendo um lapso no campo correspondente ao montante bruto dos rendimentos pagos à beneficiária dos rendimentos;
d) De resto, o acto de liquidação impugnado não foi emitido em virtude de a recorrida não ser possuidora de um formulário devidamente certificado pelas Autoridades competentes, mas, antes, com fundamento no incorrecto preenchimento do mesmo formulário na parte correspondente ao valor dos rendimentos pagos;
e) Acontece, no entanto, que a aplicação da taxa convencional - de 10% - não estava, conforme, erradamente, entendeu a Administração tributária, sujeita à verificação dos referidos requisitos formais;
f) Na verdade, a obrigação de certificação da residência fiscal através dos formulários aprovados pelo Ministro das Finanças foi, inovadoramente, introduzida no artigo 90.° do Código do IRC, pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, pelo que a referida obrigação legal apenas entrou em vigor no dia 1 de Janeiro de 2003;
g) Até ao dia 1 de Janeiro de 2003, apenas existia, sobre esta matéria, a referida Circular n.º 18/99, de 7 de Outubro, invocada pela Administração tributária para proceder à correcção que está na origem do acto impugnado;
h) As circulares administrativas não são (como não o eram à data) fonte de direito. De resto, as circulares administrativas que alteram(em) ou criam (em) obrigações fiscais principais ou acessórias, para a aplicação de prerrogativas legalmente previstas - como a responsabilidade imputável ao substituto tributário em caso de, alegado, incumprimento de requisitos formais estabelecidos por Circular - violam o disposto no artigo 103.°, n.ºs 2 e 3, da Constituição da República Portuguesa, e no artigo 8.º, n. ° 2, da Lei Geral Tributária;
i) No que, em particular, se refere à exigência dos certificados previstos nas Circulares emanadas pela Administração tributária até à data da entrada em vigor da redacção dada pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, ao n.° 3 do artigo 90.° do Código do IRC, esclareceu já o Tribunal Central Administrativo Sul, no Acórdão de 3 de Novembro de 2004, proferido no processo n.º 00151/04 que:

"II) Na situação descrita, com referência a esses proventos não havia, em princípio, lugar a qualquer retenção na fonte e entrega de valores ao Estado Português, irrelevando, por isso, eventuais incorrecções cometidas no preenchimento de documentação entregue aos serviços tributários.
III) - É que o reconhecimento e funcionamento do regime mais favorável decorrente da existência de benefícios, maxime, fiscais, tem carácter meramente declarativo - art. 4° n.º 2 do EBF-, no sentido de que é implicante da demonstração dos pressupostos de que depende a atribuição da vantagem específica, independentemente, de poder ser ou não formalizada.
IV) - Assim, a possibilidade de a Impugnante aplicar taxa de retenção de 15 e 20 % (em vez da de 25 %), ou, eventualmente, nada reter, apenas dependia da comprovação de que os indivíduos a que havia pago rendimentos (de trabalho independente), à data, tinham residência no Reino Unido.
V) - Uma vez feita tal prova, ainda que [não) pelas vias exigidas pelas autoridades tributárias portuguesas, a usufruição do benefício de aplicação da taxa mais baixa (ou nenhuma) era imediata e sem poder ser sujeita a outros condicionalismos".

j) A operatividade da Convenção sobre a Dupla Tributação em apreço encontrava-se, portanto, exclusivamente dependente, à data dos factos, da prova da residência da sociedade beneficiária dos rendimentos.
k) Ora, a recorrida possuía, à data da entrega do imposto retido, nos cofres do Estado, um formulário devidamente certificado pelas Autoridades Fiscais Austríacas - ainda que indevidamente preenchido no campo correspondente aos rendimentos brutos pagos à respectiva beneficiária, pelo que tal documento fazia prova da residência do respectivo beneficiário dos rendimentos.
l) Por conseguinte, a retenção na fonte feita pela recorrida foi efectuada em conformidade com os preceitos legais aplicáveis à data, pelo que o acto de liquidação de IRC e de juros compensatórios n.º 6420002401 é ilegal por assentar em erro sobre os respectivos pressupostos de direito.
m) Decorre do referido no n.º1 do artigo 78.º da Lei Geral Tributária que, ultrapassado o prazo de reclamação, o autor do acto pode, ainda, por sua iniciativa, rever o acto de liquidação com fundamento em erro imputável aos serviços. Neste caso, a revisão do acto pode ser feita no prazo de quatro anos ou a todo o tempo se o tributo ainda não estiver pago.
n) Resulta provado na sentença ora recorrida no momento em que a recorrida apresentou o pedido para promoção da Revisão Oficiosa - dia 27 de Abril de 2009 - o imposto em causa ainda não se encontrava pago, o que só veio a ocorrer posteriormente, em 24 de Novembro de 2009.
o) Assim, o Senhor Director-Geral dos Impostos poderia - e deveria ­ sem qualquer limitação, proceder à revisão do acto por si praticado. Para esse efeito, impunha-se, apenas, que o acto de liquidação tivesse sido praticado com base em erro imputável aos serviços, o que, in casu, se verificava.
p) De facto, a Administração tributária praticou o acto de liquidação de IRC impugnado aplicando, erradamente, o previsto na Circular n.º 18/99 de 7 de Outubro. É que, até à data da entrada em vigor da redacção dada pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, ao n.º 3 do artigo 90.º do Código do IRC, o indevido preenchimento dos certificados, ou mesmo a sua ausência, não faziam precludir a aplicação do mecanismo da taxa convencional, desde que fosse feita prova, por qualquer meio, da residência da entidade beneficiária – o que efectivamente se verificou no caso em apreço;
q) Acresce que também não assiste qualquer razão à Fazenda Pública quanto ao suposto erro da sentença recorrida "ao considerar que basta um pedido de revisão efectuado pelo contribuinte, independentemente da natureza do pedido, para que a Administração Fiscal deva aplicar com eficácia retroactiva o regime de afastamento da responsabilidade do substituto tributário previsto no n.o 6 do art.o 90-A do CIRC".
r) É que resulta evidente da douta sentença que a aplicação retroactiva do "afastamento da responsabilidade do substituto tributário previsto no n.o 6 do art.º 90-A do CIRC" não se funda na pendência, à data, de qualquer reclamação graciosa, recurso hierárquico ou impugnação judicial mas, antes, na verificação cumulativa de dois requisitos: (i) a obtenção, em momento posterior, de um (novo) formulário devidamente preenchido e certificado e (ii) o facto de o imposto liquidado não se encontrar pago à data em que foi apresentado, pela recorrida, o pedido de promoção da revisão oficiosa.
s) Ora, de acordo com o referido n.º 4.° do artigo 48.° da Lei n.º 67­A/2007, de 31 de Dezembro, a nova redacção do n.º 6 do artigo 90.º-A do Código do IRC é aplicável a todas as situações ocorridas em data anterior à da entrada em vigor da mesma desde que a situação tributária não se encontrasse já consolidada, o que acontecia - e acontece - sempre que o imposto ainda não se encontrasse pago ou, no caso de o pagamento já se encontrar realizado, se encontrar pendente reclamação, recurso hierárquico ou impugnação judicial.
t) O que significa, portanto, que a pendência destes meios de reacção só assume relevância no caso em que o imposto já tivesse pago, pois a discussão da legalidade dos respectivos actos de liquidação impediria a consolidação das situação tributária o substituto legal.
u) Na situação em apreço, como ficou provado, o imposto não se encontrava pago na data em que a recorrida solicitou a promoção da revisão oficiosa do acto impugnado, tendo esta apresentado, na mesma data, um novo formulário devidamente preenchido e certificado.
v) Em face do exposto, impunha-se, como bem decidiu o Tribunal a quo, que a Administração tributária procedesse oficiosamente à revogação do acto de liquidação impugnado, atenta a aplicação retroactiva daquele preceito legal.
w) Não o tendo feito, é evidente que é ilegal a decisão proferida pela Senhora DIRECTORA DE SERVIÇOS DO IRC, também objecto de impugnação, pelo que deve ser confirmada a douta sentença recorrida e ser negado provimento ao recurso apresentado pela Fazenda Pública.
TERMOS EM QUE DEVE SER NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO INTERPOSTO PELA FAZENDA PÚBLICA, MANTENDO-SE A SENTENÇA PROFERIDA PELO TRIBUNAL A QUO

3 - O Excelentíssimo Procurador-Geral adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer nos termos seguintes:
Objecto do recurso: sentença anulatória de liquidação adicional de IRC e respectivos juros compensatórios e condenatória da administração tributária no pagamento dos juros indemnizatórios devidos.

FUNDAMENTAÇÃO
1. O regime actual de dispensa de retenção na fonte sobre rendimentos auferidos por entidades não residentes disciplina com rigor a apresentação de prova e os efeitos da sua omissão (art.90º-A nºs 5, 6 e 7 CIRC redacção da Lei n° 67-A/2007,31 Dezembro):
a) obriga à prova da verificação dos pressupostos que resultem de convenção destinada a evitar a dupla tributação até ao termo do prazo estabelecido para a entrega do imposto que deveria ter sido deduzido
b) obriga o substituto tributário à entrega da totalidade do imposto quando aquela prova não tenha sido produzida até ao termo do prazo
c) afasta a responsabilidade do substituto tributário pela entrega do imposto que deveria ter deduzido quando comprove, ainda que supervenientemente, a verificação dos pressupostos para a dispensa total ou parcial da retenção
d) permite à entidade beneficiária dos rendimentos (mas não à entidade obrigada à retenção na fonte) solicitar o reembolso total ou parcial do imposto retido na fonte, quando não tenha sido efectuada a prova nos prazos e condições estabelecidos, mediante a apresentação de um formulário de modelo aprovado pelo Ministro das Finanças.
Este regime é de aplicação retroactiva às situações anteriores ao início da vigência da Lei n° 67-A/2007, 31 Dezembro, independentemente da data da liquidação do imposto, excepto quando se tenha verificado o pagamento do imposto e não esteja pendente reclamação recurso hierárquico ou impugnação (art. 48° n° 4 Lei n° 67-A/2007, 31 Dezembro; cf. neste sentido acórdãos STA SCT 21.10.2009 processo n° 518/09; 28.10.2009 processo n° 477/09)
2. Aplicando estas considerações ao caso concreto:
a) o substituto tributário comprovou, no preenchimento do formulário de modelo legalmente aprovado, apresentado em 18.01.2001, a sede na Áustria da sociedade beneficiária dos rendimentos (juros) sobre os quais incidiu a retenção na fonte (doc. fls. 84/86)
b) a aplicação na liquidação adicional de IRC efectuada em 15.10.2003 da taxa interna de retenção na fonte, em detrimento da taxa convencional reduzida prevista na Convenção sobre dupla tributação celebrada entre Portugal e a Áustria, resulta de erro imputável aos serviços da administração tributária (art. 90° nºs 2/3 CIRC redacção do art. 27° Lei n° 32-B/2002, 30 Dezembro)
c) este erro na interpretação e aplicação de normas jurídicas confere legitimidade ao pedido de revisão oficiosa da liquidação formulado pelo sujeito passivo em 15.05.2009, antes do pagamento do imposto efectuado em 24.11.2009 (probatório al. D); art.78° nº1 último segmento LGT)
d) sem embargo, a eficácia retroactiva conferida à nova redacção do art. 90º-A n° 6 CIRC pelo art. 48° n° 4 Lei n° 67-A/2007, 31 Dezembro vincula igualmente a administração tributária à revisão oficiosa do acto tributário, praticado com violação das normas que regem a retenção de imposto na fonte, a pedido do sujeito passivo formulado antes do pagamento do imposto, no exercício de um poder-dever que exige a consonância da sua actuação com princípios constitucionais de igualdade, justiça e boa fé (art. 266° nº2 RC/97)
CONCLUSÃO

O recurso não merece provimento.
A sentença impugnada deve ser confirmada.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
- Fundamentação -
4 – Questões a decidir
São as de saber, como decidido, foi tempestivo o pedido de revisão oficiosa do acto de liquidação impugnado ou, como alegado, tal pedido foi intempestivo em razão da inexistência de erro imputável aos serviços para efeitos da parte final do n.º 1 do artigo 78.º da Lei Geral Tributária e bem assim a de saber se, como decidido, ao caso dos autos é aplicável (retroactivamente) o disposto no artigo 90.º-A n.º 6 do Código do IRC nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 48.º da Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro.

5 – Na sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra objecto de recurso deram-se como assentes os seguintes factos:
A) A impte durante o ano de 2000, pagou à sociedade de direito austríaca "B……", juros no montante de € 360.569,76, efectuada em Junho e Dezembro daquele ano, tendo procedido no momento daquele pagamento, à retenção na fonte de IRC à taxa de 10%, prevista na Convenção Sobre Dupla Tributação celebrada por Portugal com a Áustria. - cfr. "Modelo 42" de fls. 83 e 84, e Relatório da I.T. de fls. 88 a 93, dos autos.
B) No preenchimento do formulário relativo ao segundo pagamento de juros referidos supra, devidamente certificado pelas autoridades austríacas, a impte declarou um montante de rendimento bruto pago ao titular do rendimento, o valor de € 114.419,73, sendo que o valor correcto era de € 237.066,65, tendo a Adm. Fiscal efectuado uma correcção do imposto a reter na fonte em resultado da aplicação da taxa interna de retenção, em resultado de uma acção da inspecção tributária que considerou que o referido formulário não se encontrava devidamente preenchido, pelo que não tendo dado cumprimento ao requisito formal daquele formulário não seria susceptível de beneficiar da redução da taxa de retenção. - cfr. Formulário de fls. 85 e 86, e Relatório da I.T. de fls. 88 a 93, dos autos.
C) Em resultado das correcções referidas supra foi emitida, em 15.10.2003, a liquidação adicional de IRC e de juros compensatórios n° 6420002401, no valor de € 28.103,12, cujo prazo limite de pagamento terminou em 02.12.2003. cfr. D.C. de fls. 94, dos autos e "Print Informático" df, fls. 93, do P.A. apenso.
D) Em 15.05.09, foi apresentado pedido de revisão oficiosa do acto tributário, cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido, e no qual foi junto um novo formulário e certificado com data de 17.06.2003, do qual consta o valor correcto dos juros pagos à entidade beneficiária, o qual foi objecto de decisão por parte da entidade competente, de indeferimento, proferido em 11.03.10, cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido, tendo o impte pago em 24.11.09 o valor de imposto adicionalmente liquidado, - cfr. Formulário certificado, de fls. 95 e 96, Documento de Pagamento de fls. 97, dos autos e Requerimento e Documentos anexos, de fls. 23 a 59, do P.A. apenso.

6 – Apreciando
6.1 Da tempestividade do pedido de revisão oficiosa
A sentença recorrida, a fls. 293 a 299 dos autos, a propósito da averiguação da invocada “extemporaneidade do pedido de revisão do acto tributário”, julgou-o tempestivo atento o disposto na parte final do n.º 1 do artigo 78.º da Lei Geral Tributária, pois que não estando o tributo pago na data em que foi efectuado o pedido de revisão e sendo de aplicar à situação dos autos a exclusão da responsabilidade do substituto prevista no n.º 6 do então artigo 90.º-A do Código do IRC – actual artigo 98.º do Código do IRC – nos termos estabelecidos no n.º 4 do artigo 48.º da Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro, (…) incumbia indubitavelmente, à Adm Fiscal, considerar aquela situação pretérita ao abrigo do referido n.º 4, do art. 48º daquela Lei, pelo que a manutenção do acto tributário representa um erro sobre os pressupostos de direito daquela liquidação de imposto, o qual constitui, nos termos alegados pelo impte e sustentado na vasta jurisprudência que cita e que aqui se subscreve, um erro imputável à Adm. Fiscal, pelo que impendia sobre a mesma um dever de proceder à revisão do acto nos termos da 2ª parte do n.º 1, do artº 78º da LGT (cfr. sentença recorrida a fls. 297 e 298 dos autos).
Discorda do decidido a Fazenda Pública, alegando, em síntese, que a apresentação do pedido de revisão 6 anos após a data da liquidação, é manifestamente intempestiva, (…) porquanto a liquidação foi emitida em resultado da omissão da impugnante, a qual, para além de não ter reagido contra a liquidação nos momentos próprios e através dos meios que a lei lhe concede, apenas entregou os formulários corrigidos, e que permitiam aferir da aplicabilidade da CDT, 6 anos após a data da liquidação, não podendo o conceito de erro imputável aos serviços (…) incluir as situações em que a ilegalidade da liquidação resulta de uma actuação do sujeito passivo (in casu omissiva), e como tal a este imputável, sustentando, pois, que não se verifica qualquer erro imputável aos serviços mas sim à impugnante, a qual não demonstrou, como lhe incumbia os pressupostos que permitiriam afastá-la da tributação regra, nem reagiu contra a liquidação, a qual já se consolidou na ordem jurídica, tendo a Administração Fiscal actuado no estrito cumprimento da lei, designadamente das normas sobre o ónus da prova constantes dos artigos 74°, nº 1, da LGT e 342°, nº2, do CC, bem como dos artigos 4°, nº3, alínea c) e 69°, n° 2 alínea d) do CIRC (cfr. conclusões I a XII das suas alegações de recurso).
O Excelentíssimo Procurador-Geral adjunto junto deste Supremo Tribunal no seu parecer junto aos autos e supra transcrito sustenta que o recurso não merece provimento.
Vejamos.
A tempestividade do pedido de revisão oficiosa da liquidação efectuado pelo recorrido em 15 de Maio de 2009 (cfr. a alínea D) do probatório) depende da verificação de “erro imputável aos serviços” na liquidação adicional efectuada e sindicada, pois que, nos termos da parte final do n.º 1 do artigo 78.º da Lei Geral Tributária, só no caso de erro imputável aos serviços (e de o tributo não estar pago), a revisão pode efectuar-se “a todo o tempo”.
Como bem sublinha o Excelentíssimo Procurador-Geral adjunto no seu parecer junto aos autos e supra transcrito, a sede na Áustria da sociedade beneficiária dos juros pagos pela recorrida e a que esta aplicou a taxa convencional de retenção na fonte (10%), ao invés da taxa de retenção na fonte prevista no direito interno (20%), encontrava-se comprovada desde 18 de Janeiro de 2001 através de formulário certificado pelas autoridades austríacas (cfr. formulário de fls. 84 a 86 dos autos), formulário este que, contudo, continha uma incorrecção relativamente ao montante de rendimento bruto pago ao titular do rendimento.
Foi esta incorrecção que, na perspectiva da Administração fiscal, legitimaria o afastamento da aplicação do disposto na Convenção e a aplicação ao invés das taxas de retenção na fonte previstas no Código do IRC, fundamento da liquidação adicional de IRC efectuada.
Ora, ao tempo do pagamento dos juros à sociedade “B……” inexistia norma convencional ou legal aplicável que impusesse a observância de requisitos formais suplementares – além do requisito substancial implícito resultante da Convenção da residência ou sede no outro Estado contratante do beneficiário dos juros – para a aplicação da taxa convencional de retenção na fonte incidente sobre os juros pagos a entidade não residente, daí que, comprovada a residência na Áustria da beneficiária dos rendimentos, inexistia fundamento legal para afastar a aplicação da taxa de retenção na fonte prevista na Convenção.
E embora a Lei do Orçamento do Estado para 2003 (Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro), já em vigor à data da liquidação adicional (cfr. a alínea C) do probatório), através da alteração introduzida pelo seu artigo 27.º ao então artigo 90.º do Código do IRC, tenha vindo a consagrar por via legislativa requisitos formais de cuja observância dependia o accionamento das taxas convencionais de retenção na fonte, não parece que as alterações ao artigo então introduzidas sejam de molde a poder sustentar-se que, sendo atempadamente apresentado o formulário de modelo oficial certificado pelas autoridades austríacas, a verificação de uma incorrecção quanto ao montante dos rendimentos pagos à entidade não residente tem o efeito de responsabilizar a entidade devedora dos rendimentos pelo imposto devido às taxas previstas pelo direito interno, assim afastando a aplicação da taxa convencional. É que, o que a partir da entrada em vigor da Lei do Orçamento do Estado para 2003 se passou a estabelecer inovadoramente no (então) artigo 90.º do Código do IRC foi que os beneficiários dos rendimentos devem fazer prova perante a entidade que se encontra obrigada a efectuar a retenção na fonte, da verificação dos pressupostos legais de que depende a isenção ou dos que resultem de convenção destinada a eliminar a dupla tributação, consistindo neste último caso, na apresentação de um formulário de modelo a aprovar por despacho do Ministro das Finanças certificado pelas autoridades competentes do respectivo Estado de residência, sob pena de não sendo efectuada a prova até ao termo do prazo estabelecido para a entrega do imposto, ficar o substituto tributário obrigado a entregar a totalidade do imposto que deveria ter sido deduzido nos termos da lei (cfr. o n.º 4), sem prejuízo da possibilidade de o sujeito passivo não residente poder requerer à Direcção-Geral dos Impostos o reconhecimento dos benefícios resultantes de convenção destinada a eliminar a dupla tributação e solicitar o reembolso do imposto retido na fonte, no prazo de dois anos a contar da data da verificação do facto gerador do imposto, mediante apresentação de formulário de modelo a aprovar por despacho do Ministro das Finanças (cfr. o n.º 5 do então artigo 90.º ).
Atento ao exposto, é de concluir que a liquidação adicional sindicada foi efectuada com base em erro nos pressupostos de direito, pois que, na ausência de norma cominando tal consequência, o indevido preenchimento do formulário certificado pelas autoridades austríacas não legitimava o afastamento da aplicação da taxa convencional de retenção na fonte.
Mas mesmo que assim não se entendesse, é manifesto que com a entrada em vigor da Lei do Orçamento do Estado para 2008 (Lei n° 67-A/2007, 31 Dezembro) - em cujo n.º 6 do artigo 90.º-A se passou a prever a possibilidade de afastamento da responsabilidade do substituto pela totalidade do imposto quando, não obstante não dispor do formulário até à data em que o imposto retido deve ser entregue nos cofres do Estado, o venha a obter posteriormente – cujo n.º 4 do seu artigo 48.º determinou a aplicação retroactiva do novo regime, sempre seria de entender que a liquidação sindicada padecia de “erro imputável aos serviços”, pois que, como tem decidido este Supremo Tribunal (cfr. os nossos Acórdãos de 28 Outubro de 2009, rec. n.º 477/09, de 5 de Maio de 2010, rec. n.º 1246/09 e de 9 de Junho de 2010, rec. n.º 618/09), esta norma, ao determinar a aplicação retroactiva do novo regime de limitação da responsabilidade do substituto, constitui um reconhecimento explícito de que era ilegal a imputação de responsabilidade ao substituto tributário quando comprovasse a verificação dos pressupostos para a dispensa total ou parcial de retenção.
Ora, se é assim no caso em que inexistia formulário certificado no momento próprio, por maioria de razão se deve entender ser pelo menos igualmente assim no caso em que tal formulário existia ab initio, embora padecesse de uma incorrecção no seu preenchimento. Também neste caso, que é o dos autos, a apresentação de novo formulário, expurgado da incorrecção inicial, devia ter levado à exclusão da responsabilidade do substituto pela totalidade do imposto, no caso através da anulação da liquidação adicional ilegalmente efectuada.

Conclui-se, deste modo, que, porque o imposto não tinha sido pago aquando do pedido de revisão (cfr. a alínea D) do probatório) e porque, como exposto, a liquidação adicional fora efectuada por “erro imputável aos serviços”, não foi extemporâneo o pedido de revisão oficiosa da liquidação, daí que não devesse ter sido rejeitado.

Improcedem, nesta parte, as alegações da recorrente.

6.2 Da aplicabilidade do n.º 6 do (então) artigo 90.º-A do Código do IRC nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 48.º da Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro
Alega ainda a recorrente (cfr. conclusões XV a XIX das suas alegações de recurso) a inverificação dos pressupostos de aplicação retroactiva da limitação da responsabilidade do substituto (prevista no n.º 6 do artigo 90.º-A do Código do IRC) determinada pelo n.º 4 do artigo 48.º da Lei n.º 67-A/2007, porquanto à data da entrada em vigor da Lei n° 67-A/2007 não se encontrava pendente reclamação, recurso hierárquico ou impugnação judicial, sendo que, o pedido de revisão foi efectuado nos termos da 2a parte do n° 1 do artigo 78° da LCT, não tendo, por isso, natureza de reclamação.
Vejamos.
Dispunha o n.º 4 do artigo 48.º da Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro: «O afastamento da responsabilidade prevista no n.º 4 do artigo 90.º e no n.º 6 do artigo 90.º-A do Código do IRC, na redacção que lhes foi dada pela presente lei, é aplicável às situações anteriores à entrada em vigor da mesma, independentemente de já ter sido efectuada a liquidação do imposto, excepto quando tenha havido lugar ao pagamento do imposto e não esteja pendente reclamação, recurso hierárquico ou impugnação» (sublinhados nossos).
A recorrente interpreta a parte final (e por nós sublinhada) do transcrito preceito legal como querendo significar que a aplicação retroactiva da limitação da responsabilidade do substituto seria afastada nos casos em que: (1) o imposto já tivesse sido pago; ou, que, não o estando, (2) não estivesse pendente reclamação, recurso hierárquico ou impugnação. Daí que, no caso dos autos, embora o imposto não estivesse pago à data do pedido (cfr. a alínea D) do probatório), como não estava pendente reclamação, recurso hierárquico ou impugnação - e o pedido de revisão efectuado nos termos da parte final do n.º 1 do artigo 78.º da Lei Geral Tributária não tem natureza de reclamação – não havia que o considerar à luz da limitação da responsabilidade do substituto.
Não nos parece ser esta, porém, a melhor leitura do transcrito preceito legal, antes acompanhamos a sentença recorrida quando entende que a excepção contemplada naquela norma do Orçamento do Estado para 2008, visa impedir apenas que o contribuinte se exima da responsabilidade tributária quando não tenha lançado mão de processo impugnatório e tenha efectuado o pagamento do imposto, i.e., nas situações em que o acto se firmou na ordem jurídica, o que significa que basta que não se verifique uma daquelas circunstâncias cumulativas, para que funcione o princípio geral de dispensa de responsabilidade pelo imposto (cfr. sentença recorrida, a fls. 298 dos autos).
Interpretamos, pois, a excepção legal como querendo salvaguardar apenas as situações já consolidadas em que houve lugar ao pagamento e não houve reclamação, recurso hierárquico ou impugnação da liquidação, não pretendendo o preceito beneficiar os que não pagaram em prejuízo dos que o fizeram ou prejudicar os que cumpriram o dever de pagamento mas contestaram a legalidade da liquidação.
Assim, entendemos a excepção legal à aplicação retroactiva do novo regime como excluindo apenas do seu âmbito os casos em que, tendo havido pagamento, não foi sindicada a legalidade da liquidação, não se encontrando abrangidos pela excepção os casos, como o dos autos, em que à data do pedido de revisão (15 de Maio de 2009 – cfr. a alínea D) do probatório) não tinha ainda havido pagamento (pois que este apenas foi efectuado em 24 de Novembro de 2009).
Assim, ao contrário do alegado, impunha-se à Administração fiscal proceder à revisão oficiosa da liquidação, pois que o caso dos autos não se encontrava excluído do âmbito de aplicação retroactiva do n.º 6 do (então) artigo 90.º-A do Código do IRC estabelecido pelo n.º 4 do artigo 48.º da Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro.

Improcedem, pelo exposto, as alegações da recorrente, sendo de confirmar o julgado recorrido.
- Decisão -
7 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em negar provimento ao recurso confirmando a sentença recorrida.

Custas pela recorrente.
Lisboa, 14 de Junho de 2012. - Isabel Marques da Silva (relatora) - Lino Ribeiro - Dulce Neto.