Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0570/13
Data do Acordão:11/05/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FONSECA CARVALHO
Descritores:CUSTOS DE EXERCÍCIO
QUALIFICAÇÃO DE CUSTOS
DEDUÇÃO DE ENCARGOS
APOIO À FORMAÇÃO PROFISSIONAL
Sumário:I - Os custos que nos termos do artigo 23 do CIRC relevam fiscalmente serão todos aqueles que directamente interfiram no objecto social prosseguido pela impugnante.
II - Sendo o objecto social da recorrente o apoio a nível nacional nas áreas de informação em campos de especialização manifesta como é o caso da medicina, psicologia e formação profissional a revista produzida e distribuída pela recorrente é um meio comunicacional adequado e expedito para a prossecução de tal finalidade da recorrente.
II - Os custos relacionados com a sua feitura e distribuição onerosa ou gratuita não podem deixar por isso de ser considerados indispensáveis para efeitos do disposto no artigo 23 do CIRC.
III - O conceito de indispensabilidade dos custos é um conceito indeterminado tendo cabido à jurisprudência o seu preenchimento, mas de forma casuística não tendo surgido de tal labor uma definição concreta do mesmo.
IV - Mas essa indeterminação não consente que a Administração Tributária para a sua relevância o possa fazer sob o critério da sua razoabilidade ou mesmo necessidade ou de conveniência.
Nº Convencional:JSTA00068975
Nº do Documento:SA2201411050570
Data de Entrada:04/15/2013
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A.......................................
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF LISBOA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR FISC - IRC
Legislação Nacional:CIRC88 ART23 N1 D ART260.
LGT98 ART43.
CPPTRIB99 ART55.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC01236/05 DE 2006/03/29.
Referência a Doutrina:ANTÓNIO MOURA PORTUGAL - A DEDUTIBILIDADE DOS CUSTOS NA JURISPRUDENCIA FISCAL PORTUGUESA COIMBRA EDITORA 2004 PAGS 113 E SEGS.
DUARTE MORAIS - APONTAMENTOS IRC ALMEDINA COIMBRA 2007 PAG87.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam os Juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

RELATÓRIO:

Não se conformando com a sentença do TAF de Lisboa que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida por A................................... contra a liquidação de IRC do ano de 1994 no montante de 39 838 835$00 veio a Fazenda Pública dela interpor recurso para o STA formulando as seguintes conclusões:
I Os autos respeitam a liquidação adicional de IRC de 1994.
II A sentença ora posta em causa decidiu anular parcialmente a liquidação de IRS no montante de € 155 969,87.
III A anulação supra referida refere-se às correcções infra discriminadas:
Custo da revista no valor de 21894153$00.
Custo material didáctico 4 125000$00.
Custo em rendas, água luz telefone e fax 5 250 000$00.
III O “thema decidendum” centrou-se na interpretação do artigo 23 do CIRC.
IV Em nosso entender resulta do próprio relatório e das disposições legais aplicadas que aqueles valores não têm qualquer sustentabilidade o que por si só faz inquinar os custos que o recorrido contabilizou.
V A sentença recorrida consubstancia uma errada interpretação e aplicação das normas citadas revelando-se desconforme aos artigos 23 do CIRC, 43 nº 1 da LGT e 55 do CPPT.
Deve dar-se procedência ao recurso anular-se a sentença em apreço.
Não houve contra alegações.

Colhidos os vistos cumpre decidir.

Foi a seguinte matéria de facto que o Tribunal “a quo” deu como assente e de que as partes não discordam:

A) A impugnante é uma associação empresarial representativa das empresas de construção civil no âmbito nacional que visa apoiar os seus associados nas áreas da informação, psicologia, medicina e da formação - cfr folhas 152 do Relatório da IT e artigo 5º da p.i.
B) Os Serviços de Inspecção Tributária efectuaram uma acção de inspecção à contabilidade da impugnante relativamente aos exercícios de 1994 e 1995 folhas 28 e segs.
C) Durante a acção de inspecção referida em B) entenderam os serviços de Inspecção no que ao ano de 1994 diz respeito que o ora impugnante cometeu várias irregularidades ao nível da declaração de proveitos e da consideração de custos tendo proposto as correcções consideradas devidas nos termos constantes de folhas 62 a 186 cujo teor aqui se dá por reproduzido.
D) A impugnante foi notificada do relatório da Inspecção referida em B) e para o exercício do direito de audição prévia que exerceu. Folhas 60 do relatório da IT.
E) Com base nas correcções referidas em D) foi efectuada a liquidação impugnada.
F) A impugnante foi notificada da liquidação impugnada mencionando-se no ofício de notificação que a liquidação é conforme fundamentação já remetida folhas 17.
G) O Imposto resultante da liquidação impugnada foi pago no âmbito do regime previsto no DL 248-A/2002 de 14/11 tendo o respectivo valor sido reduzido para Esc. 24 852 461$00 por força da anulação dos juros compensatórios de acordo com o disposto no referido diploma legal. Folhas 103 a 106.

Foi perante a factualidade dada como provada que a mº juiz face ao probatório pronunciando-se sobre as despesas não aceites como custos fiscais considerou que relativamente às despesas com a revista tais custos deveriam relevar fiscalmente face ao objecto prosseguido pela revista e se mostrarem também comprovados.

A Fazenda Pública não se conforma com esta decisão e sustenta que a sentença recorrida ao considerar como custos fiscais os custos suportados pela recorrida e discriminados na conclusão III fez errada interpretação e aplicação do artigo 23 do CIRC. Do artigo 43 da LGT e 55 do CPPT.
Refere que contrariamente ao que a sentença afirma – que a Inspecção Tributária não pôs em causa a razoabilidade dos custos nem a sua efectivação que decorre da fundamentação vertida no relatório da inspecção - que os valores discriminados não têm sustentabilidade o que faz inquinar os custos ora discriminados.

Quid juris?
Entende a recorrente que as despesas suportadas com a revista, com material didáctico, com as rendas, água luz telefone e fax suportados pela impugnante em actividades formativas de pessoal não docente não devem ser aceites como custos fiscalmente dedutíveis por considerar que relativamente à revista apenas deveriam aceitar-se os custos com a venda de 3850 revistas por serem apenas estas que concorrem para a formação de proveitos apesar de terem sido impressas 63000 e que os restantes custos estão indevidamente documentados.

Relativamente às despesas com a revista no montante de 21 894 153$00 está provado nos autos que a impugnante é uma associação representativa de empresas de construção civil no âmbito nacional que visa apoiar os seus associados nas áreas da informação, da psicologia, da medicina e da formação.
Decorre do exposto que a revista é um meio comunicacional adequado e expedito para a prossecução de tal finalidade pelo que os custos relacionados com a sua feitura e distribuição onerosa ou gratuita não podem deixar de ser considerados indispensáveis para efeitos do disposto no artigo 23 do CIRC.
Efectivamente o conceito de indispensabilidade dos custos é um conceito indeterminado tendo cabido à jurisprudência o seu preenchimento, mas de forma casuística não tendo surgido de tal labor uma definição concreta do mesmo.
Mas essa indeterminação não consente que a Administração Tributária para a sua relevância o possa fazer sob o critério da sua razoabilidade ou mesmo necessidade ou de conveniência.

Como refere o acórdão deste STA de 29 03 2006 in processo 01236/05 “o juízo de oportunidade ou de conveniência dos gastos é exclusivo do empresário. Se ele decide fazer despesas tendo em vista prosseguir o objecto da empresa mas é mal sucedido e essas despesas se revelam improfícuas não deixam de ser custos fiscais. Mas todo o gasto que contabilize como custo e se mostre estranho ao fim da empresa não é custo fiscal porque não é indispensável”.
A faculdade que a Contribuição Industrial cometia à DGCI no artigo 26 da CI e que lhe permitia rejeitar a dedutibilidade de determinados custos deixou de existir.
A regra de acordo com CIRC é a de que as despesas correctamente contabilizadas sejam custos fiscais.
Como diz também o mesmo aresto … “o critério da indispensabilidade foi criado pelo legislador não para permitir à Administração Tributária intrometer-se na gestão da empresa ditando como deve aplicar os seus meios mas para impedir a consideração fiscal de gastos que ainda que consabido como custos não se inscrevam no âmbito da empresa”.
Rui Duarte Morais defende in Apontamentos IRC Almedina Coimbra 2007 pp87 que o custo tem de considerar-se indispensável” sempre que o encargo que o origina derivou de “uma genuína motivação empresarial – o entendimento dos sócios e/ou gestores da sociedade, os únicos a quem cabe decidir do interesse social”.
Na esteira aliás de António Moura Portugal que in “A Dedutibilidade dos Custos na Jurisprudência Fiscal Portuguesa Coimbra Editora 2004 pp1133 e segs sustenta que “a indispensabilidade tem de ser interpretada em função do objecto societário. Deixando de ser tolerável a utilização do critério de razoabilidade como fundamento para limitar quantitativamente os encargos incorridos pelos sujeitos passivos. A indispensabilidade deve ser aferida a partir de um juízo positivo da subsunção na actividade societária o qual por natureza não deve ser sindicado pelo Direito Fiscal que se não deve imiscuir muito menos valorar as decisões empresariais do contribuinte.
Os custos indispensáveis equivalem assim os gastos contraídos no interesse da empresa.
A dedutibilidade fiscal do custo deve depender apenas de uma relação justificada com a actividade produtiva da empresa e esta indispensabilidade verifica-se sempre que por funcionamento da teoria da especialidade das pessoas colectivas as operações societárias se insiram na sua capacidade por subsunção ao respectivo escopo societário e em especial desde que se conectem com a obtenção de lucro ainda que de forma directa ou indirecta”.
Os custos que nos termos do artigo 23 do CIRC relevam fiscalmente serão todos aqueles que directamente interfiram no objecto social prosseguido pela impugnante.
Ora essa indispensabilidade resulta manifesta do probatório da sentença recorrida no ponto A) do probatório donde ressalta que é objecto social da recorrida o apoio a nível nacional nas áreas de informação em campos de especialização manifesta como é o caso da medicina, psicologia e formação profissional estando as despesas numa relação de causalidade directa com a feitura e publicação da revista.
E o mesmo se diga em relação às restantes despesas cujos montantes a recorrente questiona como já o fizera a Administração Tributária por estarem indevidamente documentados o que por força da alínea g) do artigo 45 do CIRC não permite a sua dedutibilidade.
Mas o certo é que os gastos em causa estão suportados por documentos internos e a Administração Tributária não questionou o montante destes gastos nem o seu destino de formação do pessoal não docente o que se insere como bem acentua o Mº juiz “a quo” no objecto social prosseguido pela recorrida.
E sendo assim tais despesas não podem igualmente deixar de ser considerados gastos efectuados na prossecução do fim social prosseguido pela impugnante e incluídos no conceito de indispensabilidade consagrado no artigo 23 do CIRC.

DECISÃO:

Face ao exposto acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do STA em negar provimento ao recurso.
Custas pela recorrente.

Lisboa, 5 Novembro 2014. – Fonseca Carvalho (relator) – Casimiro Gonçalves – Pedro Delgado.

Existe Acórdão rectificativo de Reforma Quanto a Custas em 22 de Abril de 2015.