Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01486/17
Data do Acordão:01/11/2018
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:COSTA REIS
Descritores:RECURSO DE REVISTA
PROVIDÊNCIA CAUTELAR
ELEGIBILIDADE
DESPESAS
Sumário:Deve ser admitida a revista quando se coloca a questão de saber se as despesas elegíveis num contrato de financiamento envolvendo fundos comunitários são as realmente satisfeitas, mesmo que se mostrem excessivas ou desmesuradas, ou apenas as que seriam criteriosas e razoáveis no circunstancialismo em causa.
Nº Convencional:JSTA000P22772
Nº do Documento:SA12018011101486
Data de Entrada:12/22/2017
Recorrente:ASFOALA - ASSOCIAÇÃO DE PRODUTORES FLORESTAIS DO ALTO ALENTEJO
Recorrido 1:INSTITUTO DE FINANCIAMENTO DA AGRICULTURA E PESCAS,IP
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: ACORDAM NA FORMAÇÃO DE APRECIAÇÃO PRELIMINAR DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA:

I. RELATÓRIO
ASFOALA – Associação de Produtores Florestais do Alto Alentejo intentou, no TAF de Castelo Branco, providência cautelar contra o IFAP – Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas, IP, pedindo:
- a suspensão de eficácia da decisão do presidente do conselho consultivo daquele Instituto - que determinou a alteração do contrato de financiamento nº 020335780/0, referente ao pedido de apoio na operação nº 020000043664, designada por área agrupada (AA) do Vale Penedo e Anexas, e a devolução no valor de € 166.543,04 - e a abster-se de lhe exigir a devolução do referido valor ou a compensá-lo com o valor de outros subsídios
- a intimação da mesma entidade a abster-se de suspender o pagamento do valor dos subsídios referentes à operação em áreas agrupadas (AA) do Vale Penedo e Anexas e às restantes operações financiadas por ela e
- a intimação da entidade requerida a abster-se de suspender a análise e aprovação das candidaturas submetidas para a execução de operações AA e em zonas integradas florestais (ZIF’s).

Por despacho de 2.11.2016, o TAF decidiu antecipar o julgamento da causa principal, por considerar preenchidos os requisitos previstos no artigo 121° do CPTA, tendo proferido sentença julgando o pedido parcialmente procedente.

lnconformada - quer com o despacho que decidiu antecipar o juízo da causa principal, quer com a sentença, na parte em que foi mantido o acto impugnado - a Asfoala apelou para o TCA Sul e este, concedendo provimento ao recurso, anulou o processado subsequente ao despacho que antecipou o juízo sobre a causa principal e ordenou a baixa dos autos ao TAF para que nele fosse proferida decisão sobre o pedido cautelar.

O TAF satisfez o ordenado, deferindo a primeira das requeridas medidas e recusando as duas restantes.

O IFAP apelou para o TCA e este, concedendo provimento ao recurso, indeferiu o pedido cautelar pelas razões que sumariou do seguinte modo:
“i) A decisão a proferir sobre o pedido de suspensão de eficácia exige que o julgador constate se há probabilidade de que a acção principal seja procedente, o que implica a probabilidade da ilegalidade do acto ou da norma (art. 120.°, n.º 1, in fine, do CPTA).
ii) É legítimo o IFAP considerar como não elegíveis, para efeito de financiamento pelo FEADER, despesas apresentadas pelo promotor, em pedido de pagamento, consubstanciadas em facturas emitidas por fornecedor subcontratado, naquilo em que tais despesas, sem correspondência real, ultrapassam o chamado preço de entrada, ou 1.º preço.
iii) Na falta de demonstração da ilegalidade do acto suspendendo, a pretensão de que se suspenda a eficácia desse acto soçobra, por falta do indispensável fumus boni juris.”

A Autora não se conforma com essa decisão por entender que não só o Acórdão recorrido é nulo por excesso e omissão de pronúncia, como por ter decidido com base em factos não alegados nem demonstrados, como porque “importa determinar qual a melhor interpretação e aplicação das normas legais que estabelecem as regras gerais de aplicação dos Programas de Desenvolvimento Rural (PDR) financiados pelo Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (FEADER), e que definem o que se deve entender por despesas elegíveis, designadamente à luz do art.º 3.º 1 do D.L. n.º 31-A/2008, de 5-3, e do art.º 11º e o Anexo I da portaria nº 1137-D/2008, de 9-10, e do art.º 24. (EU) nº 65/2011, da Comissão, de 27-1”.

II. MATÉRIA DE FACTO
Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

III. O DIREITO

1. As decisões proferidas pelos TCA em segundo grau de jurisdição não são, por via de regra, susceptíveis de recurso ordinário. Regra que sofre a excepção prevista no art.º 150.º/1 do CPTA onde se lê que daquelas decisões pode haver, «excepcionalmente», recurso de revista para o STA «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». O que significa que este recurso foi previsto como «válvula de segurança do sistema» para funcionar em situações excepcionais em que haja necessidade, pelas apontadas razões, de reponderar as decisões do TCA em segundo grau de jurisdição.
Deste modo, a pretensão manifestada pelo Recorrente só poderá ser acolhida se da análise dos termos em que o recurso vem interposto resultar que a questão nele colocada, pela sua relevância jurídica ou social, se reveste de importância fundamental ou que a sua admissão é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
Vejamos, pois, se tais requisitos se verificam in casu socorrendo-nos para isso da matéria de facto seleccionada no Acórdão recorrido.

2. Está em causa a questão da elegibilidade das despesas que originaram a ordem de devolução impugnada, concretamente as relacionadas com as relações especiais que a Autora teve com a A…………, L.da, e com o excesso de despesas.
Esta Formação admitiu uma revista onde se colocavam os problemas aqui suscitados, admissão que teve por fundamento a circunstância de se estar perante um tema jurídico com “assinalável relevância, não só por inviamente se ligar às obrigações externas do Estado, mas também porque pode repetir-se em casos análogos. Acresce que a questão jurídica em discussão não é de fácil resposta, pelo que uma «brevis cognitio» não permite desde já assegurar que as instâncias a resolveram bem.” – Acórdão de 24/05/2017 (rec. 550/17).
E essa revista já foi julgada tendo sido decidido que:
“I - É legítimo o IFAP considerar como não elegíveis, para efeito de financiamento pelo FEADER, despesas apresentadas pelo promotor, em pedido de pagamento, consubstanciadas em facturas emitidas por fornecedor subcontratado, naquilo em que tais despesas, sem correspondência real, ultrapassam o chamado preço de entrada, ou 1º preço.
II - O acto administrativo que exclui essas despesas está acobertado pelo regime comunitário e nacional no que respeita à elegibilidade de despesas.” – Acórdão de 4/10/2017.

Ou seja, o Acórdão recorrido decidiu de acordo com o entendimento do STA sobre esta problemática.
Todavia, esse único julgamento é insuficiente para se poder considerar que a jurisprudência deste Supremo já está consolidada nesta matéria.
O que nos leva a concluir que se mantém a conveniência em admitir este recurso.

DECISÃO
Termos em que os Juízes que compõem este Tribunal acordam em admitir a revista.
Sem custas.
Lisboa, 11 de Janeiro de 2018. – Costa Reis (relator) – Madeira dos Santos – São Pedro.