Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0894/08.1BESNT 0684/18
Data do Acordão:02/20/2020
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:ADRIANO CUNHA
Descritores:EXPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA
EXPROPRIAÇÃO URGENTE
RESOLUÇÃO
NOTIFICAÇÃO
COMUNICAÇÃO DO INÍCIO DO PROCEDIMENTO
DIREITO DE PARTICIPAÇÃO
PRETERIÇÃO DE FORMALIDADE
Sumário:I - A notificação da “Resolução de requerer a declaração de utilidade pública da expropriação” ao Expropriado e demais interessados, prevista no nº 5 do art. 10º do Código das Expropriações/99, é legalmente imposta quer se trate de expropriação urgente, quer não.
II - Corresponde, no essencial, à notificação aos interessados do início do procedimento prevista no art. 55º do CPA/91 e no art. 110º do CPA/15, configurando uma garantia procedimental, condicionante da legalidade da declaração de utilidade pública.

III - É, pois, uma formalidade essencial, instrumento de concretização do direito constitucional de “participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito, de grande relevo no estatuto procedimental do particular, requisito essencial para a materialização de uma participação efetiva, pois quanto mais cedo o particular souber da possibilidade de uma ablação, mais tempo disporá para preparar adequadamente a defesa dos seus interesses.

IV - A sua função primacial é comunicar ao Expropriado e demais interessados o conteúdo da resolução de requerer a declaração de utilidade pública, dando-lhe conhecimento do início do procedimento de expropriação com antecedência em relação ao momento da declaração de utilidade pública, por forma a permitir-lhe defender nele adequadamente os seus interesses, designadamente poder influenciar a própria declaração de utilidade pública.

V - A sua omissão, ou o seu cumprimento defeituoso ou tardio (designadamente, após a “declaração de utilidade pública” ou, mesmo, sem a necessária antecedência relativamente a esta) é, em princípio, invalidante da “DUP”, por apenas ser admissível nos casos de “expropriações urgentíssimas” (em estado de necessidade por razão de calamidade pública ou por exigência de segurança interna ou de defesa nacional, como previsto no art. 16º do C.E./99).

VI - Não obstante, o incumprimento ou o cumprimento defeituoso dessa formalidade legal pode degradar-se em disfunção de segunda ordem, sem eficácia invalidante, desde que os interessados não sejam realmente atingidos nos seus direitos de participação no contraditório e na tomada da decisão, isto é, quando se possa dizer que foram alcançados os objetivos tidos em vista pelo legislador ao prever aquela formalidade legal.

VII - Será o caso se os expropriados e demais interessados participarem atempadamente no procedimento, ou estiverem em condições de o poder fazer, da mesma forma que o teriam feito se aquela notificação tivesse sido cabalmente efetuada.

VIII - Não é possível recusar-se eficácia invalidante ao incumprimento daquela notificação se, no caso, a proprietária registada de parcela de terreno expropriada não foi notificada da “resolução de requerer a declaração de utilidade pública” antes da própria “DUP”, e se apenas a locatária foi informada, por ofício, da intenção da expropriação – 8 meses e meio após a “Resolução de expropriar” e 29 dias antes da “DUP” – sem as menções exigidas nas alíneas b), c) e d) do nº 1 do citado art. 10º, e sem que as solicitações de cabal informação desta locatária e da proprietária tenham obtido qualquer resposta antes de serem notificadas da “DUP”. (art.663º nº7 do CPC)

Nº Convencional:JSTA000P25638
Nº do Documento:SA1202002200894/08
Data de Entrada:11/16/2018
Recorrente:C......., ACE E OUTRA
Recorrido 1:A......., S.A. E OUTRA, MINISTÉRIO DAS OBRAS PÚBLICAS, TRANSPORTES E COMUNICAÇÕES
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

I - RELATÓRIO

1. “A………, S.A.” e “B………., Lda.” intentaram, no TAF de Sintra, ação administrativa especial contra o Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações e as Contrainteressadas “C………….., ACE” e “LusoLisboa-AutoEstradas da Grande Lisboa, S.A.”, impugnando o despacho, de 30/4/2008, publicado no D.R. de 12/5/2008, do Secretário de Estado Adjunto das Obras Públicas e Comunicações que declarara a utilidade pública, com carácter de urgência, da expropriação, entre outras, de uma parcela (nº 175), propriedade da primeira Autora e locada à segunda Autora, tendo em vista a construção de sublanço referente à obra da autoestrada A16-IC30.

2. O TAF de Sintra, por Acórdão de 21/2/2012, julgou procedente a ação e anulou aquele impugnado despacho na parte relativa à aludida parcela.

Nesse Acórdão, porém, não foi dada razão às Autoras relativamente a 6 vícios por elas invocados - ininteligibilidade do ato impugnado; violação dos instrumentos de gestão territorial aplicáveis; violação de direitos e princípios fundamentais (confiança, boa fé, segurança jurídica e respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos, direito de propriedade e iniciativa privada, adequação, proporcionalidade e justiça); falta de pressupostos e fundamentos de que depende a declaração de utilidade pública, com urgência; inexistência de proposta de aquisição por via negocial; e incompetência do autor para a prática do ato.

Mas foi dada razão às Autoras relativamente aos vícios invocados referentes à “Resolução de expropriação”: falta de cumprimento dos requisitos legais exigidos nas alíneas a), b) c) e d) do nº 1 do art. 10º do Código das Expropriações aplicável (Lei 168/99, de 18/9); falta de cumprimento da notificação aos interessados da “Resolução de requerer a declaração de utilidade pública da expropriação”, nos termos exigidos no nº 5 daquele mesmo art. 10º do Código das Expropriações.

3. As Contrainteressadas “C……..” e “LusoLisboa”, inconformadas com a anulação do despacho impugnado, interpuseram recurso de apelação daquele Acórdão do TAF de Sintra.

4. E as Autoras “A………” e “B……..”, não obstante terem obtido ganho de causa (anulação do ato que impugnaram), recorreram do Acórdão do TAF de Sintra por pretenderem ver o mesmo revogado na parte em que ficaram vencidas (primeiros 6 vícios por elas invocados, julgados improcedentes, como acima ficou dito).

5. O TCAS, por seu Acórdão de 15/3/2018 (cfr. fls. 1652 e segs. SITAF), confirmou o Acórdão do TAF de Sintra, apenas com uma divergência: contrariamente ao TAF de Sintra, considerou cumprida a exigência prevista na alínea a) do nº 1 do art. 10º do C.E. (referente à menção da causa de utilidade pública a prosseguir e da norma habilitante).

Porém, confirmou os restantes vícios da “Resolução de requerer a declaração de utilidade pública da expropriação” reconhecidos pelo TAF de Sintra, ou seja, os atinentes ao incumprimento do disposto nas alíneas b), c) e d) do nº 1 e no nº 5 do art. 10º do C.E., mantendo, consequentemente, o julgamento de anulação do despacho impugnado.

6. Mantendo-se inconformadas, agora com este Acórdão proferido pelo TCAS, vieram as Contrainteressadas “C……..” e “LusoLisboa” interpor, ao abrigo do disposto no art. 150º do CPTA, o presente recurso jurisdicional de revista, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões (cfr. fls. 1765 e segs. SITAF):

«1ª. A questão que nos ocupa tem que ver com o facto de num procedimento expropriativo (i) a Resolução de expropriar não cumprir os requisitos previstos nas alíneas b), c) e d) do art. 10º, nº 1, do Código das Expropriações e (ii) os Expropriados/Recorridos não terem sido notificados dessa Resolução de Expropriar antes de ter sido proferida a declaração de utilidade pública, incumprindo-se o disposto no nº 5 daquele preceito. Em concreto, o que se discute aqui é a eficácia invalidante da preterição daquelas formalidades relativas à Resolução de expropriar na declaração de utilidade pública expropriativa, no contexto dos autos, isto é, no contexto que ficou caracterizado nas diversas alíneas do nº 6 destas Alegações.

2ª. Nos termos do art. 150º, nº 1, do CPTA (na redação anterior à Reforma de 2015), o presente recurso deverá ser admitido, pois a questão que aqui se discute (i) reveste suficiente relevância e complexidade jurídica, registando-se decisões dos nossos Tribunais superiores contraditórias quanto à respetiva solução (cfr., supra, nº 7); (ii) tem uma evidente relevância social (cfr., supra, nº 8) e (iii) carece de melhor aplicação do Direito (cfr., supra, nº 9).

3ª. A procedência do presente recurso assenta nas seguintes razões principais:

3ª.1 A resolução de expropriar é uma mera decisão de uma entidade privada de requerer a declaração de utilidade pública: não é um ato administrativo e não é a decisão de expropriar. Assim, esta resolução de expropriar não vale por si: vale como intenção de requerer a declaração de utilidade pública. De facto, o único ato dotado de dignidade suficiente para lesar os direitos ou interesses legítimos do particular é o ato de declaração de utilidade pública, na medida é que é este o ato que dita o sacrifício do direito de propriedade do particular, sendo, também por isso, o ato contenciosamente impugnável. Como se decidiu no Acórdão decisório da 1ª instância: “A resolução de expropriar tem como intenção principal dar a conhecer ao eventual expropriado o propósito [da] entidade beneficiária da expropriação de aquisição de um prédio que lhe pertence” (pág. 44) e a Recorrente C……… (como gestora dos procedimentos expropriativos) deu a conhecer à Recorrida B…….., Lda. essa intenção no ofício de 01.04.2008 e em contactos tidos com a mesma, e a Recorrida A………, SA teve conhecimento desta notificação, tudo antes da declaração de utilidade pública expropriativa.

3ª.2 Os elementos essenciais desta expropriação (referidos nas alíneas em causa do art. 10º, nº 1, do Código das Expropriações) foram incluídos na notificação que o Recorrente C……… dirigiu à Recorrida B…….., Lda. em 01.04.2008 e que esta transmitiu à Recorrida A………, SA. As Expropriadas/Recorridas tiveram efetivo conhecimento desta intenção de expropriar e desses elementos antes de ser proferida a declaração de utilidade pública.

3ª.3 As disposições normativas do art. 10º do Código das Expropriações que regulam a resolução de expropriar (isto é, de requerer a declaração de utilidade pública), o seu conteúdo e o requerimento deste ato ao órgão administrativo competente para o efeito pretendem essencialmente regular as relações entre a entidade que pretende beneficiar da expropriação e o órgão administrativo competente para declarar a utilidade pública expropriativa.

3ª.4 A audiência prévia dos expropriados relativamente à expropriação é essencialmente regulada nos arts. 100º e ss. do CPA (na redação então em vigor), sendo certo que o art. 103º desse diploma estabelece, em termos gerais (para qualquer cidadão), que audiência prévia nem sequer tem lugar quando a decisão administrativa é urgente, como é o caso desta expropriação.

3ª.5 Por outro lado, sublinhe-se, definido o traçado da rodovia em causa (desde 2006) em vários planos e instrumentos de gestão territorial, a declaração de utilidade pública é um ato vinculado, de mera execução dessas prévias decisões de localização, relativamente ao qual, como constitui jurisprudência pacífica deste Venerando Supremo Tribunal, não se coloca a questão (ou a mesma acaba por ser irrelevante) da audiência prévia dos expropriados.

3ª.6 Ainda que assim não se entenda, a omissão da notificação da resolução de expropriar, e/ou a ausência dos requisitos legais impostos pelo art. 10º do Código das Expropriações, nunca poderá ser fundamento da anulabilidade de utilidade pública expropriativa, pois o procedimento de notificação previsto nos artigos 10º, nº 5 e 11º, nº 2, do Código das Expropriações, insere-se na “fase” da tentativa prévia de aquisição por via do direito privado, pelo que a natureza urgente da presente expropriação implica a dispensa da aquisição dos bens por via do direito privado, e, consequentemente, da notificação da resolução de requerer a expropriação por utilidade pública.

3ª.7 Ao contrário do que se decidiu no Acórdão da 1ª instância (pág. 46) que o Acórdão recorrido manteve, a resolução de expropriar não é um ato impugnável, pelo que toda a construção aí alicerçada cai pela base.

3ª.8 Os objetivos legalmente pretendidos com a notificação da resolução com a notificação da resolução de expropriar (dar conhecimento do projeto expropriante) foi plenamente assegurado no procedimento expropriativo desta parcela. Daqui decorre que, tendo sido atingida a finalidade visada pelo legislador com a notificação a que aludem os arts. 10º, nº 5 e 11º, nº 2 do Código das Expropriações, a formal notificação desta resolução de expropriar depois da declaração de utilidade pública reconduz-se à preterição de uma formalidade não essencial, pelo que não poderia ter eficácia invalidante do ato final do procedimento, neste caso concreto, da declaração de utilidade pública.

3ª.9 Mais do que uma leitura positivista e formalista do Direito, importa averiguar se, materialmente, os interesses dos cidadãos que o legislador pretende tutelar foram materialmente assegurados, o que se verificou neste procedimento expropriativo, em que as Expropriadas/recorridas não viram preteridas quaisquer garantias procedimentais ou contenciosas, relativas à legalidade da expropriação ou à justa indemnização que lhes é devida».

7. As Autoras, ora Recorridas, contra-alegaram, apresentando as seguintes conclusões (cfr. fls. 1829 e segs. SITAF):

«A – DA INADMISSIBILIDADE DO PRESENTE RECURSO

1ª. As ora recorrentes interpuseram o presente recurso excepcional de revista invocando genérica e conclusivamente que “a questão que aqui se discute (i) reveste suficiente relevância e complexidade jurídica, registando-se decisões dos nossos Tribunais superiores contraditórias quanto à respectiva solução (cfr., supra, nº 7); (ii) tem uma evidente relevância social (cfr., supra, nº 8) e (iii) carece de melhor aplicação do Direito (cfr., supra, nº 9) (v. Conclusão 2ª) – cfr. texto nºs 1 a 6;

2ª. É manifesto que não se verificam os pressupostos do recurso excepcional de revista consignados no art. 150º do CPTA, não podendo o presente recurso ser admitido, pois:

a) A questão invocada não assume especial relevância jurídica ou social, não se revestindo de importância fundamental;

b) A eventual admissão do presente recurso não é necessária para uma melhor aplicação do direito relevando apenas, nas palavras da própria recorrente, “no contexto dos autos, isto é, no contexto que ficou caracterizado nas diversas alíneas do nº 6 (das) alegações” de recurso agora apresentadas (v. Conclusão 1ª) – cfr. texto nºs 1 a 6;

3ª. O douto Acórdão recorrido não enferma de qualquer erro de julgamento evidente ou ostensivo, estando em linha e sendo absolutamente conforme com a jurisprudência que se tem pronunciado sobre as questões em causa (v. entre outros, Acs. STA de 2009.01.07, Proc. 0707/08; de 2007.03.06, Proc. 01595/03; de 2005.03.10, Proc. 047532; de 2004.03.24, Proc. 047532; de 2002.12.12, Proc. 046819; e de 2002.06.26, Proc. 047229, todos in www.dgsi.pt) – cfr. texto nºs 1 a 6;

4ª. O presente recurso excepcional de revista (i) não visa abrir “um largo debate pela doutrina e jurisprudência, com o objecto de se obter um consenso em termos de servir de orientação” a futuras decisões (v. Ac. STJ de 2010.06.17, Proc. 158/08.0TBRM2.E1.S1, www.dgsi.pt). (ii) “existe consenso jurisprudencial” sobre as questões em causa (v. Ac. STJ de 2016.05.12, Proc. 111/13.2TBVNC.G1S1, www.dgsi.pt), que estão devidamente sedimentadas “não suscitando divergências de relevo” (v. Ac. STJ de 2014.06.05, Proc. 2323/13.0TBVNG.P1.S1; cfr. Ac. STJ de 2014.10.14, Proc. 2386/11.2TBSTR-A.E1.S1, ambos in www.dgsi.pt), sendo inequívoco que (iii) as complexas e repetidas citações de jurisprudência constantes das alegações de recurso em nada corroboram – e na maior parte dos casos infirmam – as infundadas teses que as recorrentes vieram agora defender – cfr. texto nºs 1 a 6.

5ª. Como reconheceram expressamente nas suas alegações, a questão que as ora recorrentes pretendem ver apreciada não tem relevância social, não se revestindo de importância fundamental (v. art. 150º/1 do CPTA), pois “não evidencia um especial relevo social (…), não se ultrapassando, aqui, o quadro dos interesses defendido pelas Partes em litígio” (v. Ac. STA de 2008.02.14, Proc. 082/08; cfr. Ac. STA de 2008.01.17, Proc. 01060/07 e de 2007.03.22, Proc. 0217/07, todos in www.dgsi.pt) – cfr. texto nºs 1 a 6;

6ª. A eventual admissão do presente recurso não é necessária para uma melhor aplicação do direito (v. art. 150º/1 do CPTA), pois as ora recorrentes não invocaram, nem demonstram a verificação de “qualquer erro clamoroso ou ostensivo, susceptível de levar à admissão do recurso de revista, no contexto de uma melhor aplicação do direito” (v. Ac. STA de 2007.02.01, Proc. 057/07; cfr. Ac. STA de 2014.05.28, Proc. 1486/13, in www.dgsi.pt), tanto mais que a decisão recorrida seguiu e fundamentou-se em jurisprudência pacífica e incontroversa deste Venerando Supremo Tribunal – cfr. texto nºs 1 a 6;

B – DA IMPROCEDÊNCIA DO PRESENTE RECURSO

7ª. Nas Conclusões 3ª.1 a 3ª.9 das suas alegações de recurso, as recorrentes defendem, em síntese, que “a omissão da notificação da resolução de expropriar e/ou a ausência dos requisitos legais impostos pelo art. 10º do Código das Expropriações, nunca poderá ser fundamento de anulabilidade da declaração de utilidade pública expropriativa” – cfr. texto nºs 7 a 13;

8ª. Contrariamente ao invocado pelas recorrentes, “as ilegalidades cometidas no procedimento, a montante do ato expropriativo, incluindo na própria resolução de requerer a declaração de utilidade pública, são causa de anulação da declaração de utilidade pública na exacta medida em que afastem a sua validade (cfr. artigo 135º do CPA)”, como se decidiu no douto Acórdão recorrido – cfr. texto nºs 7 a 13;

9ª. A douta decisão recorrida (i) está em linha com o disposto nos arts. 2º, 20º, 205º/2 e 268º/4 da CRP, que constituem uma garantia completa e plena de recurso e impugnação de todos os actos administrativos que sejam lesivos de direitos e interesses legalmente protegidos, com fundamento em qualquer ilegalidade (v. Gomes Canotilho e Vital Moreira, CRP Anotada, 3ª ed., p.p. 983; cfr. Ac. TC nº 135/2009, de 18 de Março, in www.tribunalconstitucional.pt) e (ii) é absolutamente conforme com a jurisprudência deste Venerando Supremo Tribunal que se tem pronunciado sobre as mesmas questões (v. entre outros, Acs. STA de 2009.01.07, Proc. 0707/08; de 2007.03.06, Proc. 01595/03; de 2005.03.10, Proc. 047532; de 2004.03.24, Proc. 047532; de 2002.12.12, Proc. 046819; e de 2002.06.26, Proc. 047229, todos in www.dgsi.pt) – cfr. texto nºs 7 a 13;

10ª. Como se defendeu e demonstrou nas alegações de direito, de 2010.04.26, e nas contra-alegações de recurso, de 2012.05.22, e se decidiu no douto Acórdão recorrido, a resolução de expropriar não cumpriu os requisitos previstos no art. 10º/1/b), c) e d) e 5 do CE 99 – cfr. texto nºs 7 a 13».

8. O presente recurso de revista foi admitido pelo Acórdão de 22/10/2018 (cfr. fls. 1873 e segs. SITAF) proferido pela formação de apreciação preliminar deste STA, prevista no nº 5 do art. 150º do CPTA, nos seguintes termos:

«(…) O acórdão «sub specie» anulou o acto impugnado — a DUP de uma expropriação recaída sobre um prédio de que as autoras eram dona e locatária — porque a anterior «resolução de expropriar» não cumprira as exigências do art. 10°, n.° 1, ais. b), c) e d) do Código das Expropriações de 1999 (CE) e só foi notificada à proprietária da parcela após a emissão da DUP, o que feriu o n.° 5 do mesmo artigo.

Na sua revista, as recorrentes dizem duas essenciais coisas: que o conteúdo da «resolução de expropriar» tem por destinatário o órgão administrativo que se pronunciará sobre o «requerimento» de emissão da DUP (art. 12° do CE) — donde se depreende que, na óptica das recorrentes, os vícios dessa «resolução» não são invocáveis ou aproveitáveis pelo expropriado e demais interessados; e que a falta da notificação atempada da mesma «resolução» à expropriada era, «in casu», irrelevante, já que — por a expropriação ser urgente — a notificação não tinha de conter uma proposta de aquisição pela via do direito privado (art. 11º, n.° 1, do CE) e cumprira, portanto, o único e exclusivo fim de comunicar um intuito expropriativo que a expropriada até já conhecia.

Nos seus arts. 10° a 13°, o CE prevê sucessivos actos vestibulares: «ante omnia», a singela «resolução de expropriar» (art. 10º), a que pode seguir-se a tentativa de «aquisição por via do direito privado» (art. 11°); depois, a remessa ao órgão competente do «requerimento» de que se profira a DUP; a seguir, a própria emissão da DUP — que propriamente marca o início do processo de expropriação.

Esse art. 10° exige que a resolução de requerer a DUP da expropriação esteja imediatamente «fundamentada», «mencionando expressa e claramente» os vários pontos aludidos nas quatro alíneas do seu n.° 1. Trata-se, afinal, da enunciação dos fundamentos do intuito expropriativo. Ora, o acórdão recorrido afirmou que as omissões que aí ocorram invalidam, «ex necessitate» e por propagação, a DUP subsequente. Mas é duvidoso que assim seja se os dados fundamentais em falta na «resolução de expropriar» estiverem seguidamente na DUP.

A superação dessa dúvida passará pela natureza — e, portanto, pela função (indiscutivelmente preparatória) — da «resolução de expropriar». É este um assunto sobre que o STA nunca directamente se debruçou e que, «in casu», cobra relevo, já que a pronúncia anulatória, embora apenas em parte, se baseou nisso. Assim, este pormenor insta, desde já, ao recebimento da revista.

Dir-se-á que o Supremo indirectamente abordou a anterior temática, porquanto discorreu, por diversas vezes, sobre a finalidade e o alcance da exigência legal (inserta no art. 10º, n.° 5, do CE) de que se notifique — «ao expropriado e aos demais interessados» — a dita «resolução de expropriar». E é de recordar que este outro problema também releva no processo, pois a ofensa do art. 10°, n.° 5, do CE constituiu a segunda causa de anulação do acto.

A propósito deste preceito, o TCA procurou louvavelmente arrimar-se à jurisprudência do STA sobre o tema, a qual citou em profusão.

Mas essa jurisprudência não é absolutamente uniforme, O STA tem maioritariamente afirmado que a notificação prevista no art. 10°, n.° 5, do CE visa permitir aos notificados uma participação na formação da decisão a tomar («vide» os acórdãos do Pleno de 10/3/2005 e de 6/3/2007, proferidos, respectivamente, nos recs. ns.° 47.532 e 1595/03, e o acórdão da Secção de 7/1/2009, proferido no rec. n.° 707/08). E, como a única decisão então «in fieri» é a de emitir a DUP, o art. 10º, n.° 5, do CE teria em vista que os notificados influenciassem a existência ou o «sentido» dela (como disse o último dos arestos acima citados).

Todavia, o CE não prevê que, à notificação do art. 10°, n.° 5, se siga, por parte do expropriado e dos demais interessados, uma intervenção qualquer — salvo nos casos em que se abra uma tentativa de aquisição pela via do direito privado. Talvez por isso, aquele aresto do Pleno de 6/3/2007 desvalorizou o direito de audiência cuja emergência discernira na notificação do art. 10°, n.° 5, do CE, acabando por negar eficácia invalidante ao incumprimento da formalidade.

Avoluma-se, pois, a ideia de que a notificação prevista nessa norma não tem um sentido tão claro como pareceria «primo conspectu». Com efeito, podemos genericamente dividir as notificações em meramente informantes e em instrumentais da adopção, pelos notificados, de acções determinadas — e a notificação com vista à audiência é sempre deste último tipo.

Ora, e precisamente porque a notificação prevista no art. 10°, n.° 5, do CE não intentaria que o notificado agisse determinadamente, apenas servindo para o informar (da expropriação iminente), é que o acórdão do STA de 26/2/2002 (rec. n.° 47.229) assimilou essa notificação à geralmente consagrada no art. 55° do CPA então vigente. E, se esta tese for exacta, a possibilidade de uma inobservância do n.° 5 do art. 10° do CE se degradar em mera irregularidade aumenta sobremaneira (cfr., v.g., o acórdão do STA de 29/11/2005, proferido no rec. n.° 509/05); pois é bem diferente violar um direito de audiência ou omitir um dever de comunicação que não inste a reacções tipificadas — seja no plano da degradação de formalidades em não essenciais, seja no plano do aproveitamento do acto anulável.

Afigura-se-nos, assim, que as sobreditas «quaestiones juris» não estão totalmente apaziguadas, pois as poucas decisões do Supremo na matéria, para além de esparsas, parecem algo condicionadas pela singularidade dos casos em presença. Por outro lado, e independentemente do modo como aqui se qualifique a falta da notificação, convirá decerto averiguar as repercussões disso na concreta DUP em presença; e convirá, porventura, antecipar o que a anulação da DUP trará para a expropriação realizada — já que isso poderá causar a desvalorização do vício ou dos seus efeitos. Ora, estes pontos não foram ponderados pelas instâncias.

Justifica-se, assim, que o Supremo tome novamente posição sobre as questões mencionadas, as quais são juridicamente complexas e relevantes.

Nestes termos, acordam em admitir a revista».

9. O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste STA, notificado nos termos e para os efeitos do disposto no art. 146º nº 1 do CPTA, emitiu parecer (cfr. fls. 1883 e segs. SITAF) «no sentido da procedência do presente recurso, com a revogação da decisão recorrida e a consequente improcedência da acção».

Para fundamentar esta conclusão, ponderou, quanto à alegada preterição, na “resolução de expropriação”, das menções impostas pelas alíneas b), c) e d do nº 1 do art. 10º do C.E.:

«Com efeito, se apesar de omitidas na «resolução de expropriação» as menções em causa constarem da DUP da expropriação, então o que se poderá dizer é que os requisitos formais omitidos na emissão da «resolução de expropriação» não se projectaram, como se afigura ser o caso, sobre o acto central do procedimento expropriativo, o acto ablativo da propriedade, não possuindo, por isso, eficácia invalidade, para mais tratando-se de um acto que no procedimento expropriativo apenas releva em termos instrutórios, tendo como destinatário, nesse contexto, apenas e só, o órgão administrativo competente para a emissão da DUP».

E quanto à alegada omissão de notificação imposta no nº 5 do mesmo art. 10º:

«(…) porque afinal, como resulta do probatório (alíneas O) e P), os interessados, ora Recorridos, tomaram conhecimento da existência da resolução da expropriação e do bem a expropriar, não vê como atribuir à omissão de notificação do acto de resolução eficácia invalidante da DUP impugnada. Acresce que, no caso, estamos em presença de um procedimento especial em que a urgência da decisão dispensa a audiência dos interessados, nos termos do disposto no art. 103.º, n.º 1, al. a) do CPA (art. 124.º, n.º 1, al. a), na actual redacção)».

Pelo que, em consequência, conclui o parecer:

«Assim, ainda que se entenda que os vícios do acto de resolução são passíveis, nas circunstâncias do caso, de se projectar sobre o acto central do procedimento de expropriação (a DUP), inquinando-o dos mesmos vícios, a natureza do vício em questão e as demais circunstâncias atrás enunciadas justificam, a nosso ver, que se tenha por degradada em formalidade não essencial a falta de notificação do acto de resolução, nos termos do n.º 5, do art. 10.º do CE, não afectando e, consequentemente, não invalidando o acto concretamente impugnado na acção».

10. As Autoras, ora Recorridas, “A………” e “B……..”, pronunciaram-se nos termos do art. 146º nº 2 do CPTA, contrariando os fundamentos do parecer do MºPº neste STA (cfr. fls. 1895 e segs. SITAF).

11. As Recorrentes “C………” e “LusoLisboa” também se pronunciaram, ao abrigo do aludido normativo, mas sustentando os fundamentos do parecer (cfr. fls. 1907 e segs. SITAF).

12. Colhidos os vistos, o processo vem submetido à Conferência, cumprindo apreciar e decidir.

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II - DAS QUESTÕES A DECIDIR

13. Constitui objeto deste recurso de revista saber:

- se a preterição da notificação da “Resolução de requerer a expropriação”, prevista no nº 5 do art. 10º do Código das Expropriações/99, com as menções referidas nas alíneas b), c) e d) do nº 1 do mesmo artigo, é suscetível de se projetar na invalidade do ato de “DUP” (“declaração de utilidade pública”) – ato administrativo impugnado nos presentes autos; e

- em caso afirmativo, se pode/deve recusar-se tal eficácia invalidante no caso concreto dos autos, atendendo ao circunstancialismo fáctico apurado (eventual conhecimento, pelas expropriadas, antes da “DUP”, da projetada expropriação).

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III - FUNDAMENTAÇÃO

III. A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

14. As instâncias deram como provados os seguintes factos:

A) A 1ª Autora é a atual proprietária do prédio urbano sito no lugar de …………., em ………., município de Cascais, descrito na Conservatória do Registo Predial de Cascais, 2ª Secção, sob o nº 96 e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 3213 - Secção 37, da freguesia de ……, com 2.480 m2 — cfr. docs. 1 e 2 juntos à PI e Acordo.

B) O prédio assente em A) encontra-se classificado no PDM de Cascais como Espaço de Proteção e Enquadramento — Acordo.

C) A 2ª Autora é uma sociedade por quotas, que tem por objeto a instalação e exploração de centros de lavagem de veículos terrestres e navais de pequeno porte, assistência, comercialização e instalação de acessórios e equipamentos — cfr. doc. 3 junto à PI e Acordo.

D) A 2ª Autora explora, desde 2000, o centro de lavagens automóveis instalado no prédio identificado em A), denominado ………. — cfr. doc. 4 junto à Pl.

E) Em 04.05.2000 o Município de Cascais emitiu o alvará de licença de construção nº 591, que titula o licenciamento de construção do parque autolavagem que se encontra construído no prédio identificado em A) — cfr. doc. 4 junto à Pl.

F) Em 18.05.2000 a anterior proprietária do referido prédio, D…………, S.A., celebrou com a 2ª Autora, contrato que foi denominado "contrato de locação financeira imobiliária n° 102.458" — cfr. doc. 5 junto à PI, que aqui se dá como integralmente reproduzido.

G) Em 04.09.2000, D………, S.A. e a 2ª Autora, celebraram um contrato que foi denominado "Aditamento ao contrato de locação financeira imobiliária n° 102.458" — cfr. doc. 6 junto à PI, que aqui se dá por integralmente reproduzido.

H) Em 02.02.2001 o Município de Cascais emitiu o alvará de licença de utilização nº 96, que titula o licenciamento da utilização do "centro de lavagem automóveis destinado a: centro de lavagem de automóveis, composto de um piso, 7 pistas de auto lavagem e área técnica", instalado no prédio identificado em A) — cfr. doc. 7 junto à Pl.

I) Nos termos do Despacho Conjunto dos Ministros de Estado e das Finanças e das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, datado de 27.11.2006, o Estado Português adjudicou à LusoLisboa — Autoestradas da Grande Lisboa, ora Contra Interessada, a concessão do projeto rodoviário designado Grande Lisboa, aí se definindo o traçado da Autoestrada A16 — cfr. docs. 1 e 2 juntos à Oposição da C………, no âmbito do processo cautelar e doc. 2 junto pela C………, com a Contestação.

J) Em sequência foi celebrado o contrato de concessão, que tem por objeto a conservação e exploração dos A30/IC2 Sacavém, IC22, IC16, IC19, Eixo Norte/Sul e da CRIL e a construção da A16, que integra o IC30, entre Alcabideche (A5) e Ranholas (IC19), iniciando uma nova circular exterior e o IC16, entre Lourel e a CREL, inserindo-se o ato ora impugnado na Autoestrada A16 — Acordo e doc. 1 junto à Oposição da C………, no âmbito do processo cautelar e doc. 2, junto pela C………, com a Contestação.

K) O traçado definido para a Autoestrada A16 — IC16 e IC30, implica a expropriação de terrenos particulares, nos termos do doc. 2, junto pela C………, na oposição apresentada no processo cautelar.

L) Em 19.07.2007 foi tomada pelo Conselho de Administração da LusoLisboa — Autoestradas da Grande Lisboa, S.A., a Resolução de Expropriar, por utilidade pública e com caráter de urgência todas as parcelas de terreno necessárias à construção dos lanços objeto do contrato de Concessão da Grande Lisboa — cfr. doc. 2 junto pela C………, com a contestação.

M) Em execução do projeto e do traçado definidos foram iniciados os procedimentos expropriativos dos terrenos necessários, tendo sido declaradas de utilidade pública expropriativa mais de 400 parcelas de particulares — cfr. Despachos do SEAOPC nºs 13.267-A/2008 e 13.267-B/2008 (com relevo para o prédio referido em A), vale o Despacho nº 13.267-B/2008, junto como doc. 1, junto com a PI).

N) Por ofício de 01.04.2008, a C……… notificou a 2ª Autora do seguinte:

"Nos termos dos poderes delegados ao C………, ACE, (...), vimos por este meio notificar V. Exa. que em conformidade com o previsto no nº 5 do art. 10° da Lei nº 168/99 de 18 de setembro, com as alterações introduzidas pela Lei nº 13/2002, de 19 de fevereiro e pela Lei nº 4- A/2003, de 19 de fevereiro, aquela Empresa, na qualidade de Concessionária para a conceção, projeto, construção, financiamento, conservação e exploração dos lanços de autoestrada e conjuntos viários associados, designada por Concessão Grande Lisboa, cujas Bases foram aprovadas pelo Decreto-Lei nº 242/2006 de 28 de dezembro, por deliberação do seu Conselho de Administração de 19 de julho de 2007, tomou a resolução de requerer a expropriação por utilidade pública com caráter de urgência nos termos do art. 15° da Lei nº, 168/99 de 18 de setembro, com as alterações introduzidas pela Lei 13/2002, de 19 de fevereiro e pela Lei nº 4-A/2003, de 19 de fevereiro, e da Base XXI anexa do Decreto-Lei nº 242/2006 de 28 de dezembro (...) Aproveitamos para informar que esta empresa procedeu à avaliação da parcela nº 175, encontrando-se, portanto, habilitados a apresentar a nossa proposta de aquisição no valor global de € 214.500,00 (...), sendo € 136.500,00 (...) correspondente a benfeitorias", pretendendo a expropriação de uma parcela de terreno com a área de 2155 m2, a destacar do prédio identificado em A) — cfr. doc. 8 junto à PI, que ora se considera integralmente reproduzido.

O) Por carta datada de 17.04.2008 da 1ª Autora dirigida à C………, aquela informou a sua qualidade de proprietária do prédio identificado em A) e solicitou ser notificada da proposta de expropriação — cfr. doc. 2 junto à Contestação da C……….

P) Em 20.05.2008 a 2ª Autora comunicou à C……… o seguinte: "Na sequência da V/ prezada carta de 2008.04.01 (...) não nos foi remetida cópia da resolução de expropriação, com os elementos referidos no art. 10º/1 do Código das Expropriações. A referida omissão impossibilita a análise da situação bem como o exercício dos n/ direitos nesta fase do procedimento. Nesta conformidade, aguardamos envio urgente de cópia da resolução de expropriação e respetivos fundamentos, nos termos legalmente fixados" — cfr. doc. 9 junto à Pl.

Q) Por despacho do Secretário de Estado Adjunto das Obras Públicas e das Comunicações, nº 13267-B/2008, datado de 30.04.2008, publicado no DR, II Série, nº 91, de 12/05/2008, decidiu-se o seguinte: "Nos termos do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 14° e no nº 2 do artigo 15° do Código das Expropriações, (...), atento o despacho do Secretário de Estado Adjunto, Obras Públicas e das Comunicações de 27 de março de 2008, que aprovou, as plantas parcelares LORA-E201-20-01 a 05, RALI-E201-01 a 08 e LIAL-E201-20-01 a 06 e os mapas de áreas relativos à construção da obra da A16-1C30 - lanço Lourel (1C 16) - Ranholas (1C 19) - A 16-IC 30 - lanço Ranholas (1C19) - Linhó (EN 9) -A16-1C30) - lanço Linhó (EN9)- Alcabideche (IC 15) - projeto de expropriações, declaro, no uso da competência que me foi delegada pelo despacho do Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, ao abrigo do artigo 161° do Estatuto das Estradas Nacionais, aprovado pela Lei nº 2037, de 19 de agosto de 1949, a utilidade pública, com caráter de urgência, das expropriações das parcelas de terreno necessárias à construção deste sublanço, abaixo identificadas, com os elementos constantes da descrição predial e da inscrição matricial, dos direitos e ónus que sobre eles incidem e os nomes dos respetivos titulares.

Mais declaro autorizar a concessionária LUSOLISBOA — Autoestradas da Grande Lisboa, SA, a tomar posse administrativa das mencionadas parcelas, assinaladas nas plantas anexas, com vista ao rápido início dos trabalhos, sendo que a urgência das expropriações se louva no interesse público de que a obra projetada seja executada o mais rapidamente possível.

Os encargos com as expropriações em causa encontram-se caucionados pela concessionária LUSOLISBOA — Autoestradas da Grande Lisboa, S.A., nos termos do disposto no n° 2 do artigo 12° do Código das Expropriações" — cfr. doc. 1 junto à PI; doc. 2 junto à Contestação da C……… e fls. 3 do proc. adm., para que se remete e se considera reproduzido, para todos os efeitos legais.

R) Entre as parcelas de terreno integradas nos mapas e plantas parcelares aprovadas, consta a 175, da propriedade da ora 1ª Autora — cfr. doc. 1 junto à PI e fls. 53 e segs. do proc, adm., para que se remete e de dá por reproduzido.

5) Resulta da Declaração de Impacte Ambiental, emitida em 10.05.2008, no que se refere a "Resumo do conteúdo do procedimento, incluindo dos pareceres apresentados pelas entidades consultadas: (...) A Câmara Municipal de Cascais refere que o IC30 encontra-se previsto nos principais instrumentos de gestão territorial em vigor com incidência na área de intervenção, designadamente, no PNR, POPNSC, PROTAML e PDM de Cascais (...)" — cfr. doc. 1 junto à Contestação da LusoLisboa, que se considera integralmente reproduzido.

T) Do Estudo de Impacte Ambiental, na parte referente a "Relatório Técnico do Estudo de Impacte Ambiental", relativo à A16/1C30, Lanço Linhó (EN9)/Alcabideche (IC15), pode ler-se: "O IC30 encontra-se previsto nos principais instrumentos de gestão territorial em vigor com incidência na área de intervenção, designadamente PRN, POPNSC, PROTAML e PDM de Cascais, estando em conformidade com os objetivos de desenvolvimento da rede viária, acessibilidades e articulação urbana por eles preconizados, o que constitui um impacto positivo significativo. O Lanço Linhó/Alcabideche desenvolve-se, fundamentalmente, dentro do espaço canal do IC30 constante das Cartas do PDM de Cascais. A interferência com outras categorias de espaço é pouco significativa. (...)" — cfr. doc. 3, junto pela C………, com a Oposição no proc. cautelar.

U) Do Estudo de Impacte Ambiental, na parte referente a "Resumo Não Técnico", relativo à A16/1C30, Lanço Linhó (EN9)/Alcabideche (IC15), pode ler-se, em súmula: "A Concessão da Grande Lisboa desenvolve-se na Área Metropolitana de Lisboa e abrange um conjunto de dez lanços de autoestrada que formam uma rede de importância fundamental para as acessibilidades regionais e suburbanas desta zona do país. (...) As acessibilidades rodoviárias atualmente na região de Lisboa são manifestamente insuficientes para responder, de forma adequada, ao volume de tráfego que se verifica, dificultando a adequada mobilidade na Área Metropolitana de Lisboa.

A Concessão da Grande Lisboa pretende contribuir para aliviar o volume de tráfego sentido na região, sendo composta por um conjunto significativo de rodovias, sendo que duas delas, o 1C30 e o IC16, irão desempenhar um papel de extrema importância na rede viária na zona norte da Área Metropolitana de Lisboa, dado que irão interligar a A5 e o IC19. Esta ligação permitirá aos respetivos utentes aceder à CREL na zona de Queluz/Monte Abraão sem passar pelo Nó da CREL com o IC19 junto a Queluz, onde presentemente se verificam grandes congestionamentos. Estas vias permitirão satisfazer a procura de tráfego entre a parte ocidental da Área Metropolitana de Lisboa para o norte através da A1 e para o Sul através da A12, aliviando a circulação dentro da cidade de Lisboa. (...)" — cfr. doc. 1 junto à Oposição da C………, constante do proc. cautelar.

V) Por ofícios de 30.05.2008, a C……… notificou as Autoras do seguinte: "A LUSOLISBOA, AUTO ESTRADAS DA GRANDE LISBOA, SA, é concessionária para a conceção, projeto, construção, financiamento, conservação e manutenção dos lanços de autoestrada e conjuntos viários associados, designados por Grande Lisboa, nos termos do Decreto-Lei nº 242/2006, de 28 de dezembro, que aprovou as Bases da concessão outorgada pelo Estado à LUSOLISBOA. No objeto da conceção incluiu-se o lanço A 16/IC30, nos termos da alínea a) do nº 1 da Base II, anexa ao referido diploma legal. Nos termos das Bases XXI e seguintes, anexas ao citado Decreto-Lei, compete à LUSOLISBOA realizar as expropriações necessárias ao estabelecimento da concessão, como entidade expropriante, em nome do Estado, cabendo-lhe a condução dos respetivos processos, decorrendo perante si, designadamente, todo o procedimento com vista à investidura na Posse Administrativa nos termos dos artigos 19° a 22° do Código das Expropriações (Lei nº 168/99, de 18 de setembro). Pelo Contrato de Condução e Realização dos Processos de Expropriação, a LUSOLISBOA, AUTO ESTRADAS DA GRANDE LISBOA, S.A., (...), adjudica ao C………, ACE, (...) para praticar todos os atos inerentes e necessários à expropriação, por utilidade pública dos bens necessários à construção do referido lanço. Pela Base XXI do referido Decreto-Lei nº 242/2006, de 28 de dezembro, são consideradas de Utilidade Pública Urgente, sendo-lhe aplicável o regime definido no Código das Expropriações, as expropriações necessárias à construção deste projeto rodoviário. Assim, nos termos e para os efeitos das disposições combinadas do nº 1, do art. 17° e nº 1, alínea a), do art. 20° do Código das Expropriações, vimos notificar V. Exas. da Declaração de Utilidade Pública da expropriação com caráter urgente das parcelas abaixo referidas, de que V. Exas. são proprietários, ficando a Concessionária, como Entidade Expropriante, autorizada a tomar a Posse Administrativa da mesma, nos termos que constam no Despacho nº 13267/B de 30 de abril de 2008, do Secretário de Estado Adjunto das Obras Públicas e das Comunicações, publicado no Diário da República n.º 91, II Série, Suplemento, Parte C, de 12 de maio de 2008 (...). Do mesmo modo, nos termos do n.º 1 do artº 21º e para os efeitos do artº 20º, ambos do Código das Expropriações, ficam V. Exas. notificados de que se realiza no próximo dia 16 de junho de 2008 (...), a vistoria "ad perpetuam rei memoriam" que precede a investidura na Posse Administrativa da mencionada parcela, (...)" — cfr. doc. 10, junto à PI e cfr. doc. 2 junto pela C………, com a Contestação.

W) Por carta de 06.06.2008 a 2ª Autora comunicou à C……… o seguinte: "(...) contrariamente ao anteriormente solicitado, não nos foi remetida cópia da resolução de expropriação, com os elementos referidos no art. 10º/1 do Código das Expropriações. A referida omissão impossibilita a análise da situação bem como o exercício dos n/ direitos nesta fase do procedimento. 2. Nesta conformidade, aguardamos envio urgente de cópia da resolução de expropriação e respetivos fundamentos, nos termos legalmente fixados" — cfr. doc. 11 junto à Pl.

X) Em 16.06.2008 realizou-se vistoria ad perpetuam rei memoriam à parcela em causa, tendo sido elaborado relatório nos termos dos Docs. 12 e 13 juntos com a PI, que aqui se dão por integralmente reproduzidos.

Y) Por ofícios de 26.06.2008 a C……… notificou as Autoras do seguinte: "Para os devidos efeitos, venho comunicar a V. Exas. que, tendo recebido relatório complementar do perito, cuja cópia se anexa, a entidade expropriante, nos temos do nº 9 do artigo 21º do Código das Expropriações, vai tomar posse administrativa das parcelas em epígrafe, no próximo dia 8 de julho de 2008, pelas 9:40 horas, nas nossas instalações situadas no …………. Park, Salas ………., Zona Industrial da …………., lavrando-se os respetivos autos de posse administrativa" — cfr. docs. 12 e 13 juntos com a Pl.

Z) Na sequência da notificação que antecede, a 2ª Autora apresentou reclamação, nos termos do art. 21°/7 do Código das Expropriações — cfr. doc. 14 junto à PI, que aqui se dá por integralmente reproduzido.

AA) Por ofícios de 03.07.2008, a C……… notificou as Autoras do seguinte: "A reclamação apresentada ao relatório de vistoria foi encaminhada para o respetivo Perito nomeado, para o mesmo se pronunciar, ao abrigo do nº 8 do art. 21º do Código das Expropriações, em relatório complementar. Por conseguinte, fica adiada a posse administrativa à parcela, agendando-se oportunamente nova data" — cfr. doc. 15 junto à Pl.

BB) Por ofícios de 09.07.2008, a C……… notificou as Autoras do seguinte:

"Tendo sido recebido relatório complementar do perito, cuja cópia se anexa, a entidade expropriante, nos termos do nº 9 do artigo 21º do Código das Expropriações, vai tomar posse administrativa da parcela em epígrafe, no próximo dia 21 de julho de 2008, pelas 10:00 horas, nas nossas instalações situadas no …….. Park, Salas ………, Zona Industrial da ……….., lavrando-se o respetivo auto de posse administrativa" — cfr. doc. 16 junto à Pl.

CC) Do referido relatório complementar, que aqui se dá por integralmente reproduzido, consta o seguinte: "1. Há que referir que a parcela se encontra perfeitamente descrita no respeitante à localização, construções existentes e suas características. Quanto ao estado de conservação de todas as instalações e equipamentos do Centro de Lavagens é bom e encontram-se funcionais. Quanto à data da edificação, consta do relatório de vistoria aprm, uma cópia do documento: Alvará de Licença de Utilização n.° 96 datado de 2 de fevereiro de 2001, entregue pela expropriada. A área total do prédio é de 2.480 m2, conforme consta da D.U.P., a parte sobrante é de 325 m2. Do relatório de vistoria aprm, fazem parte todas as construções e benfeitorias, da parte expropriada, bem como da parte sobrante, devido ao entendimento que a parte sobrante fica inoperacional para a atividade atualmente exercida. (...) 2.1. À identificação da expropriada e interessados, apenas podemos referir, que se presume que " A………, SA" seja entidade credora, " B…….., Lda." seja a entidade exploradora do franchising e "E………, SA" seja a franchising. O número de trabalhadores, é de quatro, conforme consta do fax enviado pela " B…….., Lda." e anexo ao relatório de vistoria aprm. 2.2. A parte sobrante localiza-se a poente da parcela expropriada, com características idênticas às da parcela, encontrando-se as construções e benfeitorias desta descritas no relatório de vistoria, conforme indicado anteriormente, uma vez que é entendimento do perito que esta perde a sua funcionalidade face à utilização atual do prédio" — cfr. doc. 16 junto à Pl.

DD) Por ofícios datados de 21.07.2008, a C……… notificou as Autoras do auto de posse administrativa da parcela expropriada a seu favor — cfr. docs. 17 e 18 juntos à Pl.

EE) Em 31.07.2008 foi enviada às Autoras cópia da "resolução de expropriação" datada de 13.08.2007, com o seguinte teor: "Nos termos e para os efeitos dos poderes atribuídos à Lusolisboa — Auto Estradas da Grande Lisboa, SA., pelo contrato de concessão designado por Concessão Grande Lisboa, cujas Bases foram aprovadas pelo Decreto-Lei nº, 242/2006 de 28 de dezembro, celebrado ente o Estado Português e a Lusolisboa — Auto Estradas da Grande Lisboa, S.A., (...), vimos por este meio informar que por deliberação do Conselho de Administração desta sociedade de 19 de julho de 2007, na qualidade de concessionária para a conceção, projeto, construção, aumento do número de vias, financiamento, conservação e exploração, com cobrança de portagem aos utentes, de lanços de autoestradas e conjuntos viários associados, em conformidade com o previsto no Art. 10° da Lei 168/99 de 18 de setembro, com as alterações introduzidas pela Lei nº 13/2002, de 19 de fevereiro e pela Lei nº 4-A/2003, de 19 de fevereiro, foi tomada a resolução de expropriar por utilidade pública e com caráter de urgência nos termos do Art. 15º da Lei 168/99 de 18 de setembro, com as alterações introduzidas pela Lei. Nº 13/2002, de 19 de fevereiro e pela Lei nº 4-A/2003, de 19 de fevereiro, e da Base XXI anexa ao Decreto-Lei n° 242/2006 de 28 de dezembro, todas as parcelas de terreno necessárias à construção dos lanços objeto do Contrato de Concessão da Grande Lisboa, conforme previsto na Base II anexa ao Decreto-Lei n° 242/2006 de 26 de dezembro, tendo em conta o previsto no plano rodoviário nacional e projeto globalmente definido para efeitos de traçado" — doc. 19 junto com a Pl.

FF) O ato impugnado foi proferido sob delegação de poderes, nos termos do Despacho nº 26.680/2007, de 10/07/2007, publicado no Diário da República, 2ª Série, nº 224, de 21/11/2007 — cfr. doc. 3 junto à Contestação da C……….

GG) As Autoras vieram a juízo instaurar a presente ação administrativa especial em 25.08.2008 — cfr. SITAF.

HH) No âmbito do processo de expropriação foi promovida arbitragem para fixação da indemnização devida pela expropriação da parcela em causa — cfr. doc. 1 junto aos autos pela C………, com o reqº datado de 27.04.2009.

II) A expropriação em causa extinguirá a atividade desenvolvida pela 2ª Autora no imóvel assente em A) — Acordo (cfr. Ata da audiência ocorrida em 02.11.2009).

JJ) A parte sobrante do prédio expropriado, com apenas 325 m2, fica inoperacional para a atividade atualmente exercida e perde a sua funcionalidade face à utilização atual do prédio — Acordo (cfr. Ata da audiência ocorrida em 02/11/2009).

KK) A obra que fundamenta esta expropriação está em conformidade com os objetivos de desenvolvimento da rede viária, acessibilidades e articulação de rede urbana — Acordo (cfr. Ata da audiência ocorrida em 02/11/2009).

LL) Na zona adjacente, maxime a poente do prédio em causa, existiam (à data do ato impugnado) outras áreas devolutas, as quais atualmente estão ocupadas pela ..........., pelo Hospital de Cascais e por um campo de futebol — prova testemunhal e doc. 13 junto ao proc. cautelar.

MM) Além a proposta referida na alínea N), a Autora B…….. foi contactada — prova testemunhal, cfr. al. O) e docs. 10, 12 e 15 juntos à Pl.

NN) A construção da A16, que integra o IC30 e o IC16, encontra-se prevista no Plano Rodoviário Nacional (PRN), no Plano Regional de Ordenamento do Território da Área Metropolitana de Lisboa (PROTAML) e no Plano Diretor Municipal (PDM) de Cascais — prova testemunhal e docs. 4 junto ao proc. cautelar, doc. junto pelas Autoras na audiência de discussão e julgamento em 12.01.2010 e do cotejo com a factualidade assente nas alíneas S), T), U) e LL).

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III. B – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

15. Conforme resulta do probatório, as Autoras/Recorridas não foram notificadas da “Resolução de requerer a expropriação” nos termos previstos no nº 5 do art. 10º do Código de Expropriações/99, no caso aplicável.

Essa “Resolução de requerer a expropriação” havia sido tomada em 19/7/2007 – cfr. alínea L) do probatório.

Porém, a notificação desta “Resolução” às Autoras/Recorridas só teve lugar, após insistências da Autora/Recorrida “B……..” (locatária da parcela expropriada), em 31/7/2008 – cfr. alínea EE) do probatório -, isto é, três meses depois da “Declaração de Utilidade Pública (DUP)” efetuada por despacho de 30/4/2008 do Secretário de Estado Adjunto das Obras Públicas e das Comunicações, comunicado às Autoras/Recorridas em 30/5/2008 – cfr. alíneas Q) e V) do probatório; e depois, até, da “tomada de posse administrativa” da parcela expropriada em causa (parcela nº 127) ocorrida em 28/7/2008 – cfr. alíneas BB) e DD) do probatório.

16. Esta circunstância, como vimos, levou as instâncias a considerar incumprido o disposto no nº 5 do art. 10º do C.E., tendo as mesmas considerado, ademais, que a aludida “Resolução” era “completamente omissa” (cfr. Acórdão recorrido, ponto 3.3.10) quanto às menções exigidas no nº 1, designadamente na alínea b) – menção dos “bens a expropriar, os proprietários e demais interessados conhecidos”, a efetuar nos termos dos nºs 2 e 3 -, na alínea c) – menção da “previsão do montante dos encargos a suportar com a expropriação”, a efetuar nos termos do nº 4 – e da alínea d) – menção do “previsto em instrumentos de gestão territorial para os imóveis a expropriar e para a zona da sua localização”.

17. As Recorrentes começam por defender o entendimento de que a “Resolução de requerer a expropriação” não é um ato administrativo impugnável, destinando-se, como ato preparatório que é, a preparar o ato de “declaração de utilidade pública (DUP)”, este, sim, o ato ablativo dos direitos dos proprietários e demais interessados. Assim, aquela “Resolução” não tem estes particulares como seus destinatários, mas sim, exclusivamente, a Entidade Administrativa com competência para a “DUP”.

Por isso, ressalvando a finalidade de abrir a via da aquisição por direito privado – finalidade excluída nos casos de expropriação urgente, como é o caso dos presentes autos – a omissão de notificação da “Resolução” prevista no nº 5 do art. 10º do C.E. não tem qualquer consequência, nomeadamente de invalidação de atos subsequentes, como a “DUP”, pois que dessa omissão não resulta preterido qualquer direito dos proprietários e demais interessados, por não serem, repete-se, os destinatários dessa “Resolução”.

18. Não podemos secundar este entendimento das Recorrentes.

Podemos, até, concordar em que a “Resolução de requerer a expropriação” tenha como principal e direta destinatária a Entidade Administrativa competente para a “DUP”, mas daí não se segue que a notificação aos proprietários e demais interessados, imposta pelo nº 5 do art. 10º do C.E., não seja obrigatória “ex lege”, mesmo nos casos de expropriações urgentes em que afastada está a via da aquisição pelo direito privado a que se refere o art. 11º do C.E. Nem se segue que essa notificação, imposta por lei, não tenha um específico propósito procedimental referente à defesa dos direitos e interesses legítimos dos expropriados e demais interessados.

Outra interpretação, como a adiantada pelas Recorrentes, é manifestamente “contra legem”, pois que a lei claramente exige tal notificação, não a limitando à finalidade da aquisição pelo direito privado.

Essa interpretação é, aliás, claramente afastada pela jurisprudência deste STA sempre que se tem pronunciado sobre esta notificação, sua natureza e finalidade. Efetivamente, ainda que reconhecendo que a “Resolução de expropriar” prevista no art. 10º do C.E. configura um mero ato preliminar ou preparatório, não imediatamente ablativo dos direitos dos expropriados, está, porém, legalmente «prevista a notificação dos interessados, nos termos do nº 5 do citado art. 10º do CE/99, que corresponde, no essencial, à notificação prevista no art. 55º do CPA [hoje, art. 110º do CPA]» (Ac. STA de 26/6/2002, 047229).

E esta notificação é legalmente imposta quer se trate, ou não, de expropriações urgentes: «Nos termos do CE/99, a “resolução de requerer a declaração de utilidade pública” é notificada e o acto declarativo dessa expropriação é simultaneamente notificado e publicado (arts. 10º, nº 5 e 17º, nº 1) ao expropriado. É esse o regime quer se trate de expropriação urgente, quer não» (Ac. STA de 27/7/2003, 047000).

Relativamente à natureza e função da notificação prevista no art. 10º nº 5 do C.E./99 expressou o Ac. STA de 24/3/2004, confirmado pelo Ac. STA, Pleno do C.A., de 10/3/2005, ambos no rec. 047532: «A resolução de requerer a declaração de utilidade pública deve ser notificada ao expropriado (art. 10º nº 5 do Cód. das Expropriações). Tal notificação configura uma garantia procedimental, condicionante da legalidade da declaração de utilidade pública. Não é cumprida tal formalidade se a notificação é feita ao antigo proprietário da parcela a expropriar numa altura (…) em que já constava do Registo Predial a inscrição a favor do novo proprietário (…). É, portanto, claro que o incumprimento do art. 10º, 5 do Cód. Expropriações, na pessoa do expropriado, traduz o incumprimento de uma formalidade essencial e, portanto, geradora de anulabilidade».

Sobre a natureza e função da mesma notificação (imposta pelo nº 5 do art. 10º do C.E./99) discorreu também o Ac. STA, Pleno do C.A., de 6/3/2007 (01595/03):

«(…) Esta notificação é um dos instrumentos de concretização do direito constitucional de “participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito” (art. 267º/5 da CRP). E é um dos elementos de grande relevo no estatuto procedimental do particular, uma vez que a publicização do procedimento é o ponto de partida de toda a dialéctica que o procedimento pressupõe e requisito essencial para a materialização de uma participação efectiva. O conhecimento, com antecedência razoável, do objecto do procedimento é, sem dúvida, condição não só da susceptibilidade de intervenção, mas também de uma participação informada, substancial e eficiente. Quanto mais cedo o particular souber da possibilidade de uma ablação, mais tempo disporá para preparar adequadamente a defesa dos seus interesses. (Cfr, a propósito, David Duarte, in “Procedimentalização, Participação e Fundamentação Para uma Concretização do Princípio da Imparcialidade Administrativa como Parâmetro Decisório”, pp. 148/151 e Pedro Machete, in “A Audiência dos Interessados no Procedimento Administrativo”, pp. 433/438)».

Por último, nesta recensão jurisprudencial, veja-se o expressado no Ac. STA de 7/1/2009 (0707/08):

«A função primacial da notificação prevista no n.º 5 do art. 10.º do Código das Expropriações de 1999 é comunicar ao expropriado o conteúdo da resolução de requerer a declaração de utilidade pública, dando-lhe conhecimento do início do procedimento de expropriação com antecedência em relação ao momento da declaração de utilidade pública, por forma a permitir-lhe defender nele adequadamente os seus interesses, designadamente poder influenciar a própria declaração de utilidade pública. Aquela notificação tem de ser efectuada também no caso de expropriações urgentes e tem de sê-lo com antecedência suficiente em relação ao momento da declaração de utilidade pública que permita ao expropriado poder influenciar o sentido desta declaração».

E mais se expressou neste aresto:

«(…) Por isso, não há suporte legal para afirmar que, quando a expropriação é qualificada como urgente, não há lugar àquela notificação.

Por outro lado, esta interpretação no sentido de ser exigível sempre uma notificação prévia antes da declaração de utilidade pública dando conhecimento impõe-se como sendo a mais acertada (e, por isso, tem de se presumir ter sido legislativamente adoptada, face ao disposto no art. 9.º, n.º 3, do CC), pois, num Estado de Direito que tem como um dos seus pilares fundamentais o reconhecimento do direito de propriedade privada (art. 62.º da CRP), não seria compreensível, fora de circunstâncias extraordinárias ou casos especiais em que estão em interesses fundamentais do Estado, que as entidades públicas pudessem extingui-lo repentinamente, com concomitante tomada de posse administrativa (conexionada com a atribuição de urgência, como decorre do art. 15.º, n.º 2, do Código das Expropriações de 1999, e que no caso foi imediatamente assumida, como se refere no acto recorrido), sem qualquer aviso prévio.

Os casos em que pode ocorrer posse administrativa imediata, sem qualquer formalidade prévia em relação ao expropriado, são apenas os de calamidade pública ou exigências de segurança interna ou defesa nacional, previstos no art. 16.º do Código das Expropriações de 1999, em que se prevê o regime da “Expropriação urgentíssima”.

Por isso, impõe-se a conclusão de que a notificação prevista no art. 10.º, n.º 5, do Código das Expropriações de 1999 tem de ser efectuada também no caso de expropriações urgentes e tem de sê-lo com antecedência suficiente em relação ao momento da declaração de utilidade pública que permita ao expropriado poder influenciar o sentido desta declaração.

No caso em apreço, a notificação da resolução de requerer a expropriação foi efectuada, mas foi-o depois de ser declarada a utilidade pública. Na verdade, como resulta do probatório, apenas na data em que foi declarada a utilidade pública é que foi elaborada uma carta para notificação à ora Recorrente (…).

Isto significa que, como bem refere a Excelentíssima Procuradora-Geral Adjunta, a notificação que foi efectuada não foi a notificação, anterior à declaração de utilidade pública, prevista no art. 10.º, n.º 5, do Código das Expropriações de 1999. Esta questão da antecedência da notificação, ao contrário do que defende a Autoridade Recorrida na sua resposta ao parecer do Ministério Público, não é uma questão que não tenha sido incluída no âmbito do presente recurso jurisdicional, pois ela é o cerne da questão essencial que a Recorrente suscita desde a 1.ª instância, que é a de saber se a notificação que lhe foi efectuada, referida no ponto I do probatório, não tendo sido anterior à declaração de utilidade pública, pode ser considerada a notificação prevista no art. 10.º, n.º 5, do Código das Expropriações de 1999.

(…) Ou, noutra perspectiva, a Administração actuou na prática de acordo com o regime previsto para a expropriação urgentíssima, no art. 16.º do Código das Expropriações, numa situação em que este regime não podia ser aplicado.

Tem, por isso, razão a Recorrente, no que afirma nas conclusões 3.ª a 5.ª das alegações que apresentou neste recurso jurisdicional.

(…) Por isso, o acto recorrido enferma de vício procedimental por omissão da notificação prevista no art. 10.º, n.º 5, do Código das Expropriações de 1999, que justifica a sua anulação (art. 135.º do CPA), na parte relativa à expropriação da parcela n.º 118, indicada na lista anexa à Resolução n.º 463/2003, do Governo Regional da Madeira, publicada no Jornal Oficial da Região Autónoma da Madeira de 24-4-2003».

19. De toda esta recensão da jurisprudência deste STA sobre a matéria, é possível concluir-se que não têm razão as Recorrentes quanto à sua primeira linha argumentativa no sentido de que, nos processos de expropriação urgentes, em que não está em causa aquisição pela via do direito privado, a preterição da notificação prevista no nº 5 do art. 10º do C.E./99 não teria eficácia invalidante dos atos subsequentes (designadamente, da “DUP”).

Pelo contrário, resulta desta jurisprudência que a notificação prevista no art. 10º nº 5 do C.E./99 – com as menções obrigatórias referidas no nº 1:

a) é legalmente imposta quer se trate de expropriação urgente, quer não - Ac. STA de 27/7/2003, 047000;

b) corresponde, no essencial, à notificação prevista no art. 55º do CPA (art. 110º do atual CPA) - Ac. STA de 26/6/2002, 047229;

c) configura uma garantia procedimental, condicionante da legalidade da declaração de utilidade pública - Ac. STA de 24/3/2004, confirmado pelo Ac. STA, Pleno da C.A., de 10/3/2005, ambos no rec. 047532;

d) é uma formalidade essencial, instrumento de concretização do direito constitucional de “participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito” (art. 267º/5 da CRP) - Ac. STA, Pleno do C.A., de 6/3/2007, 01595/03;

e) é um dos elementos de grande relevo no estatuto procedimental do particular, requisito essencial para a materialização de uma participação efectiva; quanto mais cedo o particular souber da possibilidade de uma ablação, mais tempo disporá para preparar adequadamente a defesa dos seus interesses - idem;

f) a sua função primacial é comunicar ao expropriado o conteúdo da resolução de requerer a declaração de utilidade pública, dando-lhe conhecimento do início do procedimento de expropriação com antecedência em relação ao momento da declaração de utilidade pública, por forma a permitir-lhe defender nele adequadamente os seus interesses, designadamente poder influenciar a própria declaração de utilidade pública - Ac. STA de 7/1/2009, 0707/08; e

g) a sua omissão, ou o seu cumprimento só após a “declaração de utilidade pública” (ou, mesmo, sem a necessária antecedência relativamente a esta) é invalidante da “DUP”, por apenas ser legalmente admissível nos casos de “expropriações urgentíssimas” – em estado de necessidade por razão de calamidade pública ou por exigência de segurança interna ou de defesa nacional, como previsto no art. 16º do C.E./99 - idem.

20. Ora, como vimos que resulta da matéria de facto provada nos presentes autos, houve omissão da notificação às Autoras, ora Recorridas, da “Resolução de expropriar” (tomada em 19/7/2007), já que somente após a “declaração de utilidade pública” (de 30/4/2008) e, até, da tomada de posse administrativa da parcela em causa, nº 175 (em 21/7/2008) é que as Recorrentes lhes remeteram cópia da dita “Resolução de expropriar”, após insistências nesse sentido da 2ª Autora (locatária “B……..”), cfr. alíneas O), P), W) e EE) do probatório, ainda assim – segundo as instâncias - “completamente omissa” relativamente às menções obrigatórias referidas nas alíneas b), c) e d) do nº 1 do art. 10º do C.E./99.

Assim, dúvidas não há que se verificou o correspondente vício formal de preterição de formalidade procedimental essencial - omissão de oportuna notificação nos termos do art. 10º nºs 1 b), c) e d) e 5 do C.E./99 -, como as instâncias decidiram – e que, aliás, as próprias Recorrentes, nas suas alegações, em rigor, não contestam.

21. E não se argumente, como fazem as Recorrentes, que «não está legalmente previsto qualquer momento de intervenção dos interessados entre a notificação/informação da “Resolução de requerer a expropriação” e a “DUP”», pois a intenção e finalidade daquela notificação é - como vimos que a jurisprudência deste STA tem expressado -, a de habilitar os interessados, «com suficiente antecedência relativamente à “DUP”», com toda a informação sobre a projetada ablação dos seus direitos fundamentais, de forma a poderem, desde logo, defendê-los, inserindo-se na correspondente dialética procedimental.

Por isso, não estando formalmente previsto um momento procedimental de intervenção (designadamente, uma formal audiência de interessados), tal não significa, como também este STA tem dito, que os interessados não possam, em diálogo com a Administração, influenciar, por alguma forma, a própria “DUP” e o subsequente procedimento.

E também não se afigura pertinente argumentar, como fazem as Recorrentes, que o traçado da via (no caso a A16-IC30) resulta já fixado por instrumentos de planeamento anteriores à “Resolução de requerer a expropriação”, sendo esta, portanto, mera execução de decisões anteriores sobre a matéria, pelo que sempre resultaria inútil qualquer reacção contra esta “Resolução de expropriar”. Não cremos que assim seja, pois que, ainda que o traçado se afigure fixado por decisões anteriores, e eventualmente se tivesse por imutável, a notificação aos interessados da “Resolução de expropriar”, com as menções legalmente impostas, para além de configurar um direito procedimental dos afetados, sempre possibilita o diálogo sobre os contornos concretos da expropriação, que poderão sofrer eventuais alterações ou retificações (v.g., sobre questões indemnizatórias, sobre funcionalidade e destino das partes sobrantes, etc.).

Isto para além de que, como é sabido, em grande parte das vezes, as “Resoluções de requerer a expropriação” conterem elementos erróneos ou incorrectos sobre a identificação dos expropriados e de outros interessados conhecidos e sobre a identificação dos próprios terrenos/parcelas alvo da expropriação projectada, pelo que só a intervenção dos interessados notificados permitirá que tais elementos incorretos não passem para as “DUPs” e se mantenham ao longo do procedimento expropriativo.

22. Questão diferente é a colocada pelas Recorrentes na 2ª linha da sua argumentação recursiva: saber se, não obstante a verificação do vício formal aludido, de omissão de oportuna notificação da “Resolução de expropriar” nos termos e com as menções legalmente obrigatórias, não pode/deve ser recusada, a este vício, eficácia invalidante dos atos subsequentes, nomeadamente da impugnada “DUP”, por – conforme as Recorrentes advogam – as Autoras, ora Recorridas, terem atempadamente sabido da expropriação projetada e terem, até, intervindo no procedimento, pelo que aquela omissão não lhes cerceou, “in casu”, qualquer direito de intervenção e de defesa dos seus direitos e interesses protegidos.

23. Efetivamente, em tese geral, não há dúvida que o incumprimento ou o cumprimento defeituoso de uma formalidade legal pode degradar-se em disfunção de segunda ordem, sem eficácia invalidante, se os interessados não forem realmente atingidos nos seus direitos de participação na tomada da decisão e no contraditório, isto é, quando se possa dizer que foram alcançados os objetivos tidos em vista pelo legislador ao prever aquela formalidade legal.

É o regime que já se considerava de seguir relativamente à formalidade de comunicação aos interessados do início do procedimento que os afetasse, prevista no art. 55º do CPA/91 (hoje, art. 110º do CPA/15) – formalidade semelhante, na sua natureza e objetivos, à imposta no art. 10º nºs 1 e 5 do C.E./99.

Como se lê no Ac. STA de 29/11/2005 (0509/05): «(…) E é justamente essa mesma constatação e esse mesmo princípio que impede que se dite a anulação do acto final do procedimento pela falta da comunicação do respectivo início, como se impõe pelo art. 55º do CPA. Como dizem Esteves de Oliveira e outros (CPA Comentado, vol. I, p. 365): “Claro que não se gera tal invalidade de decisão se, não obstante isso, se demonstrar que o interessado em causa teve conhecimento do procedimento a tempo de poder nele intervir (…)”».

Assim, também o incumprimento da notificação legalmente prevista no art. 10º do C.E./99 pode degradar-se em irregularidade não invalidante da “DUP”.

Porém, para tanto, torna-se necessário concluir que os interessados tiveram conhecimento do procedimento – dos respetivos elementos relevantes - a tempo de poderem nele intervir (o que significa, como decorre da jurisprudência deste STA acima examinada, com suficiente antecedência relativamente à “DUP”).

24. Já não em termos gerais da comunicação do início do procedimento administrativo comum, prevista no art. 55º do CPA/91 ou no art. 110º do CPA/15, mas, agora, quanto ao caso específico do incumprimento, ou do cumprimento defeituoso, da notificação prevista no art. 10º do C.E./91 (comunicação da “Resolução de expropriar”), vejamos algumas posições tomadas por este STA.

No Ac. STA de 19/4/2005 (048258), a propósito de um caso em que se cumprira deficientemente a notificação imposta pelo art. 10º nº 5 do C.E./99, por apenas se comunicar a intenção de requerer a “DUP”, mas sem se ter comunicado o teor integral da “Resolução de expropriar”, entendeu-se:

«Não está documentado, pois, que tenha sido comunicado todo o teor da resolução. Mas a falta de comunicação de todo o teor da resolução não é, no caso, susceptível de inquinar o acto recorrido. (…) a alegada deficiente comunicação foi recebida pela recorrente em 7.12.99 e o acto impugnado data de 14.9.2001, isto é, a falta de elementos na notificação, sendo susceptível de interferir na ponderação pela ora recorrente da posição que devia tomar, podia ter sido arguida em tempo razoável, devendo considerar-se, na falta de prazo especial, o prazo de 10 dias previsto no artigo 71º nº 2 do CPA (…); e se tivesse sido arguida podia, também, ter sido colmatada em tempo útil. Não tendo produzido aquela arguição, sempre tal deficiente comunicação se teria de considerar sanada, para efeitos da determinação da regularidade do acto impugnado contenciosamente».

25. Na mesma linha de entendimento, e num caso semelhante ao antecedente, pode ler-se no Ac. STA de 14/4/2005 (047310):

«(…) o que aqui se mostra fundamental, enquanto marco inicial de um procedimento expropriativo, é a comunicação da “resolução de requerer a declaração de utilidade pública da expropriação”. E tal foi feito, como se pode ler a fls. 110 dos autos, por envio do ofício nº 890/NEP-A/00, de 23/08/2000 da “… …”. Assim, achando que essa notificação – feita, aliás, em cumprimento do art. 10º, nº 5, do Código das Expropriações aprovado pela Lei nº 168/99, de 18/09 – não o esclarecia completamente, e querendo o interessado conhecer o teor completo do requerimento, poderia ter solicitado certidão integral do respectivo documento. O que não pode é, agora, dizer que não pôde intervir nessa fase do procedimento para colaborar com a Administração ou para participar na decisão que lhe dissesse respeito, conforme é desígnio ínsito nas disposições legais invocadas. Portanto, uma vez que a referida resolução constitui o primeiro passo procedimental do processo expropriatório, com a sua notificação ao expropriado entende-se estar satisfeita a exigência legal do conhecimento pelo interessado directo do início do processo (no mesmo sentido, sobre caso igual, o cit. acórdão do STA [de 12/12/2002, 046819]). Significa que não se mostram violados os alegados preceitos».

Resulta desta jurisprudência do STA que, desde que os interessados tenham sido atempadamente notificados, nos termos do art. 10º nº 5 do C.E./99, da “Resolução de expropriar”, a eventual deficiência dessa notificação consistente na não comunicação do teor integral daquela “Resolução” faz impender sobre os interessados o ónus de solicitar a notificação do teor integral da “Resolução”, sob pena de, em caso de passividade, não poderem, depois, alegar aquele incumprimento defeituoso da aludida notificação.

26. Num diferente caso, em que a notificação da “Resolução de expropriar” só foi efectuada após a “DUP” e que a interessada não teve, antes desta, qualquer intervenção no procedimento, o Ac. STA de 1/7/2009 (0707/08) julgou:

«(…) tendo a declaração de utilidade pública sido proferida antes da notificação da resolução de requerer a expropriação e não se tendo demonstrado que tenha existido qualquer intervenção procedimental da ora Recorrente anterior à declaração de utilidade pública, não se está perante uma situação em que se possa afirmar que a falta de notificação não afectou os seus direitos procedimentais, pois não lhe foi assegurada a possibilidade de intervir no procedimento antes de aquela declaração ser proferida, que a notificação em causa visa. Por isso, o acto recorrido enferma de vício procedimental por omissão da notificação prevista no art. 10º, nº 5, do Código das Expropriações de 1999, que justifica a sua anulação (art. 135º do CPA), na parte relativa à expropriação da parcela nº 118 (…)».

27. Feito este enquadramento jurisprudencial, centremo-nos agora no circunstancialismo do presente caso, tal como resultante do probatório.

- A “Resolução de Expropriar”, por utilidade pública e com carácter de urgência, foi tomada em 19/7/2007, pelo Conselho de Administração da “LusoLisboa, S.A.” (cfr. doc. 2 junto pela “C………” com a contestação) – alínea L) do probatório;

- A utilidade pública, com carácter de urgência, foi declarada (“DUP”) por despacho de 30/4/2008 do Secretário de Estado Adjunto das Obras Públicas e das Comunicações, publicado no DR, II Série, de 12/05/2008, o qual mais declarou autorizar a concessionária “LUSOLISBOA, S.A.” a tomar posse administrativa das parcelas em causa, entre as quais a nº 175, da propriedade da 1ª Autora “A………, S.A.” (cfr. doc. 1 junto à PI; doc. 2 junto à Contestação da C……… e fls. 3 e 53 do proc. adm.) – alíneas M) e Q) do probatório;

- Por ofício de 01.04.2008 – ou seja, cerca de 8 meses e meio após a “Resolução de Expropriar” e cerca de 29 dias antes da “DUP” - a “C………” notificou a 2ª Autora (locatária “B…….., Lda.”) de que, em 19/7/2017, o seu Conselho de Administração havia deliberado requerer a expropriação por utilidade pública com carácter de urgência, nos termos do art. 15º da Lei 168/99, aproveitando para informar que, após avaliação, apresentava a proposta de aquisição da parcela nº 175 no valor global de €214.500,00, pretendendo a expropriação de uma parcela de terreno com a área de 2155m2, a destacar do prédio identificado (cfr. doc. 8 junto à p.i.) – alínea N) do probatório;

- Por carta datada de 17.04.2008 da 1ª Autora (proprietária “A………, S.A.”) dirigida à “C………”, aquela informou a sua qualidade de proprietária do prédio em causa e solicitou ser notificada da proposta de expropriação (cfr. doc. 2 junto à contestação da “C………”) – alínea O) do probatório;

- Em 20.05.2008 a 2ª Autora (locatária “B........, Lda.”) comunicou à “C………” o seguinte: "Na sequência da V/ prezada carta de 2008.04.01 (...) não nos foi remetida cópia da resolução de expropriação, com os elementos referidos no art. 10º/1 do Código das Expropriações. A referida omissão impossibilita a análise da situação bem como o exercício dos n/ direitos nesta fase do procedimento. Nesta conformidade, aguardamos envio urgente de cópia da resolução de expropriação e respetivos fundamentos, nos termos legalmente fixados" (cfr. doc. 9 junto à p.i.) – alínea P) do probatório.

- Por ofícios de 30.05.2008 – cerca de 1 mês após a “DUP” -, a “C………” notificou as Autoras da “Declaração de Utilidade Pública (DUP)”, «nos termos e para os efeitos das disposições combinadas do nº 1, do art. 17° e nº 1, alínea a), do art. 20° do Código das Expropriações (…) ficando a Concessionária, como Entidade Expropriante, autorizada a tomar a Posse Administrativa da mesma, nos termos que constam no Despacho nº 13267/B de 30 de abril de 2008, do Secretário de Estado Adjunto das Obras Públicas e das Comunicações, publicado no Diário da República n.º 91, II Série, Suplemento, Parte C, de 12 de maio de 2008 (...). Do mesmo modo, nos termos do n.º 1 do artº 21º e para os efeitos do artº 20º, ambos do Código das Expropriações, ficam V. Exas. notificados de que se realiza no próximo dia 16 de junho de 2008 (...), a vistoria "ad perpetuam rei memoriam" que precede a investidura na Posse Administrativa da mencionada parcela, (...)» (cfr. doc. 10, junto à p.i. e doc. 2 junto pela “C………” com a contestação) – alínea V) do probatório;

- Por carta de 06.06.2008 a 2ª Autora (locatária “B…….., Lda.”) comunicou à “C………” que "(...) contrariamente ao anteriormente solicitado, não nos foi remetida cópia da resolução de expropriação, com os elementos referidos no art. 10º/1 do Código das Expropriações. A referida omissão impossibilita a análise da situação bem como o exercício dos n/ direitos nesta fase do procedimento. 2. Nesta conformidade, aguardamos envio urgente de cópia da resolução de expropriação e respetivos fundamentos, nos termos legalmente fixados" — cfr. doc. 11 junto à p.i.) – alínea W) do probatório;

- Em 21/7/2008, a “C………” tomou posse administrativa da parcela em questão, nº 175, tendo notificado, na mesma data, as Autoras do auto de posse administrativa da parcela expropriada a seu favor (cfr. docs. 16, 17 e 18 juntos à p.i.) – alíneas BB), CC) e DD) do probatório;

- Em 31/7/2008 – ou seja, cerca de 3 meses após a “DUP” e 10 dias após a tomada de posse administrativa - foi enviada às Autoras cópia da "Resolução de Expropriação" com o seguinte teor: "Nos termos e para os efeitos dos poderes atribuídos à Lusolisboa — Auto Estradas da Grande Lisboa, SA., pelo contrato de concessão designado por Concessão Grande Lisboa, cujas Bases foram aprovadas pelo Decreto-Lei nº, 242/2006 de 28 de dezembro, celebrado ente o Estado Português e a Lusolisboa — Auto Estradas da Grande Lisboa, S.A., (...), vimos por este meio informar que por deliberação do Conselho de Administração desta sociedade de 19 de julho de 2007, na qualidade de concessionária para a conceção, projeto, construção, aumento do número de vias, financiamento, conservação e exploração, com cobrança de portagem aos utentes, de lanços de autoestradas e conjuntos viários associados, em conformidade com o previsto no Art. 10° da Lei 168/99 de 18 de setembro, com as alterações introduzidas pela Lei nº 13/2002, de 19 de fevereiro e pela Lei nº 4-A/2003, de 19 de fevereiro, foi tomada a resolução de expropriar por utilidade pública e com caráter de urgência nos termos do Art. 15º da Lei 168/99 de 18 de setembro, com as alterações introduzidas pela Lei Nº 13/2002, de 19 de fevereiro e pela Lei nº 4-A/2003, de 19 de fevereiro, e da Base XXI anexa ao Decreto-Lei n° 242/2006 de 28 de dezembro, todas as parcelas de terreno necessárias à construção dos lanços objeto do Contrato de Concessão da Grande Lisboa, conforme previsto na Base II anexa ao Decreto-Lei n° 242/2006 de 26 de dezembro, tendo em conta o previsto no plano rodoviário nacional e projeto globalmente definido para efeitos de traçado" — (doc. 19 junto com a p.i.) – alínea EE) do probatório.

28. Dos factos provados alinhados no ponto (27) antecedente, é possível concluir que a 1ª Autora, proprietária “A………, S.A.”, nunca foi notificada da “Resolução de Expropriar” tomada em 19/7/2007, não obstante ser a proprietária inscrita no registo predial (desde 1997, cfr. doc. 2 junto com a p.i. – alínea A do probatório).

Aliás, a proprietária “A………, S.A.”, em 17/4/2008 (acaso informalmente informada pela 2ª Autora, a locatária “B…….., Lda.”), por carta dirigida à “C………” invocou o seu estatuto de proprietária e solicitou ser notificada da proposta de expropriação – solicitação não satisfeita, pelo menos antes da “Declaração de Utilidade Pública”, ocorrida em 30/4/2008, e da notificação deste ato efetuada em 30/5/2008.

29. Apenas à 2ª Autora, locatária “B…….., Lda.”, foi comunicada a “Resolução de Expropriar”. Efetivamente, por ofício da “C………” de 01.04.2008 – ou seja, cerca de 8 meses e meio após a “Resolução de Expropriar” e cerca de 29 dias antes da “DUP”.

Porém, como a “Resolução de Expropriar” informada à 2ª Autora não continha os elementos referidos no nº 1 do art. 10º do C.E./99, esta (locatária “B…….., Lda.”) comunicou à “C………”, por carta de 20/5/2008 que tal omissão impossibilitava a análise da situação e o exercício dos seus direitos, e solicitou o envio urgente, pela qual ficava a aguardar, de cópia da “Resolução” e respetivos fundamentos, nos termos legalmente fixados – solicitação não satisfeita, sendo certo que já tinha sido entretanto declarada a utilidade pública da expropriação (em 30/4/2008).

A 2ª Autora, em 6/6/2008, na sequência da notificação, em 30/5/2008, da “DUP” (declarada em 30/4/2008), lembrou à “C………” a solicitação, não satisfeita, de notificação da “resolução de Expropriar” contendo os elementos legalmente exigidos e reafirmou-lhe que continuava a aguardar o seu envio urgente – insistência também não satisfeita.

30. Ora, como parece evidente, estas conclusões não permitem admitir que o ilegal incumprimento, no caso, do art. 10º nºs 1 e 5 do C.E. – notificação das Autoras interessadas, ora Recorridas, proprietária e locatária da parcela expropriada (nº 175) da “Resolução de Expropriar” tomada em 19/7/2007, a qual, ademais, omitia as menções exigidas nas alíneas b), c) e d) do aludido nº 1 – tenha perdido eficácia invalidante por acaso terem sido alcançados os objetivos tidos em vista pelo legislador ao impor tal formalidade legal.

Pelo contrário, se o objetivo legal daquela notificação é – conforme a jurisprudência deste STA – «comunicar ao expropriado o conteúdo da “resolução de requerer a declaração de utilidade pública”, dando-lhe conhecimento do início do procedimento de expropriação com antecedência em relação ao momento da declaração de utilidade pública, por forma a permitir-lhe defender nele adequadamente os seus interesses, designadamente poder influenciar a própria declaração de utilidade pública» (Ac. STA de 7/1/2009, 0707/08), então só pode concluir-se que, no presente caso, tal objetivo não foi, por nenhuma forma, alcançado.

31. Da mesma forma, se tal notificação, legalmente imposta, «configura uma garantia procedimental, condicionante da legalidade da declaração de utilidade pública» (Ac. STA de 24/3/2004, confirmado pelo Ac. STA, Pleno do C.A., de 10/3/2005, ambos no rec. 047532), e se «é uma formalidade essencial, instrumento de concretização do direito constitucional de participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito (…) um dos elementos de grande relevo no estatuto procedimental do particular, requisito essencial para a materialização de uma participação efectiva», pelo que «quanto mais cedo o particular souber da possibilidade de uma ablação, mais tempo disporá para preparar adequadamente a defesa dos seus interesses» (Ac. STA, Pleno do C.A., de 6/3/2007, 01595/03), então, a omissão, no presente caso, dessa notificação aos interessados, não obstante as solicitações destes, não satisfeitas, não permitem concluir que o objetivo legal foi, por qualquer forma, alcançado.

32. Repete-se que: a 1ª Autora, “A………, S.A.”, proprietária registada, nunca foi notificada da “Resolução de Expropriar”, ainda que o tenha solicitado (em vão) antes da declaração de utilidade pública (foi esta a sua única intervenção procedimental antes da “DUP” e, até, antes da tomada de posse administrativa da parcela expropriada de sua propriedade); a 2ª Autora, “B…….., Lda.” locatária da parcela em causa, foi informada, por carta de 01.04.2008 – 8 meses e meio após a “Resolução de Expropriar”, tomada em 19/7/2007, e 29 dias antes da “DUP”, mas tendo solicitado informação sobre as menções legais em falta, esta solicitação não lhe foi satisfeita.

33. Retira-se, pois, que as interessadas Autoras, ora Recorridas, proprietária e locatária da parcela expropriada, não foram devidamente informadas da “Resolução de Expropriar” no momento legalmente imposto – com antecedência relativamente à “declaração de utilidade pública” – nem, até, antes da “declaração de utilidade pública” ou da “tomada de posse administrativa” da parcela expropriada. E isto, não obstante a pro-atividade de ambas no sentido de lhes serem disponibilizados os pertinentes elementos.

34. Esta circunstância impediu que as interessadas tivessem atempadamente conhecimento da “resolução de expropriar” e dos seus relevantes elementos, e pudessem ter intervindo no procedimento defendendo os seus direitos.

35. A 1ª Autora, “A………, S.A.”, proprietária registada da parcela expropriada, só interveio no procedimento em 17/4/2008, dias antes da “declaração de utilidade pública” – nunca tendo sido até então notificada de nada – invocando o seu estatuto de proprietária e solicitando ser notificada da proposta de expropriação. Esta solicitação não foi satisfeita e, entretanto, foi notificada, por carta de 30/5/2008, da “declaração de utilidade pública” (declarada em 30/4/2008).

36. Por seu lado, a 2ª Autora, “B…….., Lda.”, locatária da parcela expropriada, recebeu comunicação da “Resolução de Expropriar” (tomada em 19/7/2007) apenas por ofício da “C………” de 01.04.2008 – ou seja, cerca de 8 meses e meio após a “Resolução de Expropriar” e cerca de 29 dias antes da “DUP”, e tendo solicitado, em 20/5/2008, os elementos em falta, legalmente exigíveis pelo nº 1 do art. 10º do C.E./99, em ordem a possibilitar-lhe a análise da situação e o exercício dos seus direitos, apenas recebeu, por carta de 30/5/2008, a notificação da “declaração de utilidade pública” (tomada em 30/4/2008).

37. De tudo o exposto, conclui-se que, para além de ter sido incumprida, no presente caso, a formalidade legal da notificação às interessadas Autoras, ora Recorridas, imposta pelo art. 10º nº 5 do C.E./99, não é possível admitir que o objetivo legal desta notificação foi alcançado por qualquer forma, sendo certo que as intervenções das interessadas Autoras se limitaram, até à notificação da “declaração de utilidade pública”, a solicitar informação sobre a “Resolução de Expropriar” e respetivos elementos – solicitações não satisfeitas -, não tendo, tais intervenções, sido dirigidas à defesa dos seus direitos, por não deterem, para tanto, as necessárias informações.

38. Resulta, ademais, de todo o circunstancialismo exposto, uma clara intervenção negligente das entidades responsáveis pela condução da expropriação da parcela em causa, já que fica por entender: por que razão a “Resolução de Expropriar”, tomada em 19/7/2007, nunca foi notificada à proprietária registada da parcela (a 1ª Autora); por que razão, esta notificação não lhe foi efetuada mesmo depois de aquela proprietária, 1ª Autora, o ter expressamente solicitado em 17/4/2008, ainda antes da “DUP”; por que razão a interessada locatária (2ª Autora) só foi notificada da “Resolução de Expropriar” por carta de 01.04.2008 – 8 meses e meio após a “Resolução de Expropriar”, tomada em 19/7/2007, e 29 dias antes da “DUP” -, e por que razão, ainda assim, tal notificação omitia as menções impostas pelas alíneas b), c) e d) do nº 1 do art. 10º do C.E./99; por que razão, por último, a solicitação destes elementos por parte da 2ª interessada também não foi satisfeita.

39. Em face de tudo quanto fica dito, é de secundar o julgamento do Acórdão TCAS recorrido quanto ao incumprimento da notificação imposta pelo art. 10º, nºs 1 b), c) e d) e 5 do C.E./99, formalidade essencial “in casu” invalidante do ato impugnado de “declaração de utilidade pública” de expropriação da parcela em questão nos autos.

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IV - DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202º da Constituição da República Portuguesa, em:

Negar provimento ao presente recurso de revista deduzido pelas Recorrentes/Contrainteressadas “C………, ACE” e “LusoLisboa, S.A.”, mantendo-se, assim, o Acórdão TCAS recorrido.

Custas neste S.T.A. a cargo das Recorrentes/Contrainteressadas “C………, ACE” e “LusoLisboa, S.A.”.

D.N.

Lisboa, 20 de fevereiro de 2020. – Adriano Fraxenet de Chuquere Gonçalves da Cunha  (relator) – Carlos Luís Medeiros de Carvalho – Maria Benedita Malaquias Pires Urbano.