Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0714/01.8BTLRS 068/15
Data do Acordão:09/19/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO DELGADO
Descritores:SISA
CONTRATO PROMESSA
CESSÃO DE POSIÇÃO CONTRATUAL
AJUSTE DE REVENDA
Sumário:I - Estando assente a cessão da posição contratual e a realização da venda do imóvel entre o promitente vendedor e o terceiro, há uma presunção de tradição entre o promitente vendedor e o cedente, presunção essa que decorre da redacção do artº 2º, parágrafo 2º do CIMSISSD;
II - A obrigação de pagamento do imposto só emerge quando se mostram preenchidos cumulativamente todos os pressupostos contidos na norma do artº 2º, §2º do CIMSISD, ou seja com a cedência a terceiro da posição contratual de comprador no contrato-promessa, assumindo a figura do “ajuste de revenda” e com a outorga da escritura de compra e venda celebrada entre esse terceiro e o primitivo promitente alienante.
III - Nos termos do artº 115º, 4º, do CIMSISD, o imposto é devido no prazo de 30 dias a contar da data da celebração daquela escritura de compra e venda.
Nº Convencional:JSTA000P23584
Nº do Documento:SA220180919068
Data de Entrada:01/20/2015
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A......
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – Vem a Fazenda Pública recorrer para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa de fls. 70 dos autos, a qual julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida por A………., melhor identificado nos autos, contra a liquidação oficiosa de sisa e respectivos juros compensatórios.

Apresenta as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

«I. O impugnante foi alvo de uma acção de inspecção interna, com vista à verificação da sua situação tributária em sede de Sisa, tendo-se concluído a existência de imposto em falta.
II. O impugnante veio apresentar impugnação judicial requerendo, a anulação da referida liquidação, assim como, a condenação ao pagamento de juros indemnizatórios, devidos pelo pagamento indevido, por erro imputável à administração tributária.
III. A Meritíssima Juiz do Tribunal “a quo”, considerou ilegal a liquidação dos juros compensatórios, pois os mesmos foram calculados desde o dia 12/04/1999, data da celebração do contrato de cessão da posição contratual. Continua a Meritíssima Juiz, entendendo que, os juros compensatórios apenas são devidos após 30 dias da data de celebração escritura de compra e venda.
IV. O presente recurso, visa reagir contra a decisão proferida pelo Tribunal “a quo”, julgando parcialmente procedente a impugnação deduzida, anulando os juros compensatórios calculados antes do prazo de 30 dias, após a data de celebração do contrato.
V. Do exposto, resulta que a cobrança do Imposto Sisa deverá ser paga no próprio dia da liquidação, uma vez que o facto gerador é o facto translativo dos bens, nos termos do disposto no art.° 47 do C.I.M.S.I.S.S.D.., sob pena de ficar sem efeito, conforme previsto no art. 15.º do referido diploma legal.»

2 – Não foram apresentadas contra alegações.

3 – O recurso foi interposto junto do TCA Sul, o qual se declarou incompetente em razão da hierarquia para conhecer do mesmo, tendo os autos sido remetidos, para o efeito, a esta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.
Ora, porque, na verdade, as partes divergem apenas quanto à interpretação das regras jurídicas aplicáveis, também aqui se entende, na perspectiva considerada pelo TCAS, que o recurso tem por exclusivo objecto matéria de direito (nº 1 do art. 280º do CPPT).

4 – O Exmº Magistrado do Ministério Público neste Supremo Tribunal Administrativo emitiu fundamentado parecer no sentido do não provimento do recurso.
Entende o Ministério Público que « o facto tributário não ocorre com a celebração do contrato de cedência da posição contratual, mas sim com a celebração do contrato definitivo entre o promitente vendedor e o cessionário, pois só neste momento é que opera a ficção da tradição da coisa e ocorre o facto translativo previsto na norma de incidência. E neste caso, tal como se considerou igualmente na sentença recorrida, mostra-se aplicável o disposto no artigo 115º, 4º, do CIMSISD, ou seja, o imposto é devido no prazo de 30 dias a contar da data da celebração daquele contrato. A mesma solução foi acolhida e transposta para o actual CIMT, como se alcança das disposições conjugadas dos artigos 2º, nº3, alínea e) e 36º, nº9, alínea a), deste código.»
Assim sendo, conclui o Ministério Público que «tendo o contrato definitivo entre o promitente vendedor e o cessionário sido celebrado em 31/03/2000, o imposto de sisa devia ter sido liquidado durante o mês de Abril de 2000. Como tal facto não ocorreu, são devidos juros compensatórios a partir de 1 de Maio de 2000».

Colhidos os vistos legais, cabe decidir.

4 – Com relevância para a decisão, foram dados como provados os seguintes factos:
a) Em 25/02/1998 foi celebrado, entre a sociedade B………, S.A. e o ora impugnante, um contrato que designaram por “contrato promessa de compra e venda”, através do qual a B………., S.A. prometeu vender, e o impugnante prometeu comprar, as seguintes fracções autónomas a construir no edifício a implantar no lote de terreno designado por Lote H da Urbanização de ……….., o qual se encontra descrito na Oitava Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número 1449, da freguesia de São Sebastião da Pedreira (cfr. cópia de “contrato promessa de compra e venda” documento 2 junto pelo impugnante com a PI, a fls. 9 a 17 dos autos, mais concretamente ponto II. 1 e cláusula primeira):
- “A fracção autónoma que vier a corresponder ao décimo andar, Letra A, do Corpo 2, apartamento tipo T4”;
- “A fracção autónoma que vier a corresponder ao lugar de estacionamento automóvel número 36 situado no piso menos três”;
- “A fracção autónoma que vier a corresponder ao lugar de estacionamento automóvel 37 situado no piso menos três”
b) A 12/04/1999 foi celebrado entre o ora impugnante e C……….., e, D………., contrato que designaram por “contrato de cessão de posição contratual”, através do qual o impugnante acordou ceder a C……… e D…….., “ou a quem estes indicarem a sua posição contratual no contrato-promessa” melhor identificado na alínea anterior, mediante o pagamento de 30.150.000$00, (cfr. cópia de “contrato de cessão de posição contratual” documento 3 junto pelo impugnante com a P.I, a fls. 18 a 20 dos autos);
c) A 31/03/2000, no vigésimo sétimo cartório Notarial de Lisboa, C……….. e D……….. celebraram por escritura pública contrato através do qual compraram à B……….., S.A. as fracções autónomas correspondentes: ao décimo andar A, para habitação no corpo dois; a arrecadação número 12 no rés-do-chão do Corpo dois; o estacionamento número 36 na terceira cave, e estacionamento número 37 na terceira cave (cfr. cópia de escritura a fls. 100 a 103 do PAT);
d) Na escritura melhor identificada alínea anterior, declara-se que todas as fracções autónomas fazem parte de prédio urbano situado em S. Sebastião, descrito na oitava conservatória do Registo Predial de Lisboa, sob o número 1449, daquela freguesia, (cfr. cópia de escritura a fls. 100 a 103 do PAT).
e) Na sequência de acção inspectiva à sociedade B…………, S.A., e em cumprimento da ordem de serviço n° 6425 de 20/01/2000 emitida pela 2ª Direcção de Serviço de Finanças de Lisboa, foi efectuada acção inspectiva interna ao sujeito passivo ora impugnante, com vista à verificação da sua situação tributária em sede de SISA, no termo da qual foi elaborado o relatório, a 24/04/2001, constante de fls. 26 a 29 dos autos, tendo-se concluído pela existência de imposto em falta, no valor de 6.030.000$00 (cfr. cópia de conclusões de acção de inspecção e de relatório de inspecção tributária, documento 5 junto pelo impugnante com a PI. a fls. 25 a 29 dos autos),
f) Sob a epígrafe DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS EFECTUADAS AO IMPOSTO MUNICIPAL DE SISA, pode ler-se no relatório inspectivo o seguinte (cfr. cópia de relatório de inspecção tributária, documento 5 junto pelo impugnante com a PI., a fls. 26 a 29):
“Na sequência de acção inspectiva ao sujeito passivo Fundo de Investimento Imobiliário B…….. cuja sociedade gestora é a B……….. S.A (...) verificou-se que o sujeito passivo acima identificado, celebrou com aquela empresa um Contrato Promessa de Compra e Venda datado de 25/02/98 (...), para aquisição da fracção autónoma correspondente ao 10° Andar, letra A do Corpo 2 do Lote H, apartamento T4. (...).
No entanto, veio a verificar-se, que o sujeito passivo Sr. A………., cedeu a sua posição contratual em 12/04/1999 à Srª C…………, conforme consta de carta em Anexo II. Esta cedência de posição contratual, encontra-se sujeita a Imposto Municipal de Sisa, nos termos do § 2° do Art. 2º do C.I.MS.I.S.D.”
g) No mesmo relatório, no ponto VIII — Direito de Audição, pode ler-se (cfr. cópia de relatório de inspecção tributário, documento 5 junto pelo impugnante com a PI., a fls. 26 a 29):
“O campo de aplicação do § 2° do Art.° 20 do Imposto Municipal de SISA, restringe-se à situação do promitente comprador que não entrou na posse do imóvel, ajusta a revenda com um terceiro, sendo a escritura celebrada entre este último e o promitente vendedor (...)
Provada a promessa de compra e venda da fracção autónoma em questão, e o posterior ajuste feito pelo promitente comprador com terceiro, da revenda do mesmo, vindo a escritura de venda a ser celebrada entre o terceiro e os primitivos promitentes vendedores, são duas as tradições que se verificam para efeitos de Imposto municipal de Sisa.”
h) Através do ofício n.º 5446 de 04/07/2001, do 12° Serviço de Finanças de Lisboa, foi o ora impugnante notificado da liquidação adicional de SISA, referente à cessão de posição contratual efectuada em 12/04/1999 no valor de 6.030.0004$00 (a que acrescem 859.234$00 de juros compensatórios) (cfr. cópia de notificação a fls. 51 do PAT);
i) Os juros compensatórios num total de 859.234$00 foram calculados desde 12/04/1999 a 24/04/2001, num total de 743 dias, à taxa de 7% ao ano, data indicada no documento de cálculo da liquidação como a data em que foi prestada informação pelos serviços de inspecção tributária (cfr. cópia de documento a fls. 50 do PAT).
j) A 01/08/2001 o impugnante procedeu ao pagamento de 6.030.000$00 respeitante a SISA, e a 859.234$00 respeitante a juros compensatórios, relativos à cessão de posição contratual efectuada em 12 de Abril de 1999, das fracções que constituem o 10.º A do Corpo 2, os estacionamentos 36 e 37 (cfr. cópia de conhecimento 816, documento 6 junto pelo impugnante com a PI., a fls. 30, e respectivo carimbo).

5. Do objecto do recurso
5.1 A questão objecto do recurso reconduz-se a saber qual o momento em que se inicia a contagem de juros compensatórios devidos por falta de pagamento de Sisa, considerando, nomeadamente, o disposto nos artsº 47º e 115º , nº 4 do CIMSSD.

Na sentença recorrida deu-se como assente que em 25/02/1998 foi celebrado contrato-promessa de compra e venda de fracções autónomas de edifício a implantar em lote de terreno e que em 12/04/1999 o promitente-comprador cedeu a sua posição contratual a outras pessoas, as quais vieram a celebrar o contrato definitivo com o vendedor em 31/03/2000.
Mais se deu como assente que na sequência da emissão de liquidação adicional por parte da AT, esta liquidou juros compensatórios no período compreendido entre 12/04/1999, data em que foi celebrado o contrato de cedência da posição contratual, e 24/04/2001.
Apreciando a questão da invocada ilegalidade dos juros compensatórios considerou o Tribunal Tributário de Lisboa que, ao ter cedido a sua posição contratual no contrato-promessa anteriormente celebrado para aquisição de imóvel, o recorrido fez um ajuste de revenda sujeito a imposto de sisa, ao abrigo do disposto no § 2° do artigo 2° do CIMSISD, o qual era devido aquando da realização do contrato definitivo entre o promitente -vendedor e o cessionário, que ocorreu em 31/03/2000.
No prosseguimento de tal discurso argumentativo a sentença recorrida considerou verificar-se ilegalidade da liquidação.
Isto porque, como ali se deixou expresso, “se o facto tributário só se preenche depois de ser outorgada a escritura de venda entre o promitente vendedor originário e o cessionário, então, por maioria de razão, não pode antes desse momento o cedente dever já imposto de sisa”. E nessa medida concluiu-se que os juros são devidos após 30 dias contados desde o momento da transmissão do bem para a esfera jurídica do cessionário, de acordo com o estabelecido no artigo 115°, n°4, do CIMSISD.

Não conformada alega a recorrente, Fazenda Pública, que nos termos do artigo 47° do CIMSISD a liquidação da sisa deve preceder o acto ou facto translativo dos bens e que à luz do disposto no artigo 115° do mesmo código o imposto de sisa deve ser pago no próprio dia da liquidação, motivo pelo qual, em sua tese, tendo o contrato de cedência da posição contratual sido celebrado em 12/04/1999 é nesta data que se vence a obrigação de imposto.

Carece, no entanto, a nosso ver, de razão legal.
Vejamos.
5.2
Dispunha o artº 2º do antigo Código do Imposto Municipal de Sisa (CIMSISSD) o seguinte:
Artigo 2.º (Incidência real)
«A sisa incide sobre as transmissões, a título oneroso, do direito de propriedade ou de figuras parcelares desse direito, sobre bens imóveis.
§ 1.º Consideram-se, para este efeito, transmissões de propriedade imobiliária:
1.º (... )2.º As promessa de compra e venda ou de troca de bens imobiliários, logo que verificada a tradição para o promitente-comprador ou para os promitentes permutantes, ou quando aquele ou estes estejam usufruindo os bens;
(...) § 2.º Nas promessas de venda entende-se também verificada a tradição se o promitente-comprador ajustar a revenda com um terceiro e entre este e o primitivo promitente vendedor for depois outorgada a escritura de venda.
O antigo Código do Imposto Municipal de Sisa não tipificava a celebração do contrato-promessa de compra e venda de imóveis como facto sujeito a imposto, pelo que nenhum dos promitentes tinha que pagar imposto por mero efeito desse contrato, salvo nos casos em que houvesse, ou tivesse havido, tradição do bem (n.° 2.° do § 1.° do artigo 2.° do CIMSISSD).
Porém, se o promitente adquirente cedesse, a sua posição contratual a um terceiro, como sucedeu na hipótese sub judice, o CIMSISSD sujeitava-o já a imposto na previsão do § 2.° do artigo 2.° do CIMSISSD (Cf. José Maria Fernandes Pires, Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, pag. 317 e também Francisco Pinto Fernandes e José Cardoso dos Santos. Código da Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações, edição da Imprensa Nacional, volume I, pag. 68) .
O sujeito passivo do imposto, neste caso era o cedente e a determinação do valor tributável seguia a regra geral do imposto.
Esta tributação em sede de CIMSISSD tinha a sua razão de ser no facto de os contratos promessa de compra e venda de imóveis terem deixado de ser, «progressivamente, com o desenvolvimento da actividade económica, meros negócios preparatórios de contratos de compra e venda, passando a ser utilizados como instrumentos de realização de investimentos e de especulação imobiliária, que têm por base uma transmissão puramente económica dos bens, proporcionadora de rendimentos» (Ver neste sentido Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 21.04.2010, recurso 924/09, e de 06.06.2012, recurso 903/11, in www.dgsi.pt.).
Normalmente, nestas situações, o promitente adquirente não quer comprar o imóvel, mas pretende, algum tempo depois, ceder a sua posição contratual a terceiro e obter com isso uma mais-valia.
O legislador conhecedor desta realidade e tendo por objectivo de prevenir a fuga ao imposto, não deixou de o reflectir no texto legislativo, pretendendo assim tributar imediatamente a aquisição de uma posição jurídica negociável sobre imóveis.
Refere também a propósito José Maria Pires (Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, ed. Almedina, 2010, , pag. 317) que «o terceiro que adquiriu a posição contratual não pagava qualquer imposto por esse facto, só ficando a ele sujeito na data da celebração da escritura de transmissão do imóvel. Era também nessa data que o cedente pagaria o imposto.».
Em sentido idêntico escrevem F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes (in CIMSISSD, 4ª edição, 1997, pág. 60): «o legislador contentou-se com a tradição jurídica dos bens. A teleologia deste preceito é sujeitar a sisa a revenda ou agenciação de bens alheios feita pelo promitente comprador ao negociar ou ceder a sua posição contratual, entendendo-se que se dá, nestas circunstâncias, uma tradição fiscal do imóvel, embora aquele não intervenha na escritura, uma vez que a sua intervenção no acto é escamoteada. É também no momento da celebração da escritura que se verifica a transmissão contemplada neste p. 2º. É evidente que havendo tradição efectiva não há que lançar mão deste dispositivo legal, sendo a sisa devida nos termos já ali referidos. O campo de aplicação deste preceito restringe-se, pois, à situação do promitente-comprador, que não entrou na posse do imóvel, ajusta a revenda com um terceiro, sendo a escritura celebrada entre este último e o promitente vendedor.». E no que respeita ao prazo do pagamento do imposto, acrescentam ainda os mesmos Autores, em comentário ao artigo 115º do Código (ob. cit., pág. 698):« se ajustou a revenda com terceiro e este vem a celebrar a escritura com o primitivo vendedor, o prazo de trinta dias conta-se da data da escritura que formalizou a venda ao terceiro comprador, ou da tradição que, entretanto se tenha verificado na pessoa do primitivo-promitente-adquirente com a apreensão da coisa e o exercício dos direitos inerentes ao direito de propriedade».
Em suma a obrigação de pagamento do imposto só nasce desde que se verifiquem cumulativamente estes dois factos, primeiro a cedência da posição contratual de comprador no contrato-promessa, assumindo a figura do “ajuste de revenda”, segundo, que o terceiro que adquiriu tal posição no contrato-promessa venha a celebrar efectivamente a escritura de compra e venda a que respeita esse mesmo contrato-promessa (Cf., neste sentido, Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 18.06.2014, recurso 958/13).
E o direito da Administração Tributária à liquidação do imposto só emerge quando se mostram preenchidos todos os pressupostos contidos na norma do artº 2º, §2º do CIMSISD, ou seja com a outorga da escritura de compra e venda celebrada entre esse terceiro e o primitivo promitente alienante.
Daí que se conclua que, como bem decidiu o Tribunal Tributário de Lisboa, o facto tributário não ocorre com a celebração do contrato de cedência da posição contratual, mas sim com a celebração do contrato definitivo entre o primitivo promitente vendedor e o terceiro, pois só neste momento é que opera a ficção da tradição da coisa e ocorre o facto translativo previsto na norma de incidência. E neste caso, tal como se considerou igualmente na sentença recorrida, mostra-se aplicável o disposto no artigo 115º, 4º, do CIMSISD, ou seja, o imposto é devido no prazo de 30 dias a contar da data da celebração daquele contrato.
Aliás, como bem salienta o Exmº Magistrado do Ministério Público neste Supremo Tribunal Administrativo, trata-se de solução que foi acolhida e transposta para o actual CIMT, como se alcança das disposições conjugadas dos artigos 2º, nº3, alínea e) e 36º, nº9, alínea a), deste código.
Em face do exposto haverá de se concluir que tendo o contrato definitivo entre o promitente vendedor e o cessionário sido celebrado em 31/03/2000, o imposto de sisa devia ter sido liquidado durante o mês de Abril de 2000. Como tal facto não ocorreu, são devidos juros compensatórios a partir de 1 de Maio de 2000.

A sentença recorrida, que decidiu neste pendor, não merece censura, pelo que improcederá o presente recurso.


6. Decisão
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo negar provimento ao recurso.
Custas pela recorrente.

Lisboa, 19 de Setembro de 2018. – Pedro Delgado (relator) – António Pimpão – Isabel Marques da Silva.

Segue acórdão de 12 de Dezembro de 2018:

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1. Vem a Fazenda Pública, requerer a reforma do acórdão da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo proferido nos presentes autos em 19.09.2018, invocando o disposto no nº 1 do art. 616º e nº 1 do art. 666º, ambos do Código de Processo Civil.

Alega, em síntese, que no acórdão supra identificado, foi decidido negar provimento ao recurso e condenar a Fazenda Pública, na qualidade de recorrente, em custas.

Sendo que o presente processo é uma impugnação judicial, cuja petição inicial deu entrada no Serviço de Finanças de Lisboa, 12º Bairro Fiscal, em 1 de Outubro de 2001.

Assim alega que ao mesmo se aplica o Código das Custas Processuais (CCJ), aprovado pelo DL 224-A/96 de 26/11 [prévio à entrada em vigor do RCP], na redacção anterior às alterações introduzidas pelo DL 324/03 de 27/12, dado que estas só se aplicam aos processos instaurados após a sua entrada em vigor.

Desta forma conclui que deve atender-se ao previsto na al. a) do nº 1 do artº 2.° do CCJ, que contém uma isenção subjectiva, quanto a custas, relativamente ao Estado, incluindo os seus serviços ou organismos, ainda que personalizados.


2. Com dispensa de vistos dos Ex.mos Conselheiros Adjuntos, dada a simplicidade da questão a apreciar, cumpre decidir.

3. O recorrido foi notificado do pedido de reforma e sobre o mesmo nada disse.

4. Tem razão a Fazenda Pública.

Nos termos do Acórdão de 19.09.2018, proferido por esta Secção de Contencioso Tributário, foi julgado improcedente o recurso deduzido pela Autoridade Tributária e Aduaneira, tendo a Fazenda Pública sido condenada em custas.

Sucede porém que os presentes autos de impugnação judicial deram entrada em 01.10.2001, ou seja na vigência do CCJ aprovado pelo decreto-lei 224-A/96 de 26.11, na redacção anterior às alterações introduzidas pelo decreto-lei 324/03, de 27.12, as quais só se aplicam aos processos instaurados após a sua entrada em vigor.

Em face do exposto constata-se um erro de julgamento na condenação em custas, erro que se verifica por não se ter atentado na data da apresentação da petição inicial em 1ª instância.

Ora, visto o disposto no art. 3º do Regulamento das Custas dos Processos Tributários (DL 29/98, de 11 de Fevereiro), regime de custas anterior à vigência do Dec.Lei n.º 324/2003, de 27 de Dezembro, a Fazenda Pública estava isenta de custas nos processos de natureza tributária.

Sendo que a responsabilidade por custas de entidades públicas, criada pelo decreto-lei nº 324/2003, de 27 de Dezembro, apenas existe nos processos instaurados após a sua entrada em vigor, como resulta do seu artº 14º, nº 1.

Essa entrada em vigor ocorreu em 1 de Janeiro de 2004 de acordo com o nº 1 do artº 16º daquele diploma legal.


Nestes termos, considerando a data da instauração da presente impugnação judicial e os referidos diplomas legais, forçoso é concluir que a Fazenda Pública está isenta de custas pelo que há que reformar, nesta parte, o supracitado acórdão.

5. Termos em que acordam, em conferência, os juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo em proceder à reforma do acórdão proferido nos presentes autos no segmento em que condenou a Fazenda Pública em custas, passando a nele constar “Sem custas, por Fazenda Pública delas se encontrar isenta nos processos tributários instaurados até 1/01/2004 ”.

Sem custas.

Lisboa, 12 de Dezembro de 2018. – Pedro Delgado (relator) – Francisco Rothes – Isabel Marques da Silva.