Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01145/12
Data do Acordão:02/14/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:VALENTE TORRÃO
Descritores:NOTIFICAÇÃO DO ACTO TRIBUTÁRIO
CÓDIGO DE PROCESSO TRIBUTÁRIO
Sumário:I - Consideram-se atos ou decisões suscetíveis de alterarem a situação tributária dos contribuintes não só aqueles que efetivamente determinam uma alteração desta, mas também aqueles em que está em discussão a possibilidade de se concretizar essa alteração, devendo ser assim qualificados os atos ou decisões que criam deveres ou encargos para os destinatários ou lhes restringem ou negam direitos que aqueles entendem ter, bem como as decisões finais dos processos graciosos, suscetíveis de reclamação, recurso ou impugnação judicial.
II - De acordo com o disposto no nº 1 do artº 65º do CPT, estes atos ou decisões deviam ser notificados por carta registada, com aviso de receção, considerando-se efetuada a notificação na data em que ele for assinado pelo destinatário (artº 66º, nº 3 do mesmo diploma).
III - Estando em causa nos autos o indeferimento de uma reclamação graciosa relativa a liquidações de IRS, estamos perante uma decisão enquadrável no nº 1 do artº 65º acima citado, pelo que se impunha a notificação por carta registada com aviso de receção, a qual foi efetuada por essa forma, quer quanto aos recorrentes, quer quanto ao seu mandatário.
IV - Embora o artº 67º nº 3 do CPT estabelecesse que as notificações aos mandatários “serão feitas por carta ou aviso registados, dirigidos para o domicílio ou escritório dos notificandos” o mesmo não proibia que os mesmos pudessem ser notificados por carta com A/R.
V - Deste modo, notificado o mandatário por esta forma, o prazo de interposição de recurso hierárquico contava-se a partir da data da assinatura do aviso de receção.
Nº Convencional:JSTA00068118
Nº do Documento:SA22013021401145
Data de Entrada:10/26/2012
Recorrente:A.... E OUTRA
Recorrido 1:SUB DIRGER DA AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TT1INST LISBOA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - ACÇÃO ADM ESPECIAL - REC HIERÁRQUICO
Legislação Nacional:CPTRIB91 ART65 ART57 N3 ART63 ART66 N3
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0919/08 DE 2009/03/11; AC STA PROC017307 DE 1993/12/15; AC STA PROC011231 DE 2003/11/05
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO 6ED VOLI PAG371
ALFREDO DE SOUSA E SILVA PAIXÃO - CPT ANOTADO E COMENTADO PAG143
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

I- A……. e B…….., com os demais sinais dos autos, vêm recorrer da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou improcedente a ação administrativa especial por eles deduzida, contra o Ministério das Finanças pedindo a anulação do despacho de 18/08/2004 do Sub Diretor dos Impostos, que rejeitou por intempestividade o recurso hierárquico interposto para o Ministro das Finanças, apresentando para o efeito, alegações nas quais conclui:

A) O problema dos autos reconduz-se a saber se o prazo em apreço se conta a partir da data da assinatura do aviso de receção do oficio remetido a 22/05/1997 a 23/05/1997 - ou a partir de 26/05/1997, de acordo com a dilação de 3 dias prevista no art. 66° nº 1 do C.P.T. e no art. 254° do C.P.C..

B) A sentença recorrida aplica ao acaso dos autos as regras do artº. 65° nº 1 e 66°, n° 3 do C.P.T., que determinam que - tendo as notificações por objeto atos ou decisões suscetíveis de alteraram a situação tributária dos contribuintes - a notificação se considera realizada na data da assinatura do aviso de receção. Mais sustenta a sentença recorrida que o artº. 67° do C.P.T. - relativo às notificações aos mandatários - não afasta o regime daqueles outros preceitos legais.

C) Porém, a norma do artº. 67° do C.P.T. é uma norma especial em relação às regras gerais dos arts. 65° e 66°.
Assim sendo, estando o contribuinte representado por mandatário/advogado, aplica-se a regra do artº. 67° - em todas as situações - já que ubi lex non distinguit nec nos distinguere debemus.

D) É que os advogados - e os que exercem profissionalmente o mandato - até têm a obrigação de ter essa estrutura instalada, assegurando, num escritório, a receção da correspondência registada que lhes é dirigida, razão pela qual não é razoável exigir que as notificações que lhes são dirigidas o tenham de ser com aviso de receção.

E) Pelo exposto, a sentença recorrida aplica erroneamente ao caso dos autos as regras dos artºs. 65° a 66° do C.P.T., quando deveria aplicar as regras do artº. 67° do C.P.T. e, por força do artº. 2°-f) do C.P.T., o regime do artº. 254° do C.P.C., que é equivalente à regra do artº. 66° nº 1 do C.P.T..

F) Ademais, in casu, mesmo que se aplicasse o regime geral dos arts. 65° a 66° do C.P.C., a verdade é que a situação em apreço não se enquadra no nº 1 do artº. 65°, mas no nº 2 do mesmo preceito legal.

G) É que, na situação em apreço, estávamos perante uma decisão que indeferira um pedido de reclamação, pelo que o ato em notificação não era suscetível de alterar a situação tributária do contribuinte.

H) Assim sendo, a notificação não foi efetuada ao abrigo do artº. 65°, nº 1 do C.P.T., mas do seu nº 2. A efetuar por correio registado, nos termos do artº. 65º nº 2 do C.P.T., que se presume feita no terceiro dia útil posterior ao registo, nos termos do artº. 66° nº 1 do C.P.T., razão pela qual a sentença recorrida também aplicou erroneamente os preceitos legais em que se funda.
Termo em que o recurso merece provimento, com as legais consequências.

II. A subdiretora Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou as suas contra alegações com as seguintes conclusões:

1ª) A sentença recorrida prima por excelência de decisão e qualidade de argumentação e configura os factos de forma irrepreensível aplicando a lei - os artigos 65°, nº 1, 66°, nº 3 e 67° do CPT - aos mesmos factos numa interpretação que respeita e acolhe o seu espírito.

2ª) Face às conclusões da alegação do interposto recurso, as quais definem e delimitam o objeto do mesmo, verifica-se que o recurso versa exclusivamente matéria de direito, cabendo o seu conhecimento à secção de contencioso tributário do STA, exceção dilatória cuja verificação obsta ao conhecimento do mérito da causa acordo com os art°s 493º, n° 2; 494°, al. a) e 495° do CPC.

3º) Os RR acusam a sentença recorrida de aplicar erradamente os preceitos legais em que se funda por a notificação não ter sido efetuada ao abrigo do artigo 65°, nº 1 do CPT, mas do seu nº 2, já que, por se estar perante uma situação que indeferira um pedido de reclamação, o ato em notificação não era suscetível de alterar a situação tributária do contribuinte.

4ª) Ora os RR não suscitaram na petição inicial da interposta AAE esta questão - a de o ato em notificação não ser suscetível de alterar a sua situação tributária.

5) Na verdade, nesta ação apenas se vem arguir a ilegalidade do ato recorrido por o mesmo ter erroneamente aplicado o artigo 67°, nº 3 do CPT e os artigos 253° e 254° do CPC, uma vez que esse dispositivo legal estabelece que as notificações dirigidas para os escritórios dos mandatários dos interessados se fazem por correio registado, presumindo-se feita a notificação postal no 3° dia posterior ao do registo ou no 1° dia útil seguinte a esse, quando o não seja, sendo a existência ou não do aviso de receção irrelevante para os efeitos dos autos.

6) Essa questão não constituiu objeto do litígio desenvolvido na 1ª instância, nem foi, por isso, conhecida pela decisão ora sindicada,

7ª) Consequentemente, não é lícito aos ora RR invocar em sede de recurso questões que não tenham suscitado perante o tribunal recorrido. E tais questões, novas, não podem ser apreciadas pelo tribunal de recurso (salvo em situações em que a lei expressamente o determine ou de conhecimento oficioso - cfr. artigos 676°, n° 1 e 684° do CPC), o que não é, manifestamente, o caso sub judice.

8º) Ou seja, porque extravasa o objeto do recurso, por ser questão nova que não foi antes suscitada perante o tribunal de 1° instância, devem irrelevar as alegações dos RR, insertas nas conclusões F), G) e H) alegações de recurso.

9º) Contrariamente ao alegado pelos RR. não foi feita pela sentença recorrida errónea aplicação ao caso dos autos das regras dos artigos 65° e 66° do CPT.

10º) Sobre a matéria é perfeitamente esclarecedor o comentário n° 4 ao artigo 67° do CPT, a págs.148º do CPT anotado por Alfredo José de Sousa e José da Silva Paixão, 4ª edição.

11º) A regra (geral) formulada no artº. 65.º, nº 1 do mesmo compêndio legal, é no sentido da obrigatoriedade de serem efetivadas por carta registada com aviso de receção as notificações “sempre que tenham por objeto atos ou decisões suscetíveis de alterarem a situação tributária dos contribuintes (…)”.
12ª) Não tendo sido questionada pelos então AA. não se tratar de ato suscetível de alterar a sua situação tributária, carece de qualquer sentido lógico o facto do respetivo mandatário se escudar nessa sua qualidade de mandatário dos AA e ora RR para vir ao processo exigir o que a lei proibe: a efetivação por mera carta registada de notificação que tenha por objeto ato ou decisão suscetível de alterar a situação tributária dos seus representados.

13ª) Ainda que se considere que a dilucidação da questão controvertida nos presentes autos passa pela determinação da natureza do ato notificado - decisão suscetível de alterar ou não a situação tributária dos RR - o que, sem conceder, apenas a título de patrocínio se hipotetiza - falece toda a argumentação dispendida pelos RR quando afirmam não se enquadrar a situação em apreço no nº 1 mas sim no n° 2 do artigo 65° do CPT.

14ª) A situação em discussão reporta-se a ato/decisão que negou direitos a benefícios que os RR entendiam ter.

I5ª) E sobre a matéria tem sido entendimento jurisprudencial firme que devem considerar-se “atos e decisões suscetíveis de alterarem a situação tributária dos contribuintes não apenas os que em concreto produzem uma alteração de tal situação, mas também todos aqueles em que se discuta a possibilidade dessa concretização”.

16ª) Sendo qualificados como tal também “os atos ou decisões que criam deveres ou encargos para os destinatários ou lhes restringem ou negam direitos que aqueles entendem ter”.

17ª) As notificações de atos que neguem direitos a benefícios fiscais por se concretizarem numa alteração da situação tributária dos respetivos destinatários, devem processar-se por via de carta registada com A/R, sob pena de os destinatários poderem vir a ser considerados como não validamente notificados.

18ª) A decisão de indeferimento em causa tinha de ser notificada por carta registada com A/R não sendo bastante o envio de carta registada.
Nestes termos e nos mais de direito, deverá ser julgada procedente a invocada exceção de incompetência absoluta do TCAS, em razão da hierarquia, para conhecer do presente recurso, sendo competente a Secção do Contencioso Tributário do STA e/ou ser mantida a Sentença Recorrida, negando-se provimento ao Recurso interposto por não se verificarem os vícios alegados, tudo, com as inerentes consequências legais.
Devem, outrossim, os RR ser condenados em custas e restantes despesas processuais e procuradoria condigna ao advogado do R.

III. Por acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul proferido a fls. 158/164, este declarou-se incompetente em razão da hierarquia para conhecer do recurso, porque no seu entendimento, este tem por exclusivo matéria de direito, sendo assim competente a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.

IV. Neste Tribunal, o MP não emitiu parecer.

V. Colhidos os vistos legais cabe agora decidir.

VI. Com interesse para a decisão, foram dados como provados em 1ª instância os seguintes factos:

A) Por despacho de 19/05/1997, o Diretor de Finanças (i) indeferiu o pedido formulado no âmbito do Processo de Reclamação n.º 40031.9/91, (ii) revogou o despacho de 8/11/1995 e (iii) manteve as liquidações relativas ao IRS do ano de 1989 - cfr. fls. 44 e 44-verso do processo instrutor, cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido.

B) O Mandatário dos interessados - ora Autores - tomou conhecimento do dito despacho, de 19/05/1997, por oficio, da mesma data, que foi expedido em 22/05/1997- cfr. fls. 45, 46, 47 e 47-verso, cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido.

C) O respetivo aviso de receção foi assinado em 23/05/1997 - cfr. fls. 45, 46, 47 e 47- verso, cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido.

D) A assinatura dos avisos de receção, referentes à correspondência dirigida Mandatário dos interessados, é assegurada pelos serviços administrativos do respetivo escritório - por acordo.

E) Em 25/06/1997, e relativamente ao despacho de 19/05/1997, foi interposto recurso hierárquico para o Ministro das Finanças - cfr. fls. 50 a 57 do processo instrutor, cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido.

F) Tendo merecido, em 11/03/2004, despacho que, concordando com fundamentos constantes de uma informação e de um parecer, segundo os quais “deve ser negado provimento ao presente recurso hierárquico por o mesmo ter sido interposto fora do prazo legalmente estabelecido”, manteve o ato recorrido - cf. fls. 61 a 65 do processo instrutor, cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido.

VII. Conforme referido na conclusão da alínea A) dos recorrentes, a questão dos autos reconduz-se a saber se o prazo para interposição do recurso hierárquico se devia contar a partir da data da assinatura do aviso de receção do oficio remetido a 22/05/1997 ou a partir de 26/05/1997, de acordo com a dilação de 3 dias prevista no artº. 66°, nº 1 do C.P.T. e no artº. 254° do C.P.C..

VII.1. A decisão recorrida entendeu que tal prazo deveria contar-se a partir da data da assinatura do aviso já que, por aplicação do disposto no nº 1 do artº 65º do CPT, então em vigor, a notificação deveria ser obrigatoriamente efetuada por carta registada com aviso de receção e, nestes casos, por determinação do nº 3 do artº 66º do mesmo diploma, a notificação considera-se efetuada na data em que ele for assinado pelo destinatário ou por pessoa que o possa fazer nos termos do regulamento dos serviços postais.

VII.2. Os recorrentes, por sua vez, defendendo entendimento contrário, argumentam da seguinte forma:

A norma do artº. 67° do C.P.T. é uma norma especial em relação às regras gerais dos arts. 65° e 66°. pelo que, estando o contribuinte representado por mandatário/advogado, aplica-se a regra do artº. 67° em todas as situações.

Isto porque os advogados - e os que exercem profissionalmente o mandato - até têm a obrigação de ter essa estrutura instalada, assegurando, num escritório, a receção da correspondência registada que lhes é dirigida, razão pela qual não é razoável exigir que as notificações que lhes são dirigidas o tenham de ser com aviso de receção.

De qualquer forma, mesmo que se aplicasse o regime geral dos arts. 65° a 66° do C.P.C., a verdade é que a situação em apreço não se enquadra no nº 1 do artº. 65°, mas no nº 2 do mesmo preceito legal, já que, na situação em apreço, estávamos perante uma decisão que indeferira um pedido de reclamação, pelo que o ato em notificação não era suscetível de alterar a situação tributária do contribuinte.

Assim sendo, a notificação deveria ser efetuada por correio registado, nos termos do artº. 65º nº 2 do C.P.T., que se presume feita no terceiro dia útil posterior ao registo, nos termos do artº. 66° nº 1 do C.P.T.
Deste modo, recebida a carta no dia 23/05/97, foi tempestiva a interposição do recurso em 26.06.97.

VII.3. A entidade requerida, por sua vez, defende a manutenção da decisão recorrida invocando que este STA não deve conhecer da questão de saber se está ou não em causa um ato suscetível de alterar a situação tributária do contribuinte, uma vez que essa questão não foi suscitada na petição inicial. Com efeito, nessa petição os recorrentes apenas vieram arguir a ilegalidade do ato recorrido por o mesmo ter erroneamente aplicado o artigo 67°, nº 3 do CPT e os artigos 253° e 254° do CPC. Essa questão não constituiu objeto do litígio desenvolvido na 1° instância, nem foi, por isso, conhecida pela decisão.

Assim, porque extravasa o objeto do recurso, por ser questão nova que não foi antes suscitada perante o tribunal de 1ª instância, devem irrelevar as alegações dos RR, insertas nas conclusões F), G) e H) alegações de recurso.

De todo o modo, anda que se considere que a dilucidação da questão controvertida nos presentes autos passa pela determinação da natureza do ato notificado - decisão suscetível de alterar ou não a situação tributária dos RR - falece toda a argumentação dispendida pelos RR quando afirmam não se enquadrar a situação em apreço no nº 1 mas sim no n° 2 do artigo 65° do CPT.

É que a situação em discussão reporta-se a ato/decisão que negou direitos a benefícios que os RR entendiam ter, sendo que devem considerar-se “atos e decisões suscetíveis de alterarem a situação tributária dos contribuintes não apenas os que em concreto produzem uma alteração de tal situação, mas também todos aqueles em que se discuta a possibilidade dessa concretização”, bem como também “os atos ou decisões que criam deveres ou encargos para os destinatários ou lhes restringem ou negam direitos que aqueles entendem ter”.

As notificações de atos que neguem direitos a benefícios fiscais por se concretizarem numa alteração da situação tributária dos respetivos destinatários, devem processar-se por via de carta registada com A/R, sob pena de os destinatários poderem vir a ser considerados como não validamente notificados.

A decisão de indeferimento em causa tinha de ser notificada por carta registada com A/R não sendo bastante o envio de carta registada.

Vejamos então qual destes entendimentos colhe o apoio legal.

VIII. Antes de mais e relativamente à questão de saber se a notificação respeitava a ato suscetível de alterar a situação tributária dos recorrentes, parece-nos que a mesma tem de ser apreciada, já que a decisão recorrida se baseou no artº 65º do CPT que se reporta exatamente a essa questão. Assim, embora a decisão recorrida possa não ter afrontado diretamente essa questão entendemos dever dela conhecer para apreciação do mérito da causa.

VIII.1. O citado artº 65º do CPT dispunha o seguinte, nos seus nºs 1 e 2:

“1 - As notificações são efetuadas obrigatoriamente por carta registada com aviso de receção, sempre que tenham por objeto atos ou decisões suscetíveis de alterarem a situação tributária dos contribuintes ou a convocação para estes assistirem ou participarem em atos ou diligências.
2 - As notificações não abrangidas pelo número anterior serão efetuadas por carta registada”.

De acordo com a doutrina e a jurisprudência, consideram-se atos ou decisões suscetíveis de alterarem a situação tributária dos contribuinte não só aqueles que efetivamente determinam uma alteração desta, mas também aqueles em que está em discussão a possibilidade de se concretizar essa alteração.
Assim, deverão ter essa qualificação os atos ou decisões que criam deveres ou encargos para os destinatários ou lhes restringem ou negam direitos que aqueles entendem ter.
Serão, por isso, de efetuar por carta registada com aviso de receção, entre outras e em princípio, as notificações de atos de liquidação de tributos que concretizem uma alteração da situação tributária e as de atos que recusem o reconhecimento de benefícios fiscais. (V. Lopes de Sousa – CPPT – Volume I – 6ª edição, pág. 371)

Os «atos ou decisões suscetíveis de alterarem a situação tributária dos contribuintes» são, desde logo, os atos tributários - correção ou fixação da matéria coletável, liquidação dos impostos - e as decisões finais dos processos graciosos, suscetíveis de reclamação, recurso ou impugnação judicial . (Alfredo José de Sousa e Silva Paixão – CPT Anotado e Comentado, pág. 139).

Deste modo, uma decisão de indeferimento de reclamação graciosa, na qual se discutia a possibilidade de ser alterada a situação tributária do contribuinte, integra-se no nº 1 da norma citada. (Acórdão do STA, de 11.03.2009 – Processo nº 919/2008)

Aqui chegados temos então de concluir que a notificação em causa nos autos - notificação de despacho do Diretor de Finanças que indeferiu pedido formulado em reclamação graciosa – tinha de ser – como foi – efetuada por carta registada com aviso de receção.

E, efetuada por esta forma, considerava-se a notificação realizada na data em que fosse assinado pelo destinatário o aviso de receção (artº 66º, nº 3 do CPT).

No caso dos mandatários, a regra geral constava do nº 3 do artº 67º do CPT (Notificações aos mandatários) que dizia o seguinte:
“3 - As notificações serão feitas por carta ou aviso registados, dirigidos para o domicílio ou escritório dos notificandos, podendo estes ser notificados pelo escrivão quando encontrados no edifício do tribunal ou da repartição de finanças”.

Será então que, neste caso, sendo obrigatória a notificação do contribuinte por carta registada com A/R, o seu mandatário deveria ser notificado pela mesma forma, ou, obrigatoriamente, deveria este ser notificado por mera carta registada?

VIII.2.Sobre esta questão se pronunciaram Alfredo José de Sousa e Silva Paixão – CPT Anotado e Comentado, pág. 143, em anotação ao artº 67º do CPT, nos seguintes termos: ”Este normativo não altera, pois, o regime geral do artº. 65 .°, que estabelece a regra da notificação postal.
Por isso, deve ser articulado com esse artº. 65º, de molde a que as notificações sejam por carta com aviso de receção dirigida ao mandatário judicial sempre que «tenham por objeto atos ou decisões suscetíveis de alterar a situação tributária dos contribuintes ou a convocação para estes assistirem ou participarem em atos ou diligências».
Não faria sentido que pelo facto de o contribuinte ter constituído mandatário se fosse menos exigente na forma de notificação de cada um deles”.

Também este STA se pronunciou, sobre questão idêntica no Acórdão de 15.12.1993 – Processo nº 017307, no qual se argumentou da seguinte forma:

“A questão subordinante dos autos é, antes, a de saber se é legal a notificação por via postal com aviso de receção.
Ora, nos termos do artigo 67º do CPT, as notificações aos interessados que tenham constituído mandatário serão feitas na pessoa deste e no seu escritório - nº 1- «por carta ou aviso registados, dirigidos para o domicílio ou escritório dos notificandos, podendo estes ser notificados pelo escrivão quando encontrados no edifício do tribunal ou da repartição de Finanças».
A lei não faz, pois, qualquer referência ao aviso de receção.
Mas isso não quer dizer que ele não possa ser utilizado.
Na verdade, prevê-se até uma forma de notificação mais solene: a efetuada na própria pessoa do mandatário.
Ora, a notificação - artigo 63º - tem por fim levar ao conhecimento do interessado um determinado facto.
E a garantia daquele obtém-se seguramente com a assinatura do aviso de receção. Daí que não haja de formular qualquer presunção.
O próprio artigo 65º do CPT é concretização de tal princípio ao exigir que as notificações relativas a atos mais importantes ou de maior relevância sejam efetuadas com aviso de receção, incluídos os próprios mandatários - cfr. Alfredo de Sousa e J. Paixão, Código de Processo Tributário Anotado, p. 131, nota 4.
Da circunstância não resulta, aliás, qualquer prejuízo para a recorrente, pois o prazo do recurso é sempre o mesmo - oito dias - e conta-se sempre do conhecimento da decisão.
Só que, quando não há lugar a aviso de receção, ele é presumido - presunção juris tantum: cf. artigo 66º do CPT.
A posição da recorrente é, até, algo contraditória: pois, sendo certo, nos autos, o conhecimento da decisão através da assinatura do aviso, ela, ainda assim, pretende utilizar-se da presunção do recebimento da carta registada em data diversa.
Ora, como daquele artigo 66º iniludivelmente resulta, a presunção só tem lugar quando não há aviso de receção - nº 1. Quando o há - nº 3 - «a notificação considera-se efetuada na data em que ele for assinado pelo destinatário ou por pessoa que o possa fazer nos termos do regulamento dos serviços postais».
Acrescente-se, ainda, que a abolição da exigência dos avisos de receção - artigo 1º, nº 1, do Decreto-Lei nº 121/76, de 11 de fevereiro -, deve-se ao augúrio de compressão das despesas públicas, à simplificação dos atos burocráticos e acumulação de serviço nos tribunais mas sempre sem prejuízo da segurança da comunicação - cf. o relatório do diploma.
Ora, já por aí se vê que se, não obstante for concretizada essa maior segurança, a notificação não pode ser tida por irregular, considerando-se então a data real da notificação, que não a meramente presumida”.

Não existem razões para se seguir entendimento diferente do que ficou exposto.

Acrescentaremos apenas que, como ficou dito no acórdão transcrito, o prazo para interposição do recurso hierárquico é sempre o mesmo, ao contrário do que parece resultar da conclusão da alínea A) dos recorrentes, que pretendem que, se a notificação tivesse sido efetuada por carta registada ao seu advogado, teriam uma dilação de três dias.

O que é relevante para efeito de garantias de defesa é o conhecimento do ato e não a forma por que ele é notificado (salvo se da notificação menos solene resultar a diminuição dessas garantias).

Assim, são pertinentes também nesta matéria as considerações feitas no Acórdão desta STA, de 05.11.2003 – Processo nº 011231, onde ficou escrito, para além do mais, o seguinte:

“Não sobra dúvida de que, prescrevendo a lei uma formalidade – remessa de carta registada com aviso de receção -, e procedendo-se em desacordo com essa prescrição – falta de aviso de receção – se incorre numa irregularidade, por preterição de formalidade legal.
Mas é entendimento jurisprudencial corrente que certas irregularidades devem considerar-se sanadas desde que a finalidade que a lei tem em vista com a imposição da formalidade tenha sido atingida, mau grado a sua preterição. Dito de outro modo, a irregularidade, mesmo que essencial, degrada-se, torna-se inconsequente, quando o escopo que ela visava assegurar foi, não obstante, atingido.
Tanto mais que o legislador, ao impor o aviso de receção, não quis garantir uma maior eficácia da notificação. Fica tão ciente daquilo que lhe é transmitido por uma carta aquele que a recebe com aviso de receção como aquele a quem tal aviso não é apresentado. Não é porque o destinatário tem de assinar um aviso, confirmando a receção, que a notificação se torna qualitativamente melhor.
O objetivo querido pelo legislador, ao escolher o meio, foi, antes, e só, alcançar aquilo que ele propicia: habilitar o remetente com um documento comprovativo da receção pelo destinatário, e da data em que tal ocorreu. Ou seja, a função do aviso de receção não é outra que proporcionar à Administração uma prova inequívoca de que a notificação se concretizou, na pessoa devida, e numa dada data.
Ora, no nosso caso, sabe-se, porque a recorrida o afirma, que recebeu a notificação. É verdade que tal notificação foi levada a cabo por meio que não respeitou integralmente a prescrição legal, que manda fazê-la por carta registada com aviso de receção. Mas a consequência da falta não é a inexistência da notificação, nem, sequer, a sua invalidade. É, apenas, o colocar a Administração perante a necessidade de provar que a notificação teve lugar, apesar da preterição da formalidade. Prova que, no caso, não tem que fazer, pois a recorrida não questiona, antes afirma, a receção da notificação”.

No caso dos autos, está também provado e aceite que o mandatário dos recorrentes tomou conhecimento do despacho em causa nos autos, tendo o aviso de receção sido assinado em 23.05.1997 (factos provados nas alíneas B) e C) do probatório supra).

E, assim, devendo a notificação ter-se por efetuada em 23.05.1997, por força do disposto no artº 66º, nº 3 do CPT, o prazo de trinta dias para interposição do recurso hierárquico, iniciou-se no dia seguinte para terminar em 22 de junho do mesmo ano.
Como o recurso foi interposto em 25 de junho, (V. alínea f) do probatório), é manifestamente extemporâneo, como bem se decidiu.

A decisão recorrida é, por isso, de manter.

IX. Nestes termos e pelo exposto, nega-se provimento ao recurso, confirmando-se a decisão recorrida.

Custas pelos recorrentes
Lisboa, 14 de fevereiro de 2013. – Valente Torrão (relator) – Ascensão Lopes – Pedro Delgado.