Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0712/14.1BECBR
Data do Acordão:05/10/2019
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SÃO PEDRO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
PROTOCOLO
Sumário:Justifica-se admitir revista relativamente à questão de saber em que termos são, ou não devidos os pagamentos de serviços prestados sem que tenha sido formalmente celebrado o acordo ou protocolo para tal exigido.
Nº Convencional:JSTA000P24533
Nº do Documento:SA1201905100712/14
Data de Entrada:04/24/2019
Recorrente:ASSOCIAÇÃO DOS PRODUTORES FLORESTAIS DO CONCELHO DE ARGANIL
Recorrido 1:INSTITUTO DA CONSERVAÇÃO DA NATUREZA E DAS FLORESTAS, I.P.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar – art. 150º, 1, do CPTA.


Acordam no Supremo Tribunal Administrativo (art. 150º, 1 do CPTA)

1. Relatório

1.1. A ASSOCIAÇÃO DOS PRODUTORES FLORESTAIS DO CONCELHO DE ARGANIL recorreu para este Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do art. 150º, 1, do CPTA, do acórdão do TCA Norte, proferido em 21 de Dezembro de 2018, que confirmou a sentença proferida pelo TAF de Coimbra, que por seu turno julgou improcedente a ACÇÃO ADMINISTRATIVA COMUM por si intentada contra o INSTITUTO DA CONSERVAÇÃO DA NATUREZA E DAS FLORESTAS IP, onde pedia a condenação do réu a pagar-lhe a quantia de € 22.220,95 acrescida de juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento.
1.2. Justifica a admissibilidade da revista por ser “notória a relevância jurídica da questão que se reveste de uma importância fundamental”.
1.3. A entidade recorrida pugna pela não admissão da revista.

2. Matéria de facto
Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. Matéria de Direito
3.1. O artigo 150.º, n.º 1, do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». Como decorre do próprio texto legal e a jurisprudência deste STA, tem repetidamente sublinhado trata-se de um recurso excepcional, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando-o como uma «válvula de segurança do sistema», que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.
3.2. A questão suscitada nos autos é a de saber se o réu deve ou não ser condenado a pagar à autora serviços por esta efectuados, e que se traduziram em sessões de esclarecimento, junto dos proprietários de “pinheiro bravo” visando a erradicação do organismo designado como Nemátodo da Madeira do Pinheiro.
Questão que juridicamente se colocou face à Clausula 7ª do Protocolo celebrado entre a ora recorrida, os Município de Arganil e de Lousã e mais seis Organizações de Produtores Florestais (Protocolo de Colaboração), segundo a qual: “Para o desenvolvimento das tarefas referidas nas cláusulas 2ª e 4ª o primeiro outorgante acordará com todos os restantes através de contrato ou protocolo, as formas de apoio bem como os meios necessários aos trabalhos a realizar por cada um”.
A autora (ora recorrente) organizou e divulgou sessões de esclarecimento sobre o nemátodo da madeira do pinheiro, no ano de 2008, sendo essa actividade que pretende lhe seja paga, através da presente acção. Pois, embora não tivesse celebrado qualquer contrato ou protocolo ao abrigo da citada cláusula 7ª a autora recebeu, em 27 de Outubro de 2018, do Gabinete do Secretário de Estado do Desenvolvimento Rural e das Florestas um ofício onde lhe era solicitado o “envio a este Gabinete de uma informação que identifique o ponto de situação das acções realizadas por essa associação, os exemplares materiais produzidas e as facturas correspondentes aos trabalhos e materiais executados”.
Ambas as instâncias entenderam que o réu não tinha o dever de pagar à autora os serviços em causa por não ter sido celebrado contrato ou protocolo ao abrigo da citada cláusula 7ª do Protocolo de Colaboração.
Neste recurso a autora não diz que tenha havido esse contrato ou protocolo, mas entende que deve ser paga pelos trabalhos que prestou por não ser jurídica e eticamente possível que seja a Associação a arcar com os prejuízos da urgente necessidade de intervenção do Estado, que solicitou os seus serviços. Entende a recorrente que o pagamento dos serviços prestados fora expressamente aceite, mormente pelo Secretário de Estado que superintendia na área de atribuição.
3.3. Como decorre do exposto a questão colocada é a de saber se os serviços prestados pela autora devem ou não ser pagos pelo réu, muito embora seja certo que não chegou a ser formalizado qualquer contrato ou protocolo, nos termos previstos na cláusula 7ª do denominado Protocolo de Colaboração.
Julgamos que a questão tem relevância jurídica merecedora da intervenção deste STA.
Com efeito, se por um lado, a prestação de serviços pela autora foi feita no âmbito de um protocolo e a sua necessidade não está posta em causa, também é certo que não foram seguidas as formalidades previstas para o respectivo pagamento.
Este tipo de situações – em que a actuação no terreno é levada a cabo sem o suporte jurídico formalmente adequado- é sempre controverso. O Estado aproveita os serviços prestados por quem os devia prestar e que foram efectivamente programados, não põe em causa a sua necessidade, mas por não terem sido seguidos os passos formalmente exigidos para o seu pagamento, recusa esse pagamento.
Julgamos ainda que estas situações – originadas pela inadequação entre a necessidade de intervenção no terreno e o formalismo jurídico próprio - podem vir a ocorrer no futuro, sendo nessa medida, importante a intervenção deste Supremo Tribunal Administrativo para a definição do quadro jurídico que lhes é aplicável.

4. Decisão

Face ao exposto admite-se a revista.

Porto, 10 de Maio de 2019. – São Pedro (relator) – Costa Reis – Madeira dos Santos.