Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0879/13
Data do Acordão:05/14/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:VERIFICAÇÃO DE CRÉDITOS
GRADUAÇÃO DE CRÉDITOS
APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO
COMPETÊNCIA DOS TRIBUNAIS FISCAIS
Sumário:I – Após as alterações introduzidas no Código de Procedimento e de Processo Tributário pela Lei n.º 55-A/2010, de 31.12, os Tribunais Tributários continuam a ter competência para conhecer da matéria relativa à verificação e graduação de créditos, tendo ocorrido apenas uma alteração da via ou forma processual adequada ao seu conhecimento, que deixou de ser o processo judicial de verificação e graduação de créditos, para ser o processo judicial de reclamação da decisão proferida pelo órgão da execução sobre a matéria, passando, assim, esta reclamação a constituir a forma processual de exercer a tutela jurisdicional no que toca à verificação e graduação de créditos.
II – Assim sendo, nenhuma censura merece a decisão recorrida que julgou improcedente a excepção de incompetência em razão da matéria do Tribunal para conhecimento da verificação e graduação de créditos que lhe foi remetida pelo Serviço de Finanças após a entrada em vigor da Lei n.º 55-A/2010 (embora o crédito reclamado o tenha sido em data anterior à da entrada em vigor daquela lei), porquanto um eventual erro na forma do processo não determina a incompetência do Tribunal para conhecimento da acção.
Nº Convencional:JSTA00068698
Nº do Documento:SA2201405140879
Data de Entrada:05/17/2013
Recorrente:MINISTÉRIO PÚBLICO
Recorrido 1:A......, S.A. E FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF LEIRIA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL
Legislação Nacional:ETAF02 ART5.
CPPTRIB99 ART2 E ART245 N2.
CPC96 ART64.
L 55-A/2010 DE 2010/12/13.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0323/12 DE 2012/05/09.; AC STA PROC0362/11 DE 2011/07/06.; AC STA PROC0384/11 DE 2011/07/06.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório -
1 – O Ministério Público recorre para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, de 2 de Novembro de 2012, na parte em que nesta se julgou improcedente a excepção de incompetência material do tribunal para conhecimento da acção de verificação e graduação de créditos, suscitada pelo Ministério Público no seu parecer nos autos, concluindo as suas alegações de recurso nos termos seguintes:
1. A acção de verificação e graduação de créditos, antes da entrada em vigor da Lei n.º 55-A/2010, de 31/12, de absoluta e efectiva jurisdicionalidade, corria termos, integralmente, no Tribunal Tributário desde a sua entrada aí até ao seu final (arts. 245.º/2 e 247/1 do CPPT, na redacção anterior).
2. Apesar de apensada a uma execução, mantinha a sua estrutura e autonomia de acção declarativa em relação àquela, face ao estatuído no art. 868.º do CPC, aplicável «ex vi» arts. 2.º/e) e 246.º do CPPT, classificada na 9.ª espécie pela deliberação n.º 825/2005 do CSTAF, DR II Série, n.º 11, pág. 8921, sendo que o art. 151.º/1 do CPPT referia-se a “incidentes” e a “graduação e verificação de créditos”.
3. É certo que a verificação e graduação de créditos depende de uma prévia reclamação de créditos, mas configuram fases processuais distintas e autónomas já que desta nem sempre resulta aquela, como sucede por exemplo no caso de a única reclamação ser rejeitada.
4. Daí que, na situação em análise, deve considerar-se intentada neste TAF, a acção de verificação e graduação de créditos, em 31/1/2011, e não em 25/09/2009, data da entrada da correspondente reclamação de créditos no Serviço de Finanças.
5. Consequência disso, não se questionando que a Lei n.º 55-A/2010, de 31/12, se deve aplicar aos processos de verificação e graduação de créditos pendentes nos Tribunais Administrativos e Fiscais em 1 de Janeiro de 2011, não é essa a situação que se verifica na vertente situação por o processo ter dado entrada após essa data.
6. Ao decidir como decidiu, a Mmª Juiz “a quo” fez, a nosso ver, errada interpretação e aplicação dos artigos 151º/1 e 245º/2 do CPPT e 126º e 127º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, pelo que deve anular-se a sentença recorrida e substituída por outra que determine a competência do Serviço de Finanças do Cartaxo para tramitar a acção em apreço.
VOSSAS EXCELÊNCIAS, porém, melhor decidirão.

2 - Não foram apresentadas contra-alegações.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
- Fundamentação -
3. Questão a decidir
É a de saber se, como alegado, o tribunal “a quo” era materialmente incompetente para decidir a acção de verificação e graduação de créditos, sendo para tal competente o Serviço de Finanças do Cartaxo, atento as alterações introduzidas no Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro e o facto de o processo ter sido remetido ao tribunal em data posterior à da entrada em vigor daquela Lei.


4. Apreciando.
A sentença recorrida, a fls. 43 a 50 dos autos, julgou improcedente a excepção de incompetência do tribunal para apreciar a acção de Verificação e Graduação de Créditos, suscitada pelo Ministério Público em 1.ª instância no seu parecer nos autos (a fls. 41), fundamentando o decidido nos seguintes termos (cfr. sentença recorrida, a fls. 44/45 dos autos):
«Pelo Digno Magistrado do Ministério Público vem suscitada a incompetência deste Tribunal, por força das alterações introduzidas no artigo 151.º do CPPT, pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro.
Para tanto, alega que “os autos foram intentados com base em expediente que deu entrada neste TAF em 31/1/2011”, pelo que é competente o órgão de execução fiscal.
Atenta a manifesta desnecessidade dispensa-se o contraditório, nos termos do artigo 3.º, n.º 3, do CPC, aplicável ex vi artigo 2.º, al. e), do CPPT, pelo que se passará, desde já, a decidir.
Entende este Tribunal não se verificar a excepção suscitada, pois, não obstante a remessa dos autos ter efectivamente ocorrido em 31/1/2011 (cfr. fls. 1, dos autos), o certo é que a reclamação de créditos deu entrada no Serviço de Finanças do Cartaxo em 29/5/2009 (cfr. carimbo aposto a fls. 5, dos autos), ou seja, em data anterior à entrada em vigor da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro.
Assim, a data relevante para aferir se este Tribunal é ou não competente para apreciar a presente Verificação e Reclamação de Créditos é a data de entrada da petição inicial do serviço de Finanças do Cartaxo pois é nesse momento que se inicia a instância e não quando é remetida a Tribunal.
Encontrando-se, pois, pendente a presente acção à data da entrada em vigor da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, é este o Tribunal competente, improcedendo a excepção suscitada (neste sentido veja-se, entre outros, o acórdão do STA de 9/5/2012, rec. n.º 0323/12).»
Alega, porém o Ministério Público, para sustentar a incompetência material do Tribunal para decidir da verificação e graduação de créditos, que tal acção - que apesar de apensada a uma execução, mantinha a sua estrutura e autonomia de acção declarativa em relação àquela, face ao estatuído no art. 868.º do CPC, aplicável «ex vi» arts. 2.º/e) e 246.º do CPPT, classificada na 9.ª espécie pela deliberação n.º 825/2005 do CSTAF -, deve considerar-se intentada em 31/1/2011, data da sua entrada no Tribunal, e não em 25/09/2009, data da entrada da correspondente reclamação de créditos no Serviço de Finanças, porquanto embora a verificação e graduação de créditos dependa de uma prévia reclamação de créditos,(…) configuram fases processuais distintas e autónomas já que desta nem sempre resulta aquela, como sucede por exemplo no caso de a única reclamação ser rejeitada,
Vejamos.
Como consignado nos acórdãos deste STA de 6 de Julho de 2011, proferidos nos recursos nºs 0362/11 e 384/11, e abundantemente repetido nos muitos outros que se lhes seguiram nos quais a questão decidenda era a de saber se as alterações ao CPPT introduzidas pela Lei n.º 55-A/2010 eram aplicáveis aos processos pendentes nos Tribunais Tributários à data de 1 de Janeiro de 2011, as alterações introduzidas por aquela Lei aos artigos 97.º, alínea o), 151.º n.º 1, 243.º, 245.º, 247.º e 278.º do CPPT não se traduziram em alterações respeitantes à competência dos tribunais tributários ou que contendam com o poder jurisdicional conferido aos magistrados desses tribunais de aplicar o direito aos litígios que surjam no âmbito de processos de execução fiscal, já que estes processos executivos continuam a estar na dependência do juiz do Tribunal Tributário, mesmo na fase em que correm perante as autoridades administrativas, e ele continua a deter poder jurisdicional para apreciar a matéria da verificação e graduação de créditos (agora através da forma processual da reclamação judicial), embora só após a pronúncia do órgão da execução, e, portanto, através de uma forma processual diversa - razão por que se pode continuar a afirmar que as execuções instauradas no serviço de Finanças e os inerentes actos de verificação e graduação de créditos continuam a ser da competência do Tribunal Tributário. Traduziram-se tais alterações, apenas e ao invés, numa alteração da “forma processual” adequada para conhecimento pelo Tribunal da matéria da verificação e graduação de créditos, que deixou de ser efectuada através do “processo judicial de verificação e graduação de créditos”, para ser efectuada através do meio processual de reclamação da decisão proferida pelo órgão da execução sobre a matéria, previsto nos artigos 276.º do CPPT e 103.º, n.º 2 da LGT, e expressamente contemplado como processo judicial na nova redacção conferida à alínea o) do artigo 97.º do CPPT.
Ora, se assim é - como constitui jurisprudência uniforme e pacífica deste STA -, então manifesto é também que nenhuma censura merece a decisão recorrida que julgou improcedente a excepção de incompetência em razão da matéria do Tribunal para conhecimento da verificação e graduação de créditos que lhe foi remetida pelo Serviço de Finanças em data posterior à da entrada em vigor da Lei n.º 55-A/2010 (ainda que o crédito reclamado o tenha sido em data anterior àquela), porquanto, qualquer que fosse o momento que devesse ser tido como o relevante para decidir se era de aplicar a nova forma processual ou a pretérita, o eventual erro na forma do processo nunca determinaria a incompetência em razão da matéria do Tribunal.

O recurso não merece, pois, provimento.
- Decisão -
5 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso, confirmando, com a presente fundamentação, a sentença recorrida.

Sem custas, por o Ministério Público delas estar isento.

Lisboa, 14 de Maio de 2014. – Isabel Marques da Silva (relatora) – Pedro DelgadoDulce Neto.