Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01202/14
Data do Acordão:12/04/2014
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:ALBERTO AUGUSTO OLIVEIRA
Descritores:REPOSIÇÃO DE QUANTIAS
PROCESSAMENTO DE VENCIMENTOS
REVOGAÇÃO
PRESCRIÇÃO
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
REVISTA
Sumário:Não é de admitir recurso de revista excepcional de acórdão sobre o regime de reposição nos cofres do Estado de quantias indevidamente recebidas se nele se seguiu a jurisprudência fixada em acórdão de uniformização do Supremo Tribunal Administrativo.
Nº Convencional:JSTA000P18340
Nº do Documento:SA12014120401202
Data de Entrada:11/03/2014
Recorrente:A...............
Recorrido 1:MINISTÉRIO DA JUSTIÇA E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Formação de Apreciação Preliminar da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

1.1. A…………… e outros intentaram acção administrativa especial contra o Ministério da Justiça e o Ministério das Finanças e da Administração Pública, peticionando a anulação do despacho do Subdirector-Geral da Administração da Justiça, de 07/11/2006, no qual foi determinada a reposição de quantias, auferidas pelos autores, a título de remuneração, enquanto juízes dos juízos de execução de Lisboa.

1.2. O Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, por acórdão de 23/09/2009 (fls.194/212), julgou improcedente a acção.

1.3. Os autores recorreram para o Tribunal Central Administrativo Sul que, por acórdão de 05/06/2014 (fls.284/303), confirmou o acórdão do TAC.

1.4. É desse acórdão que vem interposto novo recurso, agora com invocação do artigo 150.º do CPTA.

1.5. O Ministério da Justiça sustenta que não se verificam os pressupostos de admissão da revista.

Cumpre apreciar e decidir.

2.1. Tem-se em atenção a matéria de facto considerada no acórdão recorrido.

2.2. O artigo 150.º, n.º 1, do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, «excepcionalmente», recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental»ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».
A jurisprudência deste STA, interpretando o comando legal, tem reiteradamente sublinhado a excepcionalidade deste recurso, referindo que o mesmo só pode ser admitido nos estritos limites fixados neste preceito. Trata-se, efectivamente, não de um recurso ordinário de revista, mas antes, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, de uma «válvula de segurança do sistema» que apenas deve ser accionada naqueles precisos termos.

2.3. Nos termos da alegação dos recorrentes, «O objeto do presente recurso centra-se na questão de saber se, estando em causa a reposição de dinheiros públicos mediante a revogação de um ato administrativo constitutivo de direitos (como o é o ato de concessão e processamento de vencimentos ou abonos) e não através da mera retificação de meros erros materiais ou contabilísticos por parte da Administração, o conteúdo estruturante da aludida norma permite tal reposição dentro de um prazo de cinco anos, nos termos do disposto no artigo 40º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 155/92, de 28 de julho, ou se, pelo contrário só será possível se ocorrer dentro do prazo de um ano, de acordo com o disposto no artigo 141º do CPA».
Ora, o acórdão sobre esse ponto específico, indicado como elemento principal para a revista, ponderou: «no caso em apreciação, estando em causa um despacho de reposição de 7 de Novembro de 2006, relativamente a montantes indevidamente percebidos desde Outubro de 2004 (e num caso desde Setembro de 2005) não só não se verifica fundamento para a prescrição, visto não terem decorrido cinco anos após o seu recebimento, como não decorre a violação do artº 141º do CPA, visto tal norma não merecer aplicação ao diferendo em presença, nos termos do artº 77º da Lei nº 55-B/2004, de 30/12, que deu nova redação ao artº 40º do D.L. nº 155/92, de 28/07, introduzindo-lhe o aludido nº 3, de natureza interpretativa».

O acórdão recorrido, ao confirmar o acórdão proferido na 1.ª instância, que julgou improcedente a presente acção, segue a jurisprudência deste Supremo pelo acórdão do Pleno, de 05/06/2008, em Recurso para a Uniformização de Jurisprudência, Processo n.º 01212/06, objecto de rectificação por acórdão de 22.1.2009, que decidiu: «Uniformizar jurisprudência nos seguintes termos: O despacho que ordena a reposição nos cofres do Estado de quantias indevidamente recebidas, dentro dos cinco anos posteriores ao seu recebimento, ao abrigo do art. 40º, nº 1 do DL nº 155/92, de 28 de Julho, não viola o art. 141º do Código do Procedimento Administrativo, atento o disposto no nº 3 do art. 40º do DL nº 155/92, de 28 de Julho, preceito de natureza interpretativa introduzido pelo art. 77º da Lei nº 55-B/2004, de 30 de Dezembro».
Esse próprio acórdão uniformizador não deixou de reconhecer jurisprudência precedente contrária, mas afastou-se dela porque, nomeadamente, houve que ter em atenção o preceito de natureza interpretativa introduzido pelo artigo 77.º da Lei nº 55-B/2004, de 30 de Dezembro.
E no caso dos autos, aliás, tudo ocorreu já depois dessa Lei interpretativa.
Os recorrentes pretendem que o acórdão uniformizador não poderá ser entendido como fixando doutrina em relação a situações para além das que resultassem de meros erros materiais ou contabilísticos. Ora, a verdade é que se o acórdão uniformizador considerou o afastamento do regime temporal do artigo 141.º do CPA é porque teve em conta o universo a que se aplica este preceito, que é o da revogação de actos inválidos, não de mera operações materiais.
Nestas circunstâncias, estando a matéria esclarecida ao nível deste Supremo Tribunal, e tendo o acórdão recorrido seguido a respectiva linha de entendimento, a problemática trazida perdeu relevo, não podendo ser já considerada de importância fundamental, para o efeito da admissão deste recurso; e, naturalmente, não se revela, também, que a revista seja claramente necessária para melhor aplicação do direito.
Deve notar-se, para responder, ainda, a certa argumentação dos recorrentes, que se o acórdão sob recurso seguiu a jurisprudência fixada por este Supremo Tribunal, não é consistente fundamento do recurso de revista a existência de decisões proferidas por outras instâncias da mesma jurisdição, designadamente pelos tribunais centrais, de sentido divergente. Essas decisões divergentes do entendimento do Supremo poderão, sim, justificar recurso.

3. Pelo exposto e por não se verificarem preenchidos os pressupostos previstos no artigo 150.º, n.º 1, do CPTA, não se admite a revista.

Custas pelos recorrentes.

Lisboa, 04 de Dezembro de 2014. - Alberto Augusto Oliveira (relator) - Vítor Gomes - São Pedro.