Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0574/13
Data do Acordão:04/30/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO DELGADO
Descritores:COMPENSAÇÃO DE CRÉDITOS
PRESTAÇÃO DE GARANTIA
Sumário:I - Estando decidida, com trânsito em julgado, a ilegalidade do acto do órgão de execução fiscal que indeferiu a prestação de garantia por meio de fiança, tendo sido requerida a execução desse julgado, e estando pendente impugnação judicial em que se discute a legalidade da dívida exequenda, não pode ter lugar a compensação ao abrigo do artº 89º, nº 1 do Código de Procedimento e Processo Tributário.
II - Neste contexto o acto de compensação operado padece até de nulidade por força do disposto na alínea i) do n.º 2 do artigo 133.º do Código de Procedimento Administrativo, na medida em que constitui acto consequente do acto de indeferimento da garantia oferecida que lhe serviu de pressuposto e que foi anulado.
Nº Convencional:JSTA00068238
Nº do Documento:SA2201304300574
Data de Entrada:04/15/2013
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A..., SGPS, S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF PORTO
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL
Legislação Nacional:CPPT99 ART89
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0279/09 DE 2009/04/22; AC STA PROC0694/08 DE 2009/01/07; AC STA PROC0997/08 DE 2008/12/17; AC STA PROC0464/08 DE 2008/06/25; AC STA PROC026/12 DE 2012/01/31; AC STA PROC037/12 DE 2012/02/29; AC STA PROC0895/12 DE 2012/09/12; AC STA PROC0893/12 DE 2012/09/19; AC STA PROC0923/12 DE 2012/12/10
Referência a Doutrina:JORGE LOPES DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO VOLIV 6ED PAG286
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – A Fazenda Publica, veio recorrer para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto de 14 de Janeiro de 2013, que julgou procedente a reclamação deduzida pela A…….. – SGPS, S.A melhor identificada nos autos, do acto de compensação do crédito efectuado na execução fiscal nº 1805201001157345, contra si instaurado, por dívidas de IRC de 2006, no montante de € 3.210.655,63.

Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
«A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a reclamação deduzida nos termos do disposto no artº 276º do CPPT, contra os atos de compensações (com os nºs 214348/2012 e 21434912012), efetuados em 2012/06/19, no PEF com o nº 1805201001157345, que corre termos no SF da Maia contra aquela incorporada,
B. Sendo seu fundamento a ilegalidade da compensação efetuada pela administração tributária (AT), por violação do disposto no artº 89º, nº 1, al. a) do CPPT.
C. Decidiu, a final, a Meritíssima (Mma) Juíza a quo pela ilegalidade do ato de compensação efetuado, por violação do disposto no predito preceito legal, considerando que “só pode concluir-se pela ilegalidade da compensação operada, que viola frontalmente o disposto no artigo 89º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, por ter ocorrido, por iniciativa da Administração Tributária, enquanto se encontrava pendente impugnação na qual se discute a exigibilidade da quantia exequenda, mostrando-se garantido o crédito fiscal”.
D. decisão esta com a qual, com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se, porquanto entende que os autos demonstram o integral preenchimento dos aludidos requisitos para que a AT efetive a compensação operada, agindo a AT no estrito cumprimento da legalidade que impera na sua atuação.
E. A AT está vinculada a aplicar os créditos do contribuinte na compensação das suas dívidas, como forma de extinção das obrigações (cfr. artº 847º, nº 1 do Código Civil), prevendo o artº 40º da LGT, no seu nº 2, expressamente, a compensação de créditos tributários como forma de extinção da obrigação tributária.
F. O respeito pelos princípios da igualdade e da proibição do arbítrio impõem à AT a proibição de concessão de moratórias, bem como a suspensão da execução fiscal fora dos casos previstos na lei (cfr. artºs 36º, nº 3 da LGT e 85º do CPPT), por força do principio da indisponibilidade dos créditos tributários, genericamente enunciado no artº 30º da LGT.
G. O artº 52º da LGT impede a suspensão da cobrança da prestação tributária, efetuada no processo de execução fiscal, salvo em casos de pagamento em prestações ou reclamação, recurso, impugnação da liquidação ou oposição à execução que tenha por objeto a ilegalidade ou inexigibilidade da dívida exequenda, sempre que exista prestação de garantia idónea nos termos das leis tributárias.
H. Por seu lado, o artº 89º do CPPT, dispõe no nº 1 que os créditos do executado resultantes, designadamente, de reembolso, são obrigatoriamente aplicados na compensação das suas dívidas à mesma AT, exceto se estiver a correr prazo para interposição de reclamação graciosa, impugnação judicial, recurso judicial ou oposição à execução ou estar pendente qualquer um desses meios graciosos ou judiciais ou estar a dívida a ser paga em prestações,
I. desde que, contudo, a dívida exequenda se mostre garantida nos termos do disposto no artº 169º.
J. Por outro lado, o artº 169º do CPPT condiciona a suspensão da execução à constituição de garantia nos termos do artº 195º ou à sua prestação, nos termos do artº 199º, sendo certo que este último sugere que nem todas as garantias serão sempre adequadas a tal fim, nem, portanto imediatamente aceites.
K. Reunidos os pressupostos exigidos por lei para que a compensação operasse, impunha-se à AT a obrigação de efetuar a compensação na dívida cuja execução não se encontrava garantida, considerando, que o imperativo legal de cobrança coerciva nasce após o decurso do prazo de pagamento voluntário, e que os créditos do executado para dom a AT são obrigatoriamente aplicados na compensação das suas dívidas a essa mesma entidade.
L. É, pois, a compensação efetuada legitima face à lei, designadamente ao disposto no artº 89º do CPPT, já que, no momento da prática do ato controvertido, não obstante a reclamante ter prestado garantia, a mesma ainda se encontrava em apreciação pela AT, não se mostrando o PEF suspenso nos termos do disposto no artº 169º do mesmo diploma.
M. Não obstante a reclamante ter reagido contra a liquidação subjacente à instauração do PEF, o certo é que este não se encontrava garantido à data dos atos de compensação controvertidos.
N. Assumindo a suspensão da execução fiscal, proibida nos casos não previstos da lei (cf. artº 36º, nº 3 da LGT), um caráter claramente excecional, designadamente, tendo em conta os estritos termos e exigências reveladas pelos princípios da vinculação à lei na atividade administrativa tributária e da indisponibilidade dos créditos fiscais e proibição da concessão de moratórias no seu pagamento, mormente se estiverem vencidos, afasta-se quaisquer juízos de oportunidade daquela mesma atividade.
O. É o que decorre, afinal, da al. b) do nº 1 do artº 89º do CPPT, a contrario, que impõe que a AT efetue a aplicação de um crédito do executado na compensação das suas dividas tributárias, desde que a dívida não se mostre garantida nos termos do artº 169º do CPPT, mesmo que esteja pendente processo judicial.
P. As compensações controvertidas são, assim, legalmente admissíveis, diante do disposto no artº 89º do CPPT, pois sobre a ora reclamante impendia uma dívida fiscal, reconhecida num ato idóneo à promoção da sua cobrança, sendo pois legalmente exigível e podendo a qualquer momento ocorrer um facto extintivo da prestação tributária em dívida, como seja, a compensação efetuada.
Q. Com a prestação da garantia sob a forma de fiança, no seguimento de notificação do órgão para execução fiscal para o efeito, não ficou este órgão investido, desde logo, na obrigação de suspensão da execução.
R. Aliás, atento o valor da garantia oferecida e em conformidade com o disposto no nº 2 do artº 197º do CPPT, ex vi nº 6 do artº 199º do mesmo diploma legal, a competência para apreciar as garantias a prestar é da Direção de Finanças, motivo pelo qual não poderia o órgão de execução fiscal, sem mais, declarar a suspensão do PEF suspenso.
S. A suspensão da execução nos termos do artº 169º do CPPT, mediante aceitação de uma garantia como idónea, implica claramente um trabalho de análise adequado e proporcional ao montante da dívida a garantir,
T. estando em causa a segurança do pagamento de dívida tributária vencida de avultado montante, legitimadora de atuação do órgão da execução fiscal segundo exigências maiores na assunção das soluções adequadas à salvaguarda do interesse público no recebimento das quantias que lhe são devidas, especialmente no tipo de garantia a aceitar, sempre numa perspetiva de adequação ao montante do crédito do exequente e de mais fácil realização do crédito.
U. Entende, assim, a Fazenda Pública, com o devido respeito pelo vem decidido e salvo melhor entendimento, que a douta decisão recorrida, padece de erro no julgamento na aplicação do direito, pois, decidindo como decidiu, errou na subsunção dos factos dados como provados às normas jurídicas aplicáveis in casu, mais concretamente as que regem a compensação de dividas de tributos por iniciativa da AT e a suspensão da execução fiscal, ou seja, os artºs 89º e 169º do CPPT.»

2 – Não foram apresentadas contra alegações.

3 – O Exmº Procurador Geral Adjunto emitiu o douto parecer no sentido do não provimento do recurso argumentando, em síntese, que estando decidida, com trânsito em julgado, a ilegalidade do acto de indeferimento da requerida prestação de garantia, por meio de fiança, tendo sido requerida a execução de julgado, não poderia a Administração Tributária proceder à efectuada compensação, em 18 de Junho de 2012.

4 – Foram dispensados os vistos legais, dada a natureza urgente do processo.

5- Em sede factual apurou-se em primeira instância a seguinte matéria de facto:
1. A reclamante, em 29/12/2010, deduziu impugnação judicial em relação à liquidação em execução no Processo de Execução Fiscal nº 1805201001157345, contra si instaurado com vista a cobrança de IRC, relativo a 2006, no montante de € 3.210.655,63.
2. A reclamante deduziu reclamação em relação ao acto de indeferimento de prestação de garantia através de fiança, no âmbito do Processo de Execução Fiscal nº1805201001157345.
3. Dá-se por reproduzido o documento de fls. 43/62 que consubstancia cópia do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, que confirmou a sentença proferida no Processo nº 2625/11.2BEPRT, que correu termos no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, julgou procedente a reclamação deduzida pela reclamante aludida em 2, e anulou o acto de indeferimento de prestação de garantia, mediante fiança, no âmbito do Processo de Execução Fiscal identificado em 1.
4. Em 4/6/2012, a reclamante requereu execução de sentença no âmbito do Processo nº2615/11.2BEPRT do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto.
5. Em 18/6/2012 foi efectuada a compensação nº 2012 0000000214348, no montante de € 151.221,57, conforme documentação de fls. 31/32 que se dá por reproduzida.
6. Em 18/6/2012 foi efectuada a compensação nº 2012 0000000214349, no montante de € 117.153,32, conforme documentação de fls. 33/34 que se dá por reproduzida.
7. Dá-se por reproduzido o “print” de fls. 107/108, relativo à tramitação do Processo de Execução Fiscal nº 1805201001157345, do qual consta, além do mais, os registos de compensações nos montantes de € 140.289,52, € 117.153,32, e € 10.198,77.
8. A presente reclamação foi apresentada em 10/7/20 12.

6. Do mérito do recurso

A questão objecto do presente recurso consiste em saber se padece de erro de julgamento a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou ilegal a compensação operada pela Administração Fiscal mediante a aplicação de crédito apurado em sede de liquidação de juros indemnizatórios, depois de:
- ter sido deduzida impugnação em relação à liquidação da dívida exequenda;
- ter sido apresentada reclamação judicial da decisão do Chefe do Serviço de Finanças de Matosinhos 1, que indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia mediante fiança;
- ter sido julgada procedente tal reclamação, por sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto e ter sido a mesma confirmada por Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte;
- e de ter sido encetada a execução do referido julgado.

6.1 Da ilegalidade da compensação efectuada por iniciativa da Administração tributária
A decisão recorrida considerou (fls.131) que a existência de controvérsia em relação à quantia em execução, relativa à exigibilidade da dívida compensada, implica que a compensação por iniciativa da Administração Tributária não possa ter lugar enquanto tal controvérsia não se encontre judicialmente sanada.
Neste contexto concluiu pela inadmissibilidade da compensação operada, determinando a sua anulação.
São duas as linhas de argumentação usadas pela Fazenda Pública para, no âmbito da fundamentação das suas alegações de recurso, atacar o sentido decisório da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa.
Em primeiro lugar alega que, de acordo com o preceituado no art. 89º, nº. 1 do CPPT, os créditos resultantes de reembolso são obrigatoriamente aplicados na compensação das dívidas à Administração Tributária e que a compensação controvertida nos autos teria de ser efectuada, por imperativo legal, uma vez que a dívida não se encontrava a ser paga em prestações, nem se mostrava a mesma garantida, nos termos do art. 169º do CPPT.
Por outro lado sustenta que a compensação efectuada é legítima face à lei, designadamente ao disposto no artº 89º do CPPT, já que, no momento da prática do acto controvertido, não obstante a reclamante ter prestado garantia, a mesma ainda se encontrava em apreciação pela Administração Tributária, não se mostrando o processo de execução fiscal suspenso nos termos do disposto no artº 169º do mesmo diploma.

Esta argumentação não pode, obter acolhimento, sendo evidente, salvo o devido respeito, que não assiste razão à Fazenda Pública.
Vejamos.
Dispõe o n.º 1 do artigo 89.º do Código de Procedimento e Processo Tributário, relativo à compensação de dívidas de tributos por iniciativa da administração tributária, que «os créditos do executado resultantes de reembolso, revisão oficiosa, reclamação graciosa ou impugnação judicial de qualquer acto tributário são obrigatoriamente aplicados na compensação das suas dívidas à mesma administração tributária, salvo se pender reclamação graciosa, impugnação judicial, recurso judicial ou oposição à execução da dívida exequenda ou esta esteja a ser paga em prestações, devendo a dívida exequenda mostrar-se garantida nos termos deste Código.
São assim requisitos da compensação
1.Haver um crédito de um contribuinte de que é devedora a Administração Tributária, que esteja em fase de execução;
2.Que esse crédito resulte de reembolso, ou de revisão oficiosa, ou de reclamação graciosa ou impugnação judicial ou outro meio administrativo e contencioso;
3.Que esse contribuinte seja simultaneamente devedor de tributos;
4.Não estar a dívida garantida ou, estando-o, não estiver pendente reclamação graciosa, impugnação judicial, recurso judicial ou oposição à execução fiscal relativa à dívida do contribuinte, nem estar a dívida a ser paga em prestações (Código de procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, 6ª edição 2011, I volume. Páginas 742/745, Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa).

No caso, tanto quanto resulta do probatório, o Serviço de Finanças da Maia instaurou em Outubro de 2010, contra a executada e ora recorrente, o processo de execução fiscal n.º 1805-2010/01157345 por dívida relativa ao IRC de 2006 no valor de 3.210.655,63 €.
A executada foi citada em 10 de Outubro de 2010 e informou que iria impugnar a liquidação, solicitando a fixação de garantia para suspensão do processo de execução fiscal.
A executada foi notificada em 23 de Novembro de 2010 para prestar garantia no valor de 4.174.101,89€ e apresentou como garantia em 29 de Novembro de 2010 fiança da sociedade A……. SGPS.
A executada apresentou também uma impugnação judicial da liquidação em execução no dia 29.12.2010.
O órgão de execução fiscal indeferiu essa prestação de garantia por despacho proferido em 21 de Julho de 2011 e notificou a executada de que a suspensão da execução fiscal ficava condicionada à apresentação no prazo de 15 dias de garantia bancária, fiança bancária ou hipoteca voluntária
A executada foi notificada desse despacho por oficio datado de 22 de Julho de 2011 e impugnou esse despacho mediante Reclamação apresentada em 9 de Agosto de 2011, reclamação essa que deu origem ao processo n.º 2615/11.2BEPRT e foi julgada procedente pelo Tribunal Administrativo e Fiscal por sentença proferida em 17 de Novembro de 2011.
Não conformada a Fazenda Pública interpôs ainda recurso daquela decisão, tendo-lhe sido negado provimento por acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 18 de Janeiro de 2012 que confirmou a decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal.
Face à inércia da Administração Tributária no cumprimento da sua obrigação de imediata e plena reconstituição da legalidade do acto objecto do litígio, a executada apresentou em 4 de Junho de 2012 uma execução do referido julgado.
Porém, não obstante se encontrar pendente a referida impugnação, ter sido julgada procedente, por sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, confirmada por Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, a reclamação judicial da decisão do Chefe do Serviço de Finanças que indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia mediante fiança, e, bem assim, ter sido encetada a execução do referido julgado, a Administração Fiscal houve por bem efectuar, em 18 de Junho de 2012, a compensação entre os créditos apurados em sede de liquidação de juros indemnizatórios e a quantia exequenda em cobrança no processo de execução fiscal.
E sustenta agora, ignorando o desfecho final daquela reclamação, que tal actuação é legítima porquanto, não obstante a reclamante ter prestado garantia, a mesma ainda se encontrava em apreciação pela Administração Tributária.
Mas não lhe assiste razão.

Como se referiu no Acórdão desta Secção de 22.04.2009, recurso 277/99 (Trata-se de entendimento também acolhido nos Acórdãos de 07.01.2009, recurso 694/08, de 17.12.2008, recurso 997/08 e de 25.06.2008, recurso 464/08, in www.dgsi.pt.) “para efeitos de compensação de dívidas de tributos, por iniciativa da administração tributária (…) deve equiparar-se, à pendência dos meios processuais ou procedimentais aí elencados, o não decurso dos respectivos prazos” sendo que “isto tanto vale quanto aos meios impugnatórios propriamente ditos (reclamação, impugnação, recurso ou oposição) como aos procedimentos tendentes à prestação de garantia, por um argumento de identidade de razão e sob pena de se desvirtuar a ratio legis que a excepção à possibilidade de compensação constante da parte final do n.º 1 do artigo 89.º pretende acautelar, que parece ser o de a compensação só se dever efectuar relativamente a dívidas sobre as quais não haja controvérsia”.
No caso, a dedução de impugnação indica a existência de controvérsia acerca da dívida que a Administração Fiscal pretende executar, facultando a lei o direito ao executado de, na pendência em sede administrativa ou judicial do pleito, obstar a que a execução prossiga através da prestação de garantia ou obtendo a sua dispensa.
Por outro lado a decisão proferida pelo órgão de execução fiscal, que tinha indeferido a prestação de garantia por fiança, foi revogada por sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal que foi confirmada por acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte transitado em julgado.
Ora, como bem nota o Exmº Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal Administrativo, por força do disposto no artigo 100.º da LGT e 173.º do CPTA, a Administração Tributária está obrigada , em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão.
Sendo que no caso a ilegalidade consistiu no facto da Administração Tributária não considerar a fiança como meio idóneo de prestação de garantia para obter a suspensão do processo de execução fiscal.
Portanto, estando decidida, com trânsito em julgado, a ilegalidade do acto de indeferimento da requerida prestação de garantia, por meio de fiança, tendo sido requerida a execução desse julgado, e estando pendente impugnação judicial em que se discutia a legalidade da dívida exequenda, não podia ter lugar a compensação ao abrigo do artº 89º, nº 1 do Código de Procedimento e Processo Tributário.
Em tais circunstâncias a privação de um direito de crédito ao contribuinte, sem que se encontrem esgotados todos os meios de defesa que tem ao seu dispor, não é legalmente admissível, sob pena, até, de violação do princípio da tutela jurisdicional efectiva (artigo 268.º, n. º 4 da CRP).
Caso contrário, a seguir-se a tese da recorrente Fazenda Pública poderia haver sempre compensação, para o que bastaria indeferir o pedido de garantia, já que o recurso à via judicial por parte do executado não evitaria aquela. Ora, não restam dúvidas de que uma reclamação sobre esta matéria tem efeito suspensivo, pois que o seu objectivo é exactamente o de evitar a compensação (Cf., neste sentido Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 19.09.2012, recurso 893/12 e Código de Procedimento e Processo Tributário anotado de Jorge Lopes de Sousa, vol. IV, 6.ª ed., 2011, Lisboa, Áreas Editora, p. 286 – nota 2 b) ao art. 277.º do CPPT): a reclamação vem a ter efeito suspensivo do processo de execução fiscal (…), bem como a proibição de tramitação da execução fiscal após a subida do processo ao tribunal (ob. cit., p. 287 – nota 2c).).

Acresce dizer que a jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo se tem pronunciado, de forma unânime e reiterada no sentido de que, não estando decidida a reclamação do acto que não aceitou a garantia prestada ou que indeferiu o pedido de dispensa de a prestar, não é possível a compensação de dívidas - cf. Acórdão 26/12 de 31.01.2012, por nós relatado, que vimos seguindo de muito perto, e ainda os posteriores acórdãos de 29.02.2012, recurso 37/12, de 12.09.2012, recurso 895/12, de 19.09.2012, recurso 893/12, e de 10.12.2012, recurso 923/12, todos in www.dgsi.pt.
Por maioria de razão deverá ser assim num caso como o dos autos em que o acto de indeferimento da garantia (fiança) oferecida foi definitivamente anulado (cfr. os pontos 2 e 3 do probatório) por acórdão transitado em julgado, e, não obstante, a Administração Fiscal se apressou a operar a compensação, ignorando o desfecho final daquele incidente.
Neste contexto o acto de compensação operado padece até de nulidade por força do disposto na alínea i) do n.º 2 do artigo 133.º do Código de Procedimento Administrativo, na medida em que constitui acto consequente do acto de indeferimento da garantia oferecida que lhe serviu de pressuposto, acto este que foi anulado (cf. os citados Acórdão 37/12 e 895/12, para cuja fundamentação se remete).

Pelo que fica dito improcedem todos os fundamentos do recurso.

7. Decisão:
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas pela Fazenda Pública.
Lisboa, 30 de Abril de 2013. - Pedro Delgado (relator) - Valente Torrão - Ascensão Lopes.