Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01168/06.0BEBRG
Data do Acordão:05/06/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:NEVES LEITÃO
Descritores:TAXA DE COMPENSAÇÃO
TAXA URBANÍSTICA
REGULAMENTO MUNICIPAL
PUBLICAÇÃO
APLICAÇÃO RETROACTIVA
Sumário:I – Os regulamentos municipais relativos ao lançamento e liquidação de taxas pela realização de operações urbanísticas estão sujeitos a publicação obrigatória no Diário da República - 2ª Série; não estando em vigor na ordem jurídica antes da publicação carecem de eficácia jurídica, consequentemente não sendo oponíveis a terceiros (art.119º nº 2 CRP; art. 3º nº 4 Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, aprovado pelo DL nº 555/99 16 dezembro; arts.1º nº 1 e 2º nº 2 Lei nº 74/98,11 novembro)
II - Como regra os regulamentos municipais não são dotados de eficácia retroactiva, sob pena de violação do princípio da confiança ínsito no princípio do Estado de direito democrático e do princípio da aplicação da lei no tempo (art. 2º CRP; art.12 nº 1 LGT; art. 12º nº1 CCivil)
III - Enferma de erro sobre os pressupostos de direito a liquidação de taxa de compensação urbanística cujo fundamento legal são normas constantes de regulamentos municipais não publicados na data do acto tributário
Nº Convencional:JSTA000P25855
Nº do Documento:SA22020050601168/06
Data de Entrada:01/28/2019
Recorrente:CÂMARA MUNICIPAL DE ESPOSENDE
Recorrido 1:A.......................... E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: 1. RELATÓRIO
1.1. O Município de Esposende interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga em 16 outubro 2018 que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A………… e B………… contra liquidação de taxa de compensação urbanística no montante de € 11 450,00, em consequência anulando o acto tributário impugnado e determinando a restituição aos impugnantes do montante do tributo indevidamente pago, acrescido dos respectivos juros indemnizatórios

1.2. O recorrente apresentou alegações que sintetizou com a formulação das seguintes conclusões:
A- Entendeu a douta sentença recorrida que, não estando publicado o Regulamento Municipal à data em que foi liquidada, por despacho de 29/07/2005, a denominada “taxa de compensação”, do montante de €11.450,00, não podia a entidade demandada proceder à aplicação do Regulamento Municipal posteriormente ao acto administrativo que originou a liquidação dessa taxa, concluindo que “a inexistência de regulamento municipal
que preveja a aplicação da taxa impede o nascimento da obrigação tributária”.
B- Porém, a falta de publicidade do acto, quando legalmente exigida, implica a
sua ineficácia (cfr. n.º 2, do art.º 130º do CPA (redação antiga) e art.º 119, n.º 2, da CRP).
C- Ora a ineficácia não contende com a inexistência ou validade do acto, uma vez que o acto administrativo pode ser existente e válido, mas ineficaz, não havendo, portanto uma relação directa entre a existência e validade (que é aferida pelo conteúdo do acto) e a eficácia (que é exterior ao acto, relativa aos seus efeitos);
D- Nas situações em que a lei submete ao preenchimento de certas exigências para que possam produzir efeitos a que se dirigem (como é o caso da publicação obrigatória), tais efeitos ficam suspensos, latentes, desencadeando-se desde o momento inicial no caso de ter lugar o evento à verificação do qual estavam condicionados, produzindo-se, neste contexto, um fenómeno de “retrotracção de efeitos”, o que não significa uma verdadeira retroactividade (neste sentido, ver Prof. Mário Aroso de Almeida, em Teoria Geral do Direito Administrativo – Almedina – 2015, 3ª edição, pag.s 286/287 e 288);
E- A expressão “retrotracção de efeitos” é da autoria do Prof. Rogério Ehrhart Soares (in Direito Administrativo, Coimbra, 1978, pag. 185, para salientar que o regresso à origem é diverso da retroactividade, que inculca a ideia de agir sobre factos passados.
F- Tendo sido publicado no DR n.º 243 (Apêndice n.º 163, II Série, de 21/12/2005, pag. 22 passou o acto de liquidação (despacho de 29/07/2005) a ser eficaz.
G- Enferma, assim, de manifesto erro, a douta sentença recorrida, quando entende que não pode ser aplicado um regulamento publicado posteriormente ao acto administrativo que originou a liquidação da taxa.
H- Por outro lado, ao contrário do que consta da douta sentença recorrida, o parecer jurídico (ponto L) do probatório), não considera que o acto administrativo que origina a liquidação das taxas é a emissão do alvará de loteamento, mas tão somente que, quando fosse requerida a emissão desse alvará, devia o Senhor Presidente da Câmara proceder à liquidação das taxas “em conformidade com o Regulamento aprovado pela assembleia municipal, incluindo a “taxa de compensação”, por já ter sido publicado (sendo, portanto, eficaz, de harmonia com o princípio “tempus regit actum”)”.
I- É que, como foi alegado, com a publicação do Regulamento, assistiu-se à revivescência de efeitos do acto de liquidação.
J- Ora, emissão do alvará de loteamento – que é condição de eficácia da licença (cfr. art.º 74 do RJUE) – está condicionado ao pagamento prévio das “taxas devidas”, em que sobreleva a “taxa de compensação” em causa, que foi paga pelo A., embora condicionalmente em 10/07/2006, no montante de €11.450 (Ponto P) do probatório), após o que foi emitido em 12/02/2006 o referido alvará (ponto Q) do probatório).
K- É o que preceituam os n.s 4 e 5 do art.º 116º do RJUE, atrás transcritos.
L- Assim, essa cobrança é legal e legítima, uma vez que o Regulamento tinha sido publicado no DR de 21/12/2005 e, portanto, era, nessa data, eficaz.
M- Aliás, como foi alegado na contestação, a “taxa de compensação integra o conceito de “receitas eventuais” em que a liquidação é contemporânea com o pagamento (art.º 8 do Dec. Regulamentar n.º 52-C/84, de 28/12).
N- A douta sentença recorrida ao anular a liquidação e cobrança em apreço enferma, assim, de manifesto erro de julgamento.
Termos em que, com o douto suprimento deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a douta sentença recorrida com as legais consequências.

1.3. Os recorridos apresentaram contra-alegações que sintetizaram com a formulação das seguintes conclusões:
1. O Senhor Vice-Presidente da CME, aqui recorrente, deferiu em 29 de Julho de 2005 o licenciamento requerido pelos aqui recorridos, tendo nesse mesmo despacho liquidado o montante a pagar a título de compensação, fixando o valor exato daquela compensação, valor que estava determinado num regulamento que não cumpria, à data da liquidação, a exigência legal da publicação.
2. “(…) face ao determinado no n.º 1 do artigo 117.º do referido Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro, não podem restar quaisquer dúvidas de que a liquidação das taxas devidas pelo deferimento do pedido de licenciamento ou de autorização tem de ser feita de acordo com o regulamento municipal (e tabela de taxas que o mesmo haja fixado) em vigor à data do acto administrativo que deferiu tais pedidos e não de um qualquer outro regulamento anterior ou posterior.”
3. O princípio da publicidade dos atos com conteúdo genérico dos órgãos de soberania, das regiões autónomas e do poder local é uma exigência lógica do princípio do estado de direito democrático.
4. À data do deferimento da licença e da liquidação da compensação de 29/07/2005, o regulamento municipal que definia os termos daquela compensação era ineficaz por não estar publicitado.
5. MAS a recorrente confunde a ineficácia do regulamento com a invalidade do ato e liquidação da taxa de 29/07/2005.
6. As normas do Regulamento Municipal eram manifestamente inconstitucionais e inaplicáveis neste caso.
7. Ao fundar a liquidação num regulamento ineficaz, enferma de erro sobre os pressupostos de direito, que constitui vício de violação de lei e justifica a sua anulação (arts. 99.º do CPPT e 135ºCPA)
______________________________________
8. O ato tributário de liquidação impugnado foi praticado com fundamento em normas regulamentares inquinadas de inconstitucionalidade formal.
TERMOS EM QUE, deve o recurso interposto pela recorrente ser julgado totalmente improcedente, assim se fazendo serena e objectiva,
JUSTIÇA!

1.4. O Ministério Público emitiu parecer no sentido da negação de provimento ao recurso (processo electrónico p 244)

1.5. Após os vistos dos juízes conselheiros adjuntos cumpre apreciar e decidir em conferência.

2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. DE FACTO
A sentença recorrida julgou provados os seguintes factos:
A) Os aqui autores são proprietários de dois prédios urbanos, sitos na Rua da ………, Esposende, inscritos nas matrizes prediais urbanas sob os artigos n.º 532 e 574 e descritos na Conservatória do Registo Predial de Esposende sob os n.ºs 00486/230693 e 00813/040205, da freguesia de ………, Esposende – cf. certidão predial emitida pela Conservatória do Registo Predial de Esposende a fls. 5 a 10 do PA apenso;
B) Em 04 de Julho de 2005, o autor apresentou requerimento escrito, junto da CME, ao qual foi atribuído o n.º 3593/2005, a solicitar a aprovação de Projecto de Loteamento Urbano (emparcelamento de prédios), relativamente aos prédios a que se alude na al. anterior – cf. doc. a fls. 4 do PA apenso;
C) O requerimento a que se alude na al. anterior deu origem ao processo n.º 673/2005, que correu termos na Divisão de Gestão Urbanística [doravante DGU] da CME – cf. fls. 02 do PA apenso;
D) Em 29 de Julho de 2005, no âmbito do processo a que se alude na al. anterior, e tendo como referência o requerimento a que se alude em B., foi proferido despacho pelo Vice Presidente da CME, com o seguinte teor:
“1. Na qualidade de Vice Presidente, DEFERIDA o loteamento nos termos da informação DGU/35932/2005.
2. Informar o requerente de que deverá solicitar a emissão do alvará de loteamento no prazo máximo de 1 (um) ano, e compensar o município no valor de € 11.450,00.” - cf. fls. 26 do PA apenso;
E) Em 01-08-2005, a CME emitiu o ofício n.º 6765/2005, dirigido ao aqui autor, sob o assunto: Despacho Referente ao Processo n.º 673/2005 [processo a que se alude em C.], fazendo referência ao despacho a que se alude na al. anterior – cf. fls. 27 do PA apenso;
F) Em 24 de Novembro de 2005, o aqui autor apresentou um requerimento escrito na CME, mais concretamente, no serviço de obras, dirigido ao Presidente da Câmara Municipal de Esposende, indicando o processo a que se alude em C., a solicitar a revogação do despacho a que se alude em D., na parte em que exige a compensação do município no valor de € 11.450,00, e a ordenação da emissão de alvará, sem mais, ao qual foi atribuído o n.º 6255/2005 – cf. fls. 29, 30 e 31 do PA apenso;
G) No DR n.º 243 [apêndice n.º 163], II Série, de 21/12/2005, p. 22, foi publicado o Regulamento Municipal de Edificação e Urbanização e Regulamento e Tabela de Taxas, Licenças e outras receitas Municipais do concelho de Esposende;
H) Em 26 de Janeiro de 2006, a DGU da CME emitiu Informação com o n.º DGU/62553/2006, fazendo alusão ao processo identificado em C., e ao requerimento a que se alude em F., destacando-se, aqui, o seguinte:
(…)
2 – Efectuada a análise jurídica da questão levantada, verifica-se que assiste razão ao requerente.

3 – Porém, o despacho não deve ser revogado parcialmente mas sim na totalidade, procedendo-se a nova análise da proposta.
4 – Neste caso, tendo em atenção que não é possível proceder-se à compensação ao município, as áreas necessárias para espaços verdes e de utilização colectiva e as áreas necessárias para equipamentos, devem ser cedidos na íntegra. Como tal não se verifica na proposta apresentada, esta é possível de indeferimento, ao abrigo do disposto na al. a) do n.º 1 do art. 24.º do DL 555/99, de 16 de Dezembro alterado pelo DL 177/2001, de 04 de Junho.
5 – Contudo, e tal como a informação n.º 9/2006-JUR de 17-01-2006 refere, nesta data, o Regulamento Municipal da Edificação e da Urbanização é já um documento eficaz.
6 – Assim, antes de se proceder a qualquer decisão, deve-se dar conhecimento ao requerente da informação supra e ainda da informação jurídica referida, para que este se pronuncie sobre a questão levantada, no prazo de 20 dias.
- cf. fls. 43 do PA apenso;
I) Em 27 de Janeiro de 2006, pelo Vice-Presidente da CME é proferido despacho com o seguinte teor:
“Notificar o requerente a, no prazo de 20 (vinte) dias, se pronunciar sobre a informação (…) e DGU/62553/2006.”
-cf. fls. 44 do PA apenso;
J) Em 09-02-2006, a CME emitiu o ofício n.º 946/2006, dirigido ao aqui autor, sob o assunto: Despacho Referente ao Processo n.º 673/2005, [processo a que se alude em C.], fazendo referência à informação que consta em H., e ao despacho a que se alude na al. anterior – cf. fls. 45 do PA apenso;
K) Em 01 de Março de 2006, na sequência da notificação a que se alude na al. anterior, o autor apresentou requerimento escrito na CME, dirigido ao Presidente, formulando a final o seguinte pedido, ao qual foi atribuído o n.º 1138/2006:
“Nestes termos, mas principalmente pelo facto de o acto administrativo que determina o pagamento da compensação ao município ser nulo e pelo facto de o acto administrativo que defere o loteamento ser válido e constitutivo de direitos ao aqui requerente, deve V. Ex.ª apenas revogar o acto administrativo que determina o pagamento da compensação ao município ser revogado.”
- cf. fls. 48 a 53 e fls. 55 do PA, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;
L) Em 18 de Abril de 2006, foi remetido ao Presidente da CME, um parecer jurídico, datado de 13-04-2006, da Sociedade de Advogados – …………, sob o Assunto: A………… (Proc. n.º ……/05), referindo o ofício da CME n.º 041/2006/JUR, de 03/04/2006, do qual se destaca aqui o seguinte:
Assim, e em conclusão, sou de parecer que:
a) deve ser mantida a primeira parte do despacho de 29/07/2005(…)
b) deve ser revogada a segunda parte desse despacho, quando faz referência à compensação” ao município de € 11.450,00, com fundamento na ineficácia do Regulamento, por falta de publicação, ao abrigo do qual esse valor foi calculado;
c) quando o requerente solicitar a emissão do alvará de loteamento – no prazo de um ano e com a apresentação dos pertinentes “elementos” constantes da Portaria n.º 1105/01, de 18/09, sob pena de caducidade, - deverá o Senhor Presidente da Câmara Municipal, ou entidade delegada, proceder à liquidação das taxas “em conformidade com o Regulamento aprovado pela assembleia municipal”, incluindo o que prevê a “taxa de compensação”, por já ter sido publicado (sendo, portanto, eficaz), de harmonia com o princípio “tempus regit actum”.
- cf. doc. junto com a PI sob o n.º 4, de fls. 23 a 26 da paginação electrónica da PI, em particular fls. 26;
M) Em 22 de Maio de 2006, é proferido despacho pelo Vice-Presidente da CME, com competências delegadas pelo Presidente da Câmara, no âmbito do processo a que se alude em B., e na sequência do requerimento do autor com o n.º 1138/2006 [melhor identificado em K.] com o seguinte teor:
“1. Na qualidade de Vice-Presidente, reitero o despacho que deferiu o pedido de licenciamento da operação de loteamento.
2. Informar o requerente de que, deverá solicitar a emissão do alvará do loteamento no prazo de 1 (um) ano.
3. Revogo o ponto 2 do despacho de 2005-07-29 na parte em que se refere à compensação ao município, nos termos do parecer do consultor jurídico, o qual deve ser remetido ao requerente.”

- cf. fls. 66 do PA apenso;
N) Em 31 de Maio de 2006, a CME emitiu o ofício n.º 4057/2006, dirigido ao aqui autor, sob o assunto: Despacho Referente ao Processo n.º 673/2005 [processo a que se alude em C.], fazendo referência ao despacho a que se alude na al. anterior – cf. fls. 71 do PA apenso;
O) Em 05 de Julho de 2006 o Autor requereu a emissão do alvará de loteamento, com junção dos elementos respectivos, informando a CME que iria proceder ao pagamento da compensação, “condicionalmente e na convicção de que este é um pagamento indevido, remetendo para as instâncias judiciais a resolução do problema.” – cf. fls. 73 e 74 do PA;
P) Em 10 de Julho de 2006, o A., pagou a “TACU” [Taxa de Compensação Urbanística], no montante de € 11.450,00 – cf. fls. 84 da PA;
Q) Em 12 de Julho de 2006 foi emitido o alvará de loteamento n.º 7/2006, em nome do A., referente ao processo a que se alude em C. – cf. fls. 88 do PA.

2.2. DE DIREITO
2.2.1. Questão decidenda: legalidade da liquidação e pagamento condicional da taxa de compensação urbanística efectuada em 10 julho 2006 para emissão de alvará de loteamento

2.2.2. Apreciação jurídica
2.2.2.1. A sentença recorrida julgou procedente a impugnação judicial com a seguinte fundamentação (expressa em síntese):
a) o Regulamento Municipal de Urbanização e Edificação (RMUE) e o Regulamento e Tabela de Taxas, Licenças e Outras Receitas Municipais (RTTLORM) do município de Esposende, ao abrigo dos quais a taxa de compensação urbanística foi liquidada, não tinham sido publicados na data da prática do acto tributário, consequentemente sendo ineficaz e inoponível a terceiros;
b) o posterior pagamento exigido e efectuado quando da entrega do alvará de loteamento carece de fundamento legal, sob pena de ilegal aplicação retroactiva dos regulamentos
A taxa de compensação urbanística visa compensar o município em cujo território se realiza a operação de loteamento pela dispensa de cedência pelo promotor imobiliário de parcelas de terreno para integração no domínio público municipal destinadas a espaços verdes ,equipamentos de utilização colectiva e infra-estruturas viárias (art.44º nº 4 Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, aprovado pelo DL nº 555/99,16 dezembro - RJUE)
A câmara municipal delibera sobre o pedido de licenciamento da operação de loteamento (art.23º nº1 al.b) RJUE)
A liquidação da taxa de compensação é efectuada pelo presidente da câmara municipal, com o deferimento do pedido de licenciamento, em conformidade com o regulamento aprovado pela assembleia municipal (art.117º nº1 RJUE)
O licenciamento das operações urbanísticas é titulado por alvará, o qual constitui condição de eficácia da licença, dependendo a sua emissão do pagamento das taxas devidas pelo requerente (art. 74º nºs 1/2 RJUE)
A emissão do alvará de loteamento está sujeita ao pagamento de taxa específica, distinta da taxa de compensação urbanística (art.116º nº3 RJUE; art.19º al.a) Lei nº 42/98,6 agosto - Lei das Finanças Locais)
No exercício de poder regulamentar próprio os municípios aprovam regulamentos relativos ao lançamento e liquidação de taxas pela realização de operações urbanísticas; os regulamentos devem ser objecto de publicação na 2ª Série do Diário da República, sem prejuízo das demais formas de publicidade previstas na lei (art. 3º nºs 1e 4 RJUE).
A falta de publicação dos regulamentos emanados do poder local impede a sua vigência na ordem jurídica e implica a ineficácia jurídica, sendo inoponíveis a terceiros (art. 119º nº2 CRP; art.2º nº1 Lei nº 74/98,11 novembro aplicável na data da publicação dos regulamentos; neste sentido acórdãos STA-SCA 19.05.2004 processo 0109/03; 7.06.1994 processo 32 897; 10.11.1992 processo 27 769)
Os regulamentos publicados no Diário da República iniciam a sua vigência na data que neles tiver fixada ou, faltando tal fixação, 5 dias após a publicação para o Continente (art.2º nº2 Lei nº 74/98, 11 novembro)
A aplicação retroactiva de um regulamento não expressamente dotado de eficácia retroactiva (como sucede no caso concreto), constituindo derrogação do princípio geral de aplicação da lei no tempo; é igualmente inadmissível por violação do princípio da confiança, ínsito no princípio do Estado de direito democrático, quando dela resulte, designadamente, a imposição de encargos financeiros para os interessados (no caso o pagamento da taxa de compensação) ( arts.2º CRP; art.12º nº1 CCivil; art.12º nº1 LGT/ neste sentido acórdão STA –SCT 18.06.2014 processo 1449/13)
O CPA vigente (aprovado pelo DL nº 4/2015, 7 janeiro), consagrando entendimento doutrinário e jurisprudencial consolidado no domínio do CPA revogado, comina com a sanção da ineficácia jurídica a omissão de publicação do regulamento no Diário da República (art.139º CPA)
Está igualmente vedada a atribuição de eficácia retroactiva a regulamentos que tenham efeitos lesivos ou restritivos para os interessados, impondo-lhes deveres, encargos, ónus, sujeições ou sanções (art.141º nº1 CPA)

2.2.2.2. No caso concreto a liquidação originaria da taxa foi efectuada em 29 julho 2005 quando ainda não se encontrava publicado o RMUE e o RTTLORM (o que só se verificou em 21 dezembro 2005), apesar da sua aprovação por deliberação da Assembleia Municipal de 30 abril 2002 (factos provados al.G) Este acto tributário foi revogado por despacho do vice-presidente da CMEsposende, nos termos do parecer do consultor jurídico e com fundamento na ineficácia do Regulamento por falta de publicação à data da prática do acto de liquidação da taxa (factos provados al. M)
A posterior liquidação da taxa de compensação urbanística foi efectuada em 5 julho 2006 (após a publicação dos regulamentos), condicionalmente e na conviçcão de que o pagamento era indevido, como meio de obtenção do alvará de loteamento (factos provados als. O) P) Q)
Esta liquidação está inquinada de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, pelos seguintes motivos:
a) a legalidade do acto de liquidação da taxa deve aferir-se pela conformidade com os regulamentos municipais aplicáveis na data do facto tributário (deferimento do pedido de licenciamento);
b) apesar de juridicamente válidos, porque aprovados pela assembleia municipal em 30 abril 2002, sendo juridicamente ineficazes, consequentemente inoponíveis a terceiros por falta de publicação e insusceptíveis de aplicação retroactiva após a publicação, os regulamentos municipais em causa não podem constituir fundamento legal para a prática do acto de liquidação;
c) a taxa de compensação urbanística não representa a contrapartida sinalagmática da emissão do alvará de loteamento (a qual está sujeita ao pagamento de taxa distinta, conforme supra assinalado em 2.2.2.1);

3.DECISÃO
Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso e, em consequência, confirmar na ordem jurídica a sentença recorrida
Custas pelo recorrente (art.527º nºs 1/2 CPC/art.2º al. e) CPPT)

Lisboa, 6 de Maio de 2020. - José Manuel de Carvalho Neves Leitão (relator) -Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos - Francisco António Pedrosa Areal Rothes.