Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0927/16.8BEPRT 0325/18
Data do Acordão:12/04/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JOSÉ GOMES CORREIA
Descritores:IRC
REPORTE DE PREJUÍZOS
CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO
Sumário:I - No caso de ter sido efectuado reporte de prejuízos, o prazo de caducidade é o do exercício do direito de reporte (art.º 45º, n.º 3, da LGT), que é o de 6 anos (art.º 47º, n.º 1, do CIRC), instituindo-se a regra da equivalência ao prazo do exercício desse direito de reporte.
II - Assim, tendo sido efectuado reporte de prejuízos, a contagem do competente prazo de caducidade do direito à liquidação tem de processar-se no estrito cumprimento das regras, comuns, aplicáveis a todos os prazos de caducidade tributária, positivadas no n.º 4 do mesmo art. 45.º LGT.
III - Significa, pois, que estas situações não pressupõem qualquer tipo de especificidade ao nível da forma de computar o prazo de caducidade, determinado por correspondência com o período de permissão do exercício da possibilidade de dedução protelada.
IV - Deste modo, para os impostos periódicos, como o IRC, o prazo de caducidade, casuisticamente, relevante, há-de ser, sempre, contado “a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário”, ou seja, tal prazo conta-se a partir do termo do ano em que ocorreu o facto tributário (art.º 45º, n.º 4, da LGT).
Nº Convencional:JSTA000P25261
Nº do Documento:SA2201912040927/16
Data de Entrada:04/04/2018
Recorrente:A........,LDA
Recorrido 1:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

I – Relatório

Vem interposto recurso jurisdicional por A……., Lda., melhor identificada nos autos, visando a revogação da sentença de 27-11-2017, do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou improcedente a impugnação que deduzira da decisão de indeferimento da reclamação graciosa relativa às liquidações de IRC, referentes aos períodos de 2009 e 2010, no montante de € 127.325,65 e € 51.834,61, respectivamente.

Inconformada, formulou alegações que rematou com o seguinte quadro conclusivo:

“I. A ratio do instituto da caducidade do direito à liquidação assenta em razões objetivas de segurança jurídica, sem ter em atenção a negligência ou inércia do titular do Direito e atende unicamente à necessidade de definir com brevidade a situação jurídica;
II. Neste sentido, funciona como garantia e limite da reapreciação da obrigação abstrata resultante da prática do ato tributário, por contraposição à situação tributária substancial de que aquele ato tributário é ou foi reflexo;
III. A Lei não pretende estender a aplicação do prazo de caducidade do direito à liquidação (seis anos) ao ano em que o prejuízo fiscal reportado foi deduzido;
IV. O prazo de caducidade do direito à liquidação do período no qual foram deduzidos os prejuízos fiscais anteriormente apurados, será sempre o prazo geral de quatro anos, visto que neste período foi necessariamente apurado lucro;
V. A interpretação que o Tribunal a quo fez de que o prazo de caducidade do direito à liquidação dos períodos de 2009 e 2010 aqui em apreço, nos quais foram deduzidos prejuízos relativos a 2008, é igualmente de seis anos, não procede face ao espírito da Lei;
VI. As liquidações aqui em apreço resultaram da desconsideração da dedução dos prejuízos apurados no período de 2008;
VII. O prazo de caducidade do direito à liquidação dos períodos de 2009 e de 2010 aqui em apreço é o prazo geral de quatro anos, previsto no n.° 1 do artigo 45° da LGT e contado nos termos do n.° 3 da mesma norma;
VIII. O prazo de caducidade do direito à liquidação do período de 2009 terminou em 31 de dezembro de 2013 e o prazo de caducidade do direito à liquidação do período de 2010 terminou em 31 de dezembro de 2014;
IX. As notificações das liquidações aqui em apreço, realizadas em 9 de fevereiro de 2015 e em 27 de fevereiro de 2015, foram efetuadas fora do prazo de caducidade do direito à liquidação de quatro anos, previsto no n.° 1 do artigo 45° da LGT;
X. O Tribunal a quo fez, no caso em apreço, uma interpretação e aplicação indevida do n.° 3 do artigo 45° da LGT, na redação à data dos factos;
XI. Tal interpretação e aplicação da Lei não se compadece com a ratio do instituto do prazo de caducidade do direito à liquidação;
XII. O prazo de caducidade de quatro anos, previsto no n.° 1 do artigo 45° da LGT, é aquele que melhor se enquadra no espírito da Lei e que deve ser aplicado ao caso presente;
XIII. Deste modo, deve o presente recurso ser julgado procedente e revogada a sentença do Tribunal a quo e, consequentemente, a impugnação judicial apresentada pela Recorrente deve ser julgada procedente, com todas as consequências legais. Pedido
Nestes termos e nos mais de Direito que Vs. Exas. doutamente, não deixarão de suprir, deve o presente recurso ser julgado procedente e revogada a sentença do Tribunal a quo e, consequentemente, a impugnação judicial apresentada pela Recorrente deve ser julgada procedente, com todas as consequências legais. Pois só assim se fará inteira e sã JUSTIÇA.”

Não foram produzidas contra-alegações.

Neste Supremo Tribunal Administrativo, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, notificado nos termos do art. 146.º, n.º 1, do CPTA, pronunciou-se no sentido de o recurso não merecer provimento, com a seguinte fundamentação:

“1. Em caso de reporte de prejuízos fiscais o prazo de caducidade do direito à liquidação é o correspondente ao exercício desse direito (art.45° n°3 LGT).
Considerando os períodos de tributação de 2009 e 2010, objecto das liquidações adicionais efectuadas em 2015 (factos provados als. a) e b), o reporte dos prejuízos poderia ser efectuado nos lucros tributáveis de um ou mais dos seis exercícios posteriores (art. 47° n° 1 CIRC redacção e numeração vigentes em 2009 e 2010).
Este prazo de caducidade alargado prevalece sobre o prazo geral de quatro anos, na medida em que constante de disposição especial.
2. A solução normativa exprime um justo equilíbrio de interesses:
- o interesse do sujeito passivo na dedução ao lucro tributável de determinado exercício de prejuízos de exercícios anteriores, facilitando a regular continuidade da actividade económica e financeira da empresa pela redução da carga fiscal;
- o interesse da administração tributária na correcção dos prejuízos fiscais indevidamente declarados e indevidamente deduzidos, permitindo-lhe as consequentes e necessárias liquidações adicionais em prazo idêntico de seis anos (art. 47° n° 4 CIRC).
Neste contexto:
- o prazo de caducidade conta-se a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário, considerando a natureza de imposto periódico do IRC.
Neste contexto as liquidações adicionais impugnadas foram efectuadas e notificadas em 2015, antes do termo dos prazos de caducidade de seis anos, iniciados em 1.01.2010 (exercício de 2009) e em 1.01.2011 (exercício de 2010) (art. 45° n° 4 LGT).
Jurisprudência: acórdão STA-SCT 11.11.2015 processo n° 1353/14; acórdão TCA SUL 22.01.2013 processo n° 2857/09.
CONCLUSÃO
O recurso não merece provimento.
A sentença impugnada deve ser confirmada.”
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Os autos vêm à conferência corridos os vistos legais.

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2. FUNDAMENTAÇÃO:

2.1. - Dos Factos:

Na decisão recorrida foi fixado o seguinte probatório reputado relevante para a decisão:

a) Com data limite de pagamento de 06/04/2015 foi emitida a “Demonstração de Acerto de Contas” nº 201500001724784, no montante de €127.325,65, relativa à compensação de IRC do exercício de 2009 nº 201500001574980, liquidação nº 20158310035323 de 06/02/2015, no montante de €140.188,16 (cf. fls. 10/12 dos autos).
b) Com data limite de pagamento de 08/04/2015 foi emitida a “Demonstração de Acerto de Contas” nº 201500001735267, no montante de €51.834,61, relativa à compensação de IRC do exercício de 2010 nº 201500001618758, liquidação nº 20158310035329 de 09/02/2015, no montante de €125.618,75 (cf. fls. 13/15 dos autos).
c) Por não se conformar com as liquidações a impugnante apresentou em 26/05/2015, reclamação graciosa sobre a qual foi produzido, em 10/11/2015, o projecto de despacho onde se referia que “A reclamante apresentou, em 2013/03/27, uma reclamação graciosa nº 3190201304001125, relativa ao exercício de 2008, no âmbito da qual discordava da correcção efectuada pelos serviços de inspecção (OI200803960), ao exercício de 2008, consubstanciada na não aceitação de custos, no montante de €2.323.434,09, por se tratarem de custos relativos a exercícios anteriores.
Nessa petição solicitava a aplicação do princípio da especialização dos exercícios, previsto pelo art. 18º do CIRC.
O pedido foi parcialmente deferido, por despacho de 2015/01/15, notificado à reclamante através do n/oficio nº 2720, com a mesma data, tendo-se cumprido com a imputação dos custos em causa aos exercícios a que respeitam, nos termos legalmente previstos.
Da apreciação desse pedido verificou-se que, no exercício de 2008, a reclamante tinha apurado um prejuízo fiscal de €1.064.707,18, o qual foi corrigido para um lucro tributável de €1.258.726,90, por força das correcções resultantes da OI200803960 supra referida.
Inexistindo esse prejuízo de €1.064.707,18m, concluiu-se que o mesmo foi utilizado indevidamente, nos termos do nº 1 do art. 52º do CIRC, no exercício de 2009, em €857.368,74 e de 2010, em €207.338,44.
Nestes termos, foram corrigidas as declarações apresentadas pela reclamante, nos exercícios de 2009 e 2010, dando origem às liquidações reclamadas (…)” (cf. fls. 2/16 e 35/36 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos, doravante, apenas, PA).
d) Concluía-se naquele projecto que “No presente caso, estando perante liquidações dos exercícios de 2009 e 2010, conjugando-se os normativos legais supra invocados com o nº 4 do art. 54º da LGT, a caducidade ocorre em 2015/12/31, para o exercício de 2009, e em 2016/12/31, para o exercício de 2010.
Verificando-se que as liquidações foram notificadas à reclamante em 2015/02/09 e em 2015/02/27, respectivamente, para os exercícios de 2009 e 2010, não se demonstra a caducidade das mesmas, nos termos alegados pela reclamante.
Do exposto, verifica-se que as liquidações reclamadas têm enquadramento legal e se mostram devidas…” (cf. fls. 36 do PA).
e) Após a notificação da reclamante para o cumprimento da audiência prévia, sem que tal direito tenha sido exercido, a reclamação foi indeferida por despacho de 23/12/2015 (cf. fls. 37/39v do PA).
f) O despacho de indeferimento da reclamação graciosa foi notificado à mandatária da reclamante através de correio registado com a referência RM 7529 0511 1 PT, ofício nº 78751/0403 de 2015/12/28, recebido a 04/01/2016 (cf. fls. 40/42 do PA).
g) A presente impugnação enviada ao Tribunal mediante carta registada em 04/04/2016 (cf. fls. 21 dos autos)

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2.2.- Motivação de Direito

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo (aprovado pela Lei n.º 41/013, de 26 de Junho).

No caso, em face dos termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso pela recorrente, a questão que cumpre decidir subsume-se a saber se a decisão vertida na sentença, a qual julgou improcedente a impugnação padece de erro nos pressupostos de Direito, por incorrecta interpretação e aplicação do nº 1 e do nº 3 do artigo 45.º da LGT, no que concerne ao prazo geral de 4 anos de caducidade do direito à liquidação.

Vejamos.

Identificando a questão decidenda, na sentença considerou-se que a impugnante, em sustentáculo da sua pretensão, apenas invoca a falta de notificação das liquidações dos tributos no prazo de caducidade, por considerar que o art. 45º, nº 1 da LGT prevê o prazo de 4 anos para esse efeito, prazo que no caso em discussão foi, segundo refere, ultrapassado uma vez que as liquidações foram comunicadas em Fevereiro de 2015.

Assim, o que está em causa nos presentes autos é o prazo de caducidade do direito à liquidação, previsto no artigo 45.º da LGT e que, segundo a redacção actual, tem o seguinte teor:

“Artigo 45º - Caducidade do direito de liquidação
1 - O direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro.
(…)
3 - Em caso de ter sido efetuada qualquer dedução ou crédito de imposto, o prazo de caducidade é o do exercício desse direito.
4 - O prazo de caducidade conta-se, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, excepto no imposto sobre o valor acrescentado e nos impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efectuada por retenção na fonte a título definitivo, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respectivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário.
(…)”

Isto quer dizer que, em termos gerais, o direito de liquidar impostos caduca no prazo de quatro anos.

Acresce que, no caso de ter sido efectuada qualquer dedução ou crédito de imposto, o prazo de caducidade é o do exercício desse direito, conforme dispõe o n.º 3 do artigo 45.º da LGT e dado que estamos perante um imposto periódico, tal prazo conta-se a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário, como estabelece o n.º 4 daquela norma.

No caso dos autos, as liquidações adicionais de IRC são referentes aos exercícios de 2009 e 2010, pelo que o n.º3 do supra referido artigo 45.º da LGT, a essa data, tinha a seguinte redacção:

“Em caso de ter sido efectuado reporte de prejuízos, bem como qualquer outra dedução ou crédito de imposto, o prazo de caducidade é o do exercício desse direito”.

Por outro lado, o artigo 47.º, n.º 1 do CIRC, na redacção e numeração vigentes em 2009 e 2010, estipulava que o reporte de prejuízos poderia ser efectuado nos lucros tributáveis de um ou mais dos seis exercícios posteriores, prazo este que prevalece sobre o prazo geral, uma vez que se trata de norma especial. E o n.º 4 dessa norma, à data, estabelecia que “Quando se efectuarem correcções aos prejuízos fiscais declarados pelo sujeito passivo, devem alterar-se, em conformidade, as deduções efectuadas, não se procedendo, porém, a qualquer anulação ou liquidação, ainda que adicional, do IRC, se forem decorridos mais de seis anos relativamente àquele a que o lucro tributável respeite”.

Ora, como é consabido, a norma aplicável é aquela que está em vigor à data da prática dos factos, ao contrário do que defende a recorrente, que pretende a aplicação da lei que melhor lhe convém referindo, por um lado, que “a ratio do instituto da caducidade do direito à liquidação assenta em razões objectivas de segurança jurídica, sem ter em atenção a negligência ou inércia do titular do Direito e atende unicamente à necessidade de definir com brevidade a situação jurídica”, pelo que o prazo de caducidade “(…) será sempre o prazo de quatro anos (…)” e, por outro lado, “a actual letra da Lei não levanta qualquer dúvida quanto ao sentido do regime aqui em crise”.

O douto parecer do Ministério Público veio responder a tais questões considerando que “a solução normativa exprime um justo equilíbrio de interesses: o interesse do sujeito passivo na dedução ao lucro tributável de determinado exercício de prejuízos de exercícios anteriores, facilitando a regular continuidade da actividade económica e financeira da empresa pela redução da carga fiscal; e o interesse da administração tributária na correcção dos prejuízos fiscais indevidamente declarados e indevidamente deduzidos, permitindo-lhe as consequentes e necessárias liquidações adicionais em prazo idêntico de seis anos (art. 47° n° 4 CIRC)”, concluindo que tal prazo se conta a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário, dada a natureza do IRC, como imposto periódico.

Aliás, em situação idêntica à dos presentes autos já se pronunciou o STA, no acórdão proferido no Processo n.º 1353/14, em 11/11/2015, Conselheira Dulce Neto, e que se cita na parte que importa:

“(…) Nos termos do disposto no artigo 45.º/3 da LGT, no caso de ter sido efectuado reporte de prejuízos, como sucedeu no caso em análise, o prazo de caducidade é o do exercício do direito de reporte, que é de 6 anos (artigo 47.º/1 do CIRC).
Tal prazo, no caso, conta-se a partir do termo do ano em que ocorreu o facto tributário (artigo 45.º/4 da LGT) (…)”.

Assim, não oferece quaisquer dúvidas que o prazo de caducidade da liquidação, numa situação de reporte de prejuízos, é de seis anos e não de quatro, como pretende a recorrente.

Nesse sentido veja-se também o Acórdão do TCAS de 22-01-2013, Recurso nº02857/09, também disponível em www.dgsi.pt.

Desta forma, as notificações das liquidações de IRC impugnadas e que ocorreram em 09/02/2015 e 27/02/2015 respeitaram o prazo de caducidade de seis anos, previsto na lei, que só terminaria em 31/12/2015, no caso do IRC de 2009 e em 31/12/2016, no que concerne ao imposto de 2010.

Pelo exposto, só resta concluir que se mantém o julgado, por não padecer de qualquer erro, improcedendo o recurso.

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3. – DECISÃO:
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas pela recorrida.
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Lisboa, 4 de Dezembro de 2019. – José Gomes Correia (relator) – Francisco Rothes – Aragão Seia.


Segue acórdão de 14 de Outubro de 2020:


Descritores:
- Recurso Jurisdicional. Rectificação de erros materiais.

SUMÁRIO:
I - Como decorre do artº 614º, nºs 1 e 2 do CPC, conquanto com a prolação do Acórdão ficasse esgotado o poder jurisdicional quanto à matéria da causa, pode ter lugar a rectificação de erros materiais, o suprimento de nulidades, o esclarecimento de dúvidas naquele existente e/ou a sua reforma quanto a custas.
II - Dá-se o erro material quando o juiz escreveu coisa diversa do que queria escrever, quando o teor da sentença ou despacho não coincide com o que o juiz tinha em mente exarar, quando, em suma, a vontade declarada diverge da vontade real.
III - E o erro material ou lapso cometido é manifesto quando a inexactidão ou omissão foi verificada em circunstâncias tais que é patente através de outros elementos do processo (o termo de julgamento) a discrepância com os dados verdadeiros e se pode presumir, por isso, uma divergência entre a vontade real do juiz e o que ficou escrito.

ACORDA-SE, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO:

1.- A………….., LDA, inconformada com a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) do Porto, em 1.ª instância, que julgou a impugnação aqui em causa como improcedente, interpôs recurso para este Supremo Tribunal Administrativo (STA).

Por Acórdão proferido decidiu-se (vide ponto 3. – Decisão):
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pela recorrida.»

Vem agora a recorrida AT impetrar a rectificação do acórdão ao abrigo do disposto no artigo 614, nº 1 do C.P.C., aplicável ao caso ex vi da al. e) do art.º 2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), a Rectificação de Erros Materiais, nos termos e pelos seguintes fundamentos:
“1.
O Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) do Porto, em 1.ª instância, julgou a impugnação aqui em causa como improcedente.
2.
A Recorrente, a sociedade A…………….., LDA, inconformada com a decisão proferida, apresentou recurso para o Supremo Tribunal Administrativo (STA).
3.
A Fazenda Pública não contra-alegou no presente recurso.
4.
No acórdão proferido por este douto tribunal, no seu dispositivo, entendeu-se:
3. - DECISAO:
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
5.
Já relativamente às custas, pode ler-se, no mesmo acórdão:
«Custas pela recorrida.» (negrito nosso).
6.
Prevê o art.º 614.º n.º 1 do CPC, sob a epígrafe de “Retificação de erros materiais”, que se a sentença contiver erros de escrita ou de cálculo ou quaisquer inexactidões devidas a outras omissões ou lapso manifesto, pode ser corrigida, a requerimento das partes ou por iniciativa do juiz.
7.
Ao mencionar lapsos de escrita ou de cálculo retira-se, imediatamente da redação do preceito, que as inexatidões nele indicadas só podem ser as equiparáveis a este tipo de erros.
8.
Ou seja, estamos perante erros materiais que determinam uma divergência formal entre o que se pretendeu dizer e o que se disse.
9.
O que significa que esta norma só é aplicável nos casos em que o juiz queria dizer uma coisa e escreveu outra, o que se torna evidente face ao próprio texto da decisão.
10.
In casu, uma vez que o juiz não concede provimento ao recurso da Impugnante, mantém a sentença recorrida que julgou improcedente a impugnação, naturalmente que, relativamente às custas do processo e tendo em conta o texto da decisão, deverá condenar o Recorrente nas mesmas.
11.
Assim, ao dizer, no respetivo segmento: «Custas a cargo da recorrida.», torna-se evidente, salvo melhor opinião, que o juiz queria dizer uma coisa e escreveu outra.
12.
Desta forma, por se tratar - face ao próprio texto da decisão - de um mero erro de escrita, deve o douto acórdão ser retificado no segmento relativo à condenação em custas, de forma a passar aí a constar:
“Custas a cargo do Recorrente.”.
Nestes termos e nos demais de Direito, se requer que seja determinada a requerida RETIFICAÇÃO DE ERROS MATERIAIS.”

Notificada a parte contrária e o MP, nada disseram.

O processo é submetido à conferência com dispensa dos vistos legais.

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2. - Como decorre do artº 614º, nºs 1 e 2 do CPC, conquanto com a prolação do Acórdão ficasse esgotado o poder jurisdicional quanto à matéria da causa, se contiver erros de escrita ou de cálculo ou quaisquer inexactidões devidas a outra omissão ou lapso manifesto, pode ser corrigida por simples despacho, a requerimento de qualquer das partes ou por iniciativa do juiz.
No caso vertente, evidenciam os autos que, acolhendo as razões apresentadas pelo reclamante é configurável o cometimento de genuínos erros materiais (manifestos) cometidos no acórdão em apreço.
Com efeito, como explica J. A: Reis, CPC Anotado, 5º-130, dá-se o erro material quando o juiz escreveu coisa diversa do que queria escrever, quando o teor da sentença ou despacho não coincide com o que o juiz tinha em mente exarar, quando, em suma, a vontade declarada diverge da vontade real.
E o erro material ou lapso cometido é manifesto porquanto, a inexactidão ou omissão foi verificada em circunstâncias tais que é patente através de outros elementos do processo (o termo de julgamento) a discrepância com os dados verdadeiros e se pode presumir, por isso, uma divergência entre a vontade real do juiz e o que ficou escrito – cfr. Castro Mendes, Lições de Processo Civil, 1967/68, 2º-307).

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3 -Assim, rectifica-se o Acórdão em termos de onde no mesmo se lê
“3. – Decisão:
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pela recorrida.»

Passe a constar:

“3. — Decisão
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas pela recorrente.»

Incidente sem tributação.

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Lisboa, 14 de Outubro de 2020. - José Gomes Correia (relator) – Francisco Rothes – Aragão Seia