Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 076/02.6BTFUN |
Data do Acordão: | 10/07/2021 |
Tribunal: | 1 SECÇÃO |
Relator: | SUZANA TAVARES DA SILVA |
Descritores: | DESPACHO SANEADOR IMPUGNAÇÃO ERRO DE JULGAMENTO FACTO LICENCIAMENTO OPERAÇÃO DE LOTEAMENTO |
Sumário: | |
Nº Convencional: | JSTA00071260 |
Nº do Documento: | SA120211007076/02 |
Data de Entrada: | 01/27/2021 |
Recorrente: | A............. |
Recorrido 1: | MUNICÍPIO DO FUNCHAL |
Votação: | UNANIMIDADE |
Objecto: | SENT TAF FUNCHAL |
Decisão: | NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO |
Legislação Nacional: | art. 511.º, n.º 3, do CPC art. 10.º, n.º 1, do DL n.º 448/91, de 29/11 N.ºs 6 e 9 do Regulamento do Plano Director da Cidade do Funchal |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo I - RELATÓRIO 1. A………, com os sinais dos autos, interpôs no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa (TAC de Lisboa), em 15 de Setembro de 1995, “recurso contencioso” contra o “acto de licenciamento de loteamento com base no qual foi emitido o alvará de loteamento n.º 23/95”, acto praticado pela Câmara Municipal do Funchal (de ora em diante apenas CMF), indicando como recorrido particular, B……….., também com os sinais dos autos. O Recorrente peticionou que fosse declarada a nulidade do referido acto de licenciamento ou que o mesmo fosse anulado. 2. Por sentença do TAC de Lisboa, de 3 de Fevereiro de 1999, foi declarada a inutilidade superveniente da lide, com os seguintes fundamentos: i) aprovação e entrada em vigor do Plano Director Municipal (PDM) da cidade do Funchal, do qual resultaria que deixava de estar em vigor o Plano da Frente Mar; e ii) conformidade do alvará de loteamento com o novo Plano de Ordenamento do Território. 3. Inconformado, em 27 de Abril de 1999, o Recorrente interpôs recurso daquela decisão para o STA, que, por acórdão de 28 de Novembro de 2000, concedeu provimento ao recurso e ordenou o prosseguimento do recurso contencioso. 4. No seguimento daquele acórdão, a Câmara Municipal do Funchal interpôs recurso por oposição de julgados para o Pleno da Secção do Contencioso Administrativo deste STA, que, por acórdão de 6 de Fevereiro de 2002, julgou findo o recurso por inexistência de oposição entre os julgados. 5. No seguimento da transição do processo para o TAF do Funchal, entretanto instalado, e do convite formulado ao Recorrente para aperfeiçoar a P.I., foi apresentado novo articulado em 27 de Novembro de 2003 (fls. 274) e seguiram-se várias diligências de prova, incluindo a realização de prova pericial, tendo sido proferida sentença pelo TAF do Funchal, em 19 de Novembro de 2012, na qual se julgou improcedente o recurso contencioso (fls. 619 a 622). 6. Inconformado, o Recorrente interpôs recurso daquela sentença para este STA. Com o referido recurso da sentença subiram também os recursos de agravo que haviam sido admitidos com subida diferida, quer do despacho de 25 de Maio de 2012, que inferira um pedido de 2.ª perícia (fls. 555), quer do despacho de 11 de Setembro de 2012, que indeferira um pedido de esclarecimentos a solicitar aos peritos (fls. 593). 7. Por acórdão de 20 de Junho de 2013, o STA concedeu provimento ao agravo interposto do despacho que inferira o pedido de realização da segunda perícia, revogou-o, ordenou que fosse proferido despacho a admitir aquela diligência e considerou prejudicado o conhecimento do agravo do segundo despacho, bem como do recurso da sentença. 8. Entretanto, cabe ainda sublinhar que, em 15 de Julho de 2005, o TAF do Funchal elaborou, nos termos do artigo 845.º do Código Administrativo a especificação e o questionário (fls. 394), do qual foi apresentada reclamação pelo Recorrente em 9 de Janeiro de 2006 (fls.399 e segs.). 9. Tal reclamação foi decidida por despacho de 16 de Junho de 2008 (fls. 420), no qual se escreveu que “a matéria constante do artigo 9.º da p. i.” não podia ser seleccionada para condensação por não ser matéria fáctica. No mais a reclamação foi atendida. 10. O Recorrente e Reclamante interpôs recurso (de agravo) do despacho que decidiu a reclamação da especificação e do questionário na parte em que decaiu na sua pretensão (fls. 426). O Tribunal a quo proferiu despacho de não admissão desse recurso, com fundamento no artigo 511.º, n.º 3 do CPC, no qual se estipula que o despacho proferido sobre as reclamações da selecção da matéria de facto apenas pode ser impugnado no recurso interposto da decisão final. 11. Cumpridas as diligências de prova, incluindo a realização de segunda perícia ordenada pelo STA, foi proferida sentença pelo TAF do Funchal, em 27 de Março de 2019, que julgou improcedente o pedido e absolveu os demandados do pedido. 12. Inconformado, o Recorrente interpôs recurso para o TCA Sul, que, por despacho da Relatora de 15 de Dezembro de 2020, julgou aquele Tribunal incompetente em razão da hierarquia e competente o Supremo Tribunal Administrativo. 13. O Recorrente apresentou alegações que rematou com as seguintes conclusões: «[…] A. O recorrente interpôs recurso contencioso de um ato de licenciamento de um loteamento, imputado à Câmara Municipal do Funchal e titulado pelo alvará n.º 23/95, dirigindo o recurso contra essa Câmara e contra o interessado particular na manutenção do ato, B…….
3.1.1. Da alegada omissão de pronúncia O Recorrente alega que em sede de alegações finais (artigos 8.º e 9.º) invocou a nulidade do acto de loteamento por falta de objecto e que o Tribunal a quo não se pronunciou sobre este vício, incorrendo, por isso, na violação do artigo 615.º, n.º 1, al. d) do CPC. Compulsado o teor da P.I. aperfeiçoada (fls. 274 a 277), verifica-se que o Recorrente impugnou o acto de licenciamento do loteamento que deu origem à emissão do alvará de loteamento n.º 25/95, imputando-lhe um vício de forma por falta de publicitação e um vício de violação de lei por violação das normas do Decreto-Lei n.º 448/95. A nulidade do acto de loteamento com fundamento em falta de objecto, que o Recorrente alegou apenas nas alegações de direito (e que reconhece ter apenas alegado nesta sede – v. conclusão III das alegações de fls. 649 e segs.), não pode constituir neste caso um fundamento de omissão de pronúncia. É que não estamos perante uma “mera questão de direito”, ou seja, a alegação de um vício de nulidade do acto impugnado, mas sim perante uma “nova causa de pedir”, consubstanciada em factos novos que antecedem o próprio acto aqui impugnado, pressupondo a produção de prova sobre factos inexistentes nos autos e cuja alegação nesta “fase processual tardia”, pelas razões apontadas, é manifestamente violadora do princípio do dispositivo. Lembre-se que o Tribunal está limitado pelo princípio do dispositivo e, nessa medida, o Recorrente tem a obrigação de deduzir todas ilegalidades de que padeça o acto recorrido no articulado inicial (conforme impõe o artigo 36.º, n.º 1, al. d) da LPTA) ou mediante a apresentação de articulado superveniente (como resulta do artigo 506.º do CPC (Atendendo a que se trata de um processo instaurado em 1995 está aqui em causa a redacção do CPC aplicável à data dos factos.) , aplicável ex vi do artigo 1.º da LPTA) se estiver em causa um facto ocorrido posteriormente, ou um facto anterior de que o A. só tenha tido conhecimento posteriormente, ou ainda, mais tardiamente, nas alegações de direito a produzir em momento imediatamente anterior à prolação da sentença. Ora, neste caso, o Recorrente vem apresentar em 15 de Outubro de 2012 o que denomina de novo fundamento de ilegalidade do acto nas alegações finais, mas que consubstancia uma “causa de pedir nova e autónoma das que estiveram em apreço e foram objecto de instrução nos autos”, e alega que “só teve conhecimento desta ilegalidade” “pela consulta dos processos administrativos” (fls. 599vs.). Sucede que o processo administrativo foi junto aos autos em 11 de Novembro de 2002 (fls. 262) e relativamente a ele foi expressamente dada a oportunidade ao Recorrente de se pronunciar quanto ao respectivo teor, tendo este afirmado, em requerimento de 18 de Fevereiro de 2003 (fls. 274), o seguinte: “[Q]uanto ao conteúdo desse processo camarário e dos demais elementos já constantes dos autos ou que deles venham a constar, reserva-se o recorrente para dizer o que se lhe oferecer, no momento processual adequado, desde logo em alegações”. Sublinhe-se que o Recorrente Contencioso também não fez qualquer referência ao que depois veio denominar como “novo vício” na P.I. aperfeiçoada que apresentou em 27 de Novembro de 2003 (fls. 274), a convite do juiz. Com base neste circunstancialismo, tem de concluir-se que o que o Recorrente alegou nas alegações finais de direito não foi um novo vício (fundamento de invalidade do acto impugnado) em data muito posterior àquela em que tomou conhecimento do mesmo, nem foi um mero fundamento jurídico de nulidade do acto. Foi antes uma nova causa de pedir, assente em factualidade diversa daquela que constituiu a base instrutória dos presentes autos, tal como a mesma foi configurada a partir dos articulados até ao encerramento do momento processual do “julgamento de facto” e tal constitui fundamento suficiente e adequado para que a mesma não possa ser atendida nos presentes autos. A alegada falta de objecto do acto de licenciamento do loteamento por respeitar a um lote decorrente de uma anterior operação de loteamento que, entretanto, teria caducado, traduz-se na arguição de uma invalidade do acto administrativo dependente da apreciação da validade de um outro acto anterior cuja discussão em termos fácticos e jurídicos nunca esteve em causa nestes autos. De resto, a circunstância de este novo fundamento de ilegalidade do acto de loteamento poder constituir uma nulidade em nada prejudica a propositura de uma nova acção, atento o facto de as nulidades poderem ser conhecidas a todo o tempo. O que não pode admitir-se é que estando encerrada a instrução e o julgamento da matéria de facto, num momento processual – o das alegações de direito – em que a discussão repousa apenas na discussão dos aspectos jurídicos da causa, o Recorrente Contencioso possa convocar novos fundamentos jurídicos de invalidade do acto que estejam para além do âmbito da causa (em clara e manifesta violação do princípio do dispositivo). E o facto de não ter alegado e provado que a invocação desse vício, nesse momento processual, foi justificada pelo conhecimento superveniente, nesse momento, desse novo vício, impede que qualquer princípio de favorecimento do processo possa alterar a vinculação ao princípio do dispositivo. Lembre-se que ficou provado que o Recorrente teve acesso à informação na qual fundamento este novo vício 10 anos antes, pelo que a sua alegação neste momento aparenta ser apenas uma forma de perturbar o andamento do processo. Assim, não tinha o Tribunal a quo que conhecer da alegada nulidade do acto por falta de objecto, pelo que não existe omissão de pronúncia nesta parte. Improcede, por tudo quanto dissemos, a alegada omissão de pronúncia.
3.1.2. Erros no julgamento da matéria de facto 3.1.2.1. Alega em segundo lugar o Recorrente que o Tribunal a quo errou ao dar como não provado o quesito 3. Dispunha o quesito 3: «O PDM de 1972 integra o local em “espaço verde”?» O Tribunal a quo deu como não provado que o “Plano Director da Cidade do Funchal”, aprovado por Despacho do Secretário de Estado das Obras Públicas de 23 de Março de 1972, integrasse o local em “espaço verde”, motivando esta decisão da seguinte forma: “Da análise feita pelo tribunal às duas perícias (v. fls. 526 a 538 e fls. 751 ss) resulta que o local está integrado pelo PDM de 1972 na "zona turística e recreativa B", sendo certo que não se pode concluir que o PDM preveja ali qualquer zona/espaço como "espaço verde". Note-se que, segundo o RPDM (n.º 2), temos: um mapa de zonas e uma planta a 1: 10000; nestes 2 documentos não existe qualquer zona "espaço verde", tal como acontece no texto do RPDM (v. fls. 526 a 538). O 3.º doc. ali junto irreleva, pois não é dos referidos no n.º 2 do PDM; ainda assim, ali, o "espaço verde" é privado e num contexto meramente descritivo do então existente”. O Recorrente discorda, considerando que dos depoimentos das testemunhas, devidamente identificadas, assim como das passagens por ele identificadas e transcritas, resulta provado o contrário. Mas sem razão, pelos motivos que passamos a elencar. Primeiro, porque o facto a provar (questão técnica), que consiste em saber se a zona de implantação dos imóveis está integrada em “espaço verde”, é determinado pelo teor dos planos urbanísticos (parte regulamentar e parte cartográfica), o que significa que a prova pericial é mais adequada do que a prova testemunhal no que contende, essencialmente, com a análise da parte cartográfica. Segundo, porque havendo divergência entre a prova testemunhal e a prova pericial, deve, em regra, em domínios científicos e técnicos, prevalecer a prova pericial, atenta a sua especialidade e adequação à prova que é necessário produzir. O que, de resto, explica também a insistência do Recorrente na necessidade de realização de uma segunda perícia (objectivo que alcançou em sede de procedência de um recurso para o STA, fls. 687) face ao carácter inconclusivo da primeira. Terceiro, que, in casu, não existe sequer contradição entre a prova testemunhal e a prova pericial (fls. 752), uma vez que o teor da segunda peritagem realizada é determinante ao esclarecer o sentido a atribuir a “zona verde a conservar – privada”, referida pelas testemunhas C………. e ………. De acordo com o relatório dos peritos «[…] zona verde a conservar – privada, sendo que a representação nesta PLANTA de Zonas urbanas classificadas, enquadra-se no âmbito do capítulo IV – Preservação e Recuperação das Zonas Urbanas de Qualidade – áreas classificadas, que visa: “… definir uma orientação e um controle de renovação e recuperação das áreas da cidade do Funchal consideradas de interesse histórico-artístico e como tal fundamentais no seu valor paisagístico urbano”. […]». O sentido que se retira da prova pericial a respeito das “condicionantes” de ordenamento do território para a validade do acto urbanístico aqui em apreço é aquele que o Tribunal a quo bem aplicou. Improcede, por estas razões, o alegado erro no julgamento da matéria de facto. E inexiste também a alegada violação do direito fundamental à impugnação dos actos administrativos (artigo 268.º, n.º 4 da CRP) em resultado da referida omissão de publicidade, pois o Recorrente não ficou impedido de impugnar atempadamente o acto de loteamento que reputa de ilegal, como, de resto, a interposição deste recurso contencioso, que não foi considerado extemporâneo, demonstra.
3.1.2.2. Em terceiro lugar e ainda a respeito do julgamento da matéria de facto, o Recorrente não se conforma com o decidido em sede de reclamação do questionário e da especificação quanto a não serem questões de facto as alegadas no artigo 9.º a P.I. O Recorrente alega que os factos que invocara nesse artigo 9.º da P. I. eram verdadeiras questões de facto, essenciais para a decisão do fundo da causa e que não foram indevidamente levados à especificação, como deveria ter sucedido, uma vez que esses factos não foram contestados. Mas sem razão. Vejamos. 3.1.3. Erro de julgamento ao considerar que a omissão da afixação do aviso, nos termos do artigo 10.º do n.º 1 do Decreto-Lei n.º 448/91, de 29 de Novembro apenas pode ser sancionada com contra-ordenação, não constituindo fundamento de nulidade da licença O Tribunal a quo considerou que da interpretação conjugada dos artigos 10.º, n.º 1, 13.º, 56.º e 58.º, n.º 2, al. d) do Decreto-Lei n.º 448/91, de 29 de Novembro, se deveria concluir que a “não afixação ou a afixação de forma não visível do exterior do prédio, durante o decurso do processo de licenciamento, por parte do requerente, do aviso que publicita o pedido de licenciamento”, apenas daria lugar à aplicação de uma contra-ordenação, sendo essa consequência “excludente” de outras consequências jurídicas. E, de facto, essa interpretação normativa é errada, pois, como bem sublinha o Recorrente, a aplicação da contra-ordenação prevista no referido artigo 58.º, n.º 2, al. d) do Decreto-Lei n.º 448/91 destina-se a sancionar a falta de cumprimento da obrigação legal de publicitação do pedido que impende sobre o loteador, mas não esgota os efeitos jurídicos decorrentes da violação do mencionado princípio da publicidade. A não publicitação de um acto quando a lei o exige determina, ex vi do disposto no artigo 130.º do n.º 2 do Código do Procedimento Administrativo (na redacção aplicável à data dos factos), a sua ineficácia. Mas já não tem razão o Recorrente quando alega que a falta de cumprimento do dever de publicitação do pedido de licenciamento é geradora da nulidade do acto. Como já adiantámos, a falta de cumprimento do dever de publicitação determina apenas a ineficácia do acto não publicitado e dela não decorrem efeito invalidantes. Quer isto dizer que aquele dever de publicitação visa possibilitar a participação de qualquer interessado no procedimento de licenciamento publicitado para aí poder, desde o início, fazer valer os seus direitos ou interesses legalmente protegidos, mediante o pedido de informações ou a apresentação de reclamações ou impugnações administrativas. Sem a devida publicitação do pedido de licenciamento, a intervenção do interessado em defesa dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos só poderá ter lugar quando ele venha a ter conhecimento do acto, o que significa que pode ser num momento em que os prejuízos decorrentes de uma eventual invalidade do mesmo sejam mais gravosos para todos (o requerente, o interessado e o próprio interesse público). É por essa razão que o incumprimento do dever legal de publicitação, para além da ineficácia, dá ainda lugar à aplicação de uma contra-ordenação. Acresce que, neste caso, o Recorrente não alegou nem provou que daquela omissão de publicitação tivesse resultado para a sua esfera jurídica qualquer prejuízo ou preterição da possibilidade de exercício de um direito, razão pela qual não pode pretender valer-se deste fundamento como argumento invalidante do acto cuja publicitação foi omitida. Procede, por isso, o alegado erro de julgamento na interpretação e aplicação do direito, embora não pelas razões e com as consequências alegadas pelo Recorrente.
3.1.4. Erro de julgamento na apreciação do vício de violação de lei pelo acto de licenciamento da operação de loteamento O Recorrente alega, por último, que a sentença recorrida interpretou erradamente as normas dos instrumentos de ordenamento do território que ele havia indicado e que são violadas pelo acto que licenciou a operação de loteamento aqui em apreço. Na argumentação que expende nas suas alegações, considera que o acto de licenciamento da operação de loteamento viola os n.ºs 6 e 9 do Regulamento do “Plano Diretor da Cidade do Funchal”, aprovado por Despacho do Secretário de Estado das Obras Públicas de 23 de Março de 1972, e os n.ºs 1, 2 e 3 do Plano da Frente de Mar (conclusões AA e BB). No entanto, há que concordar com a fundamentação da sentença recorrida quando nela se afirma que, em face da prova pericial produzida, da qual resulta que o lote em questão se localiza na “zona turística e recreativa B”, “relevam os artigos ou n.ºs 2, 22-b-c-d, 26 e 27 do Regulamento do PDM/1972” (fls. 531ss) e que deles se conclui que os dois lotes que foram licenciados respeitam o índice máximo ali estabelecido, que, sendo de 1,5 (v. mapa de zonas do Regulamento), é muito superior aos 0,7 fixados para o lote a ocupar com a unidade hoteleira (ponto C da matéria de facto assente). Não procede igualmente o alegado erro de interpretação do Regulamento e dos Mapas do “Plano Diretor da Cidade do Funchal”, aprovado por Despacho do Secretário de Estado das Obras Públicas de 23 de Março de 1972, que o Recorrente refere na conclusão EE, porquanto ele pressupõe que a parcela de terreno em questão tenha uma classificação diversa daquela que foi fixada pela peritagem e dada como assente na matéria de facto. Também se concorda com a sentença, quando nela se afirma que as disposições dos regulamentos dos planos alegadamente violadas, que são invocadas pelo Recorrente não possuem densidade normativa suficiente para delas se poder recortar uma invalidade do acto de loteamento. Com efeito, quer o ponto 6, quer o ponto 9 do Regulamento do “Plano Diretor da Cidade do Funchal”, aprovado por Despacho do Secretário de Estado das Obras Públicas de 23 de Março de 1972 se limitam a enunciar princípios e regras orientadoras para a elaboração e aprovação de planos de urbanização, de planos de pormenor e de actos de licenciamento, como se infere claramente, não só da sua inserção sistemática sob a epígrafe “Condições Gerais”, como ainda da terminologia empregue, que apresenta um teor indicativo e não dispositivo (“não deverá permitir-se”, “a boa utilização dos lotes contíguos”). E o mesmo sucede com as disposições do Plano da Frente Mar, que, na parte que releva para a questão decidenda, designadamente no artigo 15.º onde são estipulados os índices de construção, refere, igualmente, um limite máximo de 1,5, ou seja, um limite inferior àquele que consta do acto de loteamento aqui em apreço. Improcedem, por estas razões, as alegadas nulidades do acto de licenciamento do loteamento.
IV. Decisão Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Administrativo em negar provimento ao recurso, mantendo, embora com fundamento diverso, a sentença. Custas pelo Recorrente com taxa de justiça e procuradoria máximas.
Lisboa, 7 de Outubro de 2021. – Suzana Maria Calvo Loureiro Tavares da Silva (relatora) – Carlos Luís Medeiros de Carvalho – Maria Benedita Malaquias Pires Urbano. |