Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0536/14
Data do Acordão:04/08/2015
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:INVALIDADE
DECISÃO
SOCIEDADE
INSOLVÊNCIA
Sumário:A isenção de custas consagrada na alínea u) do n.º 1 do artigo 4.º do RCP, para uma sociedade comercial em situação de insolvência, destina-se, não só à própria acção em que se verifica a apresentação à insolvência (ou em que é requerida a declaração de insolvência), mas também às restantes acções em que a sociedade seja parte, desde que se verifiquem os pressupostos da situação de insolvência, com excepção das acções que tenham por objecto litígios relativos ao direito do trabalho.
Nº Convencional:JSTA000P18797
Nº do Documento:SA2201504080536
Data de Entrada:05/13/2014
Recorrente:A............, SA
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Pedido de reforma do acórdão quanto a custas

Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo
1 – RELATÓRIO

A…………, SA, Recorrente, nos autos à margem identificados, notificada do Acórdão deste STA de 19/11/2014 que a condenou nas custas, vem, nos termos do nº 1 do art. 616º e do nº 1 do art.º 666, ambos do Código de Processo Civil (CPC) (disposições aplicáveis ao processo judicial tributário "ex vi" do art.º.2, al. e), do CPPT.), requerer a sua

REFORMA QUANTO A CUSTAS

o que faz nos termos e fundamentos seguintes:

A Recorrente foi notificada do Acórdão que declara o não conhecimento do objecto do recurso por força da invalidade da decisão recorrida.

Resultando do Acórdão "Custas a cargo da recorrente"

Salvo melhor opinião, a insolvente está isenta do pagamento de custas.

Na verdade, conforme resulta dos autos (Artº 18 do requerimento apresentado a 3 de Dezembro de 2012) a Recorrente foi declarada insolvente no dia 4 de Janeiro de 2012.

Ora, nos termos e com os efeitos do art.º 4º nº 1 u) do Regulamento das Custas Processuais (por aplicação remissiva do n.º 3 do artigo 31.º do CPTT) a Recorrente está isenta de custas.

A isenção prevista na referida norma do Regulamento das Custas Processuais abrange todo o tipo de processos judiciais em que a Sociedade em processo de recuperação ou a Sociedade insolvente litigue ou venha a litigar, a única excepção a tal regra diz respeito aos litígios do foro laboral.

O que é naturalmente o caso.

Nos termos do quanto antecede, requer-se a reforma da Acórdão na parte relativa às custas, nos termos dos artigos 616º nº 1 e 666.º nº 1 ambos do Código de Processo Civil, "ex vi" do arts. 2, al. e), do CPPT, estando assim a Recorrente isenta do pagamento de custas.

Ainda que assim não se entenda, o que se aduz por mera cautela e dever de patrocínio, sempre se dirá que o não conhecimento do objecto do recurso, por força da invalidade da decisão recorrida, resulta de um facto não imputável à Recorrente.

10º

Na verdade, a ora recorrente só interpôs o presente recurso porque o despacho foi proferido pelo tribunal a quo – sublata causa, tollitur effectus.

11º

Com efeito, a apreciação do recurso ficou prejudicada pelo efeito do despacho proferido.

12º

Nestes termos, não vislumbra a tão acostumada justiça no juízo de imputar as custas a cargo da recorrente.

13º

Ainda que assim não se entenda, o que se aduz por mera cautela e dever de patrocínio, e se considere que a Recorrente não está isenta de custas, estas deverão ser repartidas entre Recorrente e a Recorrida, uma vez que dispõe a alínea e) do art. 536º do CPC, conjugado com o nº 1 do mesmo artigo, que as custas são suportadas por ambos "Quando se trate de acção tendente à satisfação de obrigações pecuniárias e venha a ocorrer a declaração de insolvência do réu ou executado, desde que, à data da propositura da acção não fosse previsível para o Autor a referida insolvência".

A Fazenda Pública não se pronunciou.
O Ministério Público emitiu parecer no sentido de que deve ser indeferido o pedido de reforma.
2-DECIDINDO:
Entende, este STA que no caso específico se impõe a reforma quanto a custas.
O acórdão cuja reforma é peticionada decidiu não tomar conhecimento do objecto do recurso mas tal sucedeu por força de no mesmo acórdão ter sido declarada a invalidade da decisão recorrida ali se expressando o seguinte: “ (…)a questão da prescrição do tributo que também não foi conhecida oficiosamente e tendo entretanto transitado em julgado a sentença recorrida uma vez que da mesma não foi apresentado recurso não podia a ora recorrente suscitar a questão da prescrição e as demais que suscitou em requerimento autónomo em sede de impugnação (Isto sem prejuízo de, eventualmente, o poder fazer, ainda, noutra sede). Também o Mº Juiz se deveria ter abstido de conhecer das matérias novas que lhe foram suscitadas uma vez que a instância se extinguiu pelo julgamento efectuado de validade da liquidação de sisa efectuada pela AT não podendo extinguir-se a instância de outra maneira designadamente pela inutilidade superveniente da lide.
Assim sendo, o despacho recorrido não pode manter-se devendo ser considerado inválido e inatendível por ter violado a regra da extinção do poder jurisdicional do tribunal de 1ª Instância (neste sentido os Acs do STJ de 26/02/2009 no proc 07B4311 e de 20/05/2010 no proc. 826/04.6TBTMR-C.C1-S1 ambos disponíveis no site da DGSI, entendendo este Tribunal não ser de apreciar as questões suscitadas no requerimento de fls. 82 a 85”.
A bondade da condenação em custas é de facto questionável desde logo por não estar em causa a apresentação de qualquer requerimento por parte da massa insolvente e por a lei consagrar uma isenção subjectiva a favor da ora requerente da reforma de custas sendo nosso entendimento que a isenção de custas consagrada na alínea u) do n.º 1 do artigo 4.º do RCP, para uma sociedade comercial em situação de insolvência, destina-se, não só à própria acção em que se verifica a apresentação à insolvência (ou em que é requerida a declaração a declaração de insolvência), mas também às restantes acções em que a sociedade seja parte, desde que se verifiquem os pressupostos da situação de insolvência, com excepção das acções que tenham por objecto litígios relativos ao direito do trabalho o que tem sustentação na letra da lei. Com efeito, dispõe o artº 4.º/1/u) do RCP que: "As sociedades civis ou comercias, as cooperativas e os estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada que estejam em situação de insolvência ou em processo de recuperação de empresa, nos termos da lei, salvo no que respeita às acções que tenham por objecto litígios relativos ao direito do trabalho".
Acresce referir que não se aplica aqui a jurisprudência citada no parecer do Mº Pº de que: “(…) a declaração de insolvência da requerente fez cessar a situação de insolvência em que se encontrava, determinando a constituição de uma massa insolvente à qual já não é aplicável a isenção do artigo 4.º/1/ u) do RCP (Neste sentido, acórdãos da Relação de Lisboa, de 2013.04.18 - P. 1398/10 e da Relação do Porto de 2012.11.06- P. 352/11, disponíveis no sítio da Internet www.dgsi.pt).”, uma vez que não está aqui a apreciação de qualquer requerimento da massa insolvente mas da própria sociedade insolvente.
E, porque não é tarefa fácil definir com clareza todas as situações de isenção permitimo-nos citar o Sr. Juiz Conselheiro Salvador da Costa (Regulamento das Custas Processuais, anotado e comentado, 2009, páginas 162/163) onde refere: "Trata-se para as referidas situações, de uma isenção subjectiva, duplamente condicionada, por um lado, em quadro de sujeição a medidas de recuperação da empresa ou de situação de insolvência, e, por outro lado, não se tratar de processos do foro laboral, por isso com uma forte vertente subjectiva.
Não é, pois, em rigor, destinada aos sujeitos passivos da declaração de insolvência a que se reporta o artigo 2.º do Código da Insolvência e de Recuperação de Empresas. É mais uma isenção de custas de complexa verificação, sobretudo no que concerne à prova dos pressupostos fáctico-jurídicos da situação de insolvência, porque vai exigir uma decisão de verificação."
Aqui chegados e sustentados neste ensinamento, propendemos para enquadrar a situação concreta na previsão de isenção consagrada no preceito legal citado.
Procede pois o pedido de reforma quanto a custas ficando prejudicado o conhecimento do pedido subsidiário de repartição de custas por ambas as partes.

3. DECISÃO
Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência (como o impõe o n.º 2 do art. 719.º do CPC), em deferir o pedido de reforma quanto a custas consignando-se que no nosso acórdão de 19/11/2014 onde se lê “ Custas a cargo da recorrente” deverá doravante ler-se “ Sem custas”.

Sem custas.

Lisboa, 8 de Abril de 2015. – Ascensão Lopes (relator) – Ana Paula LoboDulce Neto.