Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0539/11.2BELRA 0680/18
Data do Acordão:09/21/2018
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SÃO PEDRO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
INSTALAÇÃO DE FARMÁCIAS
RESIDÊNCIA HABITUAL
Sumário:Não se justifica admitir recurso excepcional de revista de acórdão do TCA Sul que analisou todos os factos concretos que constavam do processo e, perante os mesmos, concluiu pela inexistência de erro nos pressupostos, relativamente à indicada residência habitual de um interessado.
Nº Convencional:JSTA000P23617
Nº do Documento:SA1201809210539/11
Data de Entrada:07/06/2018
Recorrente:A...
Recorrido 1:INFARMED-AUTORIDADE NACIONAL DO MEDICAMENTO E PRODUTOS DE SAÚDE, IP E B....
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar – art. 150º, 1, do CPTA.
Acordam no Supremo Tribunal Administrativo (art. 150º, 1 do CPTA)

1. Relatório

1.1. A……………… recorreu, nos termos do art. 150º, 1, do CPTA, para este Supremo Tribunal Administrativo do acórdão do TCA Sul, proferido em 15 de Março de 2018, que confirmou a sentença proferida pelo TAF de Leiria, que por seu turno julgou improcedente a ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL por si intentada contra o INFARMED – AUTORIDADE NACIONAL DO MEDICAMENTO E PRODUTOS DE SAÚDE, IP indicando como contra-interessada B……………, pedindo a anulação da decisão de homologação da lista de classificação final dos candidatos, datada de 13 de Janeiro de 2011.

1.2. Fundamenta a admissão da revista por entender estar em causa o princípio da repartição do ónus da prova, o princípio da igualdade e da ilegalidade.

1.3. O INFARMED e a contra-interessada pugnam pela não admissão da revista.

2. Matéria de facto

Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. Matéria de Direito

3.1. O artigo 150.º, n.º 1, do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». Como decorre do próprio texto legal e a jurisprudência deste STA, tem repetidamente sublinhado trata-se de um recurso excepcional, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando-o como uma «válvula de segurança do sistema», que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.

3.2. A questão essencial, apreciada neste processo, é a de saber se a contra-interessada tinha, ou não residência, no concelho de Espinho, conforme declarou no concurso para abertura de uma farmácia em ………. (concelho de Peniche), tendo para o efeito e no respectivo procedimento juntado um atestado de residência comprovativo daquele facto.

3.3. Tanto a primeira instância, como o TCA Sul, entenderam que esse facto (residência no concelho de Peniche) estava demonstrado no procedimento e, consequentemente, o acto de homologação da lista de classificação final – que obteve como pressuposto – não continha o vício que lhe era imputado.

Para chegar a esta conclusão – ambas as instâncias – ponderaram vários aspectos, a saber:

(i) a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa de 28-3-2006, confirmando decisão da primeira instância, que não tinha prenunciado a contra-interessada pelo crime de falsificação que lhe era imputado, precisamente pelos factos ora em causa (ter apresentado a concurso atestado de residência falso).

(ii) a contra- interessada está inscrita na Ordem dos Farmacêuticos, desde 679/90, com residência indicada em ………….. – 2520 Peniche;

(iii) a residência constante dos bilhetes de identidade emitidos em 16-7-1997 e 15-10-1999 é Atouguia da Baleia, Peniche;

(iv) a Direcção Geral dos Registos e do Notariado informou em 23-3-2005, que desde a emissão do bilhete de identidade de 29-7-1976, que a contra-interessada declarou residir na freguesia de Atouguia da Balei, concelho de Peniche;

(v) A repartição de finanças referida no cartão de contribuinte emitido em 14-6-1995 é Peniche;

(vi) O cartão de eleitor indica estar recenseada em Atouguia da Baleia;

(vii) A Junta de Freguesia da Baleia certificou, em 7-3-2003, que se encontra aí recenseada desde 18-5-1983, nunca tendo feito qualquer alteração;

(viii) O Infarmed certificou, em 17-3-2003, que a residência aí registada inicialmente, bem como a actual é ……………., Peniche, e que a contra-interessada, aquando do pedido de averbamento da direcção técnica da farmácia da Caixa de Previdência do pessoal da Empresa …………. de Leiria, indicou a morada …………., Batalha;

(viii) O Serviço de Finanças de Peniche certificou em 3-3-2003, que na Declaração modelo3, respeitantes ao ano de 2000, em que figura como primeira titular B……………, consta como residência do agregado familiar a rua ………, …………, Atouguia da Baleia; e no que se refere à declaração m/3 relativa aos rendimentos obtidos no ano de 2001, consta com titular o contribuinte C…………., com residência na Rua …………, …………, Atouguia da Baleia;

(ix) No assento de nascimento de D…………… é indicada como residência habitual do pai, C………….. e da mãe B…………….., Rua …………., n.º ……….., ……………, Atouguia da Baleia;

(x) No assento de nascimento da contra-interessada foi averbado que “casou catolicamente com C……………, em 19 de Junho de 1999, na freguesia de Atouguia, concelho de Peniche”;

(xi) A residência constante do bilhete de identidade de C……….. emitido em 1-2-2000 é Atouguia da Baleia, Peniche;

(xii) A residência da carta de condução de C………… é ……………, Atouguia da Baleia;

(xiii) A residência constante do título de registo de propriedade de 4-4-2000, relativo a um veículo propriedade de C………… é Rua ……., …………, Atouguia da Baleia;

(xiv) A residência constante do Boletim Individual de Saúde – Registo de Vacinações – de D…... é ………, Peniche;

(xv) A residência constante do Boletim de saúde e Juvenil de D…………… é …………….., Atouguia da Baleia, Peniche;

(xv) A residência constante do bilhete de identidade de D…………… emitido em 22-4-2002, é Atouguia da Baleia, Peniche;

(xvi) O Infarmed informou, em 18-11-2004, que nas candidaturas para instalação de farmácias em ………., ……….. e ………….. a contra-interessada, indicou sempre a mesma residência: Rua ………., ………., ……………., Peniche;

(xvi) Na candidatura para a instalação de uma farmácia em ………, em 20-10-1995, a contra-interessada indicou como residência Rua …….…, ………, ………. 2520 Peniche;

Perante tais elementos entendeu o TCA que “o pressuposto de que o acto impugnado partiu – de que a contra interessada tinha residência habitual no concelho de Peniche há mais de 26 anos à data da abertura do concurso – mostrava-se verificado, pelo que o mesmo não se encontrava inquinado do vício de violação de lei por erro nos pressupostos, tal como se decidiu na sentença recorrida”.

Tendo em conta a especificidade do presente litígio – que se limita a aspectos singulares da apreciação de uma situação de facto (residência no Concelho de Peniche, na data da abertura de um determinado procedimento) - não se justifica a admissão da revista. Na verdade, o que em boa verdade está em discussão é apreciação de uma concreta situação de factos instrumentais, dos quais se pode concluir, ou não, naquele caso concreto, pela residência habitual da contra - interessada num dado concelho. Não estamos assim perante questões com interesse jurídico que extravase o âmbito do caso concreto.

Por outro lado, as questões que o recorrente suscita, no recurso, foram amplamente discutidas em vários tribunais, incluindo os Tribunais Judiciais, de primeira e segunda instância.

Todos decidiram no mesmo sentido.

O argumento que o recorrente continua a dar grande destaque e que assenta na existência de um “atestado de não residência” emitido em 31-7-2002, foi devidamente ponderado e desvalorizado como meio de prova. Mais: o acórdão recorrido – a este propósito – recorda que o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 28-3-2006, face aos elementos disponíveis nos autos - concretamente a documentação junta pela interessada – referiu que “(…) poderiam até justificar que fosse questionado se não serão mais fortes os indícios de falsidade no atestado de 31-7-2002”. Ou seja, depois de quatro Tribunais terem apreciado exaustivamente as questões objecto do recurso, todos no mesmo sentido, é patente que a decisão não enferma de erro manifesto ou grosseiro a justificar a intervenção deste STA com vista a uma melhor interpretação e aplicação do direito.

Não se justifica, assim, a admissão da revista.

4. Decisão

Face ao exposto não se admite a revista.

Custas pelo recorrente.

Porto, 21 de Setembro de 2018. – São Pedro (relator) – Costa Reis – Madeira dos Santos.