Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0207/14
Data do Acordão:10/29/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:GRADUAÇÃO DE CRÉDITOS
PRIVILÉGIO IMOBILIÁRIO ESPECIAL
Sumário:I - Os créditos reclamados de IMI e Contribuição autárquica inscritos para cobrança no ano da penhora e nos dois anteriores deverão ser graduados em 1º lugar, uma vez que, gozam de privilégio imobiliário especial sobre o imóvel penhorado, conforme o disposto no art. 751.º do CC, sendo que no concurso entre uma hipoteca e um privilégio imobiliário especial devem ser graduados antes do crédito hipotecário reclamado.
II - Os créditos reclamados de IRC que foram graduados em 3.º lugar inscritos para cobrança nos anos de 2004 (ano da penhora) e 2003 e 2002 (dois anos anteriores), porque gozam de privilégio imobiliário geral, conforme o disposto no art. 116.º do C.I.R.C., devem ser graduados logo após os créditos garantidos por hipoteca.
Nº Convencional:JSTA000P18102
Nº do Documento:SA2201410290207
Data de Entrada:02/21/2014
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:B..., SA E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – RELATÓRIO

Nos presentes autos de verificação e graduação de créditos que correm apensos à execução fiscal nº 3360200301000608 em que é executado A……….., NIF ……………, melhor identificado nos autos, por dívidas de IRC do ano de 2002, de IMI dos anos de 2003 a 2008, Contribuição Autárquica e de coimas fiscais.

Por sentença de 26 de dezembro de 2012, o TAF do Porto, graduou em primeiro lugar os créditos reclamados pela B………. SA e pela C…………., SA, melhor identificados nos autos.

Inconformada com o assim decidido, reagiu a Fazenda Publica, interpondo o presente recurso para o TCA Norte que por acórdão de 13 de dezembro de 2013, se declarou incompetente em razão da hierarquia, considerando para o efeito, competente a secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo, para onde os autos foram remetidos, com as seguintes conclusões das alegações:

«A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que graduou indevidamente os créditos exequendos e reclamados de IMI, CA e de IRC dos anos de 2002, 2003 e 2004, os quais gozam de privilégio especial, sendo que os créditos de IMI e CA prevalecem sobre os créditos reclamados pela B……………, SA e pela C…………….., SA, garantidos pelas hipotecas, e o crédito relativo ao IRC dos anos de 2002, 2003 e 2004, deveria prevalecer sobre os créditos garantidos por penhora, bem como os respectivos juros de mora.
B. A Fazenda Pública não concorda com a ordem de graduação, concretamente, no que respeita créditos exequendos e reclamados de IMI, CA e de IRC dos anos de 2002, 2003 e 2004, os quais gozam de privilégio especial, sendo que os créditos de IMI e CA prevalecem sobre os créditos reclamados pela B……………., SA e pela C…………….., SA, garantidos pelas hipotecas, e o crédito relativo ao IRC dos anos de 2002, 2003 e 2004, deveria prevalecer sobre os créditos garantidos por penhora, bem como os respectivos juros de mora.
C. Os créditos reclamados por dívidas de IMI gozam de privilégio imobiliário nos termos do art. 744º, nº 1 do Código Civil e do art. 122.º do C.I.M.I.
D. Os créditos reclamados de CA gozam de privilégio imobiliário nos termos do art. 24º do Código do CCA e 748º do CC.
E. Decorre do art. 686º nº 1, do Código Civil, que “a hipoteca confere ao credor o direito de ser pago pelo valor de certas coisas móveis, ou equiparadas, pertencentes aos devedor ou a terceiro com preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo”.
F. Assim, de harmonia com o acórdão do TCAN 18/09/2008, proc. 0160/06.7BEPNF o crédito exequendo do IMI goza de privilégio imobiliário nos termos previstos no Código Civil para a contribuição predial. O artigo 744.º do Código Civil confere aos créditos da contribuição predial privilégio imobiliário sob os bens sujeitos à contribuição predial além de privilégio mobiliário geral. Este crédito deve ser graduado nos termos do artigo 751.º do Código Civil preferindo à hipoteca ainda que anterior e devidamente registada, e ainda no mesmo sentido se pronunciaram os acórdãos do TCAS de 20/11/2012, proc. 0598/12 e do STA 31/10/2007, proc. 0635/07.
G. Deste modo, os créditos exequendos e reclamados de IMI e CA, os quais gozam de privilégio especial, deveriam ser graduados antes dos créditos hipotecários reclamados pela B……………, SA e pela C……………., SA.
H. Ademais, o crédito reclamado de IRC dos anos de 2002, 2003 e 2004, goza de privilégio imobiliário nos termos do art. 108° do Código do IRC e deveria prevalecer sobre os créditos garantidos por penhora, neste sentido, vide os acórdãos do STA de 05/07/2012, proc. 0315/12 e de 14.02.2013, proc. 01340/12.
I. Daí que, os créditos reclamados e exequendos com garantia apenas da penhora tenham que ceder perante o crédito de IRC e respectivos juros de mora, por gozar quanto a este, a Fazenda Pública do privilégio especialmente previsto na lei, no art° 108° do CIRC.
J. E de igual privilégio gozam os juros de mora referentes a três anos, art. 44° da LGT e art. 8º do Dec Lei 73/99 de 16 Março, os quais deveriam ter sido considerados na graduação de créditos.
K. Desta forma, os créditos deveriam ser graduados da seguinte forma:
1° - Os créditos exequendos e reclamados de Contribuição Autárquica e de IMI respeitantes ao prédio penhorado no processo de execução fiscal (o artigo 1305°), que foram inscritos para cobrança nos anos de 2004 (ano da penhora) e 2003 e 2002 (dois anos anteriores), os quais gozam de privilégio imobiliário especial (cfr. artigo 24° nº 1 do CCA e artigo 122° do CIMI);
2° - O crédito reclamado pela B………….., SA, de 119.730,51 €, até ao limite máximo garantido (54.600.00$00) pela hipoteca constituída a seu favor, sob a Inscrição C-1, pela Ap. 39 de 1995/05/15 sobre o imóvel penhorado no processo de execução fiscal (o artigo 1305°);
3° - O crédito reclamado pela C………….., SA, de 178.428,76 € até ao montante máximo garantido de (21.765.251$00) pela hipoteca constituída a seu favor sob a Inscrição C-1, pela Ap. 43 de 1999/04/14, sobre o imóvel penhorado no processo de execução fiscal (o artigo 1305°);
4° - Os demais créditos reclamados pela Fazenda Pública, por dívidas de IRC, que foram inscritos para cobrança nos anos de 2004 (ano da penhora) e 2003 e 2002 (dois anos anteriores), os quais gozam de privilégio imobiliário sobre os bens existentes no património do sujeito passivo à data da penhora (cfr. artigo 108° do CIRC).”
5° - Os demais créditos exequendos, garantidos por penhora sobre o prédio urbano artigo 1305, efectuada em 23/03/2004, e registada na Conservatória do Registo Predial pela Ap. 34 de 2006/11/07, até ao montante máximo garantido de 7.751,16€;
6° - Os créditos reclamados pela Fazenda Pública (por dívidas de IRC de 2003 e 2004 objecto de cobrança coerciva nos Processos de Execução Fiscal nº 3964200501010956 e 3964200501058452 e de IRS de 2004 objecto de cobrança coerciva no Processo de Execução Fiscal nº 39642005001059041) os quais se mostram garantidos por penhora sobre o mesmo prédio (artigo 1.305°) registada pela Ap. 89 de 2008/01/08.
L. Sendo que deverá ser revogada a douta decisão de forma a graduar os créditos reclamados e respectivos juros de mora, consoante o acima exposto, uma vez que a mesma viola os art°s. 686 nº 1° C.C., art°. 7449 do CC, 151° do CC, art°. 108º do CIRC, art°. 8° do DL. nº 73/99 de 16 de Março e art°. 44º da LGT.»


Não houve contra alegações.

O EMMP pronunciou-se emitindo parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso na consideração de que quanto aos créditos de I.M.I. e de C.A. graduados em 3.º lugar de privilégio imobiliário sobre o imóvel penhorado, é certo serem os mesmos de graduar em 1.º lugar, conforme conjugadamente resulta do disposto no art. 751.º do CC. E que, gozando o crédito de I.R.C. graduado em 3.º lugar de privilégio imobiliário geral, conforme ora previsto no art. 116.º do C.I.R.C., deve o mesmo ser graduado logo após os garantidos por hipoteca, em face do que previsto no art. 749.º n.º 1 do C.C. e antes dos demais garantidos por mera penhora, agora por aplicação do disposto no art. 733.º do C.C., mais defendendo que quanto aos juros de mora os quais não constam explicitamente da graduação, são de considerar quanto aos cobertos por privilégio os juros dos últimos 2 anos, nos termos do art. 724.º do C.C. e que quanto a todos os demais créditos a graduar, por estarem garantidos por penhora, são de considerados abrangidos os juros dos últimos 3 anos, nos termos do art. 44.º n.º 2 da L.G.T., na redacção à data aplicável (anterior à dada pelo Dec.-Lei n.º 64-B/2011, de 30/12), sendo ainda aplicável por remissão o art. 8º do Dec.-Lei n.º 73/99, de 16/3, em que se prevê a taxa aplicável.
2 – FUNDAMENTAÇÃO

O Tribunal de primeira instância deu como provada a seguintes factualidade:

1. Contra A……………, NIF ……………, corre no Serviço de Finanças do Porto 3, o Processo de Execução Fiscal n°3360200301000608 e Aps. para cobrança de dívidas de IRS do ano de 2002, de IMI dos anos de 2003 a 2008 e de coimas fiscais (cfr. fls. 3 e 4-19 dos autos e PEF apenso).
2. Em 23/03/2004 foi efectuada a penhora do prédio urbano sito na Rua ………….., nºs ……. e ………., Freguesia de ………….., Porto, inscrito na matriz urbana sob o artigo 1305°, e descrito na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o n°51.127 (cfr. fls. 3 dos autos e fls. 12 do PEF apenso) para garantia das quantias exequendas no Processo de Execução Fiscal n°3360200301000608, no montante de 7.751,16 € é; penhora registada na Conservatória do Registo Predial pela Ap. 34 de 2006/11/07 (cfr. fls. 3 dos autos e fls. 12 e 33-41 do PEF apenso).
3. O identificado prédio (artigo 1305°) foi vendido em 26/01/2009, tendo sido adjudicado à B…………., SA., pelo valor de 70.000,00 € (cfr. fls. 3 dos autos e fls. 12 e 286 do PEF apenso).
4. Sobre o identificado prédio (artigo 1305°) havia sido constituída hipoteca a favor do BANCO ………, SA - Banco que em virtude da fusão, por incorporação, registada na 4ª Conservatória do Registo Comercial de Lisboa pela Ap 17/010723, integra agora a B…………, SA (cfr. fls. 24- 44 dos autos) — registada sob a Inscrição C-1, pela Ap. 39 de 1995/05/15, no montante máximo garantido de 54.600.000$00, para garantia do pagamento de todas e quaisquer responsabilidades assumidas pela sociedade D……………, LDA., (cfr. fls. 33-41 do PEF apenso).
5. Sobre o identificado prédio (artigo 1305°) havia também sido constituída hipoteca a favor do BANCO ………………, SA — Banco que em virtude da fusão, por incorporação, registada na 1ª Conservatória do Registo Comercial do Porto pela Ap 8/2000063 0, integra agora o BANCO ……………….., SA (cfr. fls. 134-145 dos autos) - registada sob a Inscrição C-1, pela Ap. 43 de 1999/04/14, no montante máximo garantido de 21.765.251$00, para garantia do pagamento de todas e quaisquer responsabilidades assumidas pela sociedade D…………., LDA., nomeadamente descontos de letras, livranças, emissões de fianças, subscrição de cheques, abertura de contas correntes, descobertos à ordem, empréstimos caucionados e outros títulos (cfr. fls. 3 dos autos e fls. 12 e 33-41 do PEF apenso).
6. O BANCO ………., SA cedeu à C’…………… — sucursal em Portugal, os créditos detidos sobre a sociedade D……….., LDA., incluindo os garantidos por aquela hipoteca, a qual por sua vez os cedeu à C……………., SA, NIPC ……………. (cfr. fls. 58-133 dos autos).
7. Contra o executado A…………. correm no Serviço de Finanças do Porto 3 outros Processos de Execução Fiscal para cobrança de dívidas de IRC dos anos de 2003 e 2004, inscritos para cobrança em 2006, e de IRS de 2004, inscritos para cobrança em 2006, no montante total de 403,00 € e por dívidas de Contribuição Autárquica de 2003 e 2003, de IRC dos anos 2001, 2002 e 2003, inscritos para cobrança em 2004, 2005 e 2006 e de IRS do ano de 2004, inscritos para cobrança nos anos de 2004 e 2005, no montante total de 4.210,376 € (cfr. fls. 3-19 dos autos).
8. Os créditos por dívidas de IRC de 2003 e 2004, objecto de cobrança coerciva nos Processos de Execução Fiscal nº 3964200501010956 e 3964200501058452 e de IRS de 2004 objecto de cobrança coerciva no Processo de Execução Fiscal nº 3964200501059041 mostram-se garantidos por penhora sobre o mesmo prédio (artigo 1305°) registada pela Ap. 89 de 2008/01/08 (cfr. fls. 3-19 dos autos e 158-162 dos autos).

3 – DO DIREITO

Destacam-se os trechos mais relevantes da sentença recorrida do TAF do Porto fls. 190/ 198, dos autos – proc. nº 207/14-30. Ali se expendeu:
Nestes autos de Verificação e Graduação de Créditos, relativos ao Processo de Execução Fiscal nº 3360200301000608 e Aps. em que é Executado A…………….., NIF …………., vêem reclamados os seguintes créditos:
- pela B…………….., SA, NIPC ……………., com sede na Avenida ………., ……….., Lisboa, créditos no montante total de 119.730,51 € (a fls. 20 ss.), que diz garantidos por hipoteca constituída sobre o imóvel penhorado no âmbito do Processo de Execução Fiscal (o prédio urbano sito na Rua ……….., nºs ………. e ……….., Freguesia de …………, Porto, inscrito na matriz urbana sob o artigo 1305°, e descrito na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o n°51.127);
- pela C……….., SA, NIPC …………., com sede no …………, Rua …………, nº …….-……, Lisboa, créditos no montante total de 178.428,76 € (a fls. 50 ss.), que diz garantidos por hipoteca constituída sobre o imóvel penhorado no âmbito do Processo de Execução Fiscal (o já identificado prédio urbano sito na Rua ………, nºs ……. e ……., Freguesia de ………… Porto, inscrito na matriz urbana sob o artigo 1305°, e descrito na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o n°51.127).
Notificada para o efeito (cfr. fls. 152-153) a FAZENDA PÚBLICA veio reclamar (a fls. 155) os seguintes créditos:
- créditos por dívidas de IRC dos anos de 2003 e 2004, inscritos para cobrança em 2006, e de IRS de 2004, inscritos para cobrança em 2006, no montante total de 403,00 €, que diz gozarem de garantia da penhora sobre o imóvel penhorado no processo de execução fiscal, registada em 08/01/2008 na Conservatória do Registo Predial pela Ap. 89;
- créditos por dívidas de Contribuição Autárquica de 2001 e 2002, de IRC dos anos 2001, 2002 e 2003, inscritos para cobrança em 2004, 2005 e 2006 e de IRS do ano de 2004, inscritos para cobrança nos anos de 2004 e 2005, no montante total de 4.210,37 €, que diz gozarem de privilégio imobiliário nos termos dos artigos 116° do CIRC, do artigo 111º do CIRS e do artigo 24° do código de Contribuição Autárquica.
Cumprido o disposto no artigo 866° nº 1 do Código de Processo Civil, os créditos reclamados não foram impugnados (cfr. fls. 166-180).
Dada vista ao Digno Magistrado do MINISTÉRIO PÚBLICO este emitiu o Parecer de 26/04/2012 (a fls. 182 ss.), no sentido de os créditos reclamados e exequendos serem graduados no lugar que lhes competir.
Cumpre, agora, decidir.
SANEAMENTO
(…)

FUNDAMENTAÇÃO
(…)
B) Do Direito
Ao concurso de credores apenas são admitidos, além do exequente, os que gozem de garantia real sobre os bens penhorados, e cada concorrente só pode ser pago pelo produto dos bens a que a sua garantia respeite, nos termos do disposto nos artigos 865° nº 1 e 873° nº 2 do CPC e artigo 240° nº 1 do CPPT. Sendo que, de harmonia com jurisprudência reiterada do STA, o nº 1 do artigo 240° do Código de Procedimento e de Processo Tributário, ao afirmar que “podem reclamar os seus créditos (...) os credores que gozem de garantia real sobre os bens penhorados”, deve ser interpretado amplamente, de modo a terem-se por abrangidos na sua estatuição, não apenas os credores que gozem de garantia geral, stricto sensu, mas também aqueles a quem a lei substantiva atribui causas legítimas de preferência, designadamente, privilégios creditórios sobre os bens penhorados em sede de processo de execução (cfr., entre muitos outros, os Acórdãos do STA de 14/09/2011, Proc. 573/11, e de 04/02/2004, Proc. 2078/03).
Na situação sub judice concorrem à graduação os créditos exequendos, relativos a dívidas de IRS do ano de 2002, de IMI dos anos de 2003 a 2008 e de coimas fiscais (cfr. fls. 3 e 4-19 dos autos e PEF apenso), os créditos reclamados pela B………, SA, no montante total de 119.730,51 € (a fls. 20 ss.), que diz garantidos por hipoteca constituída sobre o imóvel penhorado no âmbito do Processo de Execução Fiscal, os créditos reclamados pela C…………., SA, no montante de 178.428,76 € (a fls. 50 ss.), que diz garantidos por hipoteca constituída sobre o imóvel penhorado no âmbito do Processo de Execução Fiscal e os créditos reclamados pela FAZENDA PÚBLICA (a fls. 155) por dívidas de IRC dos anos de 2003 e 2004, inscritos para cobrança em 2006, e de IRS de 2004, inscritos para cobrança em 2006, no montante total de 403,00 E, que diz gozarem de garantia da penhora sobre o imóvel penhorado no processo de execução fiscal, registada em 08/01/2008 na Conservatória do Registo Predial pela Ap. 89; e por dívidas de Contribuição Autárquica de 2001 e 2002, de IRC dos anos 2001, 2002 e 2003, inscritos para cobrança em 2004, 2005 e 2006 e de IRS do ano de 2004, inscritos para cobrança nos anos de 2004 e 2005, no montante total de 4.210,37 E, que diz gozarem de privilégio imobiliário nos termos dos artigos 116° do CIRC, do artigo 111° do CIRS e do artigo 24° do código de Contribuição Autárquica.
O crédito reclamado pela B…………., SA, encontra-se documentado e garantido por hipoteca registada sob a Inscrição C-1, pela Ap. 39 de 1995/05/15, no montante máximo garantido de 54.600.000$00 sobre o imóvel penhorado no processo de execução fiscal; o prédio urbano sito na Rua …….., nºs ………. e ……….., Freguesia de ………….., Porto, inscrito na matriz urbana sob o artigo 1305°, e descrito na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o nº 51.127. Não tendo aquele crédito sido impugnado tem-se o mesmo por reconhecido - cfr. artigo 868° n°4 do CPC, ex vi do artigo 246° do CPTA.
O crédito reclamado pela C…………….., SA, encontra-se documentado e garantido por hipoteca registada sob a Inscrição C-1, pela Ap. 43 de 1999/04/14, no montante máximo garantido de 21.765.251$00 sobre o imóvel penhorado no processo de execução fiscal (o já identificado artigo 1305°).
De harmonia com o disposto no artigo 686° nº 1 do Código Civil a hipoteca confere ao credor o direito de ser pago pelo valor do imóvel hipotecado com preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo. De igual garantia beneficiam os acessórios do crédito que constem do registo, sendo que, tratando-se de juros, são abrangidos apenas os relativos a três anos (cfr. artigo 693° n°1 e 2 do Código Civil).
Por outro lado, o registo da hipoteca tem eficácia constitutiva (sob pena de não produzir efeitos, mesmo em relação às partes) pelo que os limites da garantia hipotecária têm de se aferir pelo que consta do registo (cfr. artigo 693°, nº 2, e 687° do Código Civil, e artigo 4°, nº 2, do Código de Registo Predial).
Os créditos garantidos por hipoteca gozam do direito de ser pagos com prevalência sobre os demais credores que não tenham privilégio especial ou prioridade de registo (cfr. artigos 686° n°1 do cc), até ao montante máximo registado e com o limite de 3 anos no que respeita a juros (cfr. artigos 693° nºs 1 e 2 do CC).
Sendo que quer a graduação dos créditos garantidos por hipoteca quer a decorrente dos créditos garantidos por penhora se faz pela prioridade do respetivo registo (cfr. artigos 686° n°1 e 822° nº1 do CC).
De harmonia com o disposto no artigo 822° nº 1 do Código Civil o exequente adquire pela penhora o direito de ser pago pelo valor dos bens penhorados com preferência a qualquer outro credor que não tenha garantia real anterior. Sendo que a graduação dos créditos garantidos por penhora se faz pela prioridade do respectivo registo (cfr. artigos 686° n°1 e 822° n°1 do CC), adquirindo o exequente pela penhora o direito de ser pago pelo valor dos bens penhorados com preferência a qualquer outro credor que não tenha garantia real anterior (cfr. artigo 822° n°1 do CC).
Os créditos exequendos, de IRS do ano de 2002, de IMI dos anos de 2003 a 2008 e de coimas fiscais, mostram-se garantidos por penhora sobre o identificado prédio (artigo 1305°) efectuada em 23/03/2004, registada na Conservatória do Registo Predial pela Ap. 34 de 2006/11/07 até ao montante máximo garantido de 7751,16 E. Serão, pois, graduados pelo produto da venda do imóvel penhorado no processo de execução fiscal.
Dos créditos reclamados pela FAZENDA PÚBLICA, os créditos por dívidas de IRC de 2003 e 2004, objecto de cobrança coerciva nos Processos de Execução Fiscal nº 3964200501010956 e 3964200501058452 e de IRS de 2004 objecto de cobrança coerciva no Processo de Execução Fiscal nº 3964200501059041 mostram-se garantidos por penhora sobre o mesmo prédio (artigo 1305°) registada pela Ap. 89 de 2008/01/08 (cfr. fls. 3-19 dos autos e 158-162 dos autos). Serão, pois, graduados pelo produto da venda do imóvel penhorado no processo de execução fiscal.
Os créditos relativos a Contribuição Autárquica e a Imposto Municipal sobre Imóveis beneficiam de privilégio imobiliário especial (cfr. artigo 24° nº 1 do CCA e artigo 122° do CIMI) se os mesmos foram inscritos para cobrança até à venda do bem penhorado (cfr. Acórdão do Pleno do STA de 08/11/2006, Proc. 630/03, in www.dgsi.pt/jsta), mas com os limites temporais previstos naquelas disposições legais: tratar-se de imposto inscrito para cobrança no ano corrente na data da penhora e nos dois anos anteriores (cfr. Acórdãos do STA de 07/01/2009, Proc. 0863/08; de 24/02/2010, Proc. 01194/09; e de 10/03/2010, Proc. 0954/09, in www.dgsi.pt). E de acordo com o disposto no artigo 751° do CC os privilégios especiais são oponíveis a terceiros, ainda que a garantia seja anterior. Os créditos de IRS gozam de privilégio imobiliário sobre os bens existentes no património do sujeito passivo à data da penhora ou outro acto equivalente (cfr. artigo 111° do CIRS), relativamente aos últimos 3 anos, da mesma garantia beneficiando os juros desses créditos como determina o artigo 734° do Código Civil. Créditos que adquiriam também pela penhora na execução fiscal o direito de serem pagos com preferência a qualquer outro que não tenha garantia real anterior, nos termos do artigo 822° nº 1 do CC.
Os créditos de IRC gozam de privilégio imobiliário sobre os bens existentes no património do sujeito passivo à data da penhora ou outro acto equivalente (cfr. artigo 108° do CIRC). Para isso é, porém, necessário que estejam inscritos para cobrança nos três últimos anos a contar do da penhora - ano da penhora e nos dois anos imediatamente antecedentes - (cfr. mesmo artigo 108° do CIRC).
Os créditos de IRS gozam de privilégio imobiliário sobre os bens existentes no património do sujeito passivo à data da penhora ou outro acto equivalente (cfr. artigo 111° do CIRS), relativamente aos últimos 3 anos, da mesma garantia beneficiando os juros desses créditos como determina o artigo 734° do Código Civil.
A penhora do identifica prédio (artigo 1305°) foi efetuada em 23/03/2004.
Pelo que dos créditos de Contribuição Autárquica de 2001 e 2002 e de IMI dos anos de 2003 a 2008, respeitantes àquele prédio apenas gozam de privilégio imobiliário especial (cfr. artigo 24° nº 1 do CCA e artigo 122.º do CIMI) os que foram inscritos para cobrança nos anos de 2004 (ano da penhora) e 2003 e 2002 (dois anos anteriores).
E dos créditos reclamados de IRC apenas gozam de privilégio imobiliário sobre os bens existentes no património do sujeito passivo à data da penhora (cfr. artigo 108° do CIRC) os que foram inscritos para cobrança nos anos de 2004 (ano da penhora) e 2003 e 2002 (dois anos anteriores).
E dos créditos reclamados de IRS apenas gozam de privilégio imobiliário sobre os bens existentes no património do sujeito passivo à data da penhora (cfr. artigo 111° do CIRS), os que foram inscritos para cobrança nos anos de 2004 (ano da penhora) e 2003 e 2002 (dois anos anteriores).
DECISÃO
Pelo exposto, decide-se julgar reconhecidos e verificados os créditos exequendos e reclamados, procedendo-se à sua graduação da seguinte forma:
1° - O crédito reclamado pela B……………., SA, de 119.730,51€, até ao limite máximo garantido (54.600.000$00) pela hipoteca constituída a seu favor, sob a Inscrição C-1, pela Ap. 39 de 1995/05/15 sobre o imóvel penhorado no processo de execução fiscal (o artigo 1305°);
2° - O crédito reclamado pela C……………, SA, de 178.428,76 € até ao montante máximo garantido de (21.765.251$00) pela hipoteca constituída a seu favor sob a Inscrição C-1, pela Ap. 43 de 1999/04/14, sobre o imóvel penhorado no processo de execução fiscal (o artigo 1305°);
3º - Os créditos exequendos e reclamados de Contribuição Autárquica e de IMI respeitantes ao prédio penhorado no processo de execução fiscal (o artigo 1305°), que foram inscritos para cobrança nos anos de 2004 (ano da penhora) e 2003 e 2002 (dois anos anteriores), os quais gozam de privilégio imobiliário especial (cfr. artigo 24° nº 1 do CCA e artigo 122° do CIMI);
4.º - Os demais créditos exequendos, garantidos por penhora sobre o prédio urbano artigo 1305°, efectuada em 23/03/2004, e registada na Conservatória do Registo Predial pela Ap. 34 de 2006/11/07, até ao montante máximo garantido de 7.751,16 €;
5º - Os créditos reclamados pela Fazenda Pública (por dívidas de IRC de 2003 e 2004, objecto de cobrança coerciva nos Processos de Execução Fiscal nº 3964200501010956 e 3964200501058452 e de IRS de 2004 objecto de cobrança coerciva no Processo de Execução Fiscal nº 3964200501059041) os quais se mostram garantidos por penhora sobre o mesmo prédio (artigo 1305°) registada pela Ap. 89 de 2008/01/08;
6° - Os demais créditos reclamados pela Fazenda Pública, por dívidas de IRC, que foram inscritos para cobrança nos anos de 2004 (ano da penhora) e 2003 e 2002 (dois anos anteriores), os quais gozam de privilégio imobiliário sobre os bens existentes no património do sujeito passivo à data da penhora (cfr. artigo 108° do CIRC).

As custas da execução saem precípuas do produto da venda dos bens penhorados - cfr. artigo 455° do CPC.


DECIDINDO NESTE STA
Não obstante estarem genericamente correctos os considerandos da decisão recorrida quanto aos privilégios de que gozam os créditos reclamados e exequendos, a final, a graduação de créditos efectuada merece reparo como vem salientado no parecer do Mº Pº junto deste STA.

Verifica-se que na sentença recorrida constante a fls. 190 e ss. se procedeu à graduação em 1.º. e 2.º lugar de créditos hipotecários, em 3.º lugar de créditos exequendos e reclamados de I.M.I., em 4.º lugar de créditos exequendos e em 5.º lugar de créditos reclamados pela F. P. por I.R.C. de 2003 e 2004 e de I.R.S. de 2004.
A Fazenda Pública defende que deve ser efectuada uma graduação diferente no que respeita ao seguinte:
- créditos de I.M.I. e Contribuição Autárquica (C.A.), os quais se encontram graduados em 3º lugar, mas que deviam ter sido graduados à frente dos garantidos por hipoteca;
- de I.R.C., graduados em 5º lugar, mas que deviam ser sido graduados logo após os anteriormente referidos.
- juros de mora dos últimos três anos.

E assiste-lhe razão atento o disposto nos arts. 688.º n.º 1 e 744.º n.º 1 do Código Civil (CC.), 122.º do C.I.M.I., 24.º do C.C.A., 748.º. do C.C., 108.º do C.I.R.C., 44.º da L.G.T. e 8º do Dec.-Lei n.º 73/99, de 16/3.
Vejamos:
Os créditos de I.M.I. e de C.A. foram graduados em 3.º lugar mas porque gozam de privilégio imobiliário especial sobre o imóvel penhorado, devem ser graduados em 1.º lugar, conforme resulta do disposto no art. 751.º do CC. É que no concurso entre uma hipoteca e um privilégio imobiliário especial devem ser graduados antes do crédito hipotecário reclamado (vide Ac. deste STA de 31/10/2007 tirado no rec. nº 31/10/2007 e Ac. do STJ de 17-5-2007 proferido no proc. P. 07B31309, acessível em www.dgsi.pt, onde se clarifica exemplarmente a distinção entre privilégios mobiliários e imobiliários e a distinção destes na sub categoria de gerais e especiais)
Só os privilégios imobiliários especiais, porque guarnecidos da característica da sequela, se traduzem em garantia real de cumprimento de obrigações, limitando-se os gerais a constituir mera preferência de pagamento.
O privilégio geral não vale contra terceiros titulares de direitos que, recaindo sobre as coisas por ele abrangidas, sejam oponíveis ao exequente (artigo 749.º, nº 1, do Código Civil).
Sobre a solução do conflito entre os privilégios imobiliários especiais e os direitos de terceiro rege o artigo 751º do Código Civil, segundo o qual, os privilégios imobiliários especiais são oponíveis a terceiros que adquiram o prédio ou um direito real sobre ele e preferem à consignação de rendimentos, à hipoteca e ao direito de retenção, ainda que estas últimas garantias sejam anteriores.
No caso dos autos verifica-se que a penhora é de 23/03/2004.
Assim sendo os créditos reclamados de IMI e Contribuição autárquica inscritos para cobrança no ano da penhora e nos dois anteriores deverão ser graduados em 1º lugar.
E, quanto ao crédito de IRC que foi graduado em 3.º lugar porque goza de privilégio imobiliário geral, conforme o disposto no art. 116.º do C.I.R.C., deve o mesmo ser graduado logo após os garantidos por hipoteca, em face do previsto no art. 749.º n.º 1 do C.C. e antes dos demais garantidos por mera penhora, agora por aplicação do disposto no art. 733.º do C.C..
O mesmo não é, pois, de graduar em último lugar, conforme foi efectuado na sentença recorrida.
Finalmente, e quanto aos juros de mora os quais não constam explicitamente da graduação, são de considerar quanto aos cobertos por privilégio os juros dos últimos 2 anos, nos termos do art. 724.º do C.C..
E certo é ainda que quanto a todos os demais créditos a graduar, por estarem garantidos por penhora, são de considerados abrangidos os juros dos últimos 3 anos, nos termos do art. 44.º n.º 2 da L.G.T., na redacção à data aplicável (anterior à dada pelo Dec.-Lei n.º 64-B/2011, de 30/12), sendo ainda aplicável por remissão o art. 8º do Dec.-Lei n.º 73/99, de 16/3, em que se prevê a taxa aplicável.
Em Conclusão:
O recurso é de proceder.
4- DECISÃO:
Pelo exposto acordam os Juízes deste STA em conceder provimento ao recurso procedendo à graduação de créditos, pela seguinte forma:
1º - Os créditos exequendos e reclamados de Contribuição Autárquica e de IMI respeitantes ao prédio penhorado no processo de execução fiscal (o artigo 1305°), que foram inscritos para cobrança nos anos de 2004 (ano da penhora) e 2003 e 2002 (dois anos anteriores), os quais gozam de privilégio imobiliário especial (cfr. artigo 24° nº 1 do CCA e artigo 122° do CIMI) aos quais acrescem juros dos 2 últimos anos;

2º - O crédito reclamado pela B……….., SA, de 119.730,51 €, até ao limite máximo garantido (54.600.00$00) pela hipoteca constituída a seu favor, sob a Inscrição C-1, pela Ap. 39 de 1995/05/15 sobre o imóvel penhorado no processo de execução fiscal (o artigo 1305º);

3º - O crédito reclamado pela C……………, SA, de 178.428,76 € até ao montante máximo garantido de (21.765.251$00) pela hipoteca constituída a seu favor sob a Inscrição C-1, pela Ap. 43 de 1999/04/14, sobre o imóvel penhorado no processo de execução fiscal (o artigo 1305°);

4º - Os demais créditos reclamados pela Fazenda Pública, por dívidas de IRC, que foram inscritos para cobrança nos anos de 2004 (ano da penhora) e 2003 e 2002 (dois anos anteriores), os quais gozam de privilégio imobiliário geral sobre os bens existentes no património do sujeito passivo à data da penhora (cfr. artigo 108° do CIRC) aos quais acrescem juros dos 2 últimos anos;

5º - Os demais créditos exequendos, garantidos por penhora sobre o prédio urbano artigo 1305, efectuada em 23/03/2004, e registada na Conservatória do Registo Predial pela Ap. 34 de 2006/11/07, incluindo juros dos 3 últimos anos, até ao montante máximo garantido de 7.751,16€;

6º - Demais créditos reclamados pela F.P. garantidos pela penhora registada a 8/1/2008, incluindo juros dos 3 últimos anos.

As custas saem precípuas.

Sem custas (no presente recurso).

Lisboa, 29 de Outubro de 2014. - Ascensão Lopes (relator) - Dulce Neto - Francisco Rothes.