Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0921/14
Data do Acordão:01/15/2015
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:VÍTOR GOMES
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
RECLAMAÇÃO
NULIDADE
REFORMA DE ACÓRDÃO
Sumário:I - Não é nulo por omissão de pronúncia o acórdão que, decidindo sobre a admissão de um recurso de revista excepcional, aprecia se a questão trazida ao recurso preenche os pressupostos previstos no artigo 150.º, 1, do CPTA.
II - Não é susceptível de reforma o acórdão cujo sentido decisório não resulta de erro ostensivo.
Nº Convencional:JSTA000P18464
Nº do Documento:SA1201501150921
Data de Entrada:07/18/2014
Recorrente:A.......
Recorrido 1:IFAP-INST DE FINANCIAMENTO DA AGRICULTURA E PESCAS, I.P.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo

1. A……….., notificada do acórdão proferido neste STA, em 30.09.2014, que decidiu não admitir o recurso de revista que havia interposto, nos termos do art. 150º CPTA, vem agora dele reclamar por nulidade, por omissão de pronúncia, e, subsidiariamente, pedir a reforma do acórdão, com aclaração.

A Reclamante vem reiterar os fundamentos constantes da interposição de recurso e, em síntese, afirma que “foram duas as circunstâncias de excepcionalidade apresentadas como fundamento para justificar a admissibilidade do recurso…”:

“A) O facto de a sentença ter sido proferida por um juiz singular e não por um relator de uma formação colectiva (com um relator e dois adjuntos que deveriam ter ab initio designados no processo), pelo que, não sendo tal Juiz Singular Relator, não só lhe não é aplicável o disposto no art. 27º nº 2 do CPTA, como também a sentença se encontra ferida de nulidade, facto que ocorreu não só neste processo mas em inúmeros processos que correram nos Tribunais Administrativos e Fiscais criados juntamente com o TAF de Castelo Branco, e que tinham precisamente a mesma composição, sendo esta questão que ainda não foi abordada nesse colendo Tribunal;

B) O facto de entre a Douta Sentença de primeira instância e o Acórdão do TCA SUL de que se recorreu – Acórdão esse que nem sequer admite conhecer do mérito da causa – terem decorrido cerca de seis anos e quatro meses (isto para além dos anos em que o processo esteve em primeira instância), sem que tenham existido, em sede de recurso de apelação, vicissitudes processuais que justifiquem tal lapso de tempo, pelo que a sua extemporânea não admissão constitui sonegação de justiça.”

E continua “…que, se no que respeita ao segundo dos fundamentos enunciados (…), se pode in extremis admitir que o Douto Acórdão em crise terá dado uma, ainda que indirecta e incompleta, resposta à questão do excessivo decurso do prazo deste processo, através da remissão para o Douto Acórdão de 26/06/2014, em formação alargada, – processo 01831/13 –, já quanto ao primeiro dos fundamentos é completamente omisso quanto às questões efectivamente colocadas pelo recorrente.”

Conclui que o acórdão é nulo por omissão de pronúncia, em violação do disposto na alínea d) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC, uma vez que “não conheceu em absoluto, e muito menos se pronunciou fundadamente, quanto à matéria” [referida em A)].

Vem ainda pedir, a título subsidiário e por mera cautela, em caso de não se considerar a existência da referida nulidade, a reforma da sentença, ao abrigo do art. 616.º, n.º 2, a) do CPC.

A este respeito, refere serem inconstitucionais as interpretações do art.º 27.º, n.º 2, do CPTA, feitas nos acórdãos de 05.12.2013, Proc. nº 01369/13 e de 26.06.2014, Proc.nº 01831/13, e, consequentemente, no acórdão em crise “na medida em que foram cooptados (…) e que por isso o integram”. Alega ainda a manifesta inaplicabilidade da norma constante do art.º 43.º, n.º 3, alínea h), do ETAF, quanto a um pretenso suprimento da insuficiência, de jure, de quadros de Juízes Administrativos do TAFCB”, concluindo existir “uma impossibilidade jurídica de constituição colegial do tribunal no processo” e “tendo o Douto Acórdão recorrido fixado que, a existir tal impossibilidade, se justificaria a admissão do recurso, requer-se a reforma do mesmo no sentido da fixação da existência dessa impossibilidade, e (…) na sua admissão…”.

Por último requer a seguinte aclaração: “qual a interpretação que deram aos artºs 40º/3 e 43/3/h) do ETAF, para concluir pela possibilidade de suprimento, pelo Juiz Presidente do TAFCB, ou pelo CSTAF, no caso de inexistência, de jure, de juízes em número suficiente para criação da formação colectiva a que alude esse artº 40º/3?”

Não houve resposta.

2. Passando à análise da arguida nulidade.

O acórdão, objecto da requerida omissão de pronúncia justificou a não admissão da revista porque “o acórdão recorrido, ao não conhecer do recurso, está em conformidade com a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo acerca do regime de impugnações das decisões do juiz de tribunal administrativo e fiscal em acções administrativas especiais de valor superior à alçada do respectivo tribunal”, enunciando de seguida as decisões do tribunal pertinentes, para concluir “estando a matéria que a recorrente quer ver apreciada, no essencial da sua argumentação, já respondida pela jurisprudência deste Supremo Tribunal e tendo o acórdão recorrido seguido a respectiva linha de entendimento, a problemática trazida perdeu relevo, não podendo ser já considerada de importância fundamental e, naturalmente, não se revela, também, que a revista seja claramente necessária para melhor aplicação do direito”.

Tal como este STA tem afirmado, a nulidade por omissão de pronúncia só ocorre quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar, essenciais para dirimir da lide e não da mera argumentação aduzida pela parte em defesa das teses por si expendidas (cfr. Ac. de 7/5/09, Proc. 209/09).

Nos termos do art. 150.º, n.ºs 1 e 5, do CPTA, os pressupostos de admissibilidade da revista devem ser objecto de “apreciação preliminar sumária”, ou seja, deve ser sumariamente ponderada a importância fundamental da relevância jurídica, social da questão ou a clara necessidade de intervenção do STA.

Ora, no caso, o que tinha de ser apreciado era se o não conhecimento do recurso por parte do TCA constituía matéria susceptível de preencher os requisitos do art.º 150.º, n.º 1 do CPTA e, como se alcança do texto transcrito, o acórdão pronunciou-se fundamentadamente sobre a questão que lhe competia enfrentar no quadro daquele preceito. A eventual menor apreciação e consideração de todos os argumentos utilizados para sustentar a admissão da revista não é subsumível à figura da nulidade por omissão de pronúncia.

3. De acordo com a disposição legal invocada (art.º 616.º, n.º 2, al. a) do CPC), a sentença (ou acórdão) insusceptível de recurso pode ser reformada pelo tribunal que a proferiu quando, por manifesto lapso do juiz, tenha ocorrido erro na determinação da norma aplicável ou na qualificação jurídica dos factos.

No caso, o requerente sustenta ter havido erro na determinação da norma aplicável. Ora, não compete à formação a que se refere o n.º 5 do artigo 150.º conhecer do mérito das questões suscitadas, mas apreciar a verificação dos requisitos exigidos pelo n.º 1 do artigo 150.º, o que se efectuou face à alegação e à identificação das questões colocadas e decididas no acórdão do TCA para que se pedia revista. E, neste juízo como em geral, a reforma só é consentida perante lapsos manifestos, não bastando que a solução encontrada pela decisão que é objecto desse pedido seja discutível ou de acerto duvidoso. A reforma é um remédio excepcional, pois derroga os princípios da estabilidade das decisões judiciais e do esgotamento do poder jurisdicional depois de proferida a decisão.

Desde logo, não pode dizer-se que o acórdão tenha interpretado o art.º 27.º, n.º 2 do CPTA “através de cooptação” de forma inconstitucional. O acórdão que não admitiu o recurso de revista excepcional concluiu que, estando o acórdão recorrido em conformidade com a jurisprudência do STA, não poderia ser a problemática trazida ao recurso (regime de impugnação das decisões do juiz de tribunal administrativo e fiscal em acções administrativas especiais de valor superior à alçada do respectivo tribunal) considerada de importância fundamental ou que existisse a clara necessidade de aplicação do direito. Efectivamente, o acórdão não aplicou sequer aquela norma como sua ratio decidendi e a jurisprudência do STA que cita não é objecto do recurso. Se houver norma ou interpretação normativa desconforme com a Constituição o seu acto jurisdicional só poderá ver-se na decisão da instância de que não se admitiu o recurso.

No que respeita à segunda questão objecto do pedido de reforma, não se vê que enferme de manifesto lapso a afirmação de que se afigura manifestamente insustentável admitir a impossibilidade jurídica de constituição colegial do tribunal porque incumbia “ao órgão de gestão – em primeiro lugar ao presidente do tribunal (al. h) do n.º 3 do art.º 43.º do ETAF) e em último termo ao Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais – designar os juízes que deveriam intervir para assegurar a composição das formações de julgamento” porque corresponde ao disposto na lei e à representação das competências do presidente na direcção do tribunal e do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais como “órgão de gestão e disciplina dos juízes da jurisdição administrativa”.

4. Quanto ao pedido de interpretação dos art.ºs 40.º, n.º 3 e 43.º, n.º 3, al. h) do ETAF, ele exorbita os limites impostos pelas leis do processo, nomeadamente pelos preceitos legais ao abrigo dos quais formulou o requerimento em apreço.

5. Decisão

Pelo exposto, decide-se indeferir os pedidos e condenar a recorrente nas custas.

Lisboa, 15 de Janeiro de 2015. – Vítor Gomes (relator) – Alberto Augusto Oliveira – São Pedro.