Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0840/11
Data do Acordão:07/05/2012
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:IRC
DETERMINAÇÃO DE LUCRO TRIBUTÁVEL
REGIME SIMPLIFICADO DE TRIBUTAÇÃO
OPÇÃO
DECLARAÇÃO DE INÍCIO DE ACTIVIDADE
Sumário:I - A tributação segundo o regime simplificado é facultativa, sendo colocada na disponibilidade do sujeito passivo a opção pelo regime geral de determinação do lucro tributável (nº 1 do art. 53º do CIRC).
II - A opção, feita na declaração de início de actividade, pela aplicação do regime geral, releva para os três exercícios seguintes (nº 7 do referido art. 53º).
Nº Convencional:JSTA000P14402
Nº do Documento:SA2201207050840
Data de Entrada:09/22/2011
Recorrente:CHEFE DE DIVISÃO DE LIQUIDAÇÃO DOS IMPOSTOS SOBRE O RENDIMENTO E SOBRE A DESPESA DA DIRECÇÃO DE FINANÇAS DO PORTO
Recorrido 1:A......, LDA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

RELATÓRIO
1.1. O Ministério das Finanças recorre da sentença que, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, na acção administrativa especial interposta pela A………, Lda. contra o acto proferido em 20/4/2004, com delegação de competência, pelo Chefe de Divisão de Liquidação dos Impostos sobre o Rendimento e a Despesa da Direcção de Finanças do Porto, de indeferimento do pedido de alteração do regime de tributação do regime simplificado para o regime geral, julgou a acção procedente e condenou a entidade demandada a enquadrar a ali autora no regime geral de determinação do lucro tributável, no exercício de 2003.

1.2. A entidade recorrente termina as alegações formulando as conclusões seguintes:
A. A sentença recorrida ao ter decidido que “O facto de a autora, no exercício de 2003, ter obtido proveitos inferiores a € 149.639,37, não tem qualquer consequência no que concerne ao regime de tributação em IRC, pois, efectuada aquela opção, ela é válida por três anos, como resulta deste nº 8 do artigo 53º”, e concluir que «foi ilegal a actuação da Administração Tributária ao alterar a tributação em IRC para as regras do regime simplificado”, fez, salvo melhor, incorrecta interpretação do art. 53º do CIRC.
B. No caso dos autos, a Recorrida, na declaração de início de actividade apresentada em 17/12/2001, inscreveu, no quadro 9, a previsão de € 150.000,00 de proveitos para os meses seguintes de 2002, tendo assinalado no quadro 19, campos 2 e 4, a opção pelo regime geral de tributação.
C. Porém, no exercício de 2002, contrariamente ao previsto, a Recorrida obteve resultados inferiores à previsão constante da declaração de início de actividade.
D. Deste modo, para o ano de início de actividade estimou um valor de proveitos superior àquele que está previsto no nº 1 do art. 53º do CIRC, pelo que estava automaticamente abrangida pelo regime geral de tributação para o exercício de 2002.
D. Com efeito, nos termos do nº 1 do art. 53º do CIRC, a integração no regime simplificado é automática, sempre que estejam preenchidos os requisitos ali indicados, sendo que, in casu, a Recorrida não os reunia atendendo ao valor de proveitos que estimou (€ 150.000,00).
E. Contrariamente à interpretação propugnada pela sentença recorrida, a opção pelo regime geral só opera para os sujeitos passivos de IRC que preencham os pressupostos que determinem a sua inclusão no regime simplificado. Só neste caso é que a lei considera como válida e eficaz uma opção pelo regime geral.
F. A inclusão automática no regime geral (ou seja, quando na declaração de início de actividade se prevê um volume de negócios superior a € 150.000,00), não se encontra sujeita à regra de validade por três anos/exercícios, cessando logo que se verifiquem os pressupostos legais para a aplicação do regime simplificado.
G. Ao iniciar uma actividade, não havendo exercício de actividade anterior que possa ser tomado como referência, há que considerar, nesse exercício, o montante estimado constante da declaração de início de actividade. Porém, para o exercício seguinte (2003), haverá que atender ao volume de proveitos real atingido pelo sujeito passivo no ano anterior (2002).
H. Na eventualidade de não se confirmar o volume de proveitos estimado e se o volume real de proveitos determinar a inclusão do sujeito passivo no regime simplificado no exercício seguinte, o enquadramento neste regime é automático e válido por três anos, se o sujeito passivo não tiver optado pelo regime geral, nos termos previstos na al. b), do nº 7 do art. 53º do CIRC.
I. Com efeito, a lei permite que ocorrendo alteração do volume real de proveitos que determine a inclusão do sujeito passivo no regime simplificado, o sujeito passivo pode optar pelo regime geral nos termos do disposto na citada al. b) do nº 7 do art. 53º do CIRC, mediante a apresentação da declaração de alterações prevista nos arts. 110º e 111º do CIRC.
J. A interpretação e aplicação do art. 53º do CIRC aos factos em presença realizada pela Administração Tributária não merece censura, na linha, aliás, do entendimento sufragado pelo Acórdão do TCA Norte de 13/01/05, Proc. N° 1570/04, e também pelo Acórdão do TCA Sul de 26/06/2007, Rec. 01639/07, questionando-se no presente recurso a interpretação do referido preceito legal propugnada na sentença recorrida.
Termina pedindo o provimento do recurso e que, em consequência, seja revogada a sentença recorrida com todas as legais consequências.

1.3. Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4. O MP não emitiu parecer (fls. 110).

1.5. Corridos os vistos legais, cabe decidir.

FUNDAMENTOS
2. Na sentença recorrida julgaram-se provados os factos seguintes, ora submetidos a alíneas:
a) Em 17/12/2001, a autora apresentou junto do serviço de finanças da Póvoa de Varzim declaração de início de actividade a partir de 01/10/2002 – cfr. documento nº 1 junto com a petição inicial, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido.
b) A autora encontrava-se na situação de início de actividade nos últimos três meses do ano de 2002, estimando atingir valores baixos quer a nível de volume de negócios, quer no que tange ao valor de proveitos.
c) Por esse motivo, indicou no campo 12 do quadro 9 o valor de € 37.500 no concernente a volume de negócios referentes a três meses, indicou no campo 18 do mesmo quadro o montante de € 150.000 relativo ao valor total dos proveitos estimado e assinalou a sua opção pelo regime geral de determinação do lucro tributável no quadro 19 da declaração, campos 2 e 4.
d) Consta do sistema informático da Administração Fiscal o enquadramento da autora, para o exercício de 2002, no regime geral de determinação do lucro tributável – cfr. processo administrativo apenso aos autos.
e) Consta do mesmo sistema informático da Administração Fiscal o enquadramento da autora, para o exercício de 2003, no regime simplificado de tributação de IRC – cfr. processo administrativo apenso aos autos.
f) Assim, em 18/07/2003, a autora solicitou ao Director de Finanças do Porto o enquadramento no regime geral de determinação do lucro tributável por opção desde a data de início de actividade – cfr. documento n.º 2 junto com a petição inicial, cujo teor aqui se tem por reproduzido.
g) Em 20/04/2004, o chefe da Divisão de Liquidação dos Impostos sobre o Rendimento e Sobre a Despesa indeferiu este pedido, com os fundamentos constantes de fls. 10 verso a 11 verso do processo físico, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido.
h) Em 27/04/2004, foi enviada a respectiva notificação à autora do acto de indeferimento – cfr. documento n.º 3 junto com a petição inicial.
i) Em 16/06/2004, a autora apresentou a presente acção neste tribunal – cfr. carimbo aposto pelos CTT, Correios no rosto do envelope que continha a petição inicial a fls. 14 do processo físico.

3.1. Julgando procedente a acção, a sentença recorrida condenou “a entidade demandada a enquadrar a autora no regime geral de determinação do lucro tributável no exercício de 2003.”
Para tanto, a sentença considera que a autora assinalou a sua opção pelo regime geral de determinação do lucro tributável de IRC conforme se constata pela cópia da declaração de início de actividade (quadro 19, campos 2 e 4) a fls. 7 e 8 do processo e que, como resulta do nº 8 do art. 53º do CIRC, uma vez exercida aquela opção pelo regime geral, ela é válida por três anos, não tendo qualquer consequência no que concerne ao regime de tributação o facto de a contribuinte ter obtido proveitos inferiores a € 149.639,37, devendo, assim, concluir-se que a Administração Tributária não podia oficiosamente proceder à alteração da forma de determinação do lucro tributável escolhida.

3.2. Discordando do assim decidido, a entidade recorrente alega que a sentença fez uma incorrecta interpretação do art. 53º do CIRC sustentando que, para determinar o regime de tributação no início de uma actividade há que considerar, nesse exercício, o montante estimado na declaração de início de actividade mas, relativamente ao ano seguinte, já terá de atender-se ao volume real atingido pelo sujeito passivo no ano anterior. Sendo que, no caso dos autos, face ao volume de proveitos estimado, a inclusão no regime geral da recorrida foi automática mas, porque o valor real de proveitos apurados foi inferior ao montante previsto no art. 53º do CIRC, ocorreram os pressupostos para a sua inclusão automática no regime simplificado para o ano de 2003, que se mantém válida por três anos por não ter optado, como podia, até Março de 2003, pelo regime geral de tributação.
Vejamos.

4.1. Nos nºs, 1, 2, 7 e 8 do citado artigo 53º do CIRC (na redacção aqui aplicável) dispõe-se o seguinte:
Artigo 53º - Regime simplificado de determinação do lucro tributável
«1 - Ficam abrangidos pelo regime simplificado de determinação do lucro tributável os sujeitos passivos residentes que exerçam, a título principal, uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, não isentos nem sujeitos a algum regime especial de tributação, com excepção dos que se encontrem sujeitos à revisão legal de contas, que apresentem, no exercício anterior ao da aplicação do regime, um volume total anual de proveitos não superior a 30.000.000$00 (euro) 149 639,37) e que não optem pelo regime de determinação do lucro tributável previsto na secção II do presente capítulo.
2 - No exercício do início de actividade, o enquadramento no regime simplificado faz-se, verificados os demais pressupostos, em conformidade com o valor total anual de proveitos estimado, constante da declaração de início de actividade, caso não seja exercida a opção a que se refere o número anterior.
(…)
7 - A opção pela aplicação do regime geral de determinação do lucro tributável deve ser formalizada pelos sujeitos passivos:
a) Na declaração de início de actividade;
b) Na declaração de alterações a que se referem os artigos 110º e 111º, até ao fim do 3º mês do período de tributação do início da aplicação do regime.
8 - A opção referida no número anterior é válida por um período de três exercícios, findo o qual caduca, excepto se o sujeito passivo manifestar a intenção de a renovar pela forma prevista na alínea b) do número anterior.» (A redacção deste nº 8 é a decorrente da Lei nº 109-B/2001, de 27/12)

4.2. De acordo com a factualidade que a sentença julgou provada a recorrida apresentou declaração de início de actividade, a partir de 1/10/2002, indicando o montante de € 150.000 relativo ao valor total dos proveitos estimados e assinalou a sua opção pelo regime geral de determinação do lucro tributável nos campos 2 e 4 do quadro 19.
Porém, para o exercício de 2003 a AT veio a enquadrá-la no regime simplificado de tributação de IRC.
Para a recorrente Fazenda Pública, a opção pelo regime geral só opera para os sujeitos passivos de IRC que preencham os pressupostos que determinem a sua inclusão no regime simplificado (só neste caso é que a lei considera como válida e eficaz uma opção pelo regime geral), sendo que, no caso da recorrida, atendendo ao valor de proveitos estimado (Euros 150.000) a respectiva inclusão no regime geral é automática, não se encontrando a permanência nesse regime sujeita à regra de validade por três anos e cessando logo que se verifiquem os pressupostos legais para a aplicação do regime simplificado.
E, no caso, tendo a recorrida apresentado um valor real de proveitos inferior ao montante determinado no art. 53º do CIRC, ocorreu a verificação dos requisitos para a inclusão automática no regime simplificado para o ano de 2003, válida por três anos, dado que não houve opção até ao fim do mês de Março de 2003, como teria de haver nos termos legais, pelo regime geral de tributação.

4.3. Todavia, não lhe assiste razão legal.
Com efeito, o que decorre do art. 53º do CIRC acima transcrito é que, no exercício do início da actividade, o enquadramento se faz em conformidade com o volume de proveitos estimados para um ano de actividade e que a opção pelo regime geral deve ser formalizada na declaração de início de actividade ou na declaração de alterações referida nos arts. 110º e 111º do mesmo Código, até ao fim do 3º mês do período de tributação do início da aplicação do regime.
Ou seja, são automaticamente abrangidos pelo regime simplificado os sujeitos passivos cujo volume total de proveitos, no exercício anterior, seja inferior a 149.639,37€, a menos que expressamente optem por regime diferente, caso em que aquele deixa de ter aplicação automática. Porém, uma vez que quando se inicia actividade não há exercício anterior que possa ser tomado como referência para aquele efeito, há que considerar nesse exercício inicial o montante anual de proveitos estimado constante da declaração de início de actividade.
Mas os sujeitos passivos que à luz dos aludidos critérios fiquem sujeitos ao regime simplificado podem optar pelo regime geral, devendo, para o efeito, fazê-lo na declaração de início de actividade, ou em declaração de alterações a apresentar até ao fim do 3º mês do período de tributação do início de aplicação do regime. E uma vez efectuada essa opção, ela é válida por um período de três exercícios, findo o qual caduca, excepto se for renovada nos termos e prazos referidos nos nºs. 8 e 9 do art. 53º do CIRC. Portanto, quando há uma expressa opção pelo regime geral este mantém-se válido por um período de três exercícios, susceptível de renovação e só a inclusão automática no regime geral é que não se encontra sujeita àquela regra de validade por três exercícios, cessando logo que se verifiquem os pressupostos legais para a aplicação do regime simplificado.
No caso, a recorrida apresentou, em 17/12/2001, junto do serviço de finanças da Póvoa de Varzim, declaração de início de actividade a partir de 1/10/2002, estimando atingir valores baixos quer a nível de volume de negócios, quer no que tange ao valor de proveitos, pelo que indicou no campo 12 do quadro 9 o valor de € 37.500 no concernente a volume de negócios referentes a três meses, indicou no campo 18 do mesmo quadro o montante de € 150.000 relativo ao valor total dos proveitos estimado e assinalou a sua opção pelo regime geral de determinação do lucro tributável no quadro 19 da declaração, campos 2 e 4.
Ora, o facto de no ano de 2003 ter obtido proveitos inferiores a 149.639,37 Euros não tem qualquer consequência no que concerne ao regime de tributação em IRC, pois, como se disse, efectuada aquela opção, ela é válida por três anos, como resulta deste nº 8 do citado art. 53º do CIRC.
De resto, ainda que a recorrida tenha estimado, na declaração de início de actividade, proveitos inferiores a 149.639,37 Euros, não havia, como não houve, qualquer obstáculo a que fosse tributada pelo regime geral, pois, como resulta da parte final do nº 1 daquele art. 53º, mesmo os contribuintes em condições de serem tributados pelo regime simplificado, podiam optar por afastar este regime.
Tendo, porém, formalizado a opção pelo regime geral de determinação do lucro tributável na declaração de início de actividade (em 17/12/2001), de acordo com o disposto na al. a) do nº 7 do art. 53º do CIRC, a sua sujeição ao regime geral subsiste no exercício de 2003, aqui em causa, ainda que no exercício de 2002 tenha obtido proveitos inferiores a € 149.639,37.
Assim, tem de concluir-se que foi ilegal a actuação da Administração Tributária ao enquadrar a recorrida no regime simplificado de determinação do lucro tributável relativamente ao exercício de 2003.
Tem sido este, aliás, o sentido da jurisprudência do STA, como pode ver-se dos acórdãos desta Secção do Contencioso Tributário, de 15/2/2007, rec. nº 959/06; de 21/5/2008, rec. nº 010/08; de 18/6/2008, rec. nº 205/08; de 26/11/2008, rec. nº 733/08; de 10/12/2008, rec. nº 874/08; de 11/3/2009, rec. nº 831/08; de 22/4/2009, rec. nº 1114/08; de 14/7/2010, rec. nº 268/10; e de 7/12/2010, rec. nº 808/10.
Pelo exposto, a sentença deve ser confirmada, improcedendo as conclusões do recurso.

DECISÃO
Nestes termos, acorda-se em, negando provimento ao recurso, confirmar a sentença recorrida.
Custas pela entidade recorrente, fixando-se a procuradoria em 1/8.
Lisboa, 5 de Julho de 2012. - Casimiro Gonçalves (relator) - Ascensão Lopes - Pedro Delgado.