Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01233/17.6BELSB
Data do Acordão:06/26/2019
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SÃO PEDRO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
PROTECÇÃO INTERNACIONAL
MATÉRIA DE FACTO
Sumário:Não se justifica admitir revista de acórdão relativamente a questões de matéria de facto, excluídas do âmbito de cognição do tribunal de revista.
Nº Convencional:JSTA000P24732
Nº do Documento:SA12019062601233/17
Data de Entrada:05/07/2019
Recorrente:A...
Recorrido 1:SEF - SERVIÇO DE ESTRANGEIROS E FRONTEIRAS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar – art. 150º, 1, do CPTA.

Acordam no Supremo Tribunal Administrativo (art. 150º, 1 do CPTA)


1. Relatório

1.1. A…………., devidamente identificada, recorreu para este Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do art. 150º, 1, do CPTA, do acórdão do TCA Norte, proferido em 21 de Fevereiro de 2019, que confirmou a sentença proferida pelo TAC de Lisboa, a qual recusou a concessão de protecção internacional.

1.2. Fundamenta a admissibilidade da revista para melhor aplicação do direito.

2. Matéria de facto

Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. Matéria de Direito

3.1. O artigo 150.º, n.º 1, do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». Como decorre do próprio texto legal e a jurisprudência deste STA, tem repetidamente sublinhado trata-se de um recurso excepcional, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando-o como uma «válvula de segurança do sistema», que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.

3.2. Entenderam as instâncias que o recorrente não provou a factualidade em que assenta o seu pedido de protecção internacional, ou seja a perseguição por motivos políticos. Para tanto ponderou o acórdão recorrido não ser aplicável ao caso o “princípio do benefício da dúvida, por não estarem preenchidos os requisitos de verificação cumulativa previstos nas als. b), c) e d) do n.º 4 do art. 18º da Lei 27/2008, dado que:

“(…)

- o recorrente não apresentou qualquer documento comprovativo da factualidade que alegou nas declarações que prestou, apesar da sua saída de Angola ter sido preparada com alguma antecedência (pois pediu um visto no Consulado de Portugal em Benguela em 11-8-2016, só tendo saído de Angola em 19-9-2016), o que lhe teria permitido munir-se de alguma prova documental (máxime da pertença ao “Movimento dos Jovens Revolucionários de Angola”);

- apesar de referir que viajou de Luanda para Lisboa com o propósito de solicitar protecção internacional em Portugal, o recorrente não formulou tal pedido em Portugal quando aqui chegou em 19-9-2016, nem nos dez dias que aqui permaneceu até viajar para França, além de que não apresentou uma justificação suficiente para tal não ter acontecido (referiu estar confuso e com medo, o que não se coaduna com a circunstância de referir que viajou e permaneceu em Portugal acompanhado (explicando que o B………… o veio trazer a Portugal e o acompanhou até viajar para França) e de a língua oficial em Portugal corresponder à sua língua materna (o que facilita as comunicações com as autoridades nacionais), ao contrário do que acontece em França, cuja língua oficial (francês) o recorrente afirmou só falar “um pouco”);

- o recorrente referiu que tem medo de regressar a Angola, pois tal significará a sua morte, o que não se mostra coerente com o facto de entre Agosto de 2015 e Setembro de 2016 ter vivido em Cuando-Cubango, mais concretamente na cidade de Malange, sem qualquer problema, em 19-9-2016 ter embarcado no Aeroporto de Luanda sem qualquer problema e, de acordo com a base de dados da Interpol, não ser procurado em Angola.

(…)”

3.3. Como decorre do exposto a decisão recorrida baseou-se, essencialmente, na apreciação e ponderação de um conjunto de factos. Foram pois claramente juízos de facto que levaram as instâncias a indeferir a pretensão do recorrente. Daí que, não cabendo no âmbito da revista o julgamento da matéria de facto – art. 12º, 4 do ETAF – não se justifique a admissão da revista.

O recorrente, ciente desta limitação do âmbito da revista, considera que foi desrespeitada uma norma que regula a força probatória de determinados meios de prova – buscando assim legitimar o uso da revista (art. 150º, 4 do CPTA) - mais precisamente o art. 18º, n.º 4 da lei 27/2008, de 30 de Junho.

Nos termos do art. 18º, n.º 4 da lei 27/2008, de 30 de Junho

4 - As declarações do requerente devem ser confirmadas mediante prova documental ou outros meios de prova admitidos em direito, a não ser que estejam reunidas cumulativamente as seguintes condições:

a) O requerente tenha feito um esforço autêntico para fundamentar o seu pedido;

b) O requerente apresente todos os elementos ao seu dispor e explicação satisfatória para a eventual falta de outros considerados pertinentes;

c) As declarações prestadas pelo requerente forem consideradas coerentes, plausíveis, e não contraditórias face às informações disponíveis;

d) O pedido tiver sido apresentado com a maior brevidade possível, a menos que o requerente apresente justificação suficiente para que tal não tenha acontecido;

e) Tenha sido apurada a credibilidade geral do requerente.”

Como decorre da transcrita norma legal, a lei exige só dispensa da confirmação das declarações do requerente nos casos especialmente previstos. O acórdão recorrido entendeu que não se verificavam as condições da desnecessidade de comprovação das declarações do requerente. Para essa conclusão ponderou diversos indícios todos eles no domínio dos factos. Ou seja, o acórdão recorrido afastou o a regra da dispensa de confirmação das declarações do requerente através de factos e ponderação articulada dos mesmos. Daí que o essencial da decisão assente em julgamento da matéria de facto e, portanto, excluída do âmbito da revista.

Do exposto resulta que não deve ser admitida a revista.

4. Decisão

Face ao exposto não se admite a revista.

Sem custas.

Porto, 26 de Junho de 2019. – São Pedro (relator) – Costa Reis – Madeira dos Santos.