Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:012/17
Data do Acordão:03/08/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA
PEDIDO
DISPENSA DO PAGAMENTO
Sumário:Não se justifica a dispensa do remanescente da taxa de justiça devida pelo recurso, ao abrigo do disposto no n.º 7 do art. 6.º do RCP, se o montante da taxa de justiça devida não se afigura desproporcionado em face do concreto serviço prestado, por a questão decidenda no recurso não se afigurar de complexidade inferior à comum e a conduta processual das partes se limitar ao que lhes é exigível e legalmente devido.
Nº Convencional:JSTA000P21541
Nº do Documento:SA220170308012
Data de Entrada:01/05/2017
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A.........., SGPS,SA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Pedido de reforma de acórdão em ordem à dispensa do pagamento do remanescente no recurso jurisdicional da decisão proferida no processo de reclamação de actos do órgão de execução fiscal com o n.º 2787/16.0BELRS

1. RELATÓRIO

1.1 A Fazenda Pública (adiante Requerente ou Recorrente), notificada do acórdão por que este Supremo Tribunal Administrativo negou provimento ao recurso por ela interposto da sentença por que o Tribunal Tributário de Lisboa julgou improcedente a reclamação deduzida pela sociedade denominada “ A…………- SGPS, S.A.” (adiante Executada ou Recorrida), ao abrigo do art. 276.º e segs. do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), contra a decisão por que a Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 10 indeferiu o pedido de suspensão da execução e de substituição da penhora por prestação de garantia num processo executivo em que é executada, veio apresentar requerimento de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça.

1.2 Alegou a Fazenda Pública, em síntese, que, atento o valor da causa, que ascende a € 519.768,10, a taxa de justiça atingirá o montante de € 2.346,00, pelo que a parte vencida teria de pagar € 7.038,00 (€ 2.346,00 da sua taxa de justiça, igual montante da taxa de justiça da parte vencedora e outro tanto a título de despesas com honorários do mandatário), o que se lhe afigura manifestamente desproporcionado «face às características do serviço público concretamente prestado», tanto mais que «entende que adoptou, neste processo, um comportamento processual irrepreensível de colaboração com os Tribunais, não promovendo quaisquer expedientes de natureza dilatória ou praticando actos inúteis, guiando-se pelos princípios da cooperação e da boa fé», que «apenas apresentou as peças processuais essenciais para a descoberta da verdade material» e «a questão em causa não é de elevada especialização jurídica ou especificidade técnica, não sendo, igualmente, as questões aqui em crise, de âmbito muito diverso», pois o recurso «apenas versou quanto à questão dos juros indemnizatórios, sem colocar em causa a totalidade da decisão de 1.ª instância».
Mais a inconstitucionalidade da legislação de custas porque, em resumo da sua autoria, «ao não estabelecerem um limite máximo para as custas a pagar, nomeadamente por não estabelecerem um limite máximo para o valor da acção a considerar para efeito de cálculo da taxa de justiça, os arts. 6.º n.ºs 1, 2 e 7, 26.º n.º 3 al. c) e 25.º n.º 2 al. d) do RCP, por referência à Tabela 1 anexa ao mesmo RCP, violam os princípios constitucionais da proporcionalidade e do acesso aos tribunais».
Por isso, pediu a este Supremo Tribunal Administrativo que «faça uso da faculdade prevista na segunda parte do n.º 7 do art. 6.º do RCP, por forma a dispensar a mesma do pagamento do remanescente das taxas de justiça, reformando-se, nessa parte, o acórdão quanto a custas, ao abrigo do n.º 1 do art. 616.º do CPC».

1.3 A Recorrida não respondeu.

1.4 Com dispensa de vistos, por haver jurisprudência firme a este propósito, cumpre apreciar e decidir.


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2. FUNDAMENTOS

2.1 DE FACTO

As circunstâncias processuais a atender resultam da consulta dos autos.

2.2 DE DIREITO

2.2.1 DA DISPENSA DO PAGAMENTO DO REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA

Pediu a Requerente a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo da faculdade prevista na segunda parte do n.º 7 do art. 6.º do RCP.
Nos termos do n.º 7 do art. 6.º do RCP, «[n]as causas de valor superior a (euro) 275.000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento».
Ou seja, como este Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a afirmar, a dispensa do remanescente da taxa de justiça, tem natureza excepcional, pressupõe uma menor complexidade da causa e uma simplificação da tramitação processual aferida pela especificidade da situação processual e pela conduta das partes.
No caso sub judice, o acórdão ocupou-se da questão de saber se a decisão do órgão da execução fiscal, que indeferiu o pedido da ora Requerida de suspensão da execução e de substituição da penhora por prestação de garantia num processo executivo em que é executada, estava ou não sujeita às exigências de fundamentação dos actos administrativos e, depois, se podia ou não considerar-se essa decisão como suficientemente fundamentada.
A questão em si mesma não pode ser considerada de complexidade inferior à comum, na medida em que exigiu estudo e decisão sobre a natureza do acto reclamado e sobre a fundamentação do mesmo.
Aliás, mal se compreende que a Fazenda Pública venha agora dizer que o recurso apenas apreciou a questão dos juros indemnizatórios, questão que, manifestamente, não foi, nem podia ser, objecto de apreciação.
No que respeita à simplificação da tramitação processual, seja em razão da específica situação processual, seja pela conduta processual das partes, que se limitou ao que lhes é exigível e legalmente devido, também não descortinamos motivo para a requerida dispensa.
Por outro lado, nem sequer o valor referido pela Requerente como sendo aquele a pagar – e note-se que, contrariamente ao que parece supor a Recorrente, apenas está aqui em causa apenas a taxa de justiça devida neste Supremo Tribunal Administrativo e não quaisquer outras responsabilidades da Recorrente relativamente às custas – se nos afigura particularmente elevado em face do serviço prestado e muito menos desproporcionado.
Deve ter-se presente que o recurso foi interposto, tramitado e decidido neste Supremo Tribunal Administrativo, requerendo a intervenção do Procurador-Geral Adjunto, que emitiu parecer, e de três Conselheiros, que proferiram o acórdão, para além do trabalho administrativo a cargo da Secretaria.
O valor exigido neste Supremo Tribunal Administrativo a título de taxa de justiça também não se nos afigura violador dos princípios constitucionais do acesso ao direito e da tutela jurisdicional efectiva, da proporcionalidade e da necessidade, a requerer a dispensa do pagamento do pagamento do remanescente para afastar essa violação.
Note-se que foi precisamente para obviar à violação desses princípios constitucionais que o art. 2.º da Lei n.º 7/2012, de 13 de Fevereiro, aditou ao art. 6.º do RCP o n.º 7, que veio permitir (poder-dever) que se atenda ao referido limite máximo de € 275.000,00 Euros e a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça nas situações também já referidas (Para maior desenvolvimento, vide o acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 9 de Julho de 2014, proferido no processo n.º 1319/13, publicado no Apêndice ao Diário da República de 19 de Outubro de 2015 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2014/32230.pdf), págs. 2591 a 2593, também disponível http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/b9dbbe59c0cd923880257d16002f0290.
Como nesse aresto ficou dito, «No acórdão n.º 421/2013, de 15/7/2013, processo n.º 907/2012, in DR, 2.ª série - n.º 200, de 16/10/2013, pp. 31096 a 31098, o Tribunal Constitucional havia julgado inconstitucionais, por violação do direito de acesso aos tribunais, consagrado no art. 20.º da CRP, conjugado com o princípio da proporcionalidade, decorrente dos arts. 2.º e 18.º, n.º 2, segunda parte, da CRP, as normas contidas nos arts. 6.º e 11.º, conjugadas com a tabela I-A anexa, do Regulamento das Custas Processuais, na redacção introduzida pelo DL n.º 52/2011, de 13/4, (anteriormente, portanto, à alteração introduzida pela Lei n.º 7/2012, de 13/2) quando interpretadas no sentido de que o montante da taxa de justiça é definido em função do valor da acção sem qualquer limite máximo, não se permitindo ao tribunal que reduza o montante da taxa de justiça devida no caso concreto, tendo em conta, designadamente, a complexidade do processo e o carácter manifestamente desproporcional do montante exigido a esse título.
Neste mesmo sentido se decidira já nos acs. desta Secção do STA, de 31/10/12 e de 26/4/2012, nos procs. n.ºs 0819/12 e 0768/11, respectivamente».).

Por último, sempre diremos que mal se compreende que a Fazenda Pública, que representa a Administração tributária, venha invocar a violação dos princípios do acesso ao direito e aos tribunais.
Tudo visto, concluímos que a decisão de negar provimento ao recurso conduziu à condenação da recorrente em custas, como não podia deixar de ser, não decorrendo tal condenação em custas de qualquer erro, lapso ou sequer descuido em que tenha incorrido o acórdão cuja reforma é peticionada, antes da estrita aplicação das normas legais que determinam a responsabilidade por custas (art. 527.º n.ºs 1 e 2 do CPC), pelo que nada há a reformar no acórdão quanto a custas.

2.2.2 CONCLUSÃO

Não se justifica a dispensa do remanescente da taxa de justiça devida pelo recurso, ao abrigo do disposto no n.º 7 do art. 6.º do RCP, se o montante da taxa de justiça devida não se afigura desproporcionado em face do concreto serviço prestado, por a questão decidenda no recurso não se afigurar de complexidade inferior à comum e a conduta processual das partes se limitar ao que lhes é exigível e legalmente devido.


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3. DECISÃO

Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em indeferir o pedido.

Custas pela Requerente, fixando-se a taxa de justiça em uma UC.


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Lisboa, 8 de Março de 2017. – Francisco Rothes (relator) – Aragão Seia – Isabel Marques da Silva.