Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01613/13
Data do Acordão:03/26/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
MÉTODOS INDIRECTOS
RECLAMAÇÃO PRÉVIA
INCONSTITUCIONALIDADE
Sumário:I – Nos termos do disposto no n.º 5 do art. 86.º da LGT e no n.º 1 do art. 117.º do CPPT, a impugnação do acto de avaliação indirecta com fundamento na falta dos pressupostos da determinação da matéria tributável por métodos indirectos ou no erro na quantificação só é possível após prévia reclamação (procedimento de revisão de matéria tributável) de acordo com o disposto nos arts. 91.º a 94.º da LGT.
II – Tal condição de impugnabilidade não pode ser dispensada pelo Tribunal, ainda que o contribuinte não tenha sido dela expressamente advertido pela Administração tributária na notificação da decisão de avaliação da matéria tributável, não sendo materialmente inconstitucionais as normas dos artigos 117.º n.º 1 do CPPT e 86.º n.º 5 da LGT quando interpretadas nesse sentido.
Nº Convencional:JSTA00068634
Nº do Documento:SA22014032601613
Data de Entrada:10/17/2013
Recorrente:A... E MULHER
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF CASTELO BRANCO
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT
Legislação Nacional:LGT98 ART91 ART86 N5 ART59 N3.
CPPTRIB99 ART117 N1.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0984/10 DE 2011/03/02; AC STAPLENO PROC0876/09 DE 2011/03/17; AC STA PROC0216/13 DE 2013/06/26
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
– Relatório –
1 – A……………. e mulher, B………….., ambos com os sinais dos autos, recorrem para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, de 12 de Junho de 2013, que julgou improcedente a impugnação judicial por eles deduzida contra liquidações adicionais de IVA relativas a 2009, no valor total de €8.809,76, apresentando para tal as seguintes conclusões:
1 – A condição imposto pelo art. 117.º n.º 1 do CPPT de pedido de revisão da matéria colectável como condição para o exercício do Direito de impugnação só pode ser aplicada se prévia e EXPRESSAMENTE Advertido o contribuinte de tal condição.
2.º – Viola os artigos 103.º n.º 2 e 20.º n.º 2 e 5 da Constituição da República Portuguesa a norma do artigo 117.º, n.º 1 do CPPT quando interpretada no sentido de se dispensar ao contribuinte a notificação expressa da condição nela ínsita para o exercício do direito de Impugnação Judicial.
3.ª – Não tendo em qualquer momento processual de calculo de impostos liquidados ao contribuinte sido informado ou advertido de que para exercer direito de Impugnação Judicial de impostos liquidados com recurso a métodos indirectos terá que previamente requerer a revisão da matéria tributável, não lhe pode ser coarctado tal direito de Impugnação.
Pretendem-se assim violados as normas previstas nos artigos 36 n.º 2, 99, 117 do CPPT, art. 68 do CPA, e 235º nº 2 do CPC
Termos em que
Sempre com o Douto Suprimento de Vs. Exas. se pugna pela procedência do presente Recurso, substituindo-se a decisão recorrida por outra que ordene o prosseguimento dos autos de Impugnação.
Assim se crê que venha a ser reposta a JUSTIÇA DO CASO.

2 – Contra-alegou a recorrida, concluindo nos termos seguintes:
a) A notificação de fixação da matéria, por métodos indirectos, refere o seguinte. “(…) contra a fixação poderá V. Exa. solicitar a revisão da matéria tributável fixada por métodos indirectos, numa única petição devidamente fundamentada, dirigida ao Director de Finanças da área do domicílio fiscal, a apresentar no prazo de 30 dias contados a partir da data da presente notificação, com a indicação do perito que o representa, nos termos do art. 91.º da LGT e, eventualmente, o pedido de nomeação de perito independente, nos termos do n.º 4 deste artigo”.
b) O exercício do direito de audição, em sede de procedimento inspectivo, não constitui pedido de revisão da matéria tributável, nem pode ser convolado como tal, pela AT.
c) A impugnação da avaliação indirecta está dependente do pedido de revisão.
d) Nos termos do art. 86.º, n.º 3 da LGT, a avaliação indirecta não é susceptível de impugnação contenciosa directa, salvo quando não dê origem a qualquer liquidação.
e) Por seu turno, diz o n.º 5 do mesmo artigo que “em caso de erro na quantificação ou nos pressupostos da determinação indirecta da matéria tributável, a impugnação judicial da liquidação ou, se esta não tiver lugar, da avaliação indirecta, depende da prévia reclamação nos termos da presente lei”.
f) Não tendo os impugnantes deduzido, em tempo, reclamação quer sobre a quantificação, quer sobre a própria decisão de aplicação dos métodos indirectos, encontra-se precludida a possibilidade de impugnação judicial com base em errónea quantificação ou quanto aos pressupostos de determinação indirecta da matéria tributável, de acordo com o que dispõe o art. 86º nº 5 da LGT e nº 1 do art. 117º do CPPT.
g) Pelo exposto, sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deve ser negado provimento ao recurso.

3 - O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer nos seguintes termos:
(…)
A nosso ver o recurso não merece, claramente, provimento.
Nos termos do disposto nos artigos 117.º/1 do CPPT e 86.º/5 da LGT a impugnação de uma liquidação, cuja matéria tributável foi apurada por métodos de avaliação indirecta, com fundamento em errónea quantificação da matéria tributável e nos pressupostos de aplicação de métodos indirectos depende de apresentação de prévio pedido de revisão da matéria tributável, nos termos do estatuído no artigo 91.º da LGT.
Trata-se, pois, de um pressuposto processual ou condição de procedibilidade, pois traduz-se num requisito cuja verificação a lei exige para que o Tribunal possa e deva pronunciar-se sobre o mérito da causa.
Quanto à necessidade da verificação desse pressuposto de procedibilidade para ser viável a impugnação judicial da liquidação com fundamento em errónea quantificação da matéria tributável e nos pressupostos de aplicação de métodos indirectos parece haver acordo quer na doutrina quer na jurisprudência.
Vêm, agora, os recorrentes sustentar que essa condição só poderá ser aplicada se prévia e expressamente o sujeito passivo tiver sido advertido da mesma, sob pena de violação dos normativos dos artigos 103º/2 e 20.º/2/5 da CRP36.º/2, 99.º e 117.º do CPPT, 68.º do CPA e 235.º/2 do CPC.
A nosso ver a tese dos recorrentes não tem qualquer apoio legal, nem os recorrentes o demonstram de forma consistente.
Como resulta do probatório e dos autos a administração Tributária notificou o recorrente da decisão de avaliação indirecta e da possibilidade de, nos termos do estatuído no artigo 91.º da LGT, solicitar a revisão da matéria tributável fixada por métodos indirectos, no prazo de 30 dias contados da notificação, com indicação do perito que o representasse e, eventualmente, o pedido de nomeação de perito independente.
Os recorrentes não apresentaram pedido de revisão da matéria tributável.
Nessa sequência a AT procedeu à liquidação sindicada, com base na matéria tributável indirectamente avaliada.
Notificada tal liquidação aos recorrentes vieram estes deduzir a presente impugnação judicial.
Ou seja, a AT notificou os recorrentes de todos os actos lesivos, no âmbito do procedimento de liquidação do tributo, indicando-lhes os meios de os impugnar, como resulta, claramente, dos autos.
E se a AT tinha o dever legal de notificar os actos administrativos-tributários lesivos para os recorrentes já não tinha que os notificar do teor dos normativos legais, nomeadamente, do teor dos artigos 117.º/1 do CPPT e 86.º/5 da LGT.
De facto, a lei é dada a conhecer aos cidadãos através da sua publicação no Diário da República, sendo certo que a ignorância ou má interpretação não justifica o seu incumprimento nem isenta as pessoas das sanções nela estabelecidas (artigo 6.º do Código Civil).
Acentue-se que os recorrentes não exerceram o direito de discutir em sede do procedimento de revisão da matéria tributável nem os pressupostos de aplicação dos métodos indirectos nem a errónea quantificação da matéria tributável, podendo fazê-lo.
Por outro lado, os recorrentes não estavam impedidos de deduzir impugnação judicial contra a liquidação do tributo com base em outros fundamentos que não a errónea quantificação da matéria tributável e erro na aplicação dos métodos indirectos, v.g., inexistência do facto tributário e falta de fundamentação.
Aliás, note-se que os recorrentes alegam a fls. 4 e 5 da PI que a impugnação tem, também por base a inexistência de facto tributário, errónea qualificação da matéria tributável, preterição de formalidades legais, falta de fundamentação, embora seja certo que conforme refere a sentença recorrida, substancial e formalmente apenas invocam como fundamentos a errónea quantificação da matéria tributável e erro na aplicação dos métodos indirectos, decisão que os recorrentes acataram.
Portanto, em suma, a nosso ver inexiste norma ou princípio legal que determine que a condição de procedibilidade estatuída no artigo 117/1 do CPPT só pode lograr aplicação se o contribuinte for prévia e expressamente advertido da mesma.
Termos em que deve negar-se provimento ao presente recurso, mantendo-se a sentença recorrida na ordem jurídica.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
- Fundamentação -
4 – Questão a decidir
É a de saber se, como alegado, a prévia reclamação para a comissão de revisão como condição de impugnabilidade de actos tributários com fundamento na errónea quantificação da matéria tributável e nos pressupostos do recurso a métodos indirectos só é exigível se o contribuinte foi prévia e expressamente advertido de que a impugnação com tais fundamentos depende daquela reclamação, sob pena de inconstitucionalidade do artigo 117.º n.º 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), por violação dos artigos 103.º n.º 2 e 20.º n.º 2 e 5 da Constituição.

5 – Matéria de facto
Na sentença objecto do presente recurso foram dados como provados os seguintes factos:
1. O impugnante foi sujeito a ação de fiscalização a coberto da Ordem de serviço nº OI201100138, através da qual foi realizada a análise ao exercício de 2009 da atividade principal de restaurante tipo tradicional, CAE 56101 e, pela atividade secundária de fabricação de produtos à base de carne, CAE 10130 – cfr. fls. 5 do processo administrativo em apenso aos presentes autos;
2. Da inspeção resultou a elaboração do projecto de relatório, o qual foi notificado ao impugnante tendo o mesmo vindo a exercer o direito de audição prévia em 1455/12 – cfr. fls. 30 a 40 do processo administrativo apenso aos presentes autos;
3. Em 31/5/12, através do Ofício nº 31219, é emitida notificação aos impugnantes, dando conta das conclusões do relatório e da fixação do rendimento colectável sobre o IRS de 2009, por métodos indiretos. Na mesma notificação é também informada os impugnantes da fixação do IVA/2009, por métodos indirectos, conforme quadro seguinte:



DESCRIÇÃO
LIQUIDAÇÃO
BASE TRIBUTÁVEL
IMPOSTO EM FALTA
MÉT. INDIRECTOS
1.º Trimestre
12108033
18.353,56
2.202,43
2.º Trimestre
12108035
18.353,56
2.202,43
3.º Trimestre
12108037
18.353,56
2.202,43
4.ºTrimestre
12108039
18.353,70
2.202,44
TOTAL
73.414,38
8.809,73


4. Do Ofício referido em 3 supra, é mencionado que “(…) a decisão de avaliação indireta tem por base factos, motivos e fundamentos constantes do Relatório de Inspecção, tendo os valores sido fixados de acordo com os critérios e cálculos mencionados no referido relatório. Nos termos do art. 91.º da LGT, poderá (ão) solicitar a revisão da matéria tributável fixada por métodos indiretos, numa única petição devidamente fundamentada, dirigida ao Director de Finanças da área do seu domicílio fiscal, a apresentar no prazo de 30 dias contados a partir da data da presente notificação, com a indicação do perito que o representa e, eventualmente, o pedido de nomeação de perito independente (…)” – cfr. fls. 2 do processo administrativo apenso aos presentes autos;
5. Os impugnantes não apresentaram pedido de revisão da matéria tributável fixada para métodos indirectos a que alude “art. 91º da LGT” – acordo;
6. Em 10/12/12, foi apresentada no Serviço de Finanças da Guarda, petição de impugnação a qual foi remetida para este TAF em 10/01/13 e autuada com o o número que deu origem aos presentes autos – cfr. 2 e segs. dos presentes autos.

6 – Apreciando
6.1 Da prévia reclamação para a comissão de revisão da matéria tributável como condição de impugnabilidade do acto de liquidação com fundamento em errónea quantificação da matéria tributável ou inverificação dos pressupostos de recurso a métodos indirectos
A sentença recorrida, a fls. 38 a 45 dos autos, julgou improcedente a impugnação deduzida pelos ora recorrentes contra liquidações de IVA cuja matéria tributável foi apurada por métodos indirectos, no entendimento de que fundamentando-se tal impugnação na errada qualificação/quantificação da matéria colectável sujeita a imposto, bem como erro nos pressupostos da determinação indirecta da matéria tributável do IVA/2009 (cfr. sentença, a fls. 41 dos autos) e não tendo sido precedida de prévio e necessário de pedido de revisão da matéria tributável nos termos do artigo 91.º e seguintes da LGT, encontra-se precludida a possibilidade de impugnação judicial com base em errónea quantificação ou quanto aos pressupostos de determinação indireta da matéria tributável, de acordo com o que dispõe o art. 86.º, n.º 5 da LGT e n.º1 do art. 117.º do CPPT (cfr. sentença recorrida, a fls. 43 dos autos), constituindo tais questões caso resolvido, o que impede que em sede impugnação judicial este tribunal possa conhecer do que vem alegado pelos impugnantes quanto a essa matéria (cfr. sentença, a fls. 44 dos autos).
Alegam porém os recorrentes que tal condição de impugnabilidade, que reconhecem estar expressa e legalmente prevista, só pode, contudo, operar desde que os contribuintes tenham sido dela expressamente advertidos, o que, não tendo sucedido no caso dos autos, determinaria que a impugnação deduzida devesse ser apreciada não obstante não ter sido precedida de pedido de revisão da matéria tributável, devendo julgar-se inconstitucional a norma do artigo 117.º, n.º 1 do CPPT quando interpretada no sentido de se dispensar ao contribuinte a notificação expressa da condição nela ínsita para o exercício do direito de Impugnação Judicial, por violação dos artigos 103.º n.º 2 e 20.º n.º 2 e 5 da Constituição da República Portuguesa.
A recorrida defende a manutenção do julgado recorrido e também o Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Supremo Tribunal defende que o recurso não merece provimento, porquanto a AT notificou os recorrentes de todos os actos lesivos, no âmbito do procedimento de liquidação do tributo, indicando-lhes os meios de os impugnar, como resulta, claramente, dos autos e se a AT tinha o dever legal de notificar os actos administrativos-tributários lesivos para os recorrentes já não tinha que os notificar do teor dos normativos legais, nomeadamente, do teor dos artigos 117.º/1 do CPPT e 86.º/5 da LGT, pois a lei é dada a conhecer aos cidadãos através da sua publicação no Diário da República, sendo certo que a ignorância ou má interpretação não justifica o seu incumprimento nem isenta as pessoas das sanções nela estabelecidas (artigo 6.º do Código Civil).
Vejamos, pois.
Compreende-se a frustração dos contribuintes ao ver-se-lhes negado o direito à apreciação do mérito da impugnação deduzida por não terem previamente reclamado da decisão de fixação da matéria tributável apurada por métodos indirectos para a comissão de revisão a que se refere o artigo 91.º da Lei Geral Tributária. E admite-se até que, se soubessem que tal reclamação era condição da posterior impugnação dos actos de liquidação com fundamento na errónea quantificação da matéria tributável e dos pressupostos de recurso a tais métodos, não teriam deixado de apresentar prévio pedido de revisão. Terão, contudo, visto precludir o seu direito de impugnação dos actos tributários com aqueles fundamentos por desconhecimento das regras processuais tributárias, que não por incumprimento de qualquer dever por parte da Administração, pois que a lei, se obriga à notificação dos meios de defesa e prazos para reagir contra o acto notificado (cfr. o n.º 2 do artigo 36.º do CPPT), a mais não a obriga, a não ser que o contribuinte lhe solicite esclarecimentos adicionais ao abrigo do seu direito à informação (artigo 59.º n.º 3 da Lei Geral Tributária).
Claro está que se tal informação for prestada aos contribuintes pela Administração tributária tanto melhor, pois que, não obstante a ignorância da lei não justificar o seu incumprimento (artigo 6.º do Código Civil), a complexidade da legislação processual fiscal é tal que por vezes nem os profissionais do foro se apercebem das suas especificidades, quanto mais os contribuintes que não disponham de assessoria jurídica especializada.
Não está, porém, na disponibilidade do Tribunal apreciar ou não a impugnação consoante tenha ou não sido previa e expressamente comunicado ao contribuinte que a impugnação de actos tributários cuja matéria tributável foi apurada por métodos indirectos depende de prévia reclamação para a comissão de revisão, pois que tal condição resulta expressa e inequivocamente da lei (artigos 117.º n.º 1 do CPPT e 86.º n.º 5 da LGT), só podendo e devendo ser afastada nos casos em que não se reconheça ao impugnante legitimidade para tal pedido prévio (como se admitiu ser o caso do responsável subsidiário no acórdão deste STA de 2 de Março de 2011, rec. n.º 984/10, não sendo, porém, tal posição a que veio a ser assumida no Pleno da Secção – cfr. o acórdão do Pleno de 17 de Março de 2011, rec. n.º 876/09 – antes se reconhecendo legitimidade ao responsável subsidiário para o pedido de revisão, contado o prazo para a sua dedução da data da citação do executado por reversão), o que manifestamente não é o caso dos autos em que, além do mais e como resulta do probatório fixado (cfr. o seu n.º 4), os contribuintes foram advertidos de que o meio que tinham ao seu dispor para questionar a avaliação indirecta era o de solicitar a revisão da matéria tributável fixada por métodos indiretos, numa única petição devidamente fundamentada, dirigida ao Director de Finanças da área do seu domicílio fiscal, a apresentar no prazo de 30 dias (…).
A arguição de inconstitucionalidade do n.º 1 do artigo 117.º do CPPT (e por identidade de razão, do n.º 5 do artigo 86.º da LGT), quando interpretado no sentido de se dispensar ao contribuinte a notificação expressa da condição nela ínsita para o exercício do direito de Impugnação Judicial, por violação dos artigos 103.º n.º 2 e 20.º da Constituição também não logra convencer este Supremo Tribunal.
De facto, não se vislumbra que resulte da Constituição – da sujeição à reserva de lei das garantias dos contribuintes (artigo 103.º n.º 2 da CRP) ou do princípio da tutela jurisdicional efectiva (artigo 20.º da CRP) – que o Tribunal, para conhecimento do mérito de uma impugnação, possa dispensar a verificação de uma condição de impugnabilidade expressamente estabelecida na lei e não destituída de sentido, no caso de o contribuinte dela não ter sido expressamente advertido pela Administração tributária, a quem a lei expressamente não impõe tal dever.
É que, como se consignou no Acórdão deste Supremo Tribunal de 26 de Junho de 2013, rec. n.º 216/13, a lei – art. 86.º, n.º 5, da LGT («Em caso de erro na quantificação ou nos pressupostos da determinação indirecta da matéria tributável, a impugnação judicial da liquidação ou, se esta não tiver lugar, da avaliação indirecta depende da prévia reclamação nos termos da presente lei») e art. 117.º, n.º 1, do CPPT («Salvo em caso de regime simplificado de tributação ou quando da decisão seja interposto, nos termos da lei, recurso hierárquico com efeitos suspensivos da liquidação, a impugnação dos actos tributários com base em erro na quantificação da matéria tributável ou nos pressupostos de aplicação de métodos indirectos depende de prévia apresentação do pedido de revisão da matéria tributável.».) – fixa uma condição para a impugnação com fundamento em erro na quantificação ou nos pressupostos da determinação indirecta da matéria tributável: a prévia reclamação, nos termos dos arts. 91.º a 94.º da LGT. Esta prévia reclamação constitui um mecanismo tendente a evitar que a discussão passe logo para sede contenciosa e judicial, quando ainda há uma hipótese de, em sede administrativa, haver acordo entre a AT e o sujeito passivo acerca da matéria tributável. Na verdade, o procedimento de revisão está vocacionado para a resolução de meras questões técnicas e não jurídicas, sem prejuízo da apreciação das questões de direito que se refiram aos pressupostos da utilização dos métodos indirectos, «que estão profundamente conexionadas com a verificação dos respectivos pressupostos de facto» (Cfr. DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, Lei Geral Tributária anotada e comentada, Encontro da Escrita Editora, 4.ª edição, nota 5 ao art. 86.º, pág. 746.), como decorre do n.º 14 do art. 91.º da LGT («As correcções meramente aritméticas da matéria tributável resultantes de imposição legal ou que possam ser objecto, de acordo com as leis tributárias, de recurso hierárquico com efeito suspensivo da liquidação e as questões de direito, salvo quando referidas aos pressupostos da determinação indirecta da matéria colectável, não estão abrangidas pelo disposto neste artigo»).; o procedimento de revisão abrange não só as operações de quantificação através de métodos indirectos, mas também a decisão de os utilizar, como evidencia claramente o art. 117.º, n.º 1, do CPPT. Na verdade, se a impugnação dos actos tributários com base em «erro nos pressupostos de aplicação de métodos indirectos» depende de prévia apresentação do pedido de revisão da matéria tributável, é forçoso concluir que este procedimento abrange a decisão de utilização de métodos indirectos (fim de citação).
Do exposto decorre que o recurso não merece provimento, sendo de confirmar a sentença recorrida, que bem julgou.

- Decisão -
7 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.

Custas pelos recorrentes.

Lisboa, 26 de Março de 2014. - Isabel Marques da Silva (relatora) - Dulce Neto - Casimiro Gonçalves.