Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0267/16
Data do Acordão:10/13/2016
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:COSTA REIS
Descritores:AUDIÊNCIA PRÉVIA
BAR
REGULAMENTO DO RUÍDO
ESTABELECIMENTO COMERCIAL
HORÁRIO DE FUNCIONAMENTO
Sumário:I - O cumprimento da formalidade imposta pelo art.º 100.º/1 do CPA não se consuma apenas com uma notificação escrita, formal, do interessado informando-o do sentido da decisão a tomar e de que, querendo, se poderá pronunciar sobre a mesma.
II - E isto porque o que ele exige é que o interessado seja ouvido no procedimento sobre o sentido da decisão a proferir sem estabelecer a forma que essa comunicação deve obedecer. Isto é, o que aquela norma impõe é que, antecipadamente à prolação do acto, se comunique ao interessado o sentido da decisão e se lhe permita argumentar contra ele e sugerir coisa diferente.
III - Deste modo, se a Autora participou na reunião que antecedeu a prolação do acto impugnado e aí teve a possibilidade para se lhe opor e para argumentar contra a sua imediata eficácia a mesma não foi surpreendida pelo acto impugnado já que lhe foi dada a oportunidade de se pronunciar sobre ele.
IV - As Câmaras Municipais têm não só uma importante função fiscalizadora na prevenção do ruído como a obrigação de tomar medidas correctivas quando o mesmo atinja os direitos de terceiros.
V - Assim, tendo a Câmara constatado que o funcionamento de um Bar suscitava protestos por causa do ruído nele provocado e/ou por causa dos crimes que nele, eventualmente, se praticavam, cabe-lhe tomar as medidas correctivas indispensáveis sem necessidade de, nos termos do disposto no DL 48/96, ouvir as entidades a que se refere o seu art.º 3.º/a).
Nº Convencional:JSTA00069851
Nº do Documento:SA1201610130267
Data de Entrada:04/22/2016
Recorrente:MUNICÍPIO DE GUIMARÃES
Recorrido 1:A... E OUTROS
Votação:MAIORIA COM 1 VOT VENC
Meio Processual:REC REVISTA EXCEPC.
Objecto:AC TCAN.
Decisão:PROVIDO.
Área Temática 1:DIR ADM CONT - ACÇÃO ADM ESPECIAL.
Legislação Nacional:CPA91 ART100 N1 ART103 N2.
DL 48/96 DE 1996/05/15 ART3 A.
CONST76 ART67 N1 N2 E.
DL 9/2007 DE 2007/01/07 ART4 N1 N3 ART13 ART14 N1.
Aditamento:
Texto Integral: ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA:

A…………….. intentou, no TAF de Braga, acção administrativa especial, contra o Município de Guimarães pedindo (1) a anulação do despacho, de 3/10/2008, do Vereador da sua Câmara Municipal que alterou o horário de funcionamento do estabelecimento comercial denominado “………..”, de que é proprietária, restringindo o seu encerramento para as 22 horas e (2) a condenação do Réu a reconhecer que tinha o direito de o encerrar às 2 horas.
Em resumo, alegou que o mesmo estava inquinado por vícios de forma - não estava fundamentado e fora proferido sem que, previamente, lhe fosse concedido o direito de audiência - e de violação de lei - infracção ao disposto na al.ª a) do art. 3° do Decreto-Lei n° 48/96, de 15/05.

O TAF julgou a acção procedente e anulou o acto impugnado por ter entendido que este incumprira o disposto no art.º 100.º do CPA e violara o estatuído no art.º 3.º/a) do DL 48/96.
Decisão que o TCA Norte confirmou.

É desse Acórdão que vem a presente revista, interposta pelo Município de Guimarães, onde se formularam as seguintes conclusões:
1. Vem o presente recurso interposto do acórdão que manteve a sentença da 1ª instância que julgou procedente a acção administrativa especial procedente anulando-se o acto administrativo de restrição do bar da A, tendo em conta que se considerou que não foi realizada a audiência prévia e que deveriam ter sido ouvidos os sindicatos, associações patronais e de consumidores em momento anterior à decisão.
2. É entendimento do recorrente que, tendo em conta o circunstancialismo factual envolvente, não havia lugar a audiência prévia uma vez que era urgente a prolação do acto administrativo, tal como não havia lugar à audição dos sindicatos, associações patronais e de consumidores, tendo em conta que a lei deve ser interpretada no sentido de que estas entidades apenas devem ser ouvidas no quadro da preparação e elaboração dos regulamentos municipais.
3. Defende-se no acórdão recorrido, tal como no acórdão da 1ª instância que não existia qualquer urgência na decisão, tendo em conta que o Município já tinha conhecimento da situação desde Março de 2006.
4. Ora, a primeira queixa apresentada relativa ao funcionamento do ………. data de Março de 2006, sendo que, outras se seguiram apresentadas por vizinhos do bar da A. e ainda da Junta de Freguesia de ………….., como se pode constatar do PA e dos factos supra enunciados de 1 a 12.
5. No entanto, as decisões camarárias não se podem basear apenas em desabafos, reclamações mais ou menos findadas de vizinhos quanto ao encerramento de um determinado estabelecimento fora de horas, que podem muito bem ser fundados em má disposição dos reclamantes ou até má vontade dos mesmos contra o dono do estabelecimento ou contra os clientes que o frequentam.
6. O que determinou a situação de urgência alegada no ato administrativo e na contestação do Réu Município foi a comunicação do Comandante do Posto da Guarda Nacional Republicana de Guimarães que afirmava que nesse bar se traficavam estupefacientes - que apesar de datada de 13 de Agosto de 2008, como consta dos factos assentes, deu entrada nos serviços do Réu Município no dia 4 de Setembro de 2008 - cfr. fls. 42 a 44 do PA.
7. Os factos narrados nesse comunicado da GNR que, volta-se a sublinhar, chegaram ao conhecimento do Réu Município em 4 de Setembro de 2008, determinaram que o Réu Município realizasse uma audiência com as presenças da Presidente da Junta de Freguesia de ……….., do Comandante do Posto da GNR e dos contra interessados no dia 10 de Setembro de 2008, conforme atesta a acta dessa reunião constante de fls. 45 e 46 do PA.
8. Nessa reunião foi decidido que se aguardasse que a Presidente da Junta de Freguesia fizesse chegar um documento ao Réu Município narrando as queixas recebidas e os factos que conhece, bem como, uma exposição dos moradores do prédio e prédios vizinhos, circunstanciando tanto quanto possível as queixas motivadas pelo estabelecimento.
9. Tal documento deu entrada nos serviços do Réu Município no dia 17 de Setembro de 2008, revelando-se a manutenção do barulho, sendo que no dia 24 do mesmo mês deu entrada novo abaixo-assinado dos vizinhos relativamente aos factos descritos na comunicação da GNR (cfr. fls. 47 a 50 do PA).
10. Estes factos e não as meras reclamações por parte dos vizinhos determinaram que o Réu Município considerasse urgente, em defesa do bem-estar e da saúde pública dos seus administrados, a tomada de medidas relativamente ao estabelecimento da Autora, tal como, aliás, decorre da acta da reunião de 10 de Setembro de 2008 (cfr. fls. 46 do PA), sendo que tais medidas, passariam, como foi sugerido pelo Comandante do posto da GNR, pela restrição do horário do estabelecimento da Autora.
11. Assim, é errado e redutor dizer-se que nenhuma urgência havia na prolação do acto administrativo em crise tendo em conta que as queixas de barulho já remontavam a Março de 2006, quando apenas em 4 de Setembro de 2008 foi comunicado ao Réu Município que, para além do barulho fora das horas normais de funcionamento do estabelecimento, ainda existia a notícia de que se praticava, no estabelecimento, o crime de tráfico de estupefacientes e a contra ordenação relativa ao consumo dos mesmos.
12. A urgência da decisão é aferida em relação à situação objectiva, real, que a decisão procedimental se destina a regular, não em relação à urgência procedimental, que esta (em regra, pelo menos) não justifica a preterição de formalidades essenciais do procedimento - cfr. Mário Esteves de Oliveira supra citado.
13. A urgência da resolução prevenida na al. a) do n° 1, dependerá como bem se compreende das circunstâncias do caso concreto e do específico interesse público em questão, já que em tese é urgente o que se torna inadiável - critério que, por si só e nestes termos utilizado, a nada servirá. - cfr José Luís Araújo e João Abreu Costa, in Código do Procedimento Administrativo Anotado, Vª edição, pg. 476.
14. Relembre-se que na comunicação apresentada pela GNR se afirmava que o explorador do Bar era conivente com a prática dos actos ilícitos acima referidos, o que por si só configura a prática de um crime previsto no art.° 30°, n° 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22/01.
15. Por outro lado, tendo em conta que, nos termos do disposto no art.° 30°, nºs 3, 4 e 5 do Dec.-Lei n.º 15/93, de 22/01 a apreensão de substâncias ilícitas num determinado estabelecimento comercial determina o seu encerramento, deve-se considerar que, tendo em conta o circunstancialismo decorrente da questão discutida nos autos, designadamente o barulho produzido pelo estabelecimento para além do horário normal do seu funcionamento, os rumores de que nesse estabelecimento se praticava o tráfico e o consumo de substâncias estupefacientes, a comunicação da GNR de que o explorador era conivente com tais práticas e a apreensão de 40 gramas de haxixe a um cliente desse estabelecimento quando este se encontrava no mesmo, torna a decisão do Município Réu justa, adequada e proporcional ao circunstancialismo apurado.
16. As circunstâncias que determinaram a prolação do acto administrativo devem ser encaradas como circunstâncias que tomaram a decisão em causa urgente, nos termos do art.° 103º, n.º 1, al. a) do CPA, pelo que não havia lugar a audiência prévia.
17. Mas, mesmo que assim não se entendesse foi realizada uma audiência oral prévia realizada na reunião de 02.10.2008 na sede do Município Réu, na qual já se dizia «Foi recordado uma intervenção inicial em Abril de 2007 pelo Sr. Comandante do Posto da GNR ao explorador do Bar para um conjunto de práticas ilícitas e geradoras de queixas dos moradores, como foi recordado que perante a indiferença e total continuação das mesmas actividades se tornou necessário realizar operação policial que aponta factos graves sendo certo que uma boa parte de registos de vária natureza nesse processo se encontram ainda em segredo de justiça», sendo que como se refere também nessa acta «trata-se de factos relacionados com o tráfico e consumo de estupefacientes praticados no estabelecimento sendo certo que ficou patente não haver de facto da parte do explorador do estabelecimento nem atitude nem convicção séria de que a resolução também passa ou passa principalmente pelas suas mãos».
18. Acresce que a A. demitiu-se de qualquer responsabilidade esquecendo que ruído produzido pelos seus clientes no exterior do café é potenciado pelo facto de servir bebidas depois do encerramento do mesmo, o que a A. expressamente confessa nos art.°s 44° e 45° da p.i..
19. Em face da factualidade vinda de expor revestia carácter urgente a restrição do horário de funcionamento do estabelecimento da R., a fim de terminar com a violação ilícita dos direitos de personalidade dos moradores do prédio onde se localiza o estabelecimento da A. e dos demais vizinhos e ainda limitar a acção do tráfico e dos traficantes, pelo que o R. se encontrava dispensado de realizar a audiência dos interessados nos termos do disposto no art.° 103° n.º 1 al. a) do CPA e artigo 68° n.º 3 da Lei n.º 169/99, de 18/09.
20. Ao contrário do que se diz no acórdão recorrido, a urgência do proferimento do acto administrativo está bem espelhada no mesmo, designadamente quando se diz que “porque a exploradora do estabelecimento não toma medidas que corrijam as situações que urge corrigir e na prossecução do interesse público que deve nortear a sua acção, cabe à edilidade adoptar procedimentos capazes de resolver o problema criado pelo ……….. de modo a assegurar um normal funcionamento e um equilíbrio salutar com o meio envolvente”.
21. A qualificação do acto administrativo como urgente é contemporânea do acto administrativo, neste vindo alegada, sendo que não tinha que ser alvo de acto administrativo avulso, mas sim de constar do próprio acto, como, aliás, se diz no acórdão citado no acórdão recorrido - Ac. STA proc. n° 04378, de 28/5/02.
22. Com efeito, “para que seja considerada dispensada a audiência de interessados não é essencial que o órgão instrutor tenha proferido uma declaração fundamentada no decurso do procedimento. O importante e relevante, nestes casos, é que a situação objectiva determinativa quer da dispensa, quer da inexistência da audiência de interessados (v.g. a urgência) tenha correspondência com a realidade.” (cfr. acórdão STA de 14/5/1998 proferido no proc. n°41737).
23. De qualquer forma, o R. teve o cuidado de fazer a audiência dos interessados: em primeiro lugar com os contra interessados em 10 de Setembro de 2008 (cfr. fls. 45 e 46 do Procedimento Administrativo); e depois com os interessados no dia 2 de Outubro de 2008 (cfr. fls. 57 a 59 do Procedimento Administrativo).
24. Assim, o R. ouviu previamente a A. que optou por dizer que nada podia fazer para alterar a situação, não requereu prazo para alegar, nem sequer solicitou que se realizasse qualquer diligência probatória, como, aliás, (não) consta da ata da audiência de interessados, ou seja, optou por não contribuir para a decisão administrativa.
25. No entanto, a constatação de ter sido praticado um acto administrativo com preterição de alguma formalidade não tem como efeito automático a anulação desse ato.
26. Pode-se concluir que tal efeito invalidante só será de atribuir ao ato cuja formalidade foi preterida se dessa preterição tenha resultado uma efectiva e real lesão dos interesses ou valores protegidos pelo preceito violado, pelo que se, não obstante tal preterição se vier a atingir o resultado que com ela se pretendia alcançar, então o vício de forma não terá efeitos invalidantes.
27. Assim, tendo em conta o supra exposto e que não só a Autora se eximiu de qualquer responsabilidade, como não adiantou qualquer facto ou argumento que não fosse de natureza meramente pessoal para criticar e ver revogado o ato administrativo em causa (o que aconteceu não só na reunião de 02.10.2008 como também na petição inicial dada aos autos), tendo em conta que pretendia defender interesses supra individuais, colectivos, de defesa do bem-estar, do sossego e da saúde pública dos administrados, ao alegadamente preterir tal formalidade, não deveria ser considerado inválido (neste sentido, o acórdão do STA de 01/7/03, publicado in www.dgsi.pt relatado por São Pedro e o acórdão do STA de 29/6/06 proferido no Proc. n° 0816/2005 supra citados).
28. Acrescente-se que a jurisprudência, ao contrário do entendimento sufragado pelo tribunal a quo, tem entendido que o princípio do aproveitamento do ato administrativo se aplica mesmo no exercício de um poder discricionário (cfr. o acórdão do Acórdão TCA de 22.06.2001 proferido no proc. n° 00462/2000).
SEM PRESCINDIR,
29. A norma do art.° 3º al. a) do DL 48/96 não pode ser lida desgarrada do diploma legal em que se insere, sendo que, por outro lado, o elemento histórico deve ter um pendor decisivo na interpretação da norma.
30. A audição das entidades referidas nessa norma tem um fundamento histórico e tem em vista «permitir-se às câmaras municipais maior flexibilização na definição e autorização dos períodos de abertura dos estabelecimentos, sob a óptica do interesse do consumidor» e isto porque «os órgãos autárquicos, pela sua proximidade das necessidades e do sentir das populações e pelo conhecimento da estrutura do comércio local, estão melhor posicionados para decidirem em matéria de horários de funcionamento dos estabelecimentos comerciais». (cf. preâmbulos do DL 417/83 e do DL. 86/95, respectivamente).
31. Esta audição visa a correcção de distorções de concorrência, na relação pequenas/médias empresas e grandes superfícies, uma política que prossiga a consolidação e fortalecimento das primeiras, fomento de postos de trabalho, preservação de hábitos de consumo adquiridos e satisfação das necessidades de abastecimento dos cidadãos.
32. Ora, nenhum dos fins da audição destas entidades apontado na lei é afectado directa ou indirectamente pela prática do acto administrativo em questão. Circunstância que, aliás, nem sequer se invoca na inicial.
33. Nem o podia ser, porquanto a audição das associações patronais, sindicais e de consumidores apenas faz sentido e se justifica quando seja aprovado ou esteja em vias de se aprovar um regulamento municipal sobre horários de funcionamento de estabelecimentos comerciais, nos termos do art.° 4° n°1 do DL 48/96 que restrinja ou alargue os limites horários fixados pelo art.° 1° do citado diploma legal.
34. Ou seja, tal audição deve ser efectuada quando a ampliação ou redução dos horários seja feita de forma genérica para todos os estabelecimentos comerciais ou para determinados tipos de estabelecimentos comerciais (ex: Bares, cafés, lojas de conveniência, etc.) e não quando ocorra em casos individualizados.
35. Aliás, historicamente assim acontecia já no DL 75-T/77, de 28/02, que previa no seu art.° 3° n.ºs 1 e 2 competia às câmaras municipais, ouvidas as associações de trabalhadores, de consumidores e patronais e os Ministérios do Comércio e Turismo e do Trabalho, fixar o período de abertura para cada um dos ramos de actividade, a vigorar em todas as épocas do ano ou apenas em épocas determinadas. Tal regime legal foi mantido no DL 417/83 de 25 de Novembro, sendo que do mesmo decorre que a audição das entidades aí referidas era necessária apenas quando se restringisse ou alargasse o horário estabelecido no art.° 1° para um conjunto de estabelecimentos.
36. Por outro lado, face aos limites permitidos pela Lei 48/96, no seu art.° 1°, ou seja, as 6.00h e as 24.00h, o recorrente veio a fixar o horário atrás referido - das 7 h às 22 h., restringindo, portanto, os limites legais (Anote-se que o estabelecimento da A. tinha um horário - 7h. às 2 h. - de 19 horas que ultrapassava em 1 hora o limite legal, sendo que abria uma hora mais tarde e fechava duas horas mais tarde do que o imposto legalmente).
37. A restrição de horário encontra-se devidamente fundamentada e prende-se com razões de segurança e protecção da qualidade de vida dos cidadãos, como acima se disse.
38. Por outro lado, como a A. bem sabe, o Regulamento Municipal de funcionamento dos estabelecimentos comerciais e de prestação de serviços no Município de Guimarães ao tempo em vigor, publicado através de Edital de 11 de Março de 1999, previa - como agora ainda prevê e se refere no acto administrativo impugnado - que “Sempre que os estabelecimentos se situem em edifícios de habitação, e por forma a salvaguardar o direito ao repouso dos moradores, só podem funcionar antes das 8 horas e para além das 22 horas desde que não haja oposição dos moradores.”
39. Ora, verificando-se a oposição dos moradores, como decorre abundantemente do PA, impunha-se a redução do horário de funcionamento do estabelecimento em causa.
40. Mesmo que assim não se entendesse, nenhum motivo existia para ouvir quaisquer sindicatos porque a A. não tem funcionários, sendo a própria A. defende em 22º e 23º da inicial que estas entidades não tinham de ser ouvidas.
41. Por outro lado, a audição de tais entidades, reduz-se a isso mesmo, uma mera audição não vinculativa na medida em que não tem que ser seguida ou perfilhada pelo órgão decisor, pelo que é formalidade não essencial à prática do acto administrativo e, como tal, a omissão de tal formalidade não tem cariz invalidante do acto administrativo.
42. Por fim dir-se-á que é irrefutável a superioridade dos direitos ao repouso, à tranquilidade da vida familiar, à segurança e à saúde, que consubstanciam direitos de personalidade consagrados na Lei Fundamental, pelo que deve ser revogado o acórdão recorrido e, em consequência, manter-se o acto administrativo posto em crise.
43. O acórdão recorrido violou ou fez errada aplicação das normas referidas nas alegações e, designadamente, do disposto nos art.°s 8°, 9°, 100º, 102° e 103° n°1 al. a) do Código de Procedimento Administrativo, 52°, 267° n°5 e 268° n°1 da Constituição, art.°s 1° e 3° do DL 48/96, art.°s 30° e 34° do DL 15/93, art.° 68° n°3 da Lei 169/99, art.° 8° do DL 252/92, art.°s 70° e 335° do Código Civil e do art.° 350 n°1 al. c) do DL 168/97, não podendo, assim, manter-se.

Não foram apresentadas contra alegações
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir


FUNDAMENTAÇÃO


I. MATÉRIA DE FACTO
A decisão recorrida julgou provados os seguintes factos:
A) A Autora, desde Março de 2007, explora o estabelecimento comercial de venda ao público de bebidas, denominado "……..", instalado na fracção autónoma designada pela letra "……..", sito na Rua de ………., freguesia de ……., concelho de Guimarães. - cfr. docs. 1, 2 e 3 juntos com o ri. do cautelar apenso.
B) A A., para o exercício da actividade, dispõe de licença de utilização de fracção autónoma n° 589/98, de licença de ocupação de espaço público n° 854/08 e licença da Sociedade Portuguesa de Autores e exploração de máquinas de diversão. - facto não impugnado.
C) A A. é titular de licença camarária que autoriza o horário de funcionamento ao público das 7 horas às 2 horas, de segunda-feira a domingo. - cfr. fls. 8 do P.A.
D) Em 31/03/2006, 13 moradores, vizinhos do estabelecimento da Requerente, dos quais 10 são aqui contra interessados, apresentaram um abaixo-assinado ao Presidente da Câmara Municipal de Guimarães onde se lê "Nós abaixo-assinado pedimos o favor de intervirem no ………. (...) devido ao imenso ruído até altas horas da madrugada e tráfego de droga"- cfr. fls. 9 do P.A.
E) A segunda queixa apresentada foi veiculada através da Junta de Freguesia de ………., no dia 20/4/06, acompanhada de novo abaixo-assinado de 17 moradores vizinhos do estabelecimento da Requerente - cfr. fls. 10, 11, 12 e 13 do P.A.
F) No dia 1 de Abril de 2007 foi levantado um auto pela GNR referente à falta de licença de utilização a uma hora - 2.10 horas da manhã - em que o estabelecimento já devia estar encerrado - cfr. fls. 22 e 23 do P.A.
G) No dia 14 de Outubro de 2007, foi levantado novo auto de contra ordenação, porquanto o estabelecimento se encontrava a laborar depois das 2 horas da manhã - cfr. fls. 40 e 41 do P.A..
H) No dia 29/10/2007, nova queixa deu entrada nos serviços do Requerido, aludindo ao barulho causado pelos clientes do estabelecimento no seu exterior - cfr. fls. 39 do P.A.
I) No dia 13/08/2008, o Comandante da GNR de Guimarães elaborou e enviou para o Presidente da Câmara Municipal de Guimarães um relatório sobre a situação que se vivia no estabelecimento gerido pela Requerente, com o seguinte teor:
"Em 01 de Abril de 2007, a freguesia de …………, (……….), passou a ser policiada pela Guarda Nacional Republicana de Guimarães, através do Posto Territorial de Guimarães
Desde logo foi apresentado ao Comandante do Posto uma petição, por parte dos moradores do edifício onde está instalado o ……….. e também por parte de vizinhos que vivem nas imediações do referido estabelecimento, queixando-se do horário de encerramento que ainda se encontra, sem qualquer alteração para as 02 horas da manhã. (...)
Uma das queixas consistia na permissão do explorador em que depois do encerramento do café ainda fornecia bebidas aos clientes que por ali ficavam na esplanada depois do encerramento do café.
Em meados do 1° semestre do ano de 2007, foi efectuada uma acção de policiamento ao estabelecimento e que resultou na detenção de um cliente habitual do café com cerca de 40 gramas de produto estupefaciente, vulgo Haxixe.
A apreensão deu origem a um Inquérito que está a decorrer no Tribunal de Guimarães, no qual foi efectuada vigilância sobre o estabelecimento donde se revelou que o explorador está conivente com a situação e nada faz para contrariar para que o bom ambiente se instale no estabelecimento.
O estabelecimento continua a ser frequentado por consumidores e clientes dos mais variados locais do concelho e com a intenção de se abastecer de produtos estupefacientes, causando sempre mal-estar entre a população local e mormente os vizinhos.
Apesar de se ter informado os Queixosos que está a decorrer um Processo-crime por consumo e tráfico de estupefacientes por parte dos clientes e frequentadores do dito estabelecimento urge reduzir com a maior urgência o horário de funcionamento do estabelecimento para que o sossego e bem-estar das pessoas volte a ser norma e não um desvio que se torna prejudicial aos vizinhos do café que desde há bastante tempo têm sido vítimas do barulho e da frequência por pessoas de mau porte por parte dos clientes do …………..
Mais se informa que a Junta de Freguesia através da sua Presidente de Junta tudo tem feito para minorar a presente situação e para que o sossego volte ao lugar tornando-o num lugar aprazível.
Não se pode ser mais elucidativo e conclusivo com fotografias e certidões do processo que está a decorrer por o mesmo se encontrar em Segredo de Justiça, já que decerto levaria ao encerramento do estabelecimento, dada a gravidade dos factos que nele estão descritos."- cfr. fls. 42 a 44 do P.A..
J) No dia 2/10/2008, na Câmara Municipal de Guimarães, teve lugar uma reunião na qual esteve presente a A., um representante do senhorio, o Comandante do Posto da GNR de Guimarães e o Vereador subscritor do ato administrativo, entre outras pessoas.
Nessa reunião foi feita uma acta descrevendo a situação que se vivia no estabelecimento da Requerente e foi comunicada a deliberação que veio a constar do acto objecto da presente acção - cfr. fls. 57 a 58 A do P.A. que se dão aqui por integralmente reproduzidas para todos os efeitos legais.
Nela se pode ler que "(...) Como primeira medida e uma vez que existe posição expressa pelo condomínio no sentido de se reduzir o horário de encerramento para as 22 horas será tal decisão proferida de imediato. Embora siga nos próximos dias notificação escrita ficou também claro que tal horário deveria ser adoptado a partir da presente data (...)"
K) A A. foi notificada de despacho datado de 03.10.08, da autoria de Vereador da Câmara Municipal de Guimarães, com o seguinte teor:
"ESTABELECIMENTO DE BEBIDAS, DENOMINADO …., SITUADO NA RUA DE …………., N°………., NA FREGUESIA DE …………….
O café supra identificado tem horário das 7h às 2 horas.
Foram dirigidas à Câmara Municipal diversas queixas dos moradores que dão conta do funcionamento daquele estabelecimento para além do horário de encerramento e de ser fonte de ruído e incómodos para quem reside nas imediações. Os moradores referem também que, mesmo após o encerramento do café, o explorador fornece bebidas aos frequentadores que permanecem no exterior junto ao mesmo.
Por outro lado, aquelas queixas dão igualmente notícia do tráfico de drogas no estabelecimento.
A GNR confirma ter recebido diversas queixas dos moradores, bem como de ter efectuado diligências no estabelecimento relacionadas com o consumo e tráfico de droga, praticados com conivência do explorador daquele estabelecimento; informa a GNR da instauração de processo-crime que está em curso. Menciona ainda aquela força policial que "o estabelecimento continua a ser frequentado por consumidores e clientes dos mais variados locais do concelho e com a intenção de se abastecerem de produtos estupefacientes, causando sempre mal-estar entre a população local e mormente os vizinhos."
A Junta de Freguesia de ………. refere também a existência de queixas dos moradores devido ao barulho nocturno provocado pelos clientes do …….. até horas avançadas da noite, sendo que o ruído se mantém apesar daquelas queixas.
Ora, todas estas circunstâncias permitem concluir que o funcionamento do …….. prejudica gravemente e de modo absolutamente intolerável, a qualidade de vida dos moradores. E, se é verdade que uma boa parte dos problemas, designadamente os respeitantes ao consumo e tráfico de estupefacientes constitui competência directa das entidades policiais, também é patente, independentemente disso, que o funcionamento do estabelecimento ocasiona graves prejuízos e incómodos aos vizinhos, e aos quais urge pôr cobro, matéria esta cuja competência também é da Câmara Municipal
Nesta data, realizou-se reunião com a exploradora do estabelecimento e respectivo cônjuge, bem como com o representante da sociedade proprietária da fracção onde está instalado o estabelecimento, na qual participaram também os comandantes do posto da GNR de Guimarães e da Polícia Municipal, além do Director de Departamento de Fiscalização e contencioso desta Câmara Municipal e, ainda, o Vereador Signatário. Foi possível constatar a falta de determinação, quando não, indiferença, com que a gerência do estabelecimento encara os factos que lhe foram então relatados e que traduzem a situação do estabelecimento e seu impacto na zona envolvente, designadamente no que se refere às actividades ilícitas já referidas. Aliás, só tal indiferença permite perceber que a situação se mantenha, apesar de avisos de proveniência vária já realizados no passado, designadamente pela GNR de Guimarães, desde Abril de 2007, como foi recordado pelo respectivo Comandante, na referida reunião, uma vez que desde essa data, e pessoalmente, havia feito tais diligências que não surtiram qualquer efeito junto dos exploradores do estabelecimento. Constata-se que, pelo contrário, a situação se agravou, como se comprova por rusga recente efectuada no estabelecimento, que originou abertura de processo criminal, a correr termos pelo Tribunal Judicial de Guimarães, e cujos contornos estão narrados em documentação junta aos presentes Autos, embora contida nos limites legais do segredo de justiça.
Face ao exposto, porque a exploradora do estabelecimento não toma medidas que corrijam as situações que urge corrigir e na prossecução do interesse público que deve nortear a sua acção, cabe à edilidade adoptar procedimentos capazes de resolver o problema criado pelo ……… de modo a assegurar um normal funcionamento e um equilíbrio salutar com o meio envolvente.
Posto isto: - apenas se está a emitir horários após as 22 horas para estabelecimentos de bebidas que se situam em edifícios sujeitos a propriedade horizontal, desde que os condóminos estejam de acordo. Ora, no caso dos autos, a maioria dos condóminos não concorda com o horário atribuído após as 22 horas aliás conforme resulta da exposição escrita apresentada nesta Câmara Municipal em 24.9.2008.
Assim, decide-se restringir o horário de funcionamento no que toca à hora do encerramento, que assim passa das 2 horas para as 22 horas, nos termos do disposto na alínea a), do artigo 3°, do Decreto-Lei n.º 48/96, de 15/5.
O estabelecimento será sujeito a vigilância apertada no que respeita à verificação da hora de encerramento praticada, com abertura de processo de contra ordenação se vierem a ser constatadas infracções.
A Câmara Municipal pondera seriamente a possibilidade de adoptar medidas mais gravosas se a pratica verificada no estabelecimento assim o exigir, de modo a assegurar o equilíbrio social que é direito de todos, designadamente dos moradores da zona envolvente". (acto impugnado) - cfr. fls. 58/60 do P.A.
L) O ato impugnado não foi precedido de audição de sindicatos, associações patronais ou associações de consumidores.”



II. O DIREITO.
Resulta do anterior relato que A………… intentou, no TAF de Braga, contra o Município de Guimarães, acção administrativa especial pedindo (1) a anulação do despacho, de 3/10/2008, do Vereador da sua Câmara Municipal que restringiu o horário de encerramento do estabelecimento comercial “………”, de que é proprietária, das 2 horas para as 22 horas e (2) a condenação do Réu a reconhecer que tinha o direito de o encerrar às 2 horas.
Para tanto alegou que o mesmo estava ferido de vícios de formafalta de fundamentação e incumprimento do direito de audiênciae de violação de lei - infracção ao disposto na al.ª a) do art. 3° do Decreto-Lei n° 48/96, de 15/05.

O TAF julgou a acção procedente e anulou o acto impugnado por ter entendido que este, apesar de estar fundamentado, violara o disposto no art.ºs 100.º/1 do CPA e 3.º/a) do DL 48/96, de 15/05.

Decisão que o TCA Norte confirmou integralmente.

É contra o Acórdão deste Tribunal Central que a presente revista se dirige, a qual foi admitida por ter sido entendido que as questões nela suscitadas eram, “por um lado, questões gerais de direito procedimento, designadamente, saber em que situações e em que termos a “urgência” pode afastar a necessidade de audiência prévia e em que medida este vício pode ser descaracterizado e, por outro lado, questões de especial relevância social, a qual é, nos autos, documentada pelo relatório que, em 13 de Agosto de 2008, o Comandante da GNR remeteu ao Presidente da Câmara Municipal de Guimarães (facto h), tendo em conta que, segundo as autoridades competentes no local são praticados actos ilícitos (tráfico de estupefacientes).”

Analisemos, pois, se o Acórdão fez correcto julgamento quando declarou a ilegalidade do acto impugnado por duas ordens de razões; por um lado, porque o mesmo não havia sido precedido pelo cumprimento do estatuído no art.º 100.º/1 do CPA e, por outro, por ter violado o disposto no art.º 3.º/a) do DL 48/96.
Vejamos, pois, começando-se pela alegada violação do direito de audiência.

1. A matéria de facto evidencia que, na sequência de diversas queixas referentes ao ruído provocado no estabelecimento da Autora e ao consumo e/ou tráfico de estupefacientes que aí ocorria, a Câmara de Guimarães reuniu nas suas instalações, em 2/10/2008, os interessados na resolução desses problemas onde, entre outros, estiveram presentes a Autora, um representante do senhorio, o Comandante do Posto da GNR de Guimarães e o autor do acto impugnado. Tendo aí o Vereador da Câmara com competência para o efeito dito que "(...) Como primeira medida e uma vez que existe posição expressa pelo condomínio no sentido de se reduzir o horário de encerramento para as 22 horas será tal decisão proferida de imediato. Embora siga nos próximos dias notificação escrita ficou também claro que tal horário deveria ser adoptado a partir da presente data (...)". – vd. a acta daquela reunião.
Tal decisão foi proferida logo no dia imediato, isto é, em 3/10/2008, e a Autora foi dela notificada. – vd. al.ªs J) e K).

O Acórdão considerou que esta factualidade configurava a violação do direito de audiência, consagrado no art.º 100.º/1 do CPA, uma vez que, na sequência daquela reunião, a Autora não foi notificada para se pronunciar sobre o sentido decisório do acto que iria ser proferido. Ilegalidade que não podia ser desvalorizada pelo facto, invocado pela Recorrente, de ter havido urgência na decisão a tomar e desta circunstância dispensar o cumprimento daquela formalidade. Com efeito ponderou:
“A dispensa de audiência prévia, nos casos previstos no art.º 103, n.º 2, do CPA, tem de ser objecto de decisão expressa, fundamentada.
A questão que importa assim ter em consideração, resulta da necessidade de verificar se ocorreu e foi, em tempo, alegada qualquer urgência na prolação do controvertido acto que obstasse à realização da necessária audiência de interessados, nos termos do art.º 103 do CPA (n.ºs 1 e 2, alíneas a)).
A simples leitura do acto objecto de impugnação mostra, claramente, não ter sido emitido para ocorrer a uma situação urgente, inadiável, que não admitisse delongas, de tal modo que pudesse deixar de cumprir-se a formalidade prevista no art.º 100.º do CPA, a coberto da excepção contemplada no art.º 103, n.º 1, alínea a), ou da situação prevista no n.º 2, alínea a).
Com efeito, a situação era conhecida há mais de dois anos, pelo que, como se disse já, nada obstaria a uma delonga adicional, de mais alguns dias, para que pudesse ser efectivada a necessária Audiência dos interessados.
A Entidade Recorrente não adiantou qualquer razão para qualificar o acto como urgente, nem essa urgência, como se viu, emana dele, não se observando, também, qualquer interesse público que se não compadeça com o cumprimento de tal diligência.
…..
Acresce, e como se sublinha no acórdão igualmente do Colendo STA, de 6.2.01, proferido no recurso 46844, “A dispensa de audiência prévia (nos termos do n.º 2 do art.º 103 do CPA) tem de ser objecto de decisão expressa fundamentada”, que, no caso em apreço, não existiu.
A redução do horário de funcionamento do estabelecimento não se impõe, assim, com carácter de premente inevitabilidade, ficando sujeito ao juízo e ponderação que a entidade decidente venha a produzir, tendo sempre em consideração o interesse público, em nome do qual esse poder de agir lhe foi conferido.
Tendo em consideração o condicionalismo legal que rodeava o acto, a entidade aqui Recorrente/Município, como se disse já, não só não estava obrigada a tomar uma posição no momento em que a tomou, como também não estava obrigada a emiti-lo com este sentido, pois que a redução do horário de funcionamento do estabelecimento em 4 horas não era a única decisão potencialmente possível.
Sendo o acto objecto de impugnação um típico ato prolatado no exercício de um poder discricionário, como se viu, fica excluída a possibilidade de lhe aplicar o princípio do aproveitamento do ato administrativo.”

O que significa que o Acórdão considerou não só que a falta de audição da Autora sobre a redução do horário de funcionamento do seu estabelecimento configurava violação do disposto no art.º 100.º/1 do CPA como entendeu que essa ilegalidade não podia ser relevada com apelo ao disposto no art.º 103.º/1/a) do CPA - a urgência da decisão - visto os problemas que o acto impugnado visava resolver serem antigos pelo não era imperioso que o mesmo tivesse de ser proferido com dispensa do cumprimento dessa formalidade.

Vejamos se decidiu com acerto.

2. Como é sabido, “concluída a instrução, e salvo o disposto no art. 103.º do CPA, os interessados têm o direito de ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final, devendo ser informados, nomeadamente, sobre o sentido provável desta” (art.º 100.º/1 do CPA) disposição que, como a jurisprudência deste Supremo tem repetida e uniformemente afirmado, constitui uma manifestação do princípio do contraditório visto, através dela, se possibilitar o confronto dos pontos de vista da Administração com os do interessado e se permitir que este participe na formação da sua vontade, protegendo-o de decisões que contrariem a legalidade ou ofendam os seus direitos. E que, por ser assim, a audição do interessado constitui uma formalidade estruturante da actividade administrativa que tem de ter lugar antes de ser tomada a decisão final visto só dessa forma se poder proporcionar ao interessado uma intervenção útil e construtiva no procedimento capaz de influenciar a projectada decisão. - Vd. Acórdão de 31/01/2012 (rec. 927/11) e jurisprudência nele invocada.
Todavia, essa formalidade não deixa de ser instrumental pelo que, em certos casos, a mesma pode degradar-se em formalidade não essencial e, portanto, ser omitida sem que daí resulte ilegalidade determinante da anulação do acto.
É o que acontecerá não só nos casos em que a decisão a tomar é urgente, como nos casos em que for razoável prever que a audiência pode comprometer a execução ou a utilidade da decisão ou, ainda, nos casos em que essa formalidade se torne impraticável, devido ao elevado número de interessados (art.º 103/1 do CPA). E é o que acontecerá, também, nos casos em que o interessado, depois de concluída a instrução, se pronunciou sobre as questões a decidir apesar de não ter sido notificado para o efeito (seu n.º 2) e nos casos em que está em causa uma actividade vinculada e, por isso, seja certo que a decisão não poderá ser outra que não a proferida.
O que quer dizer que a degradação da audiência prévia em formalidade não essencial ocorrerá sempre que, atentas as circunstâncias, a intervenção do interessado se tornou desaconselhável – seja por atrasar ou comprometer a utilidade da decisão ou ser impraticável – ou inútil - seja porque inexiste matéria sobre que o interessado se pudesse pronunciar, seja porque o contraditório já se encontra assegurado, ou seja porque, independentemente da sua intervenção, a decisão da Administração só pudesse ser a que foi tomada (Vd., Ac. do Pleno de 4/07/2006 (rec 498/03) e da Secção de 21/09/2006 (rec. 254/06) e de 12/12/2006 (rec. 685/06).) .

Posto isto vejamos se, atentas as circunstâncias que precederam a prolação do acto impugnado, se deve considerar ter sido cumprida a mencionada formalidade ou se se justificava o seu incumprimento, atenta a urgência da decisão.

3. A Câmara Municipal de Guimarães, na sequência das queixas já referidas sobre o funcionamento do Bar da Autora promoveu uma reunião com os diversos interessados, a que ela esteve presente, onde se historiaram os antecedentes que conduziram à sua realização e se discutiu a forma de os resolver, tendo ficado a constar da respectiva acta que ficara “patente não haver de facto da parte do explorador do estabelecimento nem atitude nem convicção séria de que a resolução também passa ou passa principalmente pelas suas mãos”, o que levou a Câmara a, logo nessa reunião, ter dito que iria solucionar tais problemas através da redução do horário de encerramento do estabelecimento das 2 horas para as 22 horas, decisão que iria ser proferida e implementada imediatamente. O que veio a acontecer com a prolação do acto impugnado logo no dia seguinte (vd. al.ªs J) e K) da M.F.).

O que nos obriga a ponderar se a participação da Autora nessa reunião e a possibilidade de se opor à anunciada decisão de redução do horário do seu Bar constituem o exercício do contraditório, o que dispensava, nos termos do art.º 103.º/2/a) do CPA, a audiência prévia.

4. A jurisprudência deste Tribunal tem afirmado que a intervenção do interessado, quer quando solicitada quer por motu proprio, não configura o exercício do direito de audiência se a mesma for desgarrada e for feita sem que lhe seja facultado o conhecimento de todos os elementos reunidos no processo indispensáveis à decisão, uma vez que o exercício daquele direito pressupõe que o interessado conheça os fundamentos da decisão da Administração.
O que vale por dizer que a dispensa da audiência prévia, a coberto do estatuído no art.º 103.º/2/a) só é legalmente válida quando for dada ao interessado a possibilidade de se pronunciar sobre todas as questões e provas que decorram do processo, as quais constariam da notificação ou convocação para a audiência se ela se tivesse realizado. E, a contrario, tem sido afirmado que essa dispensa será ilegal se o interessado, espontaneamente e ignorando senão todos pelo menos uma boa parte dos elementos recolhidos pela Administração e desconhecendo qual a decisão que esta congemina, vem ao processo manifestar a sua posição – M. E. Oliveira, P. Gonçalves e P. Amorim, in CPA Anotado, 2.º ed., pg. 466.

4. 1. No caso, a Autora esteve presente na reunião promovida pela Câmara onde se discutiram os problemas suscitados pelo funcionamento do seu Bar e a necessidade de os resolver tendo tido nessa ocasião a oportunidade de, de viva voz, se opor à intenção da Câmara de reduzir o horário do seu estabelecimento. E, porque assim, só por um excesso de formalismo, que não só não tem apoio legal como era inútil e incompreensível, se pode considerar que não havia razões para dispensar a audiência prévia. Com efeito, se os problemas provocados pelo seu Bar eram conhecidos e recorrentes e se já tinham sido feitos diversos contactos com vista à sua resolução e se, depois de tudo isso, a Autora foi convocada e participou numa reunião com tal fim ter-se-á de concluir que a mesma estava par de tudo e teve oportunidade de sustentar a sua posição e de se opor à projectada decisão.
Daí que se não possa aceitar, como a Autora alegou e as instâncias admitiram, que ela foi surpreendida pelo acto impugnado e que não lhe foi dada a oportunidade de se pronunciar sobre ele e que, por ser assim, o mesmo fora praticado com violação do disposto no art.º 100.º do CPA.
De resto, ao contrário do que raciocinaram as instâncias, a citada norma não impõe que o cumprimento da audiência prévia tenha de tomar a forma de um pronunciamento escrito na sequência de uma notificação do interessado informando-o do sentido da decisão a tomar e de que, querendo, se poderá pronunciar já que o que decorre do citado normativo é, apenas e tão só, que, previamente à decisão, o interessado tem de ser ouvido no procedimento sobre o sentido da mesma e que tem de lhe ser dada a possibilidade de se lhe opor. Deste modo, e muito embora seja certo que o modo mais comum de se cumprir o disposto na citada norma seja a comunicação escrita, formal, acima referenciada, também o é que é que essa audiência pode ser oral (art.º 102.º do CPA), o que significa que aquela forma não é a única, e que, até, pode ser dispensada. O que o que é essencial é que exercício do contraditório seja assegurado sem que a lei indique de um modo rígido de que como o mesmo deve ser cumprido.

4. 2. No caso, está assente que, previamente à prolação do acto impugnado, houve uma reunião onde se discutiu a forma de resolver os problemas provocados pelo Bar da Autora e, no seu final, foi elaborada uma acta descrevendo o que aí se passou. É certo que essa acta é omissa no tocante às posições que Autora terá assumido mas também o é que essa insuficiência não inquina a validade da formalidade em causa, uma vez que dela resulta que os problemas que determinaram a prolação do acto impugnado foram ali discutidos. E tanto assim que nela consta ter ficado “claro pela informação prestada aos presentes que a situação que actualmente se vive no ……….. é antiga, mantém-se e tem sido objecto de avisos, designadamente da GNR desde há imenso tempo”, recordando-se as queixas recebidas na Câmara e a intervenção policial relacionada com o consumo de drogas, o que levou a que ficasse consignado que a Câmara procuraria no domínio das suas competências “adoptar as medidas reputadas necessárias para assegurar um clima normal de convivência do estabelecimento com o meio envolvente.” E a seguir ao Vereador da Câmara dizer que iria reduzir o horário de funcionamento daquele Bar ficou consignado: “Ficou igualmente claro que só aparentemente é que esta decisão é tomada de forma abrupta. Na verdade, houve sinais de vária natureza que foram transmitidos à gerência do estabelecimento em período bem extenso que poderiam e deveriam ter determinado alterações na vivência do bar que seguramente evitava a medida agora tomada. … “
Deste modo, e muito embora a elaboração da acta seja omissa na descrição das posições da Autora, certo é que essa insuficiência não pode inquinar a legalidade da dispensa da audiência prévia já que dela decorre que o assunto que determinou a prolação do acto impugnado foi discutido e que a Autora teve oportunidade de pronunciar sobre o mesmo.
Nesta conformidade, só se poderia concluir pela ilegalidade do acto em razão da inexistência dos pressupostos que poderiam justificar a dispensa da audiência prévia se a Autora tivesse alegado, e provado, que a sua presença na reunião havia sido protocolar e que nela não lhe foi dada a possibilidade de se pronunciar sobre o seu tema e que, por isso, que a sua presença, por imposição da Câmara, tinha sido meramente passiva.
Ora, não só não vem alegado que tal tenha acontecido como, como decorre dos elementos levados ao probatório, não fazia qualquer sentido que isso pudesse ter ocorrido.

Daí que, ao contrário do que se decidiu no Acórdão, a Autora teve possibilidade de se pronunciar e de se opor ao acto que a Administração projectava proferir, não sendo, por isso, obrigatório que, após essa reunião, aquela tivesse de o notificar por escrito para, novamente, exercer o contraditório.
O acto impugnado não está, assim, ferido do vício formal que determinou a sua anulação.

5. O Recorrente insurge-se, também, contra o Acórdão por este ter entendido que o despacho sob impugnação violara o art.º 3.º/a) do DL 48/96 uma vez que, contrariamente ao que neste se dispõe, aquele tinha sido proferido sem que nenhuma das entidades aí mencionadas tivesse sido ouvida. Com efeito, ponderou:
“Tratando-se de um acto lesivo, e não tendo sido ouvidas quaisquer das entidades referidas no referido normativo, não se vislumbra como se poderá considerar como válido o acto objecto de impugnação, em face do que não merece censura, também neste aspecto, a decisão Recorrida do Tribunal a quo.
Não está em causa a legitimidade e até a obrigação de um qualquer município em determinar até o encerramento de estabelecimentos que sirvam para a prática de actos criminais, desde que devidamente comprovados. O que importa aqui sublinhar e reiterar é que quaisquer limitações aos direitos de terceiros terão necessariamente de obedecer ao figurino legal e regulamentar estabelecido.
Finalmente, mas no mesmo sentido, não se reconhece procedência à enumeração conclusivamente invocada de artigos supostamente violados por parte da decisão Recorrida.
Na realidade, conclui o Recorrente, afirmando que a decisão recorrida terá violado ou feito errada aplicação dos seguintes normativos: “(…) art.ºs 8º, 9º, 100º, 102º e 103º nº1 al. a) do Código de Procedimento Administrativo, 52º, 267º, nº 5, e 268º, nº 1, da Constituição, art.ºs 1º e 3º do DL 48/96, art.ºs 30º e 34º do DL 15/93, art.º 68º, nº 3, da Lei 169/99, art.º 8º do DL 252/92, art.º 668º, nº 1, al. d), do Código de Processo Civil, art.ºs 70º e 335º do Código Civil e do art.º 35º nº 1 al. c) do DL 168/97.”
Assim, sem prejuízo de ter sido ponderada e contraditada toda a argumentação aduzida no Recurso interposto, não se reconhece, por omissão de substanciação, os aqui conclusivamente invocados vícios, por via de meras referências normativas, nas situações em que não foram apresentadas as razões de facto e de direito do discurso jurídico fundamentador nem, sequer, a modalidade a que reverte o vício afirmado.
Assim, sem prejuízo de toda a argumentação esgrimida, ponderada e expendida, por falta de concretização e densificação do alegado, não se vislumbra que se verifique qualquer violação dos normativos invocados, como tendo sido violados pela decisão recorrida do tribunal a quo.”

O que significa que o Acórdão entendeu que a redução do horário do Bar da Autora só era legal se a Recorrente, cumprindo o estatuído no art.º 3.º/a) do DL 48/96, tivesse, antes de decidir, ouvido os sindicatos, as associações patronais e as associações de consumidores e que, não tendo tal acontecido, tinha cometido uma ilegalidade determinante da anulabilidade do acto.
Vejamos se decidiu com acerto.

6. Já sabemos que no dia seguinte à reunião havida na Câmara, em 2/10/2008, foi proferido o acto que restringiu o horário de funcionamento do Bar da Autora “no que toca à hora do encerramento, que assim passa das 2 horas para as 22 horas, nos termos do disposto na alínea a), do artigo 3°, do Decreto-Lei na 48/96, de 15/5.” Decisão que aquela reputa de ilegal por a mesma não poder ser fundamentada no citado normativo do DL 48/96.
Com efeito, muito embora fosse verdade que “os cafés, cervejarias, casas de chá, restaurantes, snack-bars e self-services poderão estar abertos até às 2 horas todos os dias da semana(seu art.º 1.º/2) e que as Câmaras podem “ouvidos os sindicatos, as associações patronais e as associações de consumidores restringir ou alargar os limites fixados no citado art.º 1.º …. em casos devidamente justificados e que se prendam com razões de segurança ou de protecção da qualidade de vida dos cidadãos[art.º 3.º/a)], também o era que esta disposição tinha sido violada uma vez que a Câmara não tinha ouvido essas entidades antes de proferir o acto impugnado.
E é verdade que este acto não foi precedido por essa audição.
Todavia, essa circunstância não determina, por si só, a sua ilegalidade uma vez que aquela disposição não foi prevista para as situações dos autos.
Com efeito, é absolutamente claro, que a obrigação imposta por aquele art.º 3.º/a) só tem aplicação quando a Câmara queira alterar, em regulamento municipal, e com carácter geral, os horários dos estabelecimentos da área da sua jurisdição e não quando a decida alterar o horário de um específico estabelecimento por razões que só a ele respeitam. E isto porque não faz sentido que, tendo a Câmara constatado que o funcionamento de um Bar suscita protestos por causa do barulho nele provocado ou por causa dos crimes que nele, eventualmente, se praticam, não possa tomar qualquer medida correctiva referente a esse funcionamento, maxime no tocante ao seu horário, sem cumprir a formalidade exigida na citada norma, isto é, sem ouvir as entidades nela referidas. Daí que seja forçoso concluir que o art.º 3.º/a) DL 48/96 tem um âmbito de aplicação mais restrito do que o suposto no acto impugnado e que ele não integra a situação ora em causa, apesar dessa norma ter sido invocada como seu fundamento.

O que quer dizer que nos encontramos perante duas dificuldades. A primeira, a de saber se a errada invocação de uma norma como fundamento de um acto é suficiente para determinar a sua irremediável ilegalidade e, a segunda, a de saber se, sendo imprestável a invocada norma, aquele pode ser juridicamente fundamentado por uma outra via.

No tocante à primeira questão, a resposta só pode ser a de que a errada invocação de uma norma como fundamento legal do acto não determina, por si só, a sua ilegalidade. E isto porque, estando definida a situação de facto, a errada subsunção dessa situação ao direito só será determinante da sua ilegalidade se essa factualidade não encontrar integração nem na norma legal invocada nem em qualquer outra. Só nessas circunstâncias é que poderemos afirmar que a autoridade administrativa actuou sem dispor de fundamento legal para o efeito e que, por ser assim, exerceu uma competência de que não dispunha, o que bastava para se anular o acto.
Ora, estando a situação de facto suficientemente esclarecida e estando esta claramente exposta no despacho sindicado, a circunstância de a Câmara, por lapso, o ter justificado com uma norma que se não aplicava à situação não tem capacidade invalidante do mesmo.

Daí que nos reste averiguar se existe norma que suporte a decisão impugnada.

7. A CRP assegura a todos “o direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender” incumbindo ao Estado promover, em colaboração com as autarquias locais, a qualidade ambiental das povoações e da vida urbana (art.º 67.º/1 e 2/e) da CRP).
Por ser assim foi publicado um Regulamento Geral do Ruído - aprovado pelo DL 09/2007, de 17/01 - onde se estatuiu competir ao “Estado, às Regiões Autónomas, às autarquias locais e às demais entidades públicas, no quadro das suas atribuições e das competências dos respectivos órgãos, promover as medidas de carácter administrativo e técnico adequadas à prevenção e controlo da poluição sonora, nos limites da lei e no respeito do interesse público e dos direitos dos cidadãos.” (seu art.º 4.º/1). E competir ao “Estado e às demais entidades públicas, em especial às autarquias locais, tomar todas as medidas adequadas para o controlo e minimização dos incómodos causados pelo ruído resultante de quaisquer actividades, incluindo as que ocorram sob a sua responsabilidade ou orientação.” (seu art.º 4.º/3).
Para além disso o referido diploma interditou a instalação e o exercício de actividades ruidosas permanentes nas zonas sensíveis e sujeitou-o à observação de determinados requisitos nas envolventes dessas zonas (art.º 13.º) e proibiu o exercício de actividades ruidosas temporárias na proximidade de edifícios de habitação, aos sábados, domingos e feriados e nos dias úteis entre as 20 e as 8 horas (art.º 14.º/1) prevendo, ainda, a suspensão dessas actividades e a aplicação de medidas cautelares destinadas a obviar os problemas por elas causados (art.ºs 18.º, 27.º e 29.º).

O que vale por dizer que o legislador preocupou-se com a emissão de ruídos e estabeleceu normas rigorosas para evitar a violação do direito à tranquilidade atribuindo às autarquias uma importante função na fiscalização das actividades que o provocam, possibilitando-lhes tomar medidas correctivas quando o mesmo seja ilegal ou atinja os direitos de terceiros. O que pressupõe que as mesmas têm competência para praticar actos como aquele que agora vem impugnado.
Com efeito, se, nos termos do referido diploma, cabe, especialmente, às autarquias locais, tomar todas as medidas adequadas para o controlo e minimização dos incómodos causados pelo ruído resultante de quaisquer actividades, (seu art.º 4.º/3) ter-se-á de considerar que se encontra dentro dos limites da sua competência o poder de, nos casos em que sejam visíveis e comprovados os incómodos causados pelo ruído proveniente de um estabelecimento reduzir o seu horário de funcionamento, protegendo dessa forma o direito dos vizinhos à tranquilidade. Tanto mais quanto é certo que está dentro do perímetro da sua competência proibir o exercício de actividades ruidosas temporárias na proximidade de edifícios de habitação, aos sábados, domingos e feriados e nos dias úteis entre as 20 e as 8 horas (art.º 14.º/1)

E, porque assim, a anulação do acto impugnado só se justificaria se o mesmo estivesse estribado em errados pressupostos de facto, isto é, se a Câmara tivesse suposto que se verificava uma determinada realidade e esta não existisse.
O que, no caso, não sucede uma vez que, conforme resulta dos elementos de facto constantes do probatório, o acto impugnado foi fundamentado em razões, suficientemente demonstradas, de segurança e de protecção da qualidade de vida dos cidadãos, os quais são esclarecedores e convincentes de que o funcionamento do Bar da Autora provocava os problemas denunciados à Câmara, problemas esses que, atenta a sua gravidade e a indiferença daquela na sua resolução, impunham a tomada de medidas capazes de lhes pôr termo.
Foi isso o que o Recorrente fez.
Daí que não se possa sufragar a decisão recorrida.

Termos em que os Juízes que compõem este Tribunal acordam em conceder provimento do recurso e, revogando o Acórdão recorrido, julgar a improcedente a acção.
Custas pela Autora, mas apenas em 1.ª instância por a mesma não ter contra alegado quer no TCA quer neste Supremo Tribunal.

Lisboa, 13 de Outubro de 2016. – Alberto Acácio de Sá Costa Reis (relator) – José Augusto Araújo VelosoAntónio Bento São Pedro, vencido nos termos da declaração junta.

Declaração de Voto

- Votei Vencido. Entendo que no presente caso não foi cumprido o artº 100º do CPA (direito de audiência). Do mesmo modo não acompanho o acórdão relativamente ao aproveitamento do acto.

Lisboa, 13 de Outubro de 2016
António Bento São Pedro.