Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:053/18
Data do Acordão:03/14/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
PRESSUPOSTOS
Sumário:Atenta a natureza excepcional do recurso de revista previsto no art. 150º do CPTA, (quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito), não se verificam os respectivos pressupostos se as questões suscitadas não revestem tal relevância e tais características.
Nº Convencional:JSTA000P23039
Nº do Documento:SA220180314053
Data de Entrada:01/19/2018
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRUBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:PC.... - PARQUE EÓLICO DE .........., LDA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na formação a que se refere o nº 1 do art. 150º do CPTA, da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

RELATÓRIO
1.1. A Autoridade Tributária e Aduaneira vem interpor recurso de revista excepcional, nos termos do artigo 150º do CPTA, do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS), em 27/04/2017, no processo que aí correu termos sob o nº 09493/16 e no qual se deu provimento ao recurso que a PE... – Parque Eólico de ………, Lda. interpusera da sentença proferida no TAF de Leiria, que julgara improcedente a impugnação por esta deduzida contra o acto de segunda avaliação do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Reguengo do Fetal, concelho da Batalha, sob o artigo P-2773, que corresponde ao Aerogerador nº 20, e ao qual foi fixado o valor patrimonial tributário de 586.130,00 Euros.

1.2. Termina as alegações formulando as conclusões seguintes:
a) A questão que se pretende ver melhor analisada pelo tribunal ad quem no presente recurso, é a de saber se um aerogerador integrado num parque eólico, destinado à injecção de energia elétrica na rede pública tem, ou não, valor económico próprio, ou seja, se o referido aerogerador se pode considerar prédio para efeitos de IMI;
b) Entende a FP que o acórdão recorrido procedeu a uma incorreta interpretação e aplicação do art. 2° do CIMI - em clara violação de lei substantiva -, o que afecta e vicia a decisão proferida, tanto mais que assentou e foi fruto, de um desacerto ou de um equívoco;
c) Na verdade, a questão acima identificada assume relevância social fundamental, porquanto, a situação apresenta contornos indiciadores de que a solução pode constituir uma orientação para a apreciação de outros casos, até porque, está em causa questão que revela especial capacidade de repercussão social ou de controvérsia relativamente a casos futuros do mesmo tipo, em que a utilidade da decisão extravasa, em muito, os limites do caso concreto das partes envolvidas no litígio;
d) Por outro lado a mesma questão assume também relevância jurídica fundamental, uma vez que a questão a apreciar é de elevada complexidade ou, pelo menos, de complexidade jurídica superior à comum;
e) In casu, o presente recurso é também absolutamente necessário para uma melhor aplicação do direito, porquanto o acórdão aqui em crise incorre em erro de interpretação, sendo certo que o erro de julgamento é gerador da violação de lei substantiva;
f) Desta forma, a necessidade de uma melhor aplicação do direito justifica-se, uma vez que, em face das características do caso concreto, existe a possibilidade de este ser visto como um caso-tipo, não só porque contém uma questão bem caracterizada e passível de se repetir no futuro, como a decisão da questão se revela ostensivamente errada, juridicamente insustentável ou suscita fundadas dúvidas, o que gera incerteza e instabilidade na resolução dos litígios;
g) Quanto ao mérito do presente recurso entende a FP que o acórdão recorrido fez, salvo o devido respeito, uma errada interpretação e aplicação do art. 2° do CIMI, em clara violação de lei substantiva, pelo que, no nosso entendimento, não deve manter-se, vejamos porquê:
h) Entendeu o acórdão recorrido que:
“(…), um aerogerador integrado num parque eólico destinado à injecção de energia eléctrica na rede pública, não tem valor económico próprio. Pelo contrário, é no próprio parque eólico que se encontra a manifestação da capacidade contributiva que revela a existência de tal valor, motivo pelo qual é o parque eólico, que não o aerogerador, que é remunerado (…).”
i) Ora, para a FP este acórdão, para além de proceder a uma errónea apreciação e interpretação do conceito de prédio para efeitos fiscais, em manifesta e clara violação do disposto no art. 2° do CIMI, enferma de erro de base nas premissas em que escorou a sua fundamentação, sendo, dessa forma, violadora dos princípios constitucionais da justiça, equidade e segurança fiscais;
j) No tocante à incidência objetiva do IMI, consagra, o art. 2º do CIMI que, é considerado prédio qualquer edifício ou construção dotado de autonomia económica em relação ao terreno onde se encontre implantado, embora situado numa fracção de território que constitua parte integrante de um património diverso ou não tenha natureza patrimonial;
k) Recorta-se assim que, o conceito fiscal de prédio se afasta da noção civilista, ou seja, o art. 2° do CIMI estabelece um conceito específico para a determinação da incidência do IMI, mais amplo do que o constante no art. 204° do CC;
l) Trata-se de um conceito de prédio que diverge, quer do conceito de prédio constante do n° 3 do art. 8° do CIRS, quer do constante do n° 2 do art. 204° do CC;
m) Por outro lado, é entendimento generalizado da doutrina sobre a matéria que, para que uma determinada realidade seja considerada prédio para efeitos fiscais, tem de reunir um elemento de natureza física (fração de território, abrangendo as águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nele incorporados ou assentes, com carácter de permanência), um elemento de natureza jurídica (exigência de que a coisa - móvel ou imóvel - faça parte do património de uma pessoa singular ou colectiva) e um elemento de natureza económica (exigência de que a coisa tenha valor económico em circunstâncias normais);
n) O acórdão recorrido deu como verificados, para efeitos de inscrição do aerogerador como prédio na matriz predial, o elemento de natureza física e o elemento de natureza jurídica, não tendo considerado como verificado o elemento de natureza económica, isto, por considerar que um aerogerador, por si só, não tem valor económico, sendo, no entendimento do referido acórdão, um componente do parque eólico, o qual é essencial para injectar na rede pública energia eólica;
o) Tal argumento é, no nosso entendimento e salvo o devido respeito, claramente infundado, tendo, desde logo, em conta, a composição do parque eólico;
p) Este é composto por aerogeradores assíncronos (torres eólicas), subestações (edifícios de comando), redes de cabos que ligam os aerogeradores às subestações e respectivos acessos, daí que, cada aerogerador é uma unidade independente em termos funcionais constituindo, naturalmente, um prédio urbano para efeitos do IMI e, atendendo à sua natureza, só pode ser qualificado como prédio urbano do tipo ‘Outros”, preenchendo, dessa forma, os requisitos estatuídos no art. 2° do CIMI;
q) Assim, tendo como objetivo a produção de energia eléctrica a partir do vento isto é, ao aproveitamento da energia eólica, os aerogeradores são constituídos por três componentes assentes sob uma sapata de betão e ferro: a torre (estrutura tubular), a “nacelle” ou cabine (compartimento onde ficam instalados o gerador e os sensores de velocidade e direcção do vento) e 3 pás que giram conforme a velocidade do vento;
r) Estamos assim, perante uma construção que semelhantemente ao tradicional “moinho de vento” [que ninguém põe em causa que, para efeitos de IMI, se trata de um prédio], foi construída para aproveitamento do vento e sua transformação em energia.
s) Desta forma, nomeadamente para efeitos da sua posterior avaliação fiscal e determinação do valor patrimonial, há que distinguir, nestas construções, a estrutura - in casu, metálica, que preenche o conceito de construção - das máquinas assentes no seu interior, que permitem o desenvolvimento do exercício da actividade de produção de energia elétrica;
t) Logo, atendendo às definições de coisa simples e composta, bem como às realidades físicas em causa, é possível inferir que - contrariamente ao raciocínio sufragado no acórdão recorrido - cada aerogerador constitui uma unidade independente e possui, inquestionavelmente, valor económico;
u) Isto porque, cada aerogerador admite um único direito e opera como uma unidade, tratando-se de coisa simples, que abrange uma coisa com várias peças que perderam autonomia com a sua junção, com vista à prossecução de um fim unitário: a produção de energia eléctrica;
v) Em suma, cada aerogerador (“coisa simples”) formada pela junção dos seus componentes sapata de betão, torre, cabine e pás) constitui uma unidade funcional independente (dado que o aproveitamento energético do vento pode ser efectuado por uma só unidade);
w) Nestes termos, entende-se que, à revelia do acórdão ora em causa, os aerogeradores devem ser qualificados como prédios, de acordo com o disposto no art. 2° do CIMI, constituindo realidades físicas distintas ou autónomas dos terrenos em que se encontram implantadas, os quais possuem, claramente, valor económico;
x) Refira-se que, quanto ao elemento de natureza económica, o acórdão sufragou que o mesmo não se encontra verificado por o aerogerador pertencer a um parque destinado à injecção de energia eléctrica na rede pública, não se verificando, no entendimento do referido acórdão, o requisito da existência do valor económico em relação a cada um dos aerogeradores, mas apenas em relação ao parque na sua unidade, atenta a sua finalidade;
y) Como é consabido, o elemento económico tem como premissa que determinado bem, em circunstâncias normais, tenha valor económico, independentemente da susceptibilidade de produzir ou não rendimento
z) Desde logo, o aerogerador é uma unidade claramente independente em termos funcionais do parque eólico, com autonomia e valor económico, o qual se traduz na susceptibilidade gerar rendimentos ou outro tipo de utilidades para o seu titular;
aa) Por outro lado, um aerogerador não precisa de estar integrado num parque eólico para produzir energia eléctrica, já que entre os aerogeradores de um mesmo parque eólico não existe qualquer ligação;
bb) Ora, a presença do elemento económico resulta do facto de o bem possuir, em circunstâncias normais, valor económico, independentemente da susceptibilidade de produzir ou não rendimento, sendo que este valor económico parece estar ligado intimamente ao preço de mercado, ou seja, é um valor expresso em moeda que se afere com objectividade e para cuja formação concorrem o valor de uso e o valor de troca, valores, estes, eminentemente sociais e que se influenciam mutuamente;
cc) É facto que todas as construções apresentam um valor económico;
dd) Resulta também dos autos o preenchimento do elemento económico através da licença emitida pela Direcção de Energia e Geologia, em 2008;
ee) Logo, verifica-se que um aerogerador possui valor económico de per si, por força da sua natureza intrínseca e individual;
ff) Neste contexto, seja qual for a perspetiva sob a qual seja analisado se, «em circunstâncias normais» um aerogerador tem valor económico, seja pela ótica da suscetibilidade de geração de fluxos de rendimento, seja pela utilidade esperada da sua exploração ou fruição ou, ainda, pelo ótica do mercado, é inegável que se está perante uma estrutura física apta a produzir um bem (energia), da qual se espera que fluam, para a entidade, benefícios económicos futuros;
gg) Aliás, é por reunir estas características que é classificado, contabilisticamente, como um ativo [cfr. definição do § 49 da Estrutura conceptual do Sistema de Normalização Contabilística (SNC)];
hh) Donde resulta que um aerogerador, por si só e em circunstâncias normais, é um bem que tem valor económico suscetível de expressão monetária, seja qual for a perspetiva de análise - o mercado, a utilidade económica potencial ou os fluxos rendimento esperados -, por conseguinte, preenche todas os requisitos legais que habilitam à qualificação como prédio para efeitos da incidência do IMI; 
ii) Importa acrescentar que, se a utilidade da torre de um aerogerador é, nas circunstâncias normais atuais, a de servir de suporte aos equipamentos de produção de energia, isso não obsta a que finda essa funcionalidade, não possa, também em circunstâncias normais, no futuro, ter outro aproveitamento ou afetação, mantendo valor económico, tal como se verificou noutras realidades prediais do passado (e.g., moinhos de vento, atualmente convertidos em museus ou afetos a habitação);
jj) Ao contrário do que é defendido no acórdão recorrido, a construção em que se consubstancia um aerogerador não é classificável como uma componente de um prédio correspondente ao "parque eólico", antes, é uma realidade física e económica completa, que desempenha autonomamente uma função produtora, portanto, dotada de valor económico e, aliás, mesmo na perspetiva contabilística o "parque eólico" não é tratado individualmente como um ativo;
kk) Não se vislumbra que tipo de paralelismo possa ser estabelecido entre, por um lado, as partes integrantes de um edifício, como sejam as portas e janelas, e, por outro, um aerogerador e o "parque eólico" em que se encontra inserido, tanto mais, que o referido parque pode reconduzir-se a um único gerador;
ll) As estruturas que, no âmbito de um "parque eólico" têm como função a conversão da potência da energia elétrica produzida pelo aerogerador e a sua injeção no ramal da rede pública de energia elétrica, desempenham funções complementares da função nuclear, que é a produção;
mm) Considerar que, em circunstâncias normais, um aerogerador integrado num parque eólico destinado à injeção de energia elétrica na rede pública não tem valor económico próprio, é esvaziar a dimensão económica da atividade desenvolvida na fase nuclear - a produção - do circuito económico da energia;
nn) Ora, sendo a atividade de produção de energia eólica em tudo semelhante à da produção de outros tipos de energia renovável, certamente que a ninguém ocorreria afirmar que uma barragem hídrica não tem valor económico em si mesma;
oo) Ao contrário do que é sustentado no acórdão recorrido, não é o "parque eólico" que é remunerado, o que é objeto de venda nos termos do Decreto-Lei n° 33-A/2005 de 16.02 (que alterou o Decreto-Lei n° 339-C/2001, de 29.12), é a eletricidade produzida por cada centro produtor (aerogerador), cujo volume e valor depende do número de aerogeradores concentrados em cada local designado por "parque eólico":
pp) Jurisprudência igualmente relevante para o caso em apreço é a vertida no acórdão do STA, de 2011-10-19, no âmbito do processo n° 0351/11 (Disponível em www.dgsi.pt), no qual, aquele Tribunal considerou, de forma clara, que os edifícios integrantes de uma barragem constituem um prédio urbano suscetível de ser tributado em sede de IMI:
«I- Não está sujeito a IMI o titular de subconcessão de terreno do domínio público hídrico, uma vez que este não pode considerar-se terreno para construção no sentido conferido pelo Código, não sendo possível aqui interpretação analógica.
II- Já nenhum obstáculo existe a que, relativamente às construções efectuadas no terreno e autorizadas no contrato de concessão (subconcessão), estas fiquem sujeitas a IMI, uma vez que o Decreto-Lei n° 468/71 estabelece expressamente que as construções se mantêm na propriedade do concessionário (subconcessionário) enquanto durar a concessão (subconcessão).»:
qq) Também mais recentemente, no estudo elaborado por Vasco Branco Guimarães acerca da qualificação das torres eólicas como prédios urbanos, este refere que:
"(...). Uma vez que as torres eólicas não podem ser prédios rústicos terão de ser prédios urbanos. A Doutrina autorizada publicada enquadra-os na qualificação: Outros. De entre os urbanos deverão ser considerados como Outros. Esta é a solução que corresponde à correcta interpretação do normativo em vigor."
rr) Resulta, assim, que o acórdão a quo procede a uma errada interpretação do disposto no art. 2° do CIMI, na medida em que, como demonstrado, um aerogerador preenche todos os pressupostos legais (elementos jurídico, físico e económico) para ser considerado como prédio para efeitos fiscais;
ss) Refira-se, ainda, que o entendimento propugnado no acórdão recorrido enferma de um erro nas suas premissas, ofendendo, claramente, os mais basilares princípios constitucionais da equidade, justiça e segurança fiscais, consignados no art. 5º da LGT e arts. 103° e 104º, ambos da CRP;
tt) Ora, o entendimento propalado no acórdão recorrido é claramente violador do princípio da justiça, da equidade e da segurança fiscais, bastando, para o efeito, pensar-se que a seguir tal entendimento e tributar-se o parque eólico ao invés dos aerogeradores, originaria que em parque eólicos cuja área de circunscrição abrange vários Concelhos, com taxas diferentes, fosse o parque eólico apenas inscrito num só Concelho, ou no Concelho que tivesse mais componentes, em detrimento de/ou Concelho limítrofe com menos componentes;
uu) Em função do supra exposto é por demais evidente que os aerogeradores, individualmente considerados e em circunstâncias normais, têm valor económico próprio, já que não dependem de outros aerogeradores para cumprir a sua função de produção de energia;
w) Assim sendo, conclui-se que o aerogerador reúne todos os requisitos legais para ser qualificado como prédio para efeitos das normas de incidência em sede de IMI, razão pela qual o acórdão recorrido procede a uma errada interpretação e apreciação do art. 2° do CIMI, colidindo tal entendimento com os princípios constitucionais da segurança, equidade e justiça fiscais.
Termina pedindo
- a admissão do recurso e que lhe seja dado provimento, revogando-se, em conformidade, o acórdão recorrido;
- que em virtude do valor da causa ser superior a 275.000,00 Euros, se determine a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do disposto no n° 7 do art. 6° do Regulamento das Custas Processuais.

1.3. A Recorrida contra-alegou terminando com a formulação das conclusões seguintes:
Do objecto das presentes alegações
A) A Recorrida discorda totalmente da posição adoptada pela Recorrente no âmbito do presente recurso, pela seguinte ordem de razões:
i.) Entende não se encontrarem preenchidos os requisitos, previstos no artigo 150° do CPTA, que permitiriam a interposição daquele recurso;
ii.) Subsidiariamente, caso esse Douto Tribunal ad quem defenda posição diversa — no que não se concede e apenas se admite por dever de patrocínio — deverá o mesmo pronunciar-se no sentido da manutenção do acórdão recorrido e, por via disso, da anulação do acto impugnado, por um aerogerador não consubstanciar um prédio nos termos do artigo 2° do CIMI.
Da falta de preenchimento dos pressupostos do recurso de revista previstos no artigo 150° do CPTA.
B) A Recorrente pretende ver apreciada pelo Douto Tribunal ad quem questão atinente à subsunção de um aerogerador no conceito de prédio nos termos e para os efeitos do artigo 2° do CIMI atenta a posição perfilhada pelo Douto Tribunal a quo no sentido de aquela realidade ser uma parte componente de um parque eólico sem valor económico autónomo, motivo pelo qual não preenche o conceito de prédio para efeitos fiscais;
C) Face à posição adoptada pelo Douto Tribunal a quo, no sentido do não preenchimento do conceito de prédio para efeitos fiscais no que respeita à realidade em presença, a Recorrente, pugnando pelo alegado preenchimento dos requisitos previstos no artigo 150°, n° 1, do CPTA, desencadeadores da admissibilidade do recurso de revista, pretende ver reapreciada pelo Douto Tribunal ad quem a referida questão;
D) A discordância manifestada pela Recorrente relativamente ao sentido decisório perfilhado por aquele órgão jurisdicional não torna, por si só, legítimo o recurso ao presente meio processual;
E) Não se verificando quaisquer dos requisitos elencados no artigo 150°, nº 1, do CPTA — o recurso pressupor a apreciação de questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou ser necessário para uma melhor aplicação do direito —, o presente recurso claudicará;
F) No presente caso mostra-se relevante a circunstância de o Douto Tribunal ad quem ter recentemente negado a admissão de um recurso de revista no âmbito de um processo em tudo idêntico ao dos presentes autos, por considerar não estarem preenchidos os requisitos necessários para o efeito, nos termos do artigo 150º do CPTA;
G) Os motivos invocados pela Recorrente com vista a justificar a admissibilidade do recurso de revista, fundamentalmente assentes (i) na existência de uma decisão «que assentou e foi fruto de um desacerto ou de um equívoco», (ii) na necessidade de uma melhor aplicação do direito porque «a decisão da questão se revela ostensivamente errada, juridicamente insustentável ou suscita fundadas dúvidas, o que gera incerteza e instabilidade na resolução dos litígios», (iii) na existência de «diversas sentenças desses TAF’S com decisões contraditórias» e (iv) no pressuposto da «fundamental intervenção do STA, na qualidade de órgão de regulação do sistema, como condição para dissipar dúvidas», não são aptos a concorrer para o preenchimento dos requisitos previstos no artigo 150°, n° 1, do CPTA;
H) Até porque esse Douto Tribunal ad quem já se pronunciou recentemente e de forma expressa sobre esta matéria, tendo considerado que um aerogerador não preenche o conceito de prédio nos termos do artigo 2° do CIMI;
I) Por outro lado, igualmente atenta a jurisprudência existente sobre a matéria em presença, não se afigura correcto qualificá-la de complexa com vista a despoletar a admissibilidade do presente meio processual, uma vez que a mesma tem sido debatida e clarificada no âmbito de tais arestos de uma forma simples e unânime, não havendo uma única decisão proferida pelos tribunais superiores consonante com o entendimento perfilhado pela Recorrente e, desse modo, contrário ao plasmado no acórdão recorrido, motivo pelo qual também este argumento não procede;
J) Por tudo quanto ficou exposto, entende a Recorrida não se encontrarem preenchidos os requisitos previstos no artigo 150°, n° 1, do CPTA — o recurso pressupor a apreciação de questão que pela sua relevância jurídica ou social se revista de importância fundamental ou ser necessário para uma melhor aplicação do direito —, pelo que, no momento da apreciação sumária de tais pressupostos nos termos do artigo 150º n° 5, do CPTA, o Douto Tribunal ad quem deverá pugnar pela não admissão do presente recurso, o que desde já se requer para os devidos efeitos legais;
K) Não obstante o exposto, caso o Douto Tribunal ad quem considere preenchidos os requisitos previstos no artigo 150º, n° 1, do CPTA, o que apenas se admite por dever de patrocínio, sem, no entanto, conceder, constitui entendimento da Recorrida ser a solução adoptada pelo Douto Tribunal a quo a que melhor se adequa à situação dos autos por se revelar totalmente conforme à lei, nos termos que adiante melhor se exporão;
Da resposta às alegações de recurso da Recorrente
L) Em sede de alegações, entende a Recorrente ser o aerogerador sub judice um prédio na acepção do artigo 2° do CIMI, sem que daí resulte qualquer violação das normas constitucionais oportunamente invocadas pela Recorrida;
M) Discorda a Recorrida da posição adoptada pela Recorrente, na medida em que claudicam os elementos atinentes à natureza física e económica ínsitos no conceito de prédio previsto no artigo 2° do CIMI, sendo certo que uma interpretação conforme à Lei fundamental — in casu, aos princípios constitucionais plasmados nos artigos 103°, n° 2, 165°, n° 1, alínea i), e 112° da CRP — pressupõe necessariamente a não aplicação deste preceito legal à realidade em presença;
N) No que especificamente respeita ao elemento atinente à natureza física, entende a Recorrente que o mesmo não se encontra preenchido uma vez que os aerogeradores de parques eólicos constituem conjuntos integrados de componentes — equipamentos — necessários à produção de energia eléctrica, não possuindo a sapata de betão e a estrutura tubular metálica autonomia funcional intrínseca, não sendo subsumíveis nos conceitos de construção e edificação;
O) No que especificamente respeita ao elemento atinente à natureza económica, não possuindo a sapata e a estrutura tubular metálica autonomia funcional relativamente aos demais componentes integrantes do aerogerador, também não a possui, pelos mesmos motivos e maioria de razão, a nível económico, claudicando, em consequência, o preenchimento do requisito em apreço, conforme já foi aliás expressamente decidido pela jurisprudência dos tribunais superiores, inclusivamente por esse Douto Tribunal ad quem;
P) Em consequência, irrelevam neste contexto os conceitos civilísticos de coisa simples e composta, sendo ademais notório que os aerogeradores são partes componentes de um parque cólico assim como a estrutura tubular e a sapata — realidades tributadas na acepção do artigo 2° do CIMI de acordo com o entendimento da Administração Tributária — são partes componentes de um aerogerador, não estando quaisquer destes componentes por si só — isto é, se individualmente considerados — aptos à produção de energia eólica;
Q) Deste modo, a subsunção da realidade em presença no conceito de prédio previsto no artigo 2° do CIMI não pode deixar de ser vista como um meio inadmissível de determinação da incidência tributária em sede de IMI, bulindo directamente com a tipicidade inerente ao escopo garantístico do princípio da legalidade tributária previsto nos artigos 103°, n° 2, da CRP, e 8°, n° 1, da LGT;
R) Ademais, provindo do entendimento vertido pela Administração Tributária na Circular n° 8/2013, de 4 de Outubro de 2013, do Director-geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, equivale a admitir como possível a definição de obrigações tributárias por meras orientações administrativas, hipótese que resulta manifestamente incompatível com o disposto no artigo 112°, n° 1, da CRP, com o referido princípio da legalidade tributária previsto nos artigos 103º da CRP e 8º da LGT e, de igual modo, com o princípio da reserva de lei previsto no artigo 165°, n° 1, alínea i), da CRP;
S) Tudo ponderado, conclui-se não serem os aerogeradores de parques eólicos prédios na acepção do artigo 2° do CIMI;
T) Em consequência, inversamente à posição assumida pela Recorrente em sede de alegações, mantêm plena razão de ser os argumentos esgrimidos na petição inicial;
U) Nestes termos, requer-se a esse Douto Tribunal ad quem que pugne pela manutenção do sentido decisório sufragado pelo Douto Tribunal a quo;
V) Subsidiariamente, no cenário desse Douto Tribunal ad quem discordar do entendimento supra, revogando o sentido decisório sufragado pelo Douto Tribunal a quo, no que não se concede e se admite apenas por dever de patrocínio, requer-se que diligencie pela baixa dos presentes autos ao Douto Tribunal a quo para efeitos de apreciação das questões jurídicas cujo conhecimento ficou prejudicado pelo sentido decisório propalado no acórdão recorrido, a saber:
i.) Se um aerogerador é um prédio classificável como prédio urbano da espécie «outros» na acepção do artigo 6º, n° 1, alínea d), e 4, do CIMI (no que não se concede);
ii.) Se (no que também não se concede) é aplicável o método de avaliação residual previsto no artigo 46°, n° 2, do CIMI em detrimento do método de avaliação geral previsto no artigo 38° do CIMI;
iii Se o acto administrativo em matéria tributária impugnado padece do vício de falta de fundamentação.
Termina pedindo que:
- não se admita o recurso interposto pela Fazenda Pública, com fundamento na falta de preenchimento dos pressupostos previstos no nº 1 do art. 150º do CPTA;
- caso se entenda que o recurso deve ser admitido, que o mesmo seja, então, julgado improcedente, confirmando-se o acórdão recorrido.
- que se determine a condenação da Fazenda Pública no pagamento das custas.
Subsidiariamente,
- caso o recurso seja admitido e julgado procedente, se determine a baixa dos autos ao Tribunal a quo para apreciação das questões jurídicas cujo conhecimento ficou prejudicado pelo sentido decisório adoptado no acórdão recorrido.



1.4. O Magistrado do Ministério Público junto deste tribunal emitiu o seguinte Parecer:
«A recorrente, FAZENDA PÚBLICA, vem interpor recurso ao abrigo do disposto no artigo 150° do CPTA, do acórdão do TCAS, de 27/04/2017, proferido a fls. 544/568, que julgou procedente recurso jurisdicional interposto de sentença proferida pelo TAF de Leiria, julgando procedente impugnação judicial deduzida contra o ato de fixação de VPT de aerogerador, no entendimento de que tal realidade não preenche o conceito fiscal de prédio pela não verificação do elemento de natureza económica que, exige que a fração do território, em circunstâncias normais, tenha valor económico.
A recorrente produziu alegações, tendo concluído nos termos de fls. 604/608.
A recorrida, PE….. - PARQUE EÓLICO DE ………, LDA., contra-alegou, tendo concluído nos termos de fls. 673/680.
Vejamos, pois, se o recurso deve ser admitido.
Nos termos do estatuído no artigo 150º/1 do CPTA o recurso excecional de revista ali regulado só é admissível quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
É jurisprudência reiterada da SCT deste STA (acórdãos de 14/09/2011-P. 0387/11, de 16/11/2011-P. 740/11 e de 12/01/2012-P. 0899/11, disponíveis em www.dgsi.pt) que:
1. O recurso de revista excecional regulado no artigo 150° do CPTA, pelo seu caráter excecional, estrutura e requisitos, não pode entender-se como de índole generalizada mas antes limitada, de modo a que funcione como uma válvula de escape do sistema, só sendo admissível se estivermos perante uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social se revista de importância fundamental, ou que, por mor dessa questão, a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
2. Assim sendo, este tipo de recurso só se justifica se estamos perante questão que é, manifestamente, suscetível de se repetir num número de casos futuros indeterminados, isto é, se se verifica a capacidade de expansão da controvérsia que legitima o recurso de revista como garantia de uniformização do direito nas vestes da sua aplicação prática.
“Não é de admitir o recurso de revista excecional quando se está perante uma questão pontual e puramente individual, que não é particularmente complexa ou melindrosa do ponto de vista jurídico e não reveste uma importância fundamental do ponto de vista social, e quando não se invoca que a doutrina e/ou jurisprudência se tenha vindo a pronunciar em sentido divergente sobre a questão, tornando necessária a sua clarificação de forma a obter a melhor aplicação do direito, nem se invoca ou vislumbra que tenha ocorrido um erro manifesto ou grosseiro na decisão recorrida” (acórdão do STA, de 21/03/2012-P. 084/12, disponível em www.dgsi.pt)
“...o preenchimento do conceito indeterminado de relevância jurídica fundamental verificar-se-á, designadamente, quando a questão a apreciar seja de elevada complexidade ou, pelo menos, de complexidade jurídica superior ao comum, seja por força da dificuldade das operações exegéticas a efectuar, de um enquadramento normativo especialmente intrincado ou da necessidade de concatenação de diversos regimes legais e institutos jurídicos, ou quando o tratamento da matéria tem suscitado dúvidas sérias quer ao nível da jurisprudência quer ao nível da doutrina.
Já a relevância social fundamental verificar-se-á quando a situação apresente contornos indiciadores de que a solução pode ser um paradigma ou orientação para se apreciarem outros casos, ou esteja em causa questão que revele especial capacidade de repercussão social, em que a utilidade da decisão extravasa os limites do caso concreto das partes envolvidas.
Por outro lado, a clara necessidade de admissão da revista para melhor aplicação do direito há-de resultar da possibilidade de repetição num número indeterminado de casos futuros e consequente necessidade de garantir a uniformização do direito em matérias importantes tratadas pelas instâncias de forma pouco consistente ou contraditória - nomeadamente por se verificar a divisão de correntes jurisprudenciais ou doutrinais e se ter gerado incerteza e instabilidade na sua resolução a impor a intervenção do órgão de cúpula da justiça administrativa como condição para dissipar dúvidas - ou por as instâncias terem tratada a matéria de forma ostensivamente errada ou juridicamente insustentável, sendo objetivamente útil a intervenção do STA na qualidade de órgão de regulação do sistema.
Em suma, a intervenção do STA no âmbito de um recurso excecional de revista só pode considerar-se justificada em materiais de assinalável relevância e complexidade, sob pena de se desvirtuarem os fins tidos em vista pelo legislador com esse recurso.” (acórdão do STA, de 09/10/2013-P. 0185/13, disponível emwww.dgsi.pt).
A recorrente pretende que o tribunal ad quem reaprecie a questão de saber se um aerogerador integra o conceito fiscal de prédio.
Ora, a decisão sindicada seguiu a jurisprudência reiterada e uniforme do STA sobre a questão, no sentido de que um aerogerador não integra o conceito fiscal e prédio pela não verificação do elemento económico, que exige que a fração de território, em circunstâncias normais, tenha valor económico (acórdãos de 15/03/2017-P. 0140/15, de 07/06/2017-P. 01417/16, de 11/10/2017-P. 0360/17, de 15/11/2017-P. 01105/17, de 20/12/2017-P. 01288/17, de 20/12/12/17-P. 01327/17, de 10/10/2018-P. 01280/17 e de 17/10/2018-P. 01109/17, todos acessíveis em www.dgsi.pt).
Assim sendo, não se verificam os pressupostos em que a recorrente faz assentar a admissibilidade do recurso, pois que não será possível afirmar que a questão reveste complexidade hermenêutica determinante para a admissibilidade do recurso (acórdãos do STA, de 28/06/2017-P. 0321/17, de 13/09/2017-P. 0543/17 e 04/10/2017-P. 0757/17, de 25/10/2017-P. 0905/17 e de 20/12/2017-P. 01210/17, disponíveis em www.dgsi.pt).
Por outro lado o recurso excecional de revista não tem como finalidade direta a eliminação de meros erros de julgamento em que, eventualmente, as instâncias tenham ocorrido.
Não se vê, assim, qual a utilidade objetiva de intervenção do STA, enquanto órgão de regulação do sistema, no caso em análise em que a interpretação jurídica do tribunal recorrido coincide com a interpretação reiterada e uniforme do STA.
Não se verificam, pois, em nosso entendimento, os pressupostos de admissão do recurso excecional de revista previsto no artigo 150° do CPTA e atrás devidamente enunciados.
Termos em que não deve ser admitido o recurso.»

1.5. Corridos os vistos legais, cabe decidir.

FUNDAMENTOS
2. Ao abrigo do disposto no nº 6 do artigo 663º do Código de Processo Civil dá-se por reproduzido, para todos os efeitos legais, o probatório constante do acórdão recorrido.

3.1. Por decisão proferida no TAF de Leiria foi julgada improcedente a impugnação deduzida pela PE……. – Parque Eólico de …….., Lda., contra o acto de segunda avaliação do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Reguengo do Fetal, concelho da Batalha, sob o artigo P-2773, que corresponde ao Aerogerador nº 20.
A referida PE….., Lda., interpôs dessa decisão recurso para o TCA Sul onde, por acórdão de 27/4/2017 (fls. 544 a 568), foi dado provimento a tal recurso, revogada a sentença recorrida e julgada procedente a impugnação, com fundamento, no essencial, em que o acto impugnado, que procedeu à 2ª avaliação, enferma do vício de violação de lei, por erro nos pressupostos, uma vez que o determinou o valor patrimonial tributário de uma realidade (aerogerador) que não preenche o conceito fiscal de prédio.
A Fazenda Pública interpõe agora para o STA este recurso de revista excepcional, ao abrigo do disposto no art. 150º do CPTA, alegando que o acórdão recorrido procedeu a uma incorreta interpretação e aplicação do art. 2° do CIMI, o que afecta e vicia a decisão proferida, tanto mais que assentou e foi fruto, de um desacerto ou de um equívoco e que, por isso, se verificam os requisitos de admissibilidade desse recurso.
Há, então, que apreciar se o recurso é admissível face aos pressupostos de admissibilidade contidos no próprio art. 150º do CPTA, em cujos nºs. 1 e 5 se estabelece:
«1 - Das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
(…)
5 - A decisão quanto à questão de saber se, no caso concreto, se preenchem os pressupostos do nº 1 compete ao Supremo Tribunal Administrativo, devendo ser objecto de apreciação preliminar sumária, a cargo de uma formação constituída por três juízes de entre os mais antigos da Secção de Contencioso Administrativo».

3.2. Interpretando este nº 1, o STA tem vindo a acentuar a excepcionalidade deste recurso (cfr., por exemplo o ac. de 29/6/2011, rec. nº 0569/11) no sentido de que o mesmo «quer pela sua estrutura, quer pelos requisitos que condicionam a sua admissibilidade quer, ainda e principalmente, pela nota de excepcionalidade expressamente estabelecida na lei, não deve ser entendido como um recurso generalizado de revista mas como um recurso que apenas poderá ser admitido num número limitado de casos previstos naquele preceito interpretado a uma luz fortemente restritiva», reconduzindo-se como o próprio legislador sublinha na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nº 92/VII e 93/VIII, a uma “válvula de segurança do sistema” a utilizar apenas e só nos estritos pressupostos que definiu: quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para a melhor aplicação do direito.
Na mesma linha de orientação Mário Aroso de Almeida pondera que «não se pretende generalizar o recurso de revista, com o óbvio inconveniente de dar causa a uma acrescida morosidade na resolução final dos litígios», cabendo ao STA «dosear a sua intervenção, por forma a permitir que esta via funcione como uma válvula de segurança do sistema».(Cfr. O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos, 2ª ed., p. 323 e Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2005, p. 150 e ss.)
E no preenchimento dos conceitos indeterminados acolhidos no normativo em causa (relevância jurídica ou social de importância fundamental da questão suscitada e a clara necessidade da admissão do recurso para uma melhor aplicação do direito,(Sobre esta matéria, cfr. Miguel Ângelo Oliveira Crespo, O Recurso de Revista no Contencioso Administrativo, Almedina, 2007, pp. 248 a 296.) também a jurisprudência deste STA vem sublinhando que «…constitui questão jurídica de importância fundamental aquela – que tanto pode incidir sobre direito substantivo como adjectivo – que apresente especial complexidade, seja porque a sua solução envolva a aplicação e concatenação de diversos regimes legais e institutos jurídicos, seja porque o seu tratamento tenha suscitado dúvidas sérias, ao nível da jurisprudência, ou da doutrina.
E, tem-se considerado de relevância social fundamental questão que apresente contornos indiciadores de que a solução pode corresponder a um paradigma ou contribuir para a elaboração de um padrão de apreciação de casos similares, ou que tenha particular repercussão na comunidade.
A admissão para uma melhor aplicação do direito justifica-se quando questões relevantes sejam tratadas pelas instâncias de forma pouco consistente ou contraditória, com recurso a interpretações insólitas, ou por aplicação de critérios que aparentem erro ostensivo, de tal modo que seja manifesto que a intervenção do órgão de cúpula da justiça administrativa é reclamada para dissipar dúvidas acerca da determinação, interpretação ou aplicação do quadro legal que regula certa situação.» (ac. do STA - Secção do Contencioso Administrativo - de 9/10/2014, proc. nº 01013/14).
Ou seja,
- (i) só se verifica a dita relevância jurídica ou social quando a questão a apreciar for de complexidade superior ao comum em razão da dificuldade das operações exegéticas a efectuar, de enquadramento normativo especialmente complexo, ou da necessidade de compatibilizar diferentes regimes potencialmente aplicáveis, ou quando esteja em causa questão que revele especial capacidade de repercussão social, em que a utilidade da decisão extravasa os limites do caso concreto das partes envolvidas no litígio.
- e (ii) só ocorre clara necessidade da admissão deste recurso para a melhor aplicação do direito quando se verifique capacidade de expansão da controvérsia de modo a ultrapassar os limites da situação singular, designadamente quando o caso concreto revele seguramente a possibilidade de ser visto como um tipo, contendo uma questão bem caracterizada, passível de se repetir em casos futuros e cuja decisão nas instâncias seja ostensivamente errada ou juridicamente insustentável, ou suscite fundadas dúvidas, nomeadamente por se verificar divisão de correntes jurisprudenciais ou doutrinais, gerando incerteza e instabilidade na resolução dos litígios.
Não se trata, portanto, de uma relevância teórica medida pelo exercício intelectual, mais ou menos complexo, que seja possível praticar sobre as normas discutidas, mas de uma relevância prática que deve ter como ponto obrigatório de referência, o interesse objectivo, isto é, a utilidade jurídica da revista e esta, em termos de capacidade de expansão da controvérsia de modo a ultrapassar os limites da situação singular (a «melhor aplicação do direito» deva resultar da possibilidade de repetição num número indeterminado de casos futuros, em termos de garantia de uniformização do direito: «o que em primeira linha está em causa no recurso excepcional de revista não é a solução concreta do caso subjacente, não é a eliminação da nulidade ou do erro de julgamento em que porventura caíram as instâncias, de modo a que o direito ou interesse do recorrente obtenha adequada tutela jurisdicional. Para isso existem os demais recursos, ditos ordinários. Aqui, estamos no campo de um recurso excepcional, que só mediatamente serve para melhor tutelar os referidos direitos e interesses») - cfr. o ac. desta Secção do STA, de 16/6/2010, rec. nº 296/10, bem como, entre muitos outros, os acs. de 30/5/2007, rec. nº 0357/07; de 20/5/09, rec. nº 295/09, de 29/6/2011, rec. nº 0568/11, de 7/3/2012, rec. nº 1108/11, de 14/3/12, rec. nº 1110/11, de 21/3/12, rec. nº 84/12, e de 26/4/12, recs. nºs. 1140/11, 237/12 e 284/12.
E igualmente se vem entendendo caber, em princípio, ao recorrente alegar e intentar demonstrar a verificação dos ditos requisitos legais de admissibilidade da revista, alegação e demonstração a levar necessariamente ao requerimento inicial ou de interposição – cfr. arts. 627º, nº 2, 635º, nºs. 1 e 2, e 639º, nºs. 1 e 2 do novo CPC (Correspondentes aos arts. 676º, nº 2, 684º, nºs. 1 e 2, e 685º-A, nºs. 1 e 2, do anterior CPC.) - neste sentido, entre outros, os acórdãos do STA de 2/3/2006, 27/4/2006 e 30/4/2013, proferidos, respectivamente, nos processos nºs. 183/06, 333/06 e 0309/13.

3.3. No caso, afigura-se-nos que não estão verificados os apontados requisitos de admissibilidade do recurso de revista excepcional.
Desde logo porque a recorrente (pretendendo ver reapreciada a questão atinente à subsunção de um aerogerador no conceito de prédio, para os efeitos do disposto no art. 2° do CIMI), justifica a admissibilidade do recurso com «um desacerto» ou «um equívoco» da decisão recorrida, com a necessidade de uma melhor aplicação do direito porque «a decisão da questão se revela ostensivamente errada, juridicamente insustentável ou suscita fundadas dúvidas, o que gera incerteza e instabilidade na resolução dos litígios», com a existência de «diversas sentenças» com «decisões contraditórias» e com a necessidade de «fundamental intervenção do STA, na qualidade de órgão de regulação do sistema, como condição para dissipar dúvidas».
Ora, para além de, como se disse, o recurso de revista excepcional de revista não ter como finalidade directa a eliminação da nulidade ou do erro de julgamento em que porventura caíram as instâncias, de modo a que o direito ou interesse do recorrente obtenha adequada tutela jurisdicional, no caso, também não se verificam as alegadas vicissitudes em que a Fazenda faz assentar a admissibilidade da revista: por um lado, a interpretação legal preconizada no recorrido acórdão do TCA Sul, igualmente tem vindo a ser reafirmada quer pelo STA, conforme se pode constatar dos acórdãos aqui proferidos em 15/3/17, no proc. nº 0140/15 e de 7/6/17, no proc. nº 01417/16, quer dos muitos outros referenciados no Parecer do MP e, por outro lado, não se vê que a questão se configure como de relevância jurídica fundamental, pois que nem é de elevada complexidade jurídica ou de complexidade jurídica superior ao comum (em razão da dificuldade das operações exegéticas a efectuar, de um enquadramento normativo especialmente intrincado, complexo ou confuso, com necessidade de compatibilizar diversos regimes legais, princípios e institutos jurídicos), nem se vislumbra que a respectiva apreciação revista complexidade hermenêutica determinante para a admissão da revista excepcional.
Conclui-se, em suma, que não se preenchem os requisitos de admissibilidade do recurso de revista excepcional (art. 150° do CPTA) que, assim sendo, não pode ser admitido.


DECISÃO
Nestes termos, acorda-se em não admitir o presente recurso de revista excepcional, por se considerar que não estão preenchidos os pressupostos a que se refere o n° 1 do artigo 150º do CPTA.
Custas pela recorrente, com a requerida dispensa do remanescente da taxa de justiça devida, ao abrigo do disposto no nº 7 do art. 6º do Regulamento das Custas Processuais, pois que, sendo o valor da causa superior a 275.000,00 Euros, a apreciação preliminar sumária dos pressupostos da admissibilidade do recurso se reveste de complexidade inferior à comum e a conduta processual das partes a tal não obsta.
Lisboa, 14 de Março de 2018. – Casimiro Gonçalves (relator) – Isabel Marques da Silva – António Pimpão.