Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01135/14
Data do Acordão:02/12/2015
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ARAGÃO SEIA
Descritores:EXECUÇÃO FISCAL
APENSAÇÃO
Sumário:Não há que ordenar a desapensação das execuções anteriormente apensadas nos termos legais, ou a anulação da venda do bem penhorado para pagamento da quantia global resultante da soma das diversas quantias exequendas, pelo facto de entretanto se ter considerado prescrita uma das quantias que compunham aquele valor global.
Nº Convencional:JSTA000P18598
Nº do Documento:SA22015021201135
Data de Entrada:10/17/2014
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
A………………, com sinais nos autos, inconformado, recorre da sentença do TAF de Aveiro, datada de 22/02/2013, que julgou improcedente o pedido formulado nestes autos para anulação da venda do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de …………., concelho de Santa Maria da Feira sob o artigo 656°, no âmbito da Execução Fiscal n° 0094200301012932.

Alegou, tendo concluído:

1) O Processo de Execução Fiscal n° 0094200301012932 foi instaurado em 29/01/2003, ao abrigo do qual foi penhorado o imóvel inscrito na matriz predial urbana da freguesia de …………, concelho de Santa Maria da Feira sob o artigo 656°, para pagamento de coimas fiscais.

2) Acontece, porém, que nos termos do artigo 34° do Regime Geral das Contra - Ordenações e Coimas, em 29/01/2008, ocorreu a prescrição da dívida exequenda (5 anos).

3) E, como demonstram os autos, o Despacho do Órgão da Execução Fiscal ao reconhecer a prescrição da dívida exequenda em 18 de Março de 2009, determinou a extinção da execução nos termos da alínea b) do n° 2 do artigo 176° do C.P.P.T.

4) Ora, a extinção do Processo de Execução Fiscal implicava, ao tempo, o levantamento ou cancelamento imediato da penhora efetuada no âmbito do processo N° 0094200301012932 e a consequente desapensação das execuções apensadas ao processo extinto, nos termos dos nºs 3 e 4 do artigo 179° do Código de Procedimento e de Processo Tributário, contudo, tal não foi feito, o que constitui vício de violação da lei.

5) É que, tal como resulta da lei, a dívida exequenda no processo principal, como é o caso, não se confunde com a totalidade das dívidas que se encontram vencidas nos processos de execução fiscal apensados, e isto, porque são processos executivos autónomos em relação a cada uma das prestações em dívida.

6) Pelo que, assim sendo, a penhora efetuada ao prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo 656° da freguesia de …….., não se podia manter, nem podia relevar para efeito das restantes execuções fiscais apensadas e autonomamente instauradas, que, à face da lei, deveriam ter seguido os seus trâmites legais após a desapensação, nos termos do nº 4 do artigo 179° do C.P.P.T.

7) Pois, a penhora efetuada ao prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo 656° da freguesia de ……….., tem por base apenas e só a Certidão de dívida n° 2003/0002032, Processo N° 0094200301012932, único título executivo, extraída pela DGCI, no valor de 114,90 € (cento e catorze euros e noventa cêntimos).

8) Assim, a penhora efectuada em 02-10-2008 apenas abrangeu a dívida exequenda de 114,90 €, e não outras.

9) Nesta conformidade, a venda realizada em 15 de Abril de 2009 deverá ser declarada nula e de nenhum efeito, em razão de ter sido realizada ao abrigo de um processo executivo já prescrito, cuja prescrição foi declarada reconhecida por Despacho do Órgão da Execução Fiscal em 18 de Março de 2009, que determinou a extinção da execução nos termos da alínea b) do n° 2 do artigo 176° do C.P.P.T.

10) Pelo que, uma vez que a penhora efectuada em 02-10-2008 apenas abrangeu a dívida exequenda de 114,90 €, pois tem por base apenas e só a Certidão de dívida nº 2003/0002032, Processo N° 00942003010 12932, único título executivo, extraída pela DGCI, no valor de 114,90 € (cento e catorze euros e noventa cêntimos), deveria ter sido imediatamente cancelada tal penhora.

11) Em suma, a venda realizada em 15-04-2009 deverá ser declarada nula e de nenhum efeito, em razão das nulidades praticadas no processo de execução fiscal, nulidades essas invocadas a todo o tempo, nos termos do nº 2 do artigo 134° do Código Procedimento Administrativo aplicável por força do artigo 2°, alínea d) do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

12) Foram violados os artigos 178°, nºs 3 e 4, 217°, 219°, nº 1, 271 ° do C.P.P.T, e ainda os artigos 266°, n° 2, 268°, nºs 3 e 4 da C.R.P. e 55° da L.G.T.

Termos em que, nos melhores de direito e com o sempre douto suprimento de V.Exas., deverá o presente Recurso ser julgado procedente e provado e, em consequência, seja proferida DECISÃO, na qual se revogue a DOUTA SENTENÇA recorrida, anulando-se a venda do imóvel realizada ilegalmente em 15-04-2009, prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo 656° da freguesia de ………., concelho de Santa Maria da Feira, com as legais consequências, a bem da JUSTIÇA.

Não foram produzidas contra-alegações.

Já neste Supremo Tribunal, o Ministério Público emitiu o seguinte parecer:

1. A prova documental constante do processo demonstra, inequivocamente, que a penhora do imóvel foi efectuada para cobrança da quantia de €16 449,71, resultante da soma das quantias exequendas no PEF 0094200301012932 e em outros processos apensos, conforme expressamente indicado no auto de penhora (fls. 107/108).

A circunstância de a coima no montante de €114,91 ter sido declarada prescrita, determinando a extinção da execução instaurada para a respectiva cobrança coerciva, não obsta ao prosseguimento da tramitação nos processos oportunamente apensados (antes da declaração de prescrição), para cobrança do remanescente ainda em dívida.

2. A pretendida desapensação das execuções:

a) carece de fundamento legal, na medida em que a subsistência da apensação da execução extinta não prejudica o andamento das restantes execuções (art. 179° nº. 4 CPPT)

b) perverteria o objectivo visado com a apensação, obrigando a uma repetição indesejável de trâmites processuais, designadamente com nova penhora incidente sobre o mesmo ou outros imóveis (se fosse entendido que a penhora apenas visava a cobrança da quantia correspondente ao montante a coima)

Neste contexto não se verifica qualquer fundamento determinante da procedência do pedido de anulação da venda do imóvel, efectuada em 15 abril 2009 (art. 257° nº 1 CPPT; art. 908° e 909° CPC revogado, arts. 838° nº 1 e 839° nº 1 CPC vigente)

CONCLUSÃO

O recurso não merece provimento.

A sentença impugnada deve ser confirmada.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

Na sentença recorrida levou-se ao probatório a seguinte matéria de facto:

1 - Em nome do requerente foi instaurado o processo de execução fiscal 009420030102932 e apensos.

2 - O processo de execução fiscal 009420030102932 foi instaurado para cobrança da dívida exequenda respeitante a uma coima no valor de € 114,91, cfr. fls. 101 e 102 destes autos e que aqui se dão por reproduzidas.

3 - Dá-se aqui por reproduzido o auto de penhora e constante destes autos de fls. 107 a 108.

4 - Dá-se aqui por reproduzido o despacho proferido em 04.03.2009 e que determinou a venda judicial do imóvel em causa e constante destes autos a fls. 139.

5 - Dá-se aqui por reproduzido o requerimento apresentado pelo requerente em 11.03.2009 solicitando a declaração da prescrição da dívida exequenda respeitante à coima no valor de € 114,90 e constante destes autos de fls. 153 a 155.

6 - Dá-se aqui por reproduzida a notificação remetida ao requerente informando-o de que a dívida exequenda referida em 5) foi declarada prescrita e constante destes autos a fls. 158.

7 - Dá-se aqui por reproduzida a informação constante destes autos a fls. 161.

8 - A petição inicial foi apresentada em 21.04.2009, cfr. fls. 6 destes autos.

Nada mais se deu como provado.

Há agora que apreciar este recurso que nos vem dirigido.

O recorrente coloca a questão de saber se, pelo facto de ter sido declarada prescrita a dívida exequenda que se encontrava a ser cobrada na execução mais antiga, à qual as restantes execuções foram apensadas, isso determinaria a necessária desapensação das restantes execuções e, consequentemente, não tendo ocorrido essa desapensação, tal determinaria a nulidade da venda efectuada do imóvel que se encontrava penhorado para pagamento da quantia exequenda.

Vejamos, então.

Dispunha à data o artigo 179.º do CPPT, sob a epígrafe “Apensação de execuções”:

1 - Correndo contra o mesmo executado várias execuções, nos termos deste Código, serão apensadas, oficiosamente ou a requerimento dele, quando se encontrarem na mesma fase.

2 - A apensação será feita à mais adiantada dessas execuções.

3 - A apensação não se fará quando possa prejudicar o cumprimento de formalidades especiais ou, por qualquer outro motivo, possa comprometer a eficácia da execução.

4 - Proceder-se-á à desapensação sempre que, em relação a qualquer das execuções apensadas, se verifiquem circunstâncias de que possa resultar prejuízo para o andamento das restantes.

Refere Jorge Lopes de Sousa, CPPT Anotado, vol. 3º, 6ª edição, em anotação a este artigo 179º que, a apensação justifica-se essencialmente por razões de economia processual, que podem incrementar a celeridade da globalidade das execuções, cfr. tb acórdão deste Supremo Tribunal, datado de 28/11/2012, recurso n.º 0840/12 (“… é inquestionável o interesse do executado na apensação das execuções fiscais quando estão reunidas as condições legais para o efeito, já que «as regras da autuação conjunta de execuções e de apensação de processos estabelecidas no nº 2 do artigo 188º e no artigo 179º do CPPT, respectivamente, têm por fundamento os princípios da celeridade e economia processual e da boa realização da justiça, pois a sua operatividade proporciona economia de actividade processual e uniformidade de decisões…”).

Portanto, ao ser determinada a apensação de várias execuções, respeitando o disposto naquele artigo 179º, deixa de haver uma pluralidade de quantias exequendas, de penhoras, etc.; passa a existir apenas uma quantia exequenda, que corresponde ao valor global de todas as execuções e, consequentemente, também passam a ser praticados os diversos actos processuais tendentes à cobrança dessa mesma quantia global, como se de uma única execução se tratasse, sendo esses actos praticados na execução mais adiantada.

Perdem, portanto, as diversas execuções, e respectivas quantias exequendas, a sua própria autonomia, passando a ser consideradas como se de uma única execução e quantia exequenda se tratasse ab initio.

E esta apensação mantém-se, mesmo que algumas das quantias parcelares exequendas venham a ser anuladas, cfr. artigo 270º do CPPT, ou pagas voluntariamente pelo executado, cfr. artigo 269º do CPPT, uma vez que, as razões que impõem a apensação dos vários processos de execução, não deixam de existir por esse facto, ainda que as quantias anuladas ou pagas sejam aquelas que dizem respeito à execução mais adiantada.

E tanto assim é que, só nestes casos de apensação de execuções é que a jurisprudência dos Tribunais Superiores tem admitido a dedução de uma única oposição relativamente às execuções apensadas, não a admitindo quando cada uma das execuções esteja autuada em diferentes processos, cfr., por todos, acórdão datado de 21/03/2012, recurso n.º 0867/11.

Está documentalmente provado nos autos, cfr. ponto 3 do probatório, que a penhora do imóvel pertencente ao recorrente foi ordenada já após a apensação das diversas execuções que contra ele corriam e para pagamento da quantia exequenda correspondente à soma dos diversos valores parcelares que diziam respeito a cada uma das execuções que foi apensada à mais adiantada.

Ora, esta penhora subsiste enquanto houver quantias em execução, sendo indiferente que uma, ou algumas delas, seja paga ou anulada, uma vez que não é por esse facto que deverá ocorrer a desapensação das execuções. A partir do momento em que as diversas execuções passam a ser tramitadas, por força da apensação, como se de uma só execução se tratasse, irrelevam quaisquer vicissitudes que possam ocorrer relativamente a alguma ou algumas das diversas quantias exequendas, desde que se deva manter a pendência do processo de execução (e da apensação) pelas restantes.

Estando provado nos presentes autos, que a apensação das diversas execuções foi efectuada nos termos legais, e que após essa apensação foi ordenada a penhora de um bem para pagamento da quantia global resultante da soma das diversas quantias exequendas e que foi efectuada a venda do mesmo bem para pagamento de tal quantia, não há, agora, que ordenar a desapensação das execuções ou a anulação da venda, pelo facto de entretanto se ter considerado prescrita uma das quantias que compunham aquele valor global, uma vez que as razões que anteriormente determinaram a apensação das diversas execuções mantêm-se actuais.

Improcede, assim, o recurso que nos vinha dirigido, não se vislumbrando que ocorra a violação de qualquer um dos preceitos legais indicados pelo recorrente nas suas conclusões.

Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em negar provimento ao recurso.

Custas pelo recorrente.

D.n.

Lisboa, 12 de Fevereiro de 2015. – Aragão Seia (relator) – Casimiro Gonçalves – Francisco Rothes.