Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0693/15
Data do Acordão:07/01/2015
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:IDONEIDADE DA GARANTIA
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO FISCAL
Sumário:O art. n.º 2 do art. 199.º do CPPT confere à administração uma certa margem de discricionariedade para decidir, em função de cada caso concreto, se a garantia prestada é ou não «idónea» para assegurar a cobrança efectiva da dívida exequenda, sendo que, para efeito do disposto no dito normativo, bem como no art. 169º do CPPT, garantia idónea será aquela que é adequada para o fim em vista, ou seja, assegurar o pagamento totalidade do crédito exequendo e legais acréscimos.
Nº Convencional:JSTA000P19245
Nº do Documento:SA2201507010693
Data de Entrada:06/01/2015
Recorrente:A.....................
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

RELATÓRIO
1.1. A…………….., com os demais sinais dos autos, recorre da sentença que, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, julgou improcedente a reclamação deduzida nos termos do artigo 276º do CPPT contra o despacho que indeferiu o pedido de suspensão do processo de execução fiscal n.º 1430201201020730, que corre termos no Serviço de Finanças de Peniche para cobrança de dívida de IRS do ano de 2008.

1.2. Termina as alegações formulando as conclusões seguintes:
I - Ao confirmar o indeferimento do requerimento da recorrente, de 22 de Outubro de 2014, no sentido de que fosse declarada a suspensão da execução, o Tribunal a quo procedeu a uma errada interpretação e aplicação do Direito, nomeadamente da norma constante do nº 1, do art. 169º do CPPT.
Uma vez que,
II - A recorrente, em 12/12/2012, deduziu impugnação judicial, tendo por objecto a ilegalidade da dívida exequenda.
E,
III - O efeito suspensivo da execução decorre, desde logo, da circunstância de ter sido deduzida impugnação judicial da dívida exequenda, quando está em causa a sua ilegalidade.
Acresce que,
IV - O regime da suspensão da execução opera “ope legis”.
V - O prosseguimento da execução implicaria para a recorrente prejuízos irreparáveis, que não correspondem aos encargos e prejuízos que decorrem para um executado, no âmbito de uma acção executiva, e que lhe são inerentes.
VI – Na situação em apreço verificam-se os pressupostos de que a lei faz depender a atribuição de efeito suspensivo à reclamação, atento o carácter irreversível das consequências que adviriam para a recorrente do comportamento ilegal do recorrido, consubstanciado no indeferimento da declaração da suspensão da execução.
VII – A douta decisão recorrenda é ilegal, por manifesta violação do disposto, nomeadamente, no nº 1, do art. 169º e n.ºs 1 e 3, do art. 278º, ambos do CPPT.
Termina pedindo a revogação da decisão recorrida.

1.3. Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4. Tendo o recurso sido interposto para o TCA Sul, aquele Tribunal veio, por decisão da respectiva Relatora de 27/04/2015 (fls. 139/144), a declarar-se incompetente, em razão da hierarquia, para dele conhecer, por versar apenas matéria de direito, declarando, consequentemente, a competência deste STA.

1.5. O MP emite parecer nos termos seguintes:
« A……………… recorre da sentença do TAF de Leiria de 13.01.2015 que julgou improcedente a reclamação do despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Peniche de 23.10.2014 que indeferiu o pedido de suspensão da execução fiscal n.º 1330201201201020730.
Sustenta nas “Conclusões” da sua “Alegação de Recurso” que na situação em apreço se verificam os pressupostos de que a lei faz depender a atribuição de efeito suspensivo à execução e que a decisão recorrida viola o disposto no n.º 1 do art. 169.º e n.os 1 e 3 do art. 278.º ambos do CPPT.
Vejamos:
Instaurada execução fiscal a mesma suspender-se-á, nos termos previstos no art. 169.º n.º 1 do CPPT, se for constituída ou prestada garantia ou a penhora garanta a totalidade da dívida e do acrescido.
Como deflui do art. 199.º n.º 1 do CPPT e vem sendo jurisprudência constante deste Supremo Tribunal, a idoneidade da garantia afere-se pela capacidade de que a mesma se reveste para assegurar o pagamento da dívida exequenda e do acrescido o que implica que o meio oferecido seja apto, sólido e suficiente para essa finalidade. Para esses efeitos, a penhora vale como garantia (n.º 4 do mesmo preceito).
O indeferimento reclamado fundou-se na insuficiência do bem penhorado para assegurar a efectiva cobrança do crédito exequendo. Para assim decidir a AT teve em conta, para além do montante da dívida exequenda, os ónus que impendiam sobre o imóvel penhorado, datas de registo e montantes garantidos e, como termo de comparação, o VTP actual do imóvel.
O valor patrimonial tributário dos imóveis, apurado nos termos do CIMI, é o valor que é tido em conta na fixação do valor base para a venda em processo de execução fiscal (artº 250º nº 1 e 4 do CPPT). E, embora não seja disso que trata o caso vertente e seja certo que, em regra, o valor patrimonial não é coincidente com o valor de mercado, não pode aquele valor deixar de ser um elemento de referência, a par de outros, na ponderação da suficiência da garantia prestada ou da penhora efectuada para assegurar a totalidade da quantia exequenda e do acrescido. Nada pode garantir, na verdade, que na eventual venda executiva o imóvel penhorado venha a ser vendido por um valor superior ao VPT inscrito na matriz. Para mais trata-se, no caso em apreço, de um prédio de recente inscrição matricial (cfr. alínea C do probatório). Elemento relevante na ponderação da suficiência da garantia prestada ou da penhora efectuada serão os ónus e encargos que porventura impendam sobre o bem em questão e quanto a esse aspecto o que resulta da alínea E do probatório é que sobre o imóvel em causa impendem duas hipotecas a favor da ………………., registadas em data anterior à penhora, garantindo um montante global de €273.600,00, valor que é superior ao dobro do valor patrimonial do imóvel.
Ora, tendo em conta que os créditos referentes a IRS não preferem, na respectiva graduação, aos créditos garantidos por hipoteca (art. 111.º do CIRS e art. 686º nº 1 do C. Civil) ((1) Cfr. Declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, por violação do artigo 2º da Constituição, da norma do art. 104 do CIRS (art. 111.º na actual redacção), na interpretação segundo a qual o privilégio imobiliário geral nele conferido à Fazenda Pública prefere à hipoteca, nos termos do artigo 751º do Código Civil.), mandará a lógica que se conclua como no despacho reclamado “que o bem penhorado em caso de necessidade de o executar não assegura a efectiva cobrança dos créditos (que) a penhora pretende garantir”.
Neste contexto, como bem se refere na sentença recorrida, “a Reclamante só poderia obter a suspensão do processo de execução através da prestação de outra garantia idónea (designadamente, requerendo a substituição da referida garantia por outra de valor suficiente para pagamento da quantia exequenda e do acrescido, ao abrigo do art. 52.º, n.º 7 da Lei Geral Tributária) ou requerendo a isenção da prestação de garantia, à luz do n.º 4 do mesmo artigo”.
Sendo certo que o regime da suspensão da execução opera ope legis, não tendo a decisão do OEF efeito constitutivo, mas antes eficácia meramente declarativa, tal só ocorre se preenchidos os respectivos pressupostos legais e, no caso vertente, tal não se verifica.
Não merece, pois, censura a sentença recorrida, não se vislumbrando, face à tramitação do processo, qual o alcance da alegada violação dos n.os 1 e 3 do art. 278.º do CPPT.
Deverá, por isso, salvo melhor entendimento, ser negado provimento ao presente recurso e, em consequência, ser mantida a sentença recorrida.
É o meu parecer.»

1.6. Com dispensa de vistos, dada a natureza urgente do processo, cabe apreciar.

FUNDAMENTOS
2. Na sentença recorrida julgaram-se provados os factos seguintes:
A. Corre termos contra a aqui Reclamante, A…………., o processo de execução fiscal com o n.º 1430201201020730, proveniente de IRS, no valor total de € 23.348,94 - cfr. documentos de fls. 1 a 3 do processo de execução fiscal (PEF) junto aos autos;
B. Em 12.12.2012, a Reclamante apresentou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria processo de impugnação judicial, que corre termos sob o n.º 1466/12.1BELRA, que tem por objecto a legalidade da dívida exequenda (facto não controvertido; consulta plataforma sitaf);
C. Em 13.01.2014, foi penhorado, no âmbito do processo de execução fiscal referido na alínea A. supra, pelo Serviço de Finanças de Peniche, o prédio urbano sito na Rua …………, n.º .., ………, correspondente ao artigo 4040 da dita freguesia, concelho de ………., inscrito na matriz em 2011, com o valor patrimonial actual de € 114.240,00 - cfr. documento a fls. 10 do PEF;
D. Em 07.02.2014, foi registada na Conservatória do Registo Civil, Predial, Comercial e de Automóveis de ………. a penhora a favor da Fazenda Nacional, pelo valor de €20.540,32 - cfr. certidão permanente a fls. 17e 18 do PEF, que se dá por reproduzida;
E. Incidem também sobre o imóvel indicado na alínea B. supra os seguintes ónus registados anteriormente à penhora referida na alínea antecedente:
i. Hipoteca Voluntária constituída a favor da ……………, com o montante máximo assegurado de € 197.600,00;
ii. Hipoteca voluntária a favor da ..................., com o montante máximo assegurado de € 76.000,00 - cfr. certidão permanente, a fls. 17 e 18 do PEF;
F. Em 22.10.2014, a Reclamante apresentou um requerimento junto do Serviço de Finanças de Peniche pedindo a suspensão do processo de execução fiscal referido em A. com fundamento no disposto no art. 169.º, n.º 1 do CPPT, “uma vez que se encontra pendente impugnação judicial que tem por objecto a legalidade da dívida exequenda, e se encontra penhorado no âmbito dos mesmos autos bem imóvel de valor suficiente para garantir o pagamento da dívida exequenda e demais encargos” - cfr. fls. 53 dos autos, que se dá por reproduzida;
G. O requerimento referido na alínea antecedente foi indeferido por despacho de 23.10.2014 da Chefe do Serviço de Finanças de Peniche com os seguintes fundamentos: “(...) Reportando-se a quantia exequenda a IRS do ano de 2008 (...) e considerando os ónus registados a favor de terceiros e respectivos montantes e datas de registo, os quais ascendem ao capital máximo assegurado de € 272.600,00 e considerando o valor patrimonial actual da coisa penhorada (€114.240,00) concluímos que o bem penhorado em caso de necessidade de o executar não assegura a efetiva cobrança dos créditos cuja penhora pretende garantir.
Por outro lado, tendo em vista a suspensão da execução, o bem penhorado deveria garantir a importância de € 23.066,27 (n.º 5 do art. 199º do CPPT) o que, considerando o valor do bem penhorado líquido dos ónus (hipotecas) registados a favor de terceiros, tal montante não se mostra minimamente garantido.
Nesse sentido, uma vez que não se mostram observados os requisitos previstos na parte final do nº 1 do art. 169º, nºs 4 e 5 do artigo 199º, todos do CPPT, indefiro o pedido de suspensão da execução (...) devendo os autos prosseguir seus termos (...).”
- cfr. fls. 60 e 61 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido;
H. A importância em dívida, à data, ascende a €18.453,02 - cfr. informação oficial a fls. 60 dos autos.

3.1. Refira-se, antes de mais, que tendo o recurso sido inicialmente interposto para o TCA Sul e tendo ali sido declarada a respectiva incompetência, em razão da hierarquia, para conhecer do recurso, considerando competente o STA, dado estar em causa apenas matéria de direito, também aqui se entende que, na perspectiva considerada pelo TCAS, o recurso tem por exclusivo objecto matéria de direito (nº 1 do art. 280º do CPPT), sendo que as partes não contestam os factos constantes do probatório, divergindo apenas quanto à interpretação das regras jurídicas aplicáveis.

3.2. O recurso respeita a reclamação instaurada, nos termos do disposto no art. 276º do CPPT, na sequência do despacho proferido pelo OEF em 23/10/2014, que indeferiu o pedido de suspensão da execução fiscal, formulado pela executada na sequência da penhora do imóvel identificado na al. c) do Probatório e da dedução de impugnação judicial contra a liquidação (IRS) subjacente à dívida exequenda.
O pedido de suspensão do processo de execução fundamenta-se em que se encontra pendente a mencionada impugnação judicial que tem por objecto a legalidade da dívida exequenda e se encontra penhorado um bem imóvel de valor suficiente para garantir o pagamento da dívida exequenda e demais encargos.
E enunciando como questão a decidir a de saber se o acto reclamado sofre de vício de violação de lei em virtude de, na sequência da dedução de impugnação judicial, não ter sido suspenso o processo de execução fiscal após a penhora realizada pelo OEF, a sentença recorrida julgou improcedente a reclamação considerando, em síntese, o seguinte:
─ De acordo com o regime que que resulta do disposto nos arts. 52.º da LGT e 169.º do CPPT, a apresentação de garantia idónea ou a realização de penhora de valor suficiente para assegurar o crédito tributário é condição indispensável para a suspensão de processo de execução fiscal.
─ No caso, sobre o bem imóvel penhorado impendem dois ónus com prioridade de registo face à penhora registada a favor da Fazenda Pública, de valor muito superior ao VPT actual do imóvel, o que faz com que o seu valor económico seja reduzido.
─ Por isso, a reclamante só poderia obter a suspensão do processo execução através da prestação de outra garantia idónea (designadamente, requerendo a substituição da referida garantia por outra de valor suficiente para pagamento da quantia exequenda e do acrescido, ao abrigo do disposto no art. 52.º, n.º 7 da LGT) ou requerendo a isenção de prestação de garantia, à luz do previsto no n.º 4 do mesmo artigo. Todavia a reclamante não alega, nem demonstra, que tenha apresentado requerimento nesse sentido, pelo que, assim sendo, não estão reunidos os requisitos exigidos pelas citadas normas legais para que a AT possa proceder à suspensão do processo de execução fiscal.
E a discordância da recorrente com o assim decidido assenta, como se viu, numa errada interpretação do nº 1 do art. 169º do CPPT: no entendimento da recorrente, o efeito suspensivo da execução decorre quer da circunstância de ter sido deduzida impugnação judicial da dívida exequenda, sendo que o regime da suspensão da execução opera “ope legis”, quer da circunstância de o prosseguimento da execução implicar para a recorrente prejuízos irreparáveis que não correspondem aos encargos e prejuízos a suportar pelo executado, inerentes a qualquer acção executiva.
Esta é, portanto, a questão a apreciar.
Vejamos.

4.1. Sob a epígrafe «Suspensão da execução. Garantias», dispõe-se no art. 169º do CPPT (redacção em vigor):
«1 - A execução fica suspensa até à decisão do pleito em caso de reclamação graciosa, (a) impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objecto a legalidade da dívida exequenda (…) desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195.º ou prestada nos termos do artigo 199.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, o que será informado no processo pelo funcionário competente.
(…)
6 - Se não houver garantia constituída ou prestada, nem penhora, ou os bens penhorados não garantirem a dívida exequenda e acrescido, é disponibilizado no portal das finanças na Internet, mediante acesso restrito ao executado, ou através do órgão da execução fiscal, a informação relativa aos montantes da dívida exequenda e acrescido, bem como da garantia a prestar, apenas se suspendendo a execução quando da sua efectiva prestação.
7 - Caso no prazo de 15 dias, a contar da apresentação de qualquer dos meios de reacção previstos neste artigo, não tenha sido apresentada garantia idónea ou requerida a sua dispensa, procede-se de imediato à penhora.
8 - Quando a garantia constituída nos termos do artigo 195.º, ou prestada nos termos do artigo 199.º, se tornar insuficiente é ordenada a notificação do executado dessa insuficiência e da obrigação de reforço ou prestação de nova garantia idónea no prazo de 15 dias, sob pena de ser levantada a suspensão da execução.
(…)».

4.2. Por sua vez, no art. 199.º do mesmo CPPT, sob a epígrafe «Garantias», dispõe-se o seguinte:
«1 - Caso não se encontre já constituída garantia, com o pedido deverá o executado oferecer garantia idónea, a qual consistirá em garantia bancária, caução, seguro-caução ou qualquer meio susceptível de assegurar os créditos do exequente.
2 - A garantia idónea referida no número anterior poderá consistir, ainda, a requerimento do executado e mediante concordância da administração tributária, em penhor ou hipoteca voluntária, aplicando-se o disposto no artigo 195.º, com as necessárias adaptações.
(…)
5 - No caso de a garantia apresentada se tornar insuficiente, a mesma deve ser reforçada nos termos das normas previstas neste artigo.
(…)
10 - Em caso de diminuição significativa do valor dos bens que constituem a garantia, o órgão da execução fiscal ordena ao executado que a reforce ou preste nova garantia idónea no prazo de 15 dias, com a cominação prevista no n.º 8 deste artigo.
(…)».

4.3. A lei confere, pois, à AT uma certa margem de discricionariedade para decidir, em função de cada caso concreto, se a garantia prestada é ou não «idónea» para assegurar a cobrança efectiva da dívida exequenda, impondo-se, especificamente, nos casos da hipoteca voluntária e do penhor, a concordância da mesma AT.
E não obstante a expressão “garantia idónea” se configure como conceito a carecer de densificação, resulta, ainda assim, da conjugação do disposto nos ditos arts. 169º e 199º do CPPT que a idoneidade da garantia se afere pela capacidade de, em caso de incumprimento do devedor, salvaguardar a efectiva cobrança da dívida exequenda e acrescidos.
Na verdade, como se pondera no acórdão desta Secção, de 15/2/2012, proc. n.º 0126/12, «Na execução fiscal confluem dois interesses conflituantes: o da administração fiscal na realização da cobrança célere dos seus créditos e o direito do executado em discutir a legalidade da dívida exequenda. Dando prevalência ao primeiro, a lei faz depender a suspensão da execução da prestação de garantia idónea, que cubra a totalidade da dívida exequenda. O que significa que a garantia há-de ser adequada a satisfazer o interesse da exequente, mas sem onerar ou afectar de forma grave os interesses legítimos do executado. (…)
Assim se compreende que legislador tenha consagrado no art. 199º do CPPT um conceito amplo de garantia idónea, com vista a acautelar a maior ou menor dificuldade para o executado em conseguir, sem onerar excessivamente a sua situação, apresentar garantia adequada a suspender a execução. E, no mesmo sentido, se deve entender o facto de não se estabelecer nenhuma preferência ou qualquer graduação das garantias, em conformidade com a sua maior ou menor eficácia resultante da maior ou menor liquidez imediata.
Em conformidade com a melhor doutrina, diz-se que na lei processual fiscal vigora como que “um princípio geral da equivalência da caução, penhora e outras garantias idóneas, como a hipoteca (uma vez que, na presença de qualquer uma delas, a execução se suspende até decisão da oposição deduzida), devendo ser aceite pelo órgão exequente aquela que, sem prejuízo do credor, melhor sirva os interesses do executado” (Neste sentido, cfr. RUI DUARTE MORAIS, A Execução Fiscal, 2ª ed., Almedina, Coimbra, 2006, p.78.). No mesmo sentido, estando em causa um pedido de substituição de bens penhorados por garantia bancária, no Acórdão deste Supremo Tribunal, de 7/12/2011, proc. nº 1006/11, ficou consignado que tal substituição seria admissível, ponto é que “a garantia cubra a totalidade do crédito exequendo e acrescido, atenta a previsível duração do processo, pois apenas a garantia da totalidade da dívida exequenda controvertida e acrescido garantem a suspensão da execução até à decisão do pleito”.
Considerando o exposto, podemos extrair desde já uma ilação no sentido de que, quando o nº 5 do art. 52º da LGT permite, ainda que a título excepcional, a substituição de uma garantia por outra, essa substituição há-de abranger qualquer das garantias previstas no art. 199º do CPPT, porque todas são consideradas idóneas pela lei.
Por outro lado, do exposto resulta igualmente que o prejuízo para o credor na substituição não pode alicerçar-se na melhor ou menor qualidade ou eficácia das garantias em causa.
(…) … o objectivo do legislador não é dotar a Administração fiscal de garantia absoluta do seu crédito, tanto mais que o mesmo é ainda incerto, mas tão-só de “garantia idónea”, que o mesmo é dizer adequada ao fim em vista».(Cfr. também no mesmo sentido, entre outros, os acs. desta secção do STA, de 30/1/2013, proc. n.º 034/13; de 21/9/2011, proc. n.º 0786/11; de 11/7/2012, proc. n.º 730/12; e de 10/10/2012, proc. n.º 0916/12; bem como, Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário - anotado e comentado, 6ª ed., Áreas Editora, Volume III, anotação 2 ao art. 199º, pp. 411/412.)
Ora, no caso vertente, o despacho de indeferimento que foi objecto da reclamação fundou-se na insuficiência do bem penhorado para assegurar a efectiva cobrança do crédito exequendo: o OEF conclui que o imóvel penhorado não assegura (caso haja necessidade de proceder à respectiva venda) a efectiva cobrança dos créditos que a penhora pretende garantir, dado que tal bem deverá garantir a importância de 23.066,27 Euros mas, considerando, por um lado, os ónus registados a favor de terceiros, os respectivos montantes (que ascendem ao capital máximo assegurado de 272.600,00 Euros) e as datas de registo e considerando, por outro lado, o valor patrimonial actual do imóvel (114.240,00 Euros), então, atendendo ao valor do mesmo, líquido dos ónus (hipotecas) registados a favor de terceiros, aquele montante de 23.066,27 Euros não se mostra garantido.
A esta conclusão a recorrente contrapõe, como se viu, que o efeito suspensivo da execução opera “ope legis” e decorre desde logo de ter sido deduzida a impugnação judicial da dívida exequenda e de o prosseguimento da execução implicar prejuízos irreparáveis que não correspondem aos encargos e prejuízos a suportar pelo executado, inerentes a qualquer acção executiva.
Carece, porém, de razão legal.

4.4. Não sofre dúvida que a suspensão da execução ocorre por força da lei e que, por conseguinte, o despacho que porventura a declare não tem efeito constitutivo mas antes eficácia meramente declarativa, retroagindo os seus efeitos à data da verificação dos pressupostos legais determinantes daquela suspensão (cfr. os acs. desta Secção do STA, de 5/8/2009 e de 16/11/2011, nos procs. n.ºs 0693/09 e 0977/11, respectivamente).
Mas é, precisamente, com referência à verificação de tais pressupostos que, no caso vertente, a questão se coloca, pois que no reclamado despacho de indeferimento do pedido de suspensão da execução se considera que com a penhora do imóvel questionado (enquanto garantia) não está garantida a dívida exequenda, atendendo ao valor patrimonial actual do bem penhorado e aos ónus reais que sobre ele impendem.
Ora se, por um lado, o valor patrimonial tributário dos imóveis (VPT), apurado nos termos do CIMI, é o valor que é tido em conta na fixação do valor base para a venda em processo de execução fiscal (cfr. n.ºs 1 e 4 do art. 250º do CPPT), então, esse valor (ainda que possa não ser totalmente coincidente com o valor de mercado - questão que, no caso, nem sequer se coloca) não pode deixar de ser, como aponta o MP, um elemento de referência, a par de outros, na ponderação da suficiência da garantia prestada ou da penhora efectuada para assegurar a totalidade da quantia exequenda e do acrescido: na verdade, nada pode garantir que na eventual venda executiva, a ocorrer, o imóvel penhorado venha a ser vendido por um valor superior ao VPT inscrito na matriz, tanto mais que, no caso concreto, se trata de um prédio de recente inscrição matricial [cfr. alínea C) do Probatório].
E, assim sendo, a existência dos provados ónus e encargos que impendem sobre o bem em causa, não pode deixar de ser um elemento relevante para a ponderação da suficiência da garantia prestada ou da penhora efectuada. Ou seja, estando a idoneidade da garantia dependente da possibilidade de o credor tributário assegurar o seu crédito através da execução desta, a determinação de tal impossibilidade, no caso, é suficiente para considerar como inidónea a garantia oferecida pela reclamante, considerando que relativamente ao imóvel penhorado, estão registadas, em data anterior à penhora [cfr. al. E) do Probatório], duas hipotecas a favor da ……………….., para garantia de um montante global de 273.600,00 Euros (valor que é superior ao dobro do valor patrimonial do imóvel) e considerando que os créditos referentes a IRS não preferem, na respectiva graduação, aos créditos garantidos por hipoteca,(Face ao disposto no n.º 1 do art. 686º do CCivil e à declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, do anterior art. 104.º do CIRS (a que corresponde o actual art. 111.º) na interpretação segundo a qual o privilégio imobiliário geral nele conferido à Fazenda Pública prefere à hipoteca, nos termos do artigo 751º do CCivil.) então não se verificam os pressupostos legais para a pretendida suspensão da execução. Como se diz na sentença, a reclamante só poderia, pois, «… obter a suspensão do processo de execução através da prestação de outra garantia idónea (designadamente, requerendo a substituição da referida garantia por outra de valor suficiente para pagamento da quantia exequenda e do acrescido, ao abrigo do art. 52.º, n.º 7 da Lei Geral Tributária) ou requerendo a isenção da prestação de garantia, à luz do n.º 4 do mesmo artigo».
Em suma, a sentença recorrida decidiu de acordo com a lei aplicável, não sofrendo do erro de julgamento que a recorrente lhe imputa, por errada interpretação e consequente violação do disposto no n.º 1 do art. 169.º e dos n.ºs 1 e 3 do art. 278º, ambos do CPPT.

DECISÃO
Nestes termos, acorda-se em, negando provimento ao recurso, confirmar a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
Lisboa, 1 de Julho de 2015.- Casimiro Gonçalves (relator) – Francisco RothesAragão Seia.